quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

CONHECE-TE A TI MESMO[1]




Qual é o meio prático e mais eficaz para se melhorar nesta vida, e resistir aos arrastamentos do mal?
‒ Um sábio da antiguidade vos disse: “Conhece-te a ti mesmo[2]”.
Compreendemos toda a sabedoria dessa máxima, porém, a dificuldade está precisamente em se conhecer a si mesmo; qual é o meio de o conseguir?
‒ Fazei o que eu fazia quando vivi na Terra: no fim de cada dia interrogava a minha consciência, passava em revista o que havia feito e me perguntava a mim mesmo se não tinha faltado ao cumprimento de algum dever, se ninguém teria tido motivo para se queixar de mim.
Foi assim que cheguei a me conhecer e ver o que em mim necessitava de reforma. Aquele que todas as noites lembrasse todas as suas ações do dia, e, se perguntasse o que fez de bem ou de mal, pedindo a Deus e ao seu anjo guardião que o esclarecessem, adquiriria uma grande força para se aperfeiçoar, porque, acreditai-me, Deus o assistirá. Formulai, portanto, as vossas perguntas, indagai o que fizestes e com que fito agistes em determinada circunstância, se fizestes alguma coisa que censuraríeis nos outros, se praticastes uma ação que não ousaríeis confessar. Perguntai ainda isto: Se aprouvesse a Deus chamar-me neste momento, ao entrar no mundo dos Espíritos, onde nada é oculto, teria eu de temer o olhar de alguém? Examinai o que pudésseis ter feito contra Deus, depois contra o próximo e por fim contra vós mesmos. As respostas serão motivo de repouso para vossa consciência ou indicarão um mal que deve ser curado.
O conhecimento de si mesmo é portanto a chave do melhoramento individual. Mas, direis, como julgar a si mesmo? Não se terá a ilusão do amor-próprio, que atenua as faltas e as torna desculpáveis? O avaro se julga simplesmente econômico e previdente, o orgulhoso se considera tão somente cheio de dignidade. Tudo isso é muito certo, mas tendes um meio de controle que não vos pode enganar. Quando estais indecisos quanto ao valor de uma de vossas ações, perguntai como a qualificaríeis se tivesse sido praticada por outra pessoa. Se a censurardes em outros, ela não poderia ser mais legítima para vós, porque Deus não usa de duas medidas para a justiça. Procurai também saber o que pensam os outros e não negligencieis a opinião dos vossos inimigos, porque eles não têm nenhum interesse em disfarçar a verdade e geralmente Deus os colocou ao vosso lado como um espelho, para vos advertirem com mais franqueza do que o faria um amigo. Que aquele que tem a verdadeira vontade de se melhorar explore, portanto, a sua consciência, a fim de arrancar dali as más tendências como arranca as ervas daninhas do seu jardim; que faça o balanço da sua jornada moral como o negociante o faz dos seus lucros e perdas, e eu vos asseguro que o primeiro será mais proveitoso que o outro. Se ele puder dizer que a sua jornada foi boa, pode dormir em paz e esperar sem temor o despertar na outra vida.
Formulai, portanto, perguntas claras e precisas e não temais multiplicá-las: pode-se muito bem consagrar alguns minutos à conquista da felicidade eterna. Não trabalhais todos os dias para ajuntar o que vos dê repouso na velhice? Esse repouso não é o objeto de todos os vossos desejos, o alvo que vos permite sofrer as fadigas e as privações passageiras? Pois bem: o que é esse repouso de alguns dias, perturbado pelas enfermidades do corpo, ao lado daquilo que aguarda o homem de bem? Isto não vale a pena de alguns esforços? Sei que muitos dizem que o presente é positivo e o futuro incerto. Ora, aí está, precisamente, o pensamento que fomos encarregados de destruir em vossas mentes, pois desejamos fazer-vos compreender esse futuro de maneira a que nenhuma dúvida possa restar em vossa alma. Foi por isso que chamamos primeiro a vossa atenção para os fenômenos da Natureza que vos tocam os sentidos e depois vos demos instruções que cada um de vós tem o dever de difundir. Foi com esse propósito que ditamos “O Livro dos Espíritos”.
SANTO AGOSTINHO

Muitas faltas que cometemos nos passam despercebidas. Se, com efeito, seguindo o conselho de Santo Agostinho, interrogássemos mais frequentemente a nossa consciência, veríamos quantas vezes falimos sem disso nos apercebermos, por não perscrutarmos a natureza e o móvel dos nossos atos. A forma interrogativa tem alguma coisa de mais preciso do que uma máxima que em geral não aplicamos a nós mesmos. Ela exige respostas categóricas, por um sim ou um não, que não deixam lugar a alternativas: respostas que são outros tantos argumentos pessoais, pela soma das quais podemos computar a soma do bem e do mal que existe em nós.

Questão 919/O Livro dos Espíritos

A indução do mal é constante na alma que começa a chegar à maturidade espiritual, no entanto, é nesta oportunidade que ela assimila conhecimentos espirituais, capazes de levá-lo à libertação.
Conhecer-se a si mesmo é a chave preciosa de despertamento dos valores internos, onde o coração é a porta e a consciência, a sala de meditação. Deves, ao final de cada dia, se possível, pensar nos teus atos e analisá-los com bastante rigor, procurando, no outro dia, corrigir alguma coisa que não podes desejar para os outros.
O mal, por vezes, é necessário, como diz Jesus, no tocante ao escândalo, pois é por seu intermédio que passamos a valorizar o bem. Ele é o mesmo bem invertido. Todos, sem exceção, praticamos o inconveniente. Como agricultor ao chegar à mata virgem, que somente encontra dificuldades, depois de tudo pronto, a lavoura medra no terreno, dando-lhes prazer, como frutos do trabalho que venceu todas as dificuldades. Deves fazer qual o comerciante precavido, que sempre, em todo final de dia, dá um balanço na sua organização, para saber o que deve mudar para melhor, conhecendo a intimidade da sua casa comercial. Por que não fazer assim, com o comércio dos teus pensamentos no dia-a-dia, observando o que deve ser mudado para melhor, moralmente? É um trabalho algo pesado, mas que o bom senso pede urgência, principalmente entre os espíritas conscienciosos, que estudam com sinceridade a Doutrina dos Espíritos. Aí os benfeitores espirituais vêm em auxílio aos de boa vontade, ajudando-os no conhecimento de si mesmos.
Conhece-te a ti mesmo é a alta iniciação que a maturidade oferta à alma porque, passando a conhecer-se, fica mais fácil conhecer e respeitar os outros. Podemos dizer que o Espírito, em qualquer posição em que esteja, na carne ou no mundo espiritual, que conhece a si mesmo, encontrou a medula da vida, de onde poderá confortar o corpo e o próprio Espírito, abrindo a visão para a vida transcendental, onde nos aguardam a esperança e a certeza de que não existe morte, porque os sentidos crescem em todas as direções, nos mostrando vida em tudo, desde o vírus até os acúmulos dos mundos que circulam dentro da criação de Deus. Deus é vida.
Para se conhecer a si mesmo, o primeiro passo é o desprendimento, mas que seja feito com certo discernimento, principalmente na época em que vives.
E se emprestais àqueles de quem esperais receber qual é a vossa recompensa? Também os ímpios emprestam aos ímpios, para receberem outro tanto[3].
A usura empana a mente, onde pode dirigir o coração. O interesse pessoal é capaz de turvar os sentimentos de amor, dando outra direção à força do bem, de sorte que o egoísmo cresça e o orgulho passe a dominar o ambiente de paz, surgindo a guerra, e enquanto houver essa luta, jamais o homem entenderá o conhece-te a ti mesmo.
Deus fez as leis espirituais, por saber que começaríamos a vida, torcendo os mandamentos. As leis formuladas por Ele nos ajudam a compreendê-Lo na sua profundidade. A ignorância, ao desaparecer, vai cedendo lugar à compreensão, e a alma percebe que existe a felicidade, pelos raios de paz na consciência que vão surgindo, pela marca do amor.
A Doutrina dos Espíritos, pelos processos da mediunidade, estabelece na Terra modalidades variáveis de aprendizado, pela variação dos sentimentos humanos. Isso é justiça, dando a cada um a lição que merece, ajustando suas forças na força de Cristo.
Sê atento aos meios por que Deus fala ao teu coração, e não percas oportunidade no aprendizado. A tua senda de crescimento somente tu entendes, porque Deus não falha nos teus caminhos nem Cristo te abandona nas tuas lutas.
Esforça-te para não te esqueceres dessa máxima atribuída a Sócrates, mas que é repetição do mesmo que disseram outras almas do passado. Verdadeiramente ela é de Jesus, vinda d`Ele pelos processos do mediunismo mais puro, para almas que viviam à luz da fraternidade.
MIRAMEZ



[1] Filosofia Espírita – Volume 19 – João Nunes Maia
[2] O aforismo grego "Conhece a ti mesmo", é uma das máximas de Delfos e foi inscrita no pronaos do Templo de Apolo em Delfos de acordo com o escritor Pausanias. A máxima, ou aforismo, "conhece-te a ti mesmo" teve uma variedade de significados atribuídos a ele na literatura. Wikipédia
[3] Lucas, 6:34.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

BIOFÓTONS E O PASSE – Qual a atual relação científica entre ambas?[1]



Sandro Fontana


Leitores assíduos já devem ter percebido nossos trabalhos com ralação ao passe. Esse artigo vem para fazer um acréscimo a tudo que já foi abordado pela Revista Ciência Espírita - RCE até hoje.
Em edições passadas relatamos, escrevemos e fizemos diversos experimentos relativos ao passe, inclusive citando diversos trabalhos de cientistas dedicados a uma pesquisa detalhada sobre essa energia detectável que emana das mãos de diversas pessoas. Mas afinal de contas, o que há de mais preciso quanto a essa luz que é expelida quando algumas pessoas desejam ajudar alguém?
Durante os diversos estudos (já citados em edições anteriores), essa energia se demonstrou reflexiva à emissão de fótons. Sim, isso mesmo, emissão de luz numa intensidade ultrafraca. Houve relatos, em experimento controlados[2], de que algumas pessoas chegaram a atingir um nível tão elevado de emissão de fótons que estes se tornaram visíveis.
Esses fótons recebem o nome técnico de biofótons (biophotons), isto porque são emitidos por um corpo vivo, sem a intervenção de elementos artificiais.
Um pesquisador chamado Baumann (dentre outros membros de sua equipe), detectaram que essa emissão ocorre tanto nas faixas UV (ultravioleta) como IR (Infravermelho), na gama de 200nm a 400nm.
Outros dois pesquisadores, Cohen e Popp, afirmam ter captado emissão do corpo humano nas faixas de 400nm a 800nm, onde puderam acompanhar diversas respostas em um estudo que envolveu 200 pessoas.
 Choi2 (e sua equipe), ao fazerem experimentos sobre a energia que surge da palma das mãos, observaram que a maioria dos sinais estão na faixa de 300nm a 650nm.
Em um momento diferente, Popp e outra equipe, fazem experimentos e detectam essa emissão de biofótons na gama de 200nm até 800nm, demonstrando coerência com outros estudos.
Como é possível perceber, o indetectável agora já é detectável, em outras palavras, muito do que o conhecimento espirita vinha disseminando, agora pode ser detectável e mensurável.
Bom, até certo ponto sim, mas isso expõe outras afirmações espiritas em “check”, dentre elas a ideia de que algum tipo de medicação é enviada para o enfermo ou que os espíritos manipulem tal energia.
Até o momento, de fato mesmo, não sabemos se os biofótons são um reflexo do que é realmente transmitido ou se é puramente a luz que provoca tal “ajuda” ou melhora. Já é de conhecimento que uma luz IR artificial reduz inchaços e dores, assim como a UV relacionada com vitaminas, eleva o sistema imunológico. Ok, mas e as outras curas conhecidas?
Se somente a luz explicaria tal processo de cura de algumas coisas, o efeito placebo[3] poderia explicar as demais? Sim, é possível, mas qualquer afirmativa ainda ficaria no campo da especulação e crença. Algo não estudado profundamente até o momento.
Mas e se realmente houver algum “remédio” junto dessa energia, como afirmam os espíritos, como isso poderia ser possível?
Mantendo-nos ainda no campo especulativo, há uma boa chance de que tais elementos subatômicos sejam “lançados” juntamente, e desse modo o processo ocorreria via alteração de DNA e não, pura e simplesmente, algum tipo de elemento químico ou espiritual (sem detecção). Em outras palavras, poderíamos supor que, uma pessoa em estado equilibrado e boa saúde, poderia enviar informações de DNA para DNA via biofótons.
Mas será que existe algo que embasaria isso?
Sim… Por incrível que pareça existe um experimento que sugere isso. Popp percebe uma boa interação entre os biofótons e o DNA, possibilitando que uma fonte transmissora afete a receptora.
Para deixar o tema ainda mais interessante, um grupo de italianos fez uma pesquisa para testar a possibilidade de entrelaçamento quântico com essa energia “sutil”, emanada pelas mãos de médiuns e curandeiros. Eles testaram a intenção de transmissão de tal energia a cerca de 7300km distante do agente/médium. Patrizio Tressoldi e sua equipe concluíram que isso foi totalmente possível, onde o equipamento sensor percebe uma elevação no número de biofótons.
Essas pesquisas são importantes, pois seus resultados condizem com muitas das informações obtidas através dos médiuns. Isso tudo coloca em check a hipótese materialista do placebo, uma vez que a presença de tal energia, mesmo que em quantidade muito menor, justifique uma possível explicação alternativa.
Se o leitor ficou atento a essência e detalhes nesses relatos e estudos, deve ter percebido que o “imaterial” ou o “sutil” se torna material agora, ou talvez podemos dizer: energético, bioeletromagnético, fisioquímico.
Em geral vemos muitos espiritas defendendo uma hipótese de algo 100% espiritual, ou seja, de que tal “energia” jamais seria detectável, pois se trata de algo do espirito. Particularmente não comungo da mesma opinião uma vez que essa energia ficou muito clara em toda a Codificação, de que se trata de algo ligado ao ser vivo, ao perispírito.
Outro ponto interessante a ser abordado é o fato das imagens bioeletrográficas serem totalmente condizentes com esses princípios, isto é, a camada iônica/gasosa que é expelida pelo nosso corpo, bem mais acentuada em médiuns e totalmente expelida nos momento de transe, revelam que existe sim alguma relação com biofótons. Mais interessante ainda é a capacidade que os atuais equipamentos possuem para diagnosticar uma série de problemas no corpo humano, muitas vezes antes mesmo que aconteçam.
Embora tais equipamentos não sejam bem aceitos aqui no Brasil, por se vincularem a um misticismo (algo infundado), na Rússia esses aparelhos vem sendo utilizado como uma excelente forma de descobrir doenças físicas e psíquicas das pessoas.

Referências
Tressoldi et al., Can our brains emit light at 7300 km distance? |NeuroQuantology | September 2016 | Volume 14 | Issue 3 | Page 447- 455 | doi: 10.14704/nq.2016.14.3.906
F. A. PoPP', W. NAGL, b,* K. H. Ll ~, W. SCHOLZ, O. WEINGARTNER, ",~ and R. WOLF | Biophoton Emission -New Evidence for Coherence and DNA as Source | 0163-4992/84/0300-0033504.00
C. Choi , W. M. Woo , M. B. Lee , J. S. Yang and K.-S. oS | Biophoton Emission from the Hands | Journal of the Korean Physical Society, Vol. 41, No. 2, August 2002, pp. 275278 S Cohen e F A Popp | Biophoton Emission of Human Boyd | Indian Journal of Experimental Biology - Vol 41, may 2003 pages 440-445
WILLIAM T. JOINES , STEPHEN B. BAUMANN (DECEASED ), AND JOHN G. KRUTH | ELECTROMAGNETIC EMISSION FROM HUMANS DURING FOCUSED INTENT | THE JOURNAL OF PARAPSYCHOLOGY




[1] Revista Ciência Espírita – Edição 14 – Março/2018
[2] Para saber mais, busque pela bibliografia ao final deste artigo.
[3] Cura provocada pela crença ou fé.

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

NECESSIDADE DA ENCARNAÇÃO - Dissertações Espíritas[1]


(Sociedade Espírita de Sens – Médium: Sr. Percheron)



Quis Deus que o Espírito do homem fosse ligado à matéria para sofrer as vicissitudes do corpo, com o qual se identifica a ponto de iludir-se e de o tomar por si mesmo, quando não passa de sua prisão passageira; é como se um prisioneiro se confundisse com as paredes da cela. Os materialistas são muito cegos por não perceberem seu erro, porquanto, se quisessem refletir um pouco seriamente, veriam que não é pela matéria do corpo que se podem manifestar; concluiriam que, desde que a matéria desse corpo se renova continuamente, como a água de um rio, não é senão pelo Espírito que podem saber que são sempre eles mesmos.
Suponhamos que o corpo de um homem que pesasse sessenta quilos assimile, para a reparação de suas forças, um quilo de nova substância por dia, a fim de substituir a mesma quantidade de antigas moléculas de que se separa e que cumpriram o papel que deviam desempenhar na composição de seus órgãos; assim, ao cabo de sessenta dias a matéria desse corpo estaria renovada. Nesta hipótese, cujos números podem ser contestados, mas verdadeira em princípio, a matéria do corpo renovar-se-ia seis vezes por ano; portanto, o corpo de um homem de vinte anos já se teria renovado cem vezes; aos quarenta, duzentas e quarenta vezes; aos oitenta, quatrocentas e oitenta vezes. Mas o vosso Espírito se terá renovado? Não, pois tendes consciência de que sois sempre vós mesmos. É, pois, o vosso Espírito que constitui o vosso eu, e segundo o qual vós vos manifestais, e não o vosso corpo, que não passa de matéria efêmera e mutável.
Os materialistas e os panteístas dizem que as moléculas desagregadas depois da morte do corpo retornam à massa comum de seus elementos primitivos, o mesmo se dando com a alma, isto é, com o ser que pensa em vós; mas que sabem eles disso? Há uma massa comum de substância que pensa? Jamais o demonstraram, e é o que deveriam ter feito antes de afirmar. Da parte deles não passa de uma hipótese. Ora, se durante a vida do corpo as moléculas se desagregam centenas de vezes, não obstante o Espírito seja sempre o mesmo e conserve a consciência de sua individualidade, não é mais lógico supor que a natureza do Espírito não é passível de desagregar-se? Por que, então, se dissolveria após a morte do corpo, e não antes?
Após esta digressão, dirigida aos materialistas, volto ao meu assunto. Se Deus quis que suas criaturas espirituais fossem momentaneamente unidas à matéria, é, repito, para as fazer sentir e, a bem dizer, para que sofressem as necessidades que a matéria exige de seus corpos, no que respeita ao seu sustento e conservação. Dessas necessidades nascem as vicissitudes que vos fazem sentir o sofrimento e compreender a comiseração que deveis ter por vossos irmãos na mesma posição. Esse estado transitório é, pois, necessário ao adiantamento do vosso Espírito, que, sem isto, ficaria estagnado. As necessidades que o corpo vos faz experimentar estimulam os vossos Espíritos e os forçam a buscar os meios de as prover; desse trabalho forçado nasce o desenvolvimento do pensamento. Constrangido a presidir aos movimentos do corpo para os dirigir, visando a sua conservação, o Espírito é conduzido ao trabalho material e daí ao trabalho intelectual, necessários um ao outro, pois a realização das concepções do Espírito exige o trabalho do corpo e este não pode ser feito senão sob a direção e o impulso do Espírito. Tendo assim o Espírito adquirido o hábito de trabalhar, e a ele constrangido pelas necessidades do corpo, o trabalho, por sua vez, se lhe torna uma necessidade; e quando, desprendido de seus laços, não tem mais de pensar na matéria, pensa em trabalhar em si mesmo para o seu adiantamento.
Agora compreendeis a necessidade para o vosso Espírito de estar ligado à matéria durante uma parte de sua existência, para não ficar estacionário.

Teu pai, Percheron, assistido pelo Espírito Pascal

Observação – A estas observações, perfeitamente justas, acrescentaremos que, trabalhando para si mesmo, o Espírito encarnado trabalha para a melhoria do mundo em que habita, assim ajudando a sua transformação e o seu progresso material, que estão nos desígnios de Deus, de quem é o instrumento inteligente. Na sua sabedoria previdente, quis a Providência que tudo se encadeasse na Natureza; que, todos, homens e coisas, fossem solidários. Depois, quando o Espírito houver realizado a sua tarefa e estiver suficientemente adiantado, gozará do fruto de suas obras.



[1] Revista Espírita – Fevereiro/1864 – Allan Kardec


segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

José María Fernandez Colavida[1]





Pioneiro do Espiritismo espanhol. Nasceu em Tortosa, província de Tarragona, em 19 de março de 1819. Lutou nas guerras carlistas, nome que se deu a três guerras civis que tiveram lugar na Espanha, entre 1833 e 1876, e nas quais distinguiu-se por sua valentia e humanitarismo, alcançando a patente de Coronel. Em consequência de tais conflitos, emigrou para a França, onde estudou e aprendeu, com perfeição, o idioma desse país.
Ao regressar a Barcelona, contrai núpcias com Ana Campos, jovem dotada de surpreendentes faculdades mediúnicas. Conhece a Doutrina Espírita em 1860, lendo em sua versão original francesa, “Le Livre des Esprits” que lhe ofertou o capitão da marinha mercante, Ramón Lagier y Pomares.
Previamente havia conhecido e praticado o magnetismo, guiando-se pelos ensinamentos de Du Potet e outros magnetizadores franceses. A impressão que lhe causou a leitura de O Livro dos Espíritos, do Mestre Allan Kardec, peça fundamental do pensamento espírita, foi muito grande e, de imediato, começou sua tradução para o espanhol, que viria à luz pública em 1861. Assim, então, tem Colavida a honra e o mérito de ser o primeiro tradutor das obras de Kardec em idioma espanhol.
Em 1869 fundou a Revista de Estudos Psicológicos, da qual foi seu diretor e redator durante 20 anos. Criou a "Sociedade Barcelonesa Propagadora del Espiritismo" e estabeleceu na capital de Cataluña, a primeira Livraria Espírita. Dirigiu o Grupo Espírita "La Paz".
Foi designado Presidente de Honra do "Primeiro Congresso Internacional Espírita", celebrado em Barcelona, em setembro de 1888.
Têm sido altamente reconhecidos e valorizados seus estudos e práticas nos campos de hipnotismo e magnetismo. Realizou experimentos com a regressão mental, apresentando uma metodologia rigorosamente científica, de grande utilidade com evidência favorável à reencarnação, antecedendo os conhecidos trabalhos de Albert de Rochas, na França.
Por sua meritória atuação conhecem-no como o "Kardec" espanhol. Desencarnou em Barcelona, em 11 de dezembro de 1888.

sábado, 26 de janeiro de 2019

Restabelecendo o equilíbrio nas relações corpo-espírito[1]



J. Herculano Pires

Entre duas formas de exagero, a compreensão espírita
– Charlatanismo e superstições no passado e no presente
– Desenvolvimento cíclico da mente humana.

A natureza humana é um conjunto de ações e reações espirituais e materiais. Interpretá-la apenas através de um dos seus aspectos é cair fatalmente no erro. De um lado, temos a alma, o espírito encarnado, que é o senhor e o diretor do corpo. De outro lado, o organismo físico, na plenitude da sua vitalidade animal.
Na antiguidade, e particularmente na Idade Média, a mentalidade popular, apegada ao sentimento do maravilhoso, atribuía tudo ao espírito, subestimando a ação do corpo. Vieram daí os exageros de toda espécie, criando superstições e temores, de que se originaram muitas crenças, rituais e dogmas religiosos.
A partir do Renascimento, o problema foi praticamente invertido nos seus termos. O acurado racionalismo medieval explodiu no Renascimento em novas formas de interpretação da vida. A filosofia deixou de ser a antiga serva da teologia, e a revolta intelectual contra a tradição e a autoridade abalou profundamente a mentalidade popular. Os homens passaram a desconfiar das explicações místicas, a repelir superstições, e chegaram, no mundo moderno, ao exagero oposto, dando supremacia ao corpo e negando ou subestimando a ação do espírito.
Foi exatamente quando mais se acentuava essa nova forma de exagero, de parcialidade, que o Espiritismo surgiu no mundo, dando pleno cumprimento à promessa do Consolador, formulada por Jesus. A função do Espiritismo é restabelecer o equilíbrio, conduzindo o homem à verdade. Sua advertência pode ser interpretada assim: “Nem tanto à terra, nem tanto ao mar”.
O Espiritismo demonstrou, cientificamente, servindo-se das mesmas armas do materialismo – como disse Kardec – que a existência da alma não era uma superstição. E provou, de maneira insofismável, que a ação dos espíritos desencarnados sobre os homens é tão real, como a ação dos raios e emanações invisíveis da natureza.
No seu maravilhoso livro A Gênese - os Milagres e as Predições, segundo o Espiritismo, Kardec analisa a razão por que o Espiritismo só podia aparecer em meados do século passado, e conclui:
O Espiritismo, tendo por objeto o estudo de um dos dois elementos constitutivos do universo, toca forçosamente na maioria das ciências, e não podia surgir senão depois da elaboração delas. Surgiu, pois, pela própria força das coisas, diante da impossibilidade de tudo se explicar somente com a ajuda das leis da matéria.
Dessa maneira, podemos apresentar a evolução da mente humana como um perfeito processo cíclico: partindo da aceitação intuitiva da ação do mundo invisível sobre o homem, a mente passa a negar esse fato num estágio superior do seu desenvolvimento para, afinal, voltar a admitir a verdade primitivamente intuída, mas já agora através da razão amadurecida e das provas experimentais.
O charlatanismo e a superstição figuram em larga escala no processo de formação das religiões antigas e modernas. São explorações da credulidade, devidas à imperfeição das criaturas humanas. Hoje, existe também o charlatanismo na ciência, e existem formas de superstição nascidas de teorias científicas.
Uma dessas formas, e das mais nefastas, é a que considera os desequilíbrios psíquicos como simples manifestações de desordens orgânicas.
Essa superstição se origina da negação do elemento espiritual, considerado como produto ou secreção da matéria, e conduz à destruição de todo e qualquer sentimento religioso. Contra essa forma moderna de superstição, que é o inverso das superstições do passado, só um remédio se mostra realmente eficaz: a demonstração científica da realidade do espírito. Essa demonstração é feita pelo Espiritismo e pelas teorias científicas dele decorrentes: a metapsíquica, a chamada ciência psíquica inglesa, e a parapsicologia. As ciências biológicas atuais, resultantes da revolta intelectual do Renascimento, mostram-se impregnadas da superstição materialista. Mas a contribuição espírita vem ganhando terreno nos meios culturais do presente, como se vê no crescente interesse pela parapsicologia em todo o mundo, e mesmo nos meios religiosos mais adiantados, onde já se compreende que o Espiritismo traz uma nova mensagem para o mundo moderno.




[1] O Mistério do Bem e do Mal – J. Herculano Pires

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

ONTEM INIMIGOS, HOJE MARIDO E MULHER[1]



Richard Simonetti


O ditado popular “O homem propõe e Deus dispõe” pode ser aplicado a penosos processos obsessivos, sustentados por recíproca animosidade.
Ainda que os obstinados adversários pretendam loucamente continuar a se agredir um ao outro, tais vendetas contrariam os princípios de harmonia que sustentam o Universo.
O ódio é a negação do Amor, lei suprema de Deus.
Infalivelmente, sempre chega o momento de mudar.
As bênçãos do tempo acabam por esgotar o fel de seus corações. Exaustos de tantos rancores, sedentos de paz, os “duelistas” acabam por desejar ardentemente uma trégua, uma possibilidade de renovar seus caminhos.
E um dia, após longo sono, ei-los reencarnados nas experiências em comum, ligados agora por laços de consanguinidade.
Ontem inimigos, hoje irmãos.
Ontem verdugo e vítima, hoje pai e filho.
Ontem obsessor e obsidiado, hoje marido e mulher.
Assim a Justiça Divina exige a reparação.
Assim a Divina Misericórdia promove a reconciliação.
Assim a Sabedoria do Eterno transforma o ódio em amor.
É uma metamorfose difícil, sofrida, porquanto, embora as bênçãos do esquecimento e os elos familiares, eles conservam, inconscientemente, indelével ressentimento.
Daí a ausência de afinidade, a dificuldade de relacionamento, a mágoa indefinível, a animosidade e, não raro, a aversão que experimentam entre si.
Para os mais esclarecidos isso tudo é motivo de aflitivos padecimentos, em duras experiências que somente à custa de abnegação e sacrifício poderão vencer.
É como se enxergasse nele um velho perseguidor disfarçado, uma ameaça.

A convivência com minha mãe é complicada.
Nutro por ela sentimentos contraditórios de amor filial e rancor figadal que revolve minhas entranhas.
Brigamos eu e meu irmão como gato e cachorro. Quando adolescentes era até natural.
Agora que somos adultos é inexplicável. Ao menor desentendimento sinto-me possuído de ódio por ele, tentado a ofendê-lo e agredi-lo.
Até hoje não sei como casei com minha mulher. Uma atração física irresistível talvez, mas foi só. Passado o fogo da paixão, resta invencível animosidade. Simplesmente não nos entendemos.
Vivemos às turras, com intermináveis cobranças. Uma situação insustentável.
Amo extremadamente meu filho mais novo.
Quanto ao mais velho, não há nenhuma afinidade entre nós. Ele me desrespeita e eu não consigo ser carinhosa com ele. Há momentos em que me parece um estranho. É recíproco. Ele simplesmente me ignora.

Parece sadismo de Deus promover esses “desencontros” no lar para que as pessoas vivam a brigar.
Tais problemas, entretanto, relacionam se muito mais com a ausência de compreensão, tolerância e respeito no presente e muito menos à presença de inimigos do passado.
Embora se trate de uma situação desconfortável e complicada, é preciso lutar pelo pleno aproveitamento da experiência. Não podemos perder a oportunidade de corrigir os desvios de ontem, habilitando-nos a transitar amanhã com maior conforto e segurança pelos caminhos da Vida.
Imperioso não esquecer, em relação aos nossos desafetos do pretérito, transvestidos possivelmente em familiares de convivência difícil, que as lições serão repetidas tantas vezes quantas forem necessárias, até aprendermos todos que somos irmãos.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

O PERISPÍRITO TEM FORMA?[1]



Miramez


O envoltório semimaterial do Espírito tem formas determinadas e pode ser perceptível?
‒ Sim; tem uma forma que o Espírito deseja, e é assim que ele se vos apresenta algumas vezes, seja em sonho, seja em estado de vigília, podendo tomar forma visível e mesmo palpável.
Questão 95/Livro dos Espíritos


O perispírito não tem forma, no entanto, ele é obediente à determinação do espírito, e conserva aquela que o espírito lhe dá, inspirado na forma esquematizada pelos instrutores da humanidade, que se reflete no corpo físico. Assim como o perispírito toma as dimensões engendradas pelo espírito, o corpo físico obedece às regras do perispírito na sua formação congênita.
Mas, o corpo de carne herda, até certo ponto, muitos traços dos seus ancestrais. A lei de hereditariedade é um fato que a ciência do mundo reconhece.
Até certas doenças são assimiláveis para os descendentes, com muita propriedade, e essas hereditariedades, em casos diversos se interpenetram por vibrações afins.
Os males psicológicos são também transferíveis e, em muitos casos, passam para o mundo biológico, e por vezes, de forma bem acentuada. A descoberta do cientista russo Pavlov dos reflexos condicionados é um ponto de partida e apoio para as doenças herdadas ou, por vezes, assimiladas por nós, quando ouvimos alguém falar em doenças, e mesmo a criação de ideias e suas materializações, na psicosfera da Terra, pelos homens decadentes mentalmente.
Tudo que se cria mentalmente toma forma e passa a viver no campo propício da vida de quem criou. A ciência oficial fala muito em hereditariedade, contudo, examina essas leis somente no corpo físico. Porém, ela tem mais amplitude na seara mental e é muito mais absorvida pelas emoções semelhantes às dos criadores.
O corpo perispirítico é de natureza extraordinária no que tange à sensibilidade. O sistema nervoso do complexo humano recebe do perispírito cargas e mais cargas de energias, de acordo com os sentimentos, capazes de equilibrar todo o soma, como de desarmonizar todos os seus princípios harmoniosos.
Depende da educação da alma, e foi sem explicar particularidades que o Evangelho apareceu no cenário do mundo, na sua mais profunda simplicidade, para educar o ser humano; entretanto, se estudado cientificamente, torna-se o livro mais científico do mundo, por falar das principais verdades ligadas à alma, com todos os seus possíveis corpos e a sua mais elevada harmonização.
O perispírito não tem forma definitiva, mas tem forma relativa com o ambiente onde foi criado. O homem, ou mesmo o espírito desencarnado, conhecedor dessas verdades, passa a educar a mente, usando todos os recursos possíveis. É pelos pensamentos que nascem as ideias, e são elas que determinam a qualidade do espírito e o plano em que ele vive na escala dos seres.
Os impulsos inferiores desqualificam os sentimentos, enervando as energias sublimadas e tornando-as em magnetismo inferior, de sorte a pesar a carga vibratória e endurecer as sensibilidades do corpo astral, que serve ao espírito como carro de condução, e ele, animalizado, torna-se pesado e de difícil manejo. É qual o animal lerdo que, mesmo sob os mais drásticos açoites, ainda é insensível ao comando. A Doutrina dos Espíritos, sob a influência do Cristo, vem nos ajudar a sair desse letargismo primitivo e alcançar o despertamento, dos dons espirituais, de maneira a nos libertar da escravidão da ignorância.
O perispírito é semimaterial, pela sintonia que deve ter entre o espírito e o corpo; ele faz a junção dos dois, para que o espírito alcance a luz. Com o tempo e a reforma do homem, pode tornar-se puro, de sorte a ficar mesmo invisível a alguns olhos espirituais, como pode, em muitos casos, ser tão material ao ponto de confundir-se com os próprios homens.




[1] Filosofia Espírita – Volume 2 – João Nunes Maia

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Os centros de força não são conceitos espíritas[1]



Andrea Laporte (Holambra, SP) e Alexandre Fontes da Fonseca (Campinas, SP)


Centros de força, ou centros vitais, seriam estruturas fluídicas do perispírito, vinculadas a determinados plexos no corpo físico, com funções específicas envolvendo assimilação de fluidos e controle sobre o corpo físico, com repercussão no equilíbrio do Espírito. Elas seriam responsáveis pela ligação do corpo com a mente, recepção dos estímulos do Espírito, sustentação do sistema nervoso, alimentação das células, absorção de fluidos, percepções da alma etc.
Embora o conceito de centros de força seja baseado em conceitos esotéricos milenares, o movimento espírita os acolheu sem nunca apresentar uma análise doutrinária dos mesmos.
Aqui, apresentamos a primeira análise doutrinária crítica das definições de centros de força contidas em algumas obras de André Luiz. Não apenas verificamos que essas estruturas não fazem parte dos ensinamentos da Doutrina Espírita, mas também mostramos que suas propriedades e funções estão em completo desacordo com o que o Espiritismo ensina sobre as propriedades e funções dos fluidos e do perispírito. Algumas hipóteses baseadas em algumas citações de Kardec são também analisadas e mostradas não serem coerentes com o Espiritismo. Concluímos que o conceito de centros de força não é coerente com a Doutrina Espírita.

Para um conhecimento mais aprofundado desta matéria recomendo a leitura do artigo completo, publicado no Jornal de Estudos Espíritas, no endereço abaixo:





terça-feira, 22 de janeiro de 2019

O Espiritismo nas Prisões[1]





Na Revista de novembro de 1863 publicamos a carta de um condenado, detido numa penitenciária, como prova da influência moralizadora do Espiritismo. A carta a seguir, de um condenado em outra prisão, é mais um exemplo desta poderosa influência. É de 27 de dezembro de 1863; transcrevemo-la textualmente, quanto ao estilo, corrigindo apenas os erros ortográficos.

Senhor,
Há poucos dias, quando me falaram pela primeira vez de Espiritismo e de revelação de além-túmulo, ri e disse que isto não era possível; falava como ignorante que sou. Alguns dias depois tiveram a bondade de me confiar, na horrível posição em que me acho agora, vosso bom e excelente O Livro dos Espíritos. A princípio, li algumas páginas com incredulidade, não querendo, ou melhor, não crendo nessa ciência. Enfim, pouco a pouco e sem me dar conta, por ele tomei gosto; depois levei a coisa a sério; então reli pela segunda vez o vosso livro, desta vez com outro espírito, isto é, com calma e com toda a pouca inteligência que Deus me deu. Senti despertar essa velha fé que minha mãe me tinha posto no coração e que cochilava há bastante tempo; senti o desejo de me esclarecer sobre o Espiritismo. A partir desse momento tive um pensamento bem decidido, o de me esclarecer, aprender, ver e depois julgar. Pus-me à obra com toda a crença que se pode ter e que é preciso ter com Deus e seu poder; desejava ver a verdade; orei com fervor e comecei as experiências; as primeiras foram nulas, sem resultado algum.
Não me desencorajei, perseverei em minhas experiências e, palavra de honra, renovei minhas preces, que talvez não fossem bastante fervorosas, e me entreguei ao trabalho com toda a convicção de uma alma crente e que espera. Ao cabo de algumas noites, pois só posso fazer experiências à noite, senti, por cerca de dez minutos, tremores nas pontas dos dedos e uma leve sensação no braço, como se tivesse sentido correr um pequeno regato de água morna, que parava no punho. Eu estava então inteiramente recolhido, todo atenção e cheio de fé. Meu lápis traçou algumas linhas perfeitamente legíveis, mas não bastante corretas para descrer que estivesse sob o peso de uma alucinação.
Esperei então com paciência a noite seguinte para recomeçar as experiências e, desta vez, agradeci a Deus de todo o coração, por ter obtido mais do que ousava esperar.
A partir de então, de duas em duas noites entretenho-me com os Espíritos, que são bastante bons para responderem ao meu apelo e, em menos de dez minutos, respondem sempre com caridade. Escrevo meias-páginas, páginas inteiras, que somente minha inteligência não poderia fazer, porquanto, muitas vezes, são tratados filosófico-religiosos em que jamais pensei e, com mais forte razão, jamais os pus em prática; porque dizia a mim mesmo aos primeiros resultados: Não serás joguete de uma alucinação, ou da tua vontade? E a reflexão e o exame me provavam que eu estava muito longe da inteligência que havia traçado aquelas linhas. Baixei a cabeça; acreditava e não podia ir contra a evidência, a menos que estivesse completamente louco.
Remeti duas ou três entrevistas à pessoa que fizera a caridade de me confiar o vosso bom livro, para que ela sancione se estou certo. Venho pedir-vos, senhor, vós que sois a alma do Espiritismo, o obséquio de permitir vos envie o que obtiver de sério em minhas conversas de além-túmulo, desde que o julgueis acertado. Se isto vos for agradável, eu vos enviarei as conversas de Verger, que assassinou o Arcebispo de Paris. Para bem me assegurar se era ele mesmo quem se manifestava, evoquei São Luís, que me respondeu afirmativamente, bem como outro Espírito, no qual tenho muita confiança etc...

As consequências morais deste fato se deduzem por si mesmas. Eis um homem que tinha abjurado toda crença e que, atingido pela lei, é confundido com a escória da sociedade; mas este homem, no meio desse lodo moral, voltou à fé; vê o abismo em que caiu, arrepende-se e ah! Ora com mais fervor que muita gente que exibe devoção. Para isto bastou a leitura de um livro, onde encontrou elementos de fé que a sua razão pôde admitir, que reavivaram as suas esperanças e lhe fizeram compreender o futuro.
Além disso, é de notar-se que, a princípio, leu com prevenção e sua incredulidade só foi vencida pelo ascendente da lógica. Se tais resultados são produzidos por uma simples leitura, a bem dizer feita às escondidas, o que seria se a ela se pudesse aliar a influência das exortações verbais! É bem certo que na disposição de espírito em que hoje se acham esses dois homens (ver o fato relatado no número de novembro último), não só não se queixarão durante a sua detenção, como retornarão ao mundo decididos a nele viverem honestamente.
Já que esses dois culpados puderam ser reconduzidos ao bem pela fé que hauriram no Espiritismo, é evidente que, se tivessem essa fé previamente, não teriam cometido o mal. É, pois, do interesse da sociedade a propagação de uma doutrina de tão grande poder moralizador. É o que se começa a compreender.
Uma outra consequência a tirar do fato que acabamos de narrar é que os Espíritos não são detidos pelos ferrolhos e que vão até o fundo das masmorras levar suas consolações. Assim, não está no poder de ninguém impedir que eles se manifestem de uma ou de outra maneira; se não for pela escrita, será pela audição. Eles afrontam todas as proibições, riem-se de todas as interdições, transpõem todos os cordões sanitários. Consequentemente, que barreiras podem opor-lhes os inimigos do Espiritismo?




[1] Revista Espírita - Fevereiro/1864 – Allan Kardec

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

John Worth Edmonds – O Grande Juiz Espírita[1]





O Kardec norte-americano nasceu em Hudson, estado de Nova York, em 13 de março de 1799 e morreu na cidade de Nova York em 5 de abril de 1874, aos 75 anos de idade.
O juiz John Edmonds escreveu um artigo para o jornal New York Courier, em 1º de agosto de 1853. Demonstrou assumir coragem moral suficiente para informar aos norte-americanos sua conversão ao Espiritualismo, e os motivos que o levaram a enveredar pelos estudos do incognoscível. John Edmonds reforçou o time de pesquisadores da doutrina espiritualista nascente, tornando-se um dos estudiosos de maior importância nas Américas, estimulando-nos a considerar a importância de nossa atitude investigativa em relação aos fenômenos, e a relevância de assumir isso perante o público. Haverá um período histórico, entre os anos de 1853 a 1855, que os termos Espiritismo, e Espiritualismo serão utilizados simultaneamente pelos vanguardistas dos Estados Unidos, na busca de definição de uma identificação para o movimento, o que ocorrerá a partir do final do ano de 1855, quando a expressão Espiritualismo se tornará na designação seguida por todos. A partir do final de 1855 na França, o estudioso Allan Kardec criará um modelo de investigação estruturado em dois anos de experimentações, catalogação dos fatos mediúnicos, inaugurando a fundação inédita de princípios do Espiritismo.
A expressão Espiritualismo já era conhecida na Europa, antes que os americanos a utilizassem para designar a aceitabilidade da comunicação com os espíritos. Prova disso é a revista ‘Le Magnétiseus spiritualiste’, escrita pelos membros da Sociedade Espiritualista de Paris, sob a direção de Alphonse Cahagnet, a partir de 1849. Os pesquisadores franceses consideravam o magnetismo um dom divino, e o desenvolviam de modo apropriado a produzir efeitos terapêuticos, com o que mantinham gabinetes de atendimento com hora marcada, e, naturalmente, cobravam pelos seus serviços. A profissionalização dos magnetizadores do século XIX lembra a composição dos grupos atuais de estudiosos e aplicadores do Reiki, os quais munidos de um diploma que certifica a sua formação, ministram profissionalmente suas habilidades de auxílio, ficando por aí as semelhanças entre as duas escolas terapêuticas. Os magnetizadores espiritualistas aplicavam sobre os pacientes, passes e imposição de mãos, orientados pelos estudos anteriores de Franz Anton Mesmer e daqueles que o sucederam. Ocorria que alguns de seus pacientes detinham a faculdade do sonambulismo, e sob a aplicação de demorados passes, restavam induzidos em estado modificado de consciência, quando não somente diagnosticavam as próprias enfermidades, como prestavam-se a orientar o tratamento de outras pessoas doentes. Alguns desses pacientes, que passaram a trabalhar em dupla com seu magnetizador, obtinham o diagnóstico tocando o doente e ato contínuo revelando a enfermidade que possuíam, o órgão afetado e o tratamento a ser seguido, além da duração deste.  

sábado, 19 de janeiro de 2019

QUEM TEM MEDO DE "FANTASMAS"?[1]





Jorge Hessen - jorgehessen@gmail.com

O temor de “fantasmas” é uma atitude ingênua causada pela ausência de conhecimento a respeito da natureza etérea dos “mortos”. Sobre as suas aparições são mais frequentes do que se pensa e muitos creem que a preferência dos Espíritos ‒ “fantasmas”‒ é pelos ambientes escuros, mas isso é um mito e um engano. Ocorre, simplesmente, que a substância vaporosa dos períspiritos dos “fantasmas” é mais perceptível no escuro, tal como ocorre com as estrelas que só podem ser visualizadas à noite. A claridade do dia, por exemplo, ofusca a essência sutil que constituem os corpos dos “mortos”. Isto porque os tecidos perispirituais são compostos de energia semelhante à luz, portanto, o perispírito dos “fantasmas” não é, digamos, fosco, ao contrário, é dotado de grande diafaneidade para ser perceptível a olho nu, durante o dia.
O perispírito, no seu estado normal, é invisível; mas, como é formado de substância etérea, o Espírito, em certos casos, pode, vontade própria, fazê-lo passar por uma modificação molecular que o torna momentaneamente visível. É assim que se produzem as aparições, que não se dão, do mesmo modo que outros fenômenos, fora das leis da Natureza. Conforme o grau de condensação do fluido perispiritual, a aparição é às vezes vaga e vaporosa; de outra, mais nitidamente definida; em outras, enfim, com todas as aparências da matéria tangível. Pode mesmo chegar à tangibilidade real, ao ponto do observador se enganar com relação à natureza do ser que tem diante de si[2].
A pesquisadora Elizabeth Tucker, da Universidade Estadual de Binghamton, em Nova York, apresenta diversos relatos de aparições ‒ Espíritos ‒ em campus universitário. Conta-se que os fantasmas revelam o lado sombrio da ética. Suas aparições são muitas vezes um lembrete de que a ética e a moral transcendem nossas vidas e que deslizes podem resultar em um pesado fardo espiritual. No entanto, as histórias de fantasmas também trazem esperança. Ao sugerir a existência de uma vida após a morte, elas oferecem uma chance de estar em contato com aqueles que já morreram e, portanto, uma oportunidade de redenção ‒ uma forma de reparar erros do passado[3].
A crença nos “fantasmas” é comum, pois baseia-se na percepção que temos na existência e sobrevivência dos Espíritos e na possibilidade de comunicar-se com eles. Deste modo, todo Ser espiritual que manifesta a sua presença sob várias circunstâncias é um Espírito que no senso comum é chamado de “fantasma”. Comumente, pelo conhecimento vulgar, são imaginados sob uma aparência fúnebre, vindo de preferência à noite, e sobretudo nas noites mais sombrias, em horas fatais, em lugares sinistros, cobertos de lençóis ou bizarramente cobertos. Todavia, os tais “fantasmas” assustadores , longe de serem atemorizantes, são, comumente, parentes ou amigos que se apresentam por simpatia, entretanto podem ser Espíritos infelizes que eventualmente são assistidos; “algumas vezes, são farsantes do mundo Espírita que se divertem às nossas custas e se riem do medo que causam; mas supondo-se mesmo que seja um mau Espírito, que mal poderia ele fazer, e não se teria cem vezes mais a temer de um bandido vivo que de um bandido morto e tornado Espírito! [4]”.
Todos que veem um “fantasma” podemos conversar com ele, e é o que se deve fazer nesse caso, podendo perguntar-lhe quem é, o que deseja e o que se pode fazer por ele. Se o Espírito for infeliz e sofredor, o testemunho de comiseração o aliviará. Se for um Espírito bondoso, pode acontecer que traga a intenção de dar bons conselhos. Tais Espíritos ‒ “fantasmas” ‒ poderão responder, muitas vezes verbalizando mesmo, porém na maioria das vezes o fazem por transmissão de pensamentos [5]”.
Os “fantasmas” afáveis, quando surgem, têm intenções elevadas ou, no mínimo, para confortarem pessoas queridas que padecem com a desencarnação de entes queridos e ou com a dúvida sobre a continuação da vida post-mortem; oferecerem sugestões ou, ainda, solicitarem auxílio para si mesmos, “o que pode ser feito através de orações e boas ações, no sentido de corrigir ou compensar as transgressões do morto. Mas os espíritos perversos também aparecem e estes, sim, têm o intuito de "assombrar" os encarnados movidos por sentimentos negativos [6]”.
Os “fantasmas” , aliás, estão por toda parte e não temos a necessidade de vê-los para saber que podem estar ao nosso lado. “O Espírito ‒ “fantasma” ‒ que queira causar perturbação pode fazê-lo, e até com mais penhor, sem ser visto. Ele não é perigoso por ser Espírito ‒ “fantasma”‒, mas pela influência que pode exercer em nosso pensamento, desviando-nos do bem e impelindo-nos ao mal [7]”.
Em resumo, não é lógico assustar-nos mesmo diante da “assombração de um morto”. Se raciocinarmos com calma compreenderemos que um “fantasma”, qualquer que seja, é menos perigoso do que certos espíritos encarnados que existem à sombra das leis humanas (marginais).


Artigos Espiritas - Jorge Hessen




[2] KARDEC , Allan. O Livro dos Médiuns, II parte “das manifestações espíritas” capitulo VI “manifestações visuais”, RJ: Ed FEB 2000
[3] Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/vert-fut-46515221 , acessado em 25/12/2018.
[4] KARDEC, Allan . Revista Espírita, julho de 1860, DF: Ed Edicel, 2002.
[5] KARDEC , Allan. O Livro dos Médiuns , II parte “das manifestações espíritas” capitulo VI “manifestações visuais”, RJ: Ed FEB 2000.
[6] KARDEC, Allan . Revista Espírita, julho de 1860, DF: Ed Edicel, 2002.
[7] KARDEC , Allan. O Livro dos Médiuns , II parte “das manifestações espíritas” capitulo VI “manifestações visuais”, RJ: Ed FEB 2000.