quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Os limites do encantamento[1]


Marco Milani


Na Parábola do Semeador, identificamos as diferentes maneiras pelas quais os ensinamentos do Evangelho podem ser aproveitados. Variando daqueles que nada se servem da Boa Nova até aqueles que a compreendem e aplicam a si mesmos, beneficiando-se do progresso realizado.
A mesma analogia pode ser feita aos adeptos do Espiritismo, passando por aqueles que nada mais fazem do que admirarem as manifestações espirituais e deterem-se na atitude mística e contemplativa até aqueles que depreendem as profundas consequências morais e seguem a orientação do Espírito da Verdade para amarem-se uns aos outros e instruírem-se.
Um dos pilares da doutrina espírita é a fé raciocinada, ou seja, aquela que se sustenta pela lógica diante da análise crítica dos fatos. Sabe-se porque efetivamente conhece-se e não porque se reproduz argumentos aceitos sem a necessária ponderação.
Assim como as sementes espargidas pelo semeador da parábola necessitam de boa terra para frutificarem, os ensinos dos Espíritos de escol que contribuíram diretamente para a construção do corpo teórico-doutrinário do Espiritismo pressupõem a fé raciocinada para a plena compreensão e aplicação.
A essência desses ensinamentos é simples e totalmente acessível. Porém, quanto mais nos aprofundarmos no conhecimento de nós mesmos e da realidade em que estamos inseridos, mais teremos elementos para planejar e agir adequadamente em prol de nossa melhoria e felicidade.
A jornada evolutiva é uma conquista interior, mas necessariamente implica aprender a amar a si mesmo e ao próximo, além de Deus.         
Certamente esses ensinamentos podem tocar o coração de cada um em diferentes momentos, conforme esforço nesse sentido, mas se torna cada vez mais premente nos desvencilharmos da inércia contemplativa e abraçarmos a atitude libertadora dos grilhões da ignorância. Ninguém absorve conhecimentos, como equivocadamente alguns supõem, mas os obtém por méritos próprios.
No movimento espírita encontramos muitos que acreditam estar absorvendo sabedoria ao deixarem-se encantar pela oratória eloquente deste ou daquele palestrante. Preocupantemente, o conteúdo pode passar a ser secundário diante da envolvente forma como é expresso. Que oratória fantástica, dizem, ainda que não se lembrem exatamente do que foi abordado nem como isso pode fazê-los progredir moral e intelectualmente. Locupletam-se emocionalmente e quanto mais famoso for o palestrante, mais afortunados se consideram.
Muitas casas espíritas convidam notórios expositores buscando lotar os seus salões sem conhecerem, muitas vezes, o teor do que será dito. Basta o nome do palestrante. O título da palestra é “tema livre”, pois vindo de quem vem, creem que será ótima.
Obviamente, as boas palestras atuam como poderosos elementos disseminadores dos princípios e valores espíritas e devem ser incentivadas.
O que poderíamos refletir é: até que ponto o carisma pessoal de terceiros estimula o próprio potencial de crescimento interior? O encantamento provocado por palestrantes carismáticos favorece o pensamento crítico ou a dependência intelectual?
Determinados autores de livros espíritas também provocam encantamento para um público específico de leitores. Foi o fulano quem psicografou ou escreveu, alegam alguns, portanto é verdade. Será?
Para identificar o grau de dependência ou emancipação de alguém perante algum autor ou palestrante, pode-se fazer o seguinte questionamento: se esse autor ou palestrante afirmar algo sobre um assunto que eu tenha dúvidas ou discorde, a partir desse momento passarei a aceitar a ideia dele (a) porque confio mais nele (a) do que em mim?
Se a resposta for “sim”, então a dependência é grande.
O próprio Kardec insiste na necessidade de tudo ser confrontado racionalmente mediante fatos e argumentos válidos, então por que acreditar cegamente em um palestrante ou escritor? Se tal afirmação contrariar os ensinamentos dos Espíritos que Kardec validou servindo-se de rigoroso método, mais um motivo para redobrar a cautela e analisar as evidências que são apresentadas. Diante de incerteza, não se pode aceitar ou refutar algo, a priori, mas aprofundar-se no que já se sabe por diferentes fontes, nunca por uma ou poucas pessoas somente.
Que possamos nos encantar pelo verdadeiro conhecimento, sempre valorizando a fé raciocinada.




[1] Texto publicado no jornal Correio Fraterno, ed. 472, p. 11.

quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Um homem, uma história resignificando o vínculo solidário[1]


 
Jorge Hessen - jorgehessen@gmail.com


Objetivando transmitir uma mensagem de “alento” e “esperança” a pessoas em desespero, John Edwards, de 61 anos, um ex-dependente de drogas e ex-alcóolatra (sóbrio há mais de duas décadas) inexplicavelmente se voluntariou deitar em um caixão que foi fechado e enterrado no terreno de uma igreja de Belfast, na Irlanda do Norte. Obviamente o ataúde foi especialmente adaptado para que Edwards “sobrevivesse” por três dias (quando fosse desenterrado) e pudesse transmitir a experiência ao vivo pelas redes sociais.
No passado Edwards enfrentou abuso sexual, viveu na rua, recebeu tratamentos para distúrbios mentais, sobreviveu a várias overdoses e “perdeu” mais de 20 amigos por conta de abuso de drogas, álcool e suicídios. Sobreviveu a dois cânceres e a um transplante de fígado após desenvolver hepatite C por causa de uma agulha contaminada.
Há quase 30 anos, após passar pelo que descreveu como um “incrível encontro com Deus”, Edwards criou vários centros cristãos de reabilitação e abrigos para moradores de rua. Atualmente se dedica a aconselhar e orar com pessoas em situações de abandono e desesperança[2].
Em que pese o desígnio altruístico de John Edwards, é evidente que agiu de forma irracional ao se permitir enterrar vivo por três dias, visando gritar o brado da “esperança” para as pessoas em desespero. A rigor, tal manifesto não faz sentido lógico sob qualquer análise racional. Entretanto, deixando de lado essa insanidade (sepultar-se vivo), vislumbremos os efeitos positivos da transformação de sua vida pessoal.
Importa reconhecermos que os diversos núcleos de reabilitação e abrigos para moradores de rua instituídos por John são passaportes pujantes para auto conquista da paz espiritual. Nisso Edwards acertou em cheio, pois embrenhou-se no orbe da solidariedade através do compartilhamento de um sentimento de identificação em relação ao sofrimento alheio. Não apenas reconheceu a situação delicada dos moradores de rua, mas também auxiliou essas pessoas desamparadas.
Sabemos que os males que afligem a Humanidade são resultantes exclusivamente do egoísmo (ausência de solidariedade). A eterna preocupação com o próprio bem-estar é a grande fonte geradora de desatinos e paixões desajustantes. A máxima “Fora da Caridade não há Salvação” [3] é a bandeira da Doutrina Espírita na luta contra o egoísmo. Nesse sentido, a solidariedade é a caridade em ação, a caridade consciente, responsável, atuante, empreendedora.
Os preceitos espíritas contribuem para o progresso social, deterioram o materialismo, orientam para que os homens compreendam onde está seu verdadeiro interesse. O Espiritismo destrói os preconceitos “de seitas, de castas e de raças, ensina aos homens a grande solidariedade que deve uni-los como irmãos” [4] . Destarte, segundo os Benfeitores espirituais, “quando o homem praticar a lei de Deus, terá uma ordem social fundada na justiça e na solidariedade” [5] .
A recomendação do Cristo de “que vos ameis uns aos outros como eu vos amei” [6] assegura-nos o regime da verdadeira solidariedade e garante a confiança e o entendimento recíproco entre os homens. A solidariedade na vida social é como o ar para o avião. É imprescindível darmo-nos através do suor da colaboração e do esforço espontâneo na solidariedade para atender substancialmente as nossas obrigações primárias à frente do Cristo[7].
Ante as responsabilidades resultantes da consciência doutrinária que nos impõe a superar a temática de vulgaridade e imediatismo ante o comportamento humano, em larga maioria, a máxima da solidariedade apresenta-se como roteiro abençoado de uma ação espírita consciente, capaz de esclarecer e edificar os corações com a força irresistível do exemplo.




[2] Disponível em http://www.bbc.com/portuguese/curiosidades-39191185 acesso em 21-03-2017.
[3] Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2001, Cap. XV.
[4] Kardec, Allan. O Livro dos Espíritos, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2000, pergunta 799.
[5] Idem.
[6] Jo 15.12.
[7] Xavier, Francisco Cândido. “Fonte Viva” ditada pelo Espírito Emmanuel, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1992

terça-feira, 28 de novembro de 2017

O Anjo da Cólera[1]

 

Um de nossos correspondentes de Varsóvia escreve-nos o seguinte:
“... Ouso reclamar vossa atenção para um fato de tal forma extraordinário que seria preciso colocá-lo na categoria do absurdo, se o caráter da pessoa que me relatou não fosse uma garantia de sua realidade. Todos nós, que do Espiritismo conhecemos tudo quanto foi tratado por vós tão judiciosamente – o que significa que julgamos compreendê-lo bem – não encontramos explicação para este fato; desse modo, entrego-o à vossa apreciação, rogando me perdoeis o tempo que vos faço perder para lê-lo, caso não o julgueis digno de um exame mais sério.
Eis do que se trata:
A pessoa de quem falei acima estava, em 1852, em Wilna, cidade da Lituânia, na época assolada pela cólera. Sua filha, encantadora menina de doze anos, era dotada de todas as qualidades que constituem as naturezas superiores. Desde a mais tenra idade, fez-se notar por uma inteligência excepcional, uma bondade de coração e uma candura verdadeiramente angélicas. Em nossa região ela foi uma das primeiras a gozar da faculdade mediúnica, sempre assistida por Espíritos de ordem bastante elevada. Muitas vezes, e sem ser sonâmbula, tinha pressentimento do que ia acontecer, e o predizia sempre com justeza. Estas informações não me parecem inúteis para julgar de sua sinceridade.
Certa noite, tão logo as velas acabavam de ser apagadas, a garota, ainda completamente desperta, viu erguer-se diante de seu leito a figura lívida e sangrenta de uma velha, cuja simples visão a fez estremecer. A mulher aproximou-se do leito da menina e lhe disse: Sou a cólera, e venho pedir-te um beijo; se me beijares, voltarei aos lugares que deixei e a cidade ficará livre da minha presença.
A heroica menina não recuou diante do sacrifício: colou os lábios sobre o rosto gelado e úmido da velha e a visão – se era visão – desapareceu. Apavorada, a criança não se acalmou senão ao colo do pai, que, embora nada compreendendo do caso, estava, no entanto, convencido de que a filha havia dito a verdade; mas não falaram a ninguém. Por volta do meio-dia receberam a visita de um médico, amigo da família: Venho trazer-vos uma boa notícia – disse ele ‒; esta noite nenhum doente foi encaminhado ao hospital dos coléricos, que acabo de visitar. E, com efeito, desde esse dia a cólera deixou de ceifar.
Cerca de três anos mais tarde, essa pessoa e sua família fizeram outra viagem à mesma cidade. Durante sua estada a cólera reapareceu e as vítimas já eram contadas por centenas, quando uma noite a mesma velha apareceu junto ao leito da menina, sempre perfeitamente desperta, e lhe fez o mesmo pedido, acrescentando que, se sua prece fosse atendida, dessa vez deixaria a cidade para nunca mais voltar. Como da primeira vez, a jovem não recuou. Logo viu abrir-se um sepulcro e se fechar sobre a mulher. A cólera acalmou-se como que por milagre, não tendo sido do meu conhecimento que haja reaparecido em Wilna. Era uma alucinação ou uma visão real? Ignoro-o. Tudo quanto posso garantir é que não posso duvidar da sinceridade da mocinha e de seus pais”.
 
Realmente, o fato é muito singular. Os incrédulos não deixarão de dizer que é uma alucinação; mas, provavelmente, ser-lhes-ia mais difícil explicar esta coincidência com um fato material, que nada podia deixar prever.
Uma primeira vez isto poderia ser levado à conta do acaso, essa maneira tão cômoda de passar sobre aquilo que não se compreende. Mas em duas ocasiões diferentes, em condições idênticas, era mais extraordinário. Admitindo o fato da aparição, restava saber o que era essa mulher. Era realmente o anjo exterminador da cólera? Estariam os flagelos personificados em certos Espíritos, encarregados de provocá-los ou de fazê-los cessar? Podia-se crer, vendo este desaparecer pela vontade dessa mulher? Mas, então, por que se dirigia ela àquela garota, estranha à cidade, e de que maneira um beijo desta podia ter tal influência?
Embora o Espiritismo já nos tenha dado a chave de muitas coisas, ainda não disse a última palavra; no caso de que se trata, a última hipótese nada tinha de positivamente absurda. Confessamos que, inicialmente, nós nos inclinávamos para este lado, não vendo no fato o caráter da verdadeira alucinação. Algumas palavras dos Espíritos vieram derrubar a nossa suposição. Eis a explicação, muito simples e muito lógica, dada por São Luís, na sessão da Sociedade, em 19 de abril de 1861.
– O fato que acaba de ser relatado parece muito autêntico. A propósito, gostaríamos de obter algumas explicações. Primeiramente poderíeis dizer quem é essa mulher que apareceu à menina e disse ser a cólera?
Não era a cólera; um flagelo material não reveste a aparência humana. Era um Espírito familiar da menina, que assim experimentava sua fé, fazendo coincidir esta prova com o fim do flagelo. Essa prova era salutar à criança que a sofria; idealizando-as, fortalecia as virtudes em germes nesse ser protegido e abençoado. As naturezas de escol, as que, vindo ao mundo, trazem a lembrança dos bens adquiridos, muitas vezes recebem essas advertências, que seriam perigosas para uma alma não depurada e não preparada, pelas migrações anteriores, aos grandes devotamentos do amor e da fé.
– O Espírito familiar dessa jovem tinha bastante poder para prever o futuro e o fim do flagelo?
Os Espíritos são os instrumentos da vontade divina e, muitas vezes, elevados à altura dos mensageiros celestes.
– Os Espíritos não têm nenhuma ação sobre os flagelos, como agentes produtores?
Eles não têm absolutamente nada com isto, assim como as árvores com o vento e os efeitos com as causas.
 
Na previsão de respostas conformes ao nosso primeiro pensamento, tínhamos preparado uma séria de perguntas que, em consequência, se tornaram inúteis. Isto prova uma vez mais que os médiuns não são o reflexo do pensamento de quem interroga. Não obstante, devemos dizer que a respeito não tínhamos nenhuma opinião prévia. Em falta de outra melhor, inclinávamos para a que havíamos emitido, porque não nos parecia impossível. Contudo, sendo mais simples e mais racional a explicação dada pelo Espírito, nós a julgamos infinitamente preferível.
Aliás, pode-se tirar do fato outra instrução. O que aconteceu àquela mocinha deve ter-se produzido em outras circunstâncias e, mesmo na Antiguidade, desde que os fenômenos espíritas são de todos os tempos. Não seria uma das causas que levaram os Antigos a personificar e a ver em cada coisa um gênio particular? Não pensamos que seja preciso buscar-lhe a causa apenas no gênio poético, uma vez que se veem essas ideias em povos menos avançados.
Suponhamos que um fato semelhante a esse que relatamos se tivesse produzido num povo supersticioso e bárbaro; não era preciso mais para acreditar na ideia de uma divindade malfazeja, que não se podia apaziguar senão lhe sacrificando vítimas. Como já dissemos, todos os deuses do paganismo não têm outra origem senão as manifestações espíritas. O Cristianismo veio derrubar os seus altares, mas ao Espiritismo estava reservado dar a conhecer a sua verdadeira natureza e lançar a luz sobre os fenômenos desnaturados pela superstição, ou explorados pela cupidez.




[1] Revista Espírita – Maio/1861 – Allan Kardec

segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Eugène-Auguste Albert De Rochas d’Aiglum[1]


 


Nascido em Saint-Firmin, Alpes, França, no dia 20 de maio de 1837, sendo oriundo de grande família provinciana que possuiu o feudo d'Aiglum, perto do Digne, desde metade do século XV até o advento da revolução francesa.
Incontáveis foram os cientistas que, no século passado, perquiriram os fenômenos espíritas. Muitos deles iniciaram as investigações animados do propósito de descobrir fraudes, pois sua maioria era composta de cépticos que não admitiam, mesmo da forma mais remota, que os fenômenos pudessem existir. Eles queriam ver para crer.
O Coronel Albert de Rochas foi um desses valorosos pesquisadores.
Ele persistiu, viu, sentiu a plenitude da verdade bafejando aquilo que ele até então julgava inverossímil.
Em face da realidade insofismável dos fatos, ele não trepidou em render-se à evidência. Se enfrentou alguns insucessos iniciais, isso não constituiu entraves ao seu Espírito dotado de inquebrantável vontade de desvendar a verdade, por isso não esmoreceu enquanto não se capacitou de que a produção dos fenômenos constituía patente realidade.
Seu pai e avó foram magistrados, por isso, após seus brilhantes estudos no Liceu de Grenoble, inclinou-se para essa carreira, na qual, não se sentindo realizado, por julgar que tais estudos não eram suficientes para dar vazão às suas atividades intelectuais, voltou ao Liceu para estudar Ciências.
No ano de 1875, obteve o prêmio de honra de Matemáticas espaciais, o que o animou a entrar, no ano seguinte, na Escola Politécnica. No ano de 1861, já havia alcançado a terceira colocação na lista de promoção à Escola de Aplicação, de Metz, o que o levou a ingressar no Exército, no posto de tenente de Engenharia.
Promovido a capitão em 1864, teve importante participação na guerra de 1870 a 1871. Em 1880 foi promovido a comandante de batalhão, entretanto, no ano de 1889, a fim de atender à sua natural inclinação para o estudo científico, abandonou as atividades militares, passando para o Exército territorial no posto de Tenente-Coronel.
Alcançaram grande projeção os trabalhos militares e científicos do Coronel de Rochas, porém, neste ligeiro resumo biográfico, nos tingiremos apenas aos seus estudos no campo do Magnetismo e do Espiritismo.
Experimentador consumado e grande conhecedor de tudo o que se havia escrito sobre esses transcendentais assuntos, colaborou assiduamente para fazer com que o Magnetismo fosse classificado entre as ciências puramente físicas. Estudou a polaridade, contribuiu para a classificação atual das fases do estudo sonambúlico, observou com verdadeiro critério científico a produção de fenômenos espíritas, descobriu a exteriorização da sensibilidade, até então apenas suspeitada, e revelou o mecanismo do desdobramento astral.
O Magnetismo e o Espiritismo muito devem a esse renomado sábio, pois ele publicou uma dezena de importantes obras sobre matérias pertinentes a eles, procurando sempre destacar a sobrevivência da alma.
Albert de Rochas foi membro de numerosas sociedades científicas, oficial da Legião de Honra, oficial da Instrução Pública, em França; agraciado da Ordem de S. Salvador, da Grécia; da Ordem de S. Maurício e S. Lázaro, da Itália; comendador de Sant'Ana, da Rússia; do Mérito Militar, de Espanha; do Medjidie, Turquia; do Nicham, de Turus; do Dragão Verde, de Annam.
De sua bibliografia salientamos: "Forças não Definidas", "A Levitação", "O Fluido dos Magnetizadores", "Os Estados Superficiais da Hipnose", "A Exteriorização da Motricidade", "As Fronteiras da Física" e "Os Eflúvios Ódicos".
Incluo, também, nesta biografia o livro “Vidas Sucessivas”, traduzido pelo Hermínio C. Miranda e editado pelo Instituto Lachâtre.




[1] Personagens do Espiritismo - Antônio de Souza Lucena e Paulo Alves Godoy

sábado, 25 de novembro de 2017

UM MUNDO PARA NOSSAS CRIANÇAS[1]

 

Ante tantas guerras e rumores de guerras, atentados terroristas que roubam a paz das gentes simples, é de nos perguntarmos: que mundo estamos construindo para nossos filhos?
O que ofereceremos para esses pequenos que apenas desabrocham para a vida física?
O que estamos preparando para seus olhos, para seu futuro?
Importante seria se nos preocupássemos em construir um mundo onde eles pudessem viver o amanhã, mantendo o brilho no olhar.
Com menos tristeza estampada na face. Menos dor pela perda prematura dos pais.
Menos desencanto por verem partir seus amigos e encontrar tantos bancos vazios na escola.
Um mundo em que as pessoas pudessem andar livres pelas ruas, sem temer balas perdidas, arrastões ou manifestações agressivas.
Um mundo onde todos se unissem para vencer a enfermidade, a fome, a miséria, que ainda existe em tantas vielas da Terra.
Onde cada qual pensasse no melhor para a sua família e para o seu próximo.
Um mundo onde as crianças pudessem sonhar, com a única preocupação de crescer e se tornarem cidadãos úteis, trabalhadores do bem.
Criaturas que encantassem o planeta com sua arte, enchendo-o de maravilhosos sons com a sinfonia das suas vozes.
Ou com a leveza dos seus corpos na dança.
Ou com a agilidade e eficiência nas disputas esportivas.
Ou utilizassem suas mentes, suas mãos para curar enfermidades que persistem em machucar tanta gente.
Ou pudessem se dedicar a experimentos que resultassem em inventos para facilitar a vida do homem sobre a face da Terra.
Quem sabe, vencer a gravidade e lançar-se no espaço, rumo a novas descobertas, novas estrelas?
Uma criança é um raio de luz. Não apaguemos a esperança que brilha em seu olhar, em seus gestos.
Construamos um mundo em que cada criança tenha seu lugar ao sol, seja amada, possa brincar livre, vivendo intensamente sua infância.
Em que possa ir à escola, ir ao parque, à piscina, ao campo, à praia, sem medo.
 
* * *
É possível que ouvindo esta mensagem alguns de nós digamos que somos pessoas normais, vivendo o dia a dia, sem poder interferir nos conflitos armados ou em decisões armamentistas.
No entanto, pensemos em como podemos semear a paz em nossos dias, sendo menos agressivos, mais tolerantes.
Que não dirijamos nosso carro como se fosse uma arma, que respeitemos nosso semelhante, que honremos o trabalho honesto.
Há tanto para fazer neste mundo que pode beneficiar a muitos.
A vibração de amor que lançamos na direção do outro é a mesma que acalmará a onda dos conflitos armados.
A dignidade com que executemos nossas tarefas diminuirá a corrupção, a desonestidade.
A nossa doação em espécie ou em trabalho voluntário diminuirá dificuldades que se apresentam próximas ou distantes.
Um mundo novo. Um mundo para ser compartilhado com todos.
Um mundo para nossos filhos. Um mundo de esperança, bordado com as cores do arco-íris.
Comecemos hoje e unamo-nos a outros tantos que já semeiam no mundo o bem, o amor, a paz.
Façamos isso pelos nossos filhos. Pelas nossas crianças. Por nós mesmos que retornaremos, em futuras vidas, para o mundo que construirmos agora.
 
 
Redação do Momento Espírita, com base na canção Let the children have a world, de Danna Winner.




sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Reclamações e Vitimismo[1]


 
Marco Milani[2]


Reclamar é uma atitude humana. Alguns reclamam mais, outros menos. Alguns com razão aos olhos do próximo, outros com razão somente aos próprios olhos.
Ao nos manifestarmos sobre o que acreditamos ser necessário e correto, exercemos o livre-arbítrio e buscamos o aprimoramento de determinado contexto, entretanto, nem sempre o que reivindicamos guarda relação com a justiça e com a verdade. Em nosso acanhado nível evolutivo, não é raro observarmos o orgulho e o egoísmo motivarem essas manifestações.
Uma forma orgulhosa e imatura de posicionamento é culpar terceiros pela situação em que o reclamante se encontra. Os outros seriam os responsáveis diretos pelas infelicidades e desconfortos percebidos. Se não fossem aquelas pessoas, tudo seria diferente...
O centro espírita não está imune desses comportamentos, pois não é o rótulo que determina o comportamento dos frequentadores.
Podemos encontrar queixosos recorrentes que alegam ser vítimas de dirigentes, por não terem suas ideias e propostas revolucionárias acatadas na casa espírita. Algumas queixas podem ser justas e outras não.
Muitos reclamantes se consideram perseguidos e vítimas das circunstâncias por não terem todos os seus desejos satisfeitos.
Alguns potencializam suas queixas nas redes sociais, tentando cooptar simpatizantes em causa própria. Acusam dirigentes de entidades espíritas de impedirem o desenvolvimento do espiritismo no Brasil e no mundo, por não lhes oferecer a tribuna para se apresentarem ou por não obterem espaços privilegiados em eventos para venderem os seus livros.
Mas críticas a dirigentes existem desde os primórdios do espiritismo, pois Kardec mesmo foi chamado de centralizador e acusado por adeptos místicos de impedir que 'novos ensinamentos', obtidos sem qualquer critério metodológico sério, fossem inseridos no corpo doutrinário. Um desses queixosos foi o advogado Jean-Baptiste Roustaing, que afirmava ter recebido 'novas revelações', mas como se mostravam bem distante do bom senso e da coerência doutrinária foram justificadamente rejeitadas por Kardec.
Nos dias de hoje, basta um clique para se fazer circular eletronicamente textos elaborados com as mais variadas intenções, sendo cômodo para algumas pessoas simplesmente se afirmarem vítimas injustiçadas de malvados dirigentes de centros espíritas, que tolhem suas maravilhosas iniciativas. Servindo-se do discurso acusatório atual, Roustaing chamaria Kardec de conservador, retrógrado, reacionário e outros adjetivos da moda.
Certamente, todos erram e podem melhorar. Portanto, o diálogo respeitoso e racional sempre será o melhor caminho para os esclarecimentos necessários às partes envolvidas em divergências de ideias. As conquistas morais, entretanto, não são obtidas por reclamações ou vitimismo, mas por trabalho e mérito.
 




[1] Publicado no jornal Correio Fraterno - Edição 477 setembro/outubro 2017
[2] Economista e professor da Unicamp. Diretor do Departamento do Livro da USE-Regional SP.

quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Amor e desapego[1]

O amor propicia o desapego a tendências negativas, pessoas, coisas e utilidades


Joanna de Ângelis
 

Indispensável tornar o amor um estado de espírito, uma condição natural no processo de crescimento interior, uma fatalidade que deve ser conseguida quanto antes.
À medida que se posterga a vivência desse sentimento, que é força vital e dinamizadora, o sentido existencial padece hipertrofia de finalidade, porque destituído de riqueza, de aspirações do belo, do bom, do libertador. Mesmo que vicejem tais aspirações, apresentam-se debilitadas, porque procedem dos sentidos físicos, de ambições egoístas, de necessidades para o prazer, sem o contributo valioso e de profundidade, que tem por base o Espírito em si mesmo e suas legítimas ambições de imortalidade e triunfo sobre as vicissitudes e amarras com a retaguarda.
Amar deve significar a aspiração máxima do ser que transborda de emoções relevantes e deseja reparti-las a mancheias, como quem distribui luz objetivando a vitória sobre toda treva, qualquer sombra.
Essa força, que domina o coração e se expande mediante as ações, altera por completo o rumo da existência física, concedendo-lhe um colorido especial e uma finalidade superior, que deve ser buscada sem cansaço, adornada de otimismo e de paz.
Trazer esse amor para todos os momentos da vida, é torná-la digna de ser experienciada, capaz de ser transformada em triunfo.
A Humanidade sempre teve expoentes desse amor, que lhe constituíram razão de desenvolvimento e de conquistas em todos os setores do processo de crescimento moral, intelectual, artístico, cultural, tecnológico, religioso, espiritual, sem cujo contributo, por certo, as criaturas ainda se encontrariam às faixas primitivas do processo da evolução.
Foram esses homens e mulheres forjados no amor e distribuidores de amor, que se olvidaram de si mesmos, que promoveram a espécie aos patamares de que hoje desfruta.
Não pensaram primeiro em si, mas desenvolveram interiormente a capacidade de doação, de tal forma que o bem geral constituiu-lhes o motivo para que lutassem estoicamente, vencendo os próprios limites e dificuldades, de maneira que a enfermidade, a intolerância, o atraso moral e mental dos seus coevos não se lhes transformaram em impedimento para a construção do mundo melhor. E mesmo quando se lhes exigiam a existência, deram-na, fiéis à confiança e certeza de que o seu era o trabalho de libertação das massas e de promoção da sociedade.
Tornaram-se modelos porque demonstraram que a felicidade é mais risonha quando objetiva o próximo sem detença, oferecendo-lhe motivações para existir e seguir adiante, conquistando espaços de harmonia.
Isso ocorre porque, toda vez que alguém se ilumina pela chama do amor, oferece mais claridade ao mundo, torna-o melhor e enseja que outras vidas também se clarifiquem, libertando-se dos atavismos cruéis da ignorância, do preconceito, da crueldade.
O amor é sempre feito de compaixão e torna-se finalidade essencial da vida por expressar valores que não se amontoam, que não enferrujam e ninguém consegue roubar, porque se encontram à disposição de todo aquele que os deseje possuir, recebendo-os jovialmente e de maneira especial.
O nosso amor modifica a estrutura da sociedade, que se encontra vitimada pelas guerras e por diversas calamidades que geram sofrimento e alucinação.
Com a contribuição do amor, modificam-se essas condições, e, graças à Ciência e à Tecnologia que aproximam criaturas e povos, ninguém mais desconhece as necessidades que afligem o mundo, permanecendo indiferente ao seu destino amargo.
Assim, qualquer contribuição de afeto, por pensamento, mediante palavras e através de atos, encarrega-se de tornar menos densa a psicosfera em que se movimentam os seres, menos venenoso o ódio que campeia desenfreado, mais animador o espírito de competitividade sem os extremos de dominação e de arbitrariedade.
Isso porque o amor é destituído de vilania e de interesses doentios.
O amor propicia o desapego a tendências negativas, pessoas, coisas e utilidades.
É imparcial e generoso para com tudo e com todos, não se permitindo prender, escravizar-se ou reter, impedindo o avanço de outrem, a realização pessoal do ser amado, nem acumulando recursos amoedados ou não, que se transformam em cárcere de sofrimento.
Nesse cometimento em favor do desapego, vale ressaltar que o mais difícil é a libertação das impressões perturbadoras que remanescem no imo como herança do passado infeliz, transformando-se em ressentimentos, ódios, angústias, ciúmes, que necessitam ser superados.
É comum negar-se essas vivas expressões perniciosas do caráter, recalcando-as, sem as eliminar, o que lhes permite reaparecer com frequência, dominando as paisagens interiores e asfixiando as aspirações da felicidade.
Um esforço honesto para reconhecer-lhes a presença dominadora auxilia no empreendimento pela sua superação. Aceitar a sua existência não significa concordar com as manifestações que irrompem com periodicidade, mas substituir, lentamente que seja, porém com denodo, cada uma dessas paixões nefastas, abrindo espaços para o surgimento dos valores positivos, do amor que deverá predominar.
Nesse campo emocional, que está sendo arado com bondade e coragem de produzir melhor, despontam então a alegria, a paz, a vida exuberante, que passam a substituir aqueles cruéis inimigos da plenitude.
O amor preenche os vazios interiores, fazendo que desapareçam as falsas necessidades externas. Por isso, amplia-se sempre no rumo do infinito, envolvendo aqueles que se encontram próximos como a todos quantos se situam a distância.
Quando atinge o seu clímax, tem características idênticas em relação àqueles aos quais se direciona, sem privilégios nem imposições.
Por isso renuncia, ensinando que a posse excessiva é crime contra a escassez dominante.
Da mesma forma, demonstra que os atavismos perversos, a que muitos indivíduos se vinculam, necessitam ser deixados à margem, superados e substituídos, sem saudades ou tormentos, abrindo veredas a experiências novas e a realizações pacificadoras.
É certo que tal providência exige coragem e combatividade, espírito que anseia pelo progresso e se ama, tomando a decisão de não mais permanecer na retaguarda do processo evolutivo, em razão da lucidez mental de que se sente possuidor.
O desapego material é importante na desincumbência do esforço por amar, no entanto, mais grave e significativo é o de natureza emocional, em referência aos vícios, às tendências primitivas, aos sentimentos inferiores.
Não dês guarida à atração do mal, seja como for que se te apresente.
Ama-te, a ponto de te transformares em exemplo de vitória sobre a inferioridade moral, tornando-te cooperador do esforço que outros envidem no mesmo sentido.
Assim, compreenderás quanto é difícil para o próximo libertar-se daquilo que nele te desagrada, em face do que em ti igualmente a outros perturba.
Esse amor, que se inicia no teu esforço, em breve tomará conta de ti com tal força que não mais haverá espaço interior senão para amar e servir.




[1] Garimpo de Amor - Joanna de Angelis / Divaldo Franco

quarta-feira, 22 de novembro de 2017

PLANEJAMENTO ENCARNATÓRIO? SÓ EM LINHAS GERAIS[1]



Jader Sampaio


A Organização das Nações Unidas – ONU diz que nascem 180 pessoas por minuto no mundo, que viverão, em média, 71,4 anos. Inferindo, 94 milhões e 600 mil pessoas nascem todo o ano. Juntas, elas vivem cerca de 59 trilhões de horas.
Fiquei imaginando qual seria a infraestrutura no mundo dos espíritos para fazer o planejamento de 94 milhões de corpos por ano, ou para planejar os eventos que envolvem 59 trilhões de horas para as pessoas que encarnarão em apenas um ano nos quatro cantos do mundo.
Por que estou dizendo isso?
Os leitores da obra do espírito André Luiz, via Chico Xavier, irão se recordar, no livro "Missionários da Luz", um caso de planejamento reencarnatório, intitulado “preparação de experiências”. Ele trata de um espírito, em boas condições mentais, apoiado por outros que lhe são afins, preparando-se para reencarnar.
O autor espiritual faz uma ressalva, que há espíritos que reencarnam sem este tipo de apoio, tendo por base apenas suas promessas, endossadas pelo mais alto.
Alguns leitores apressados, ou desencantados com os revezes da vida, acreditam que tudo o que passam foi programado anteriormente. Não percebem as “causas atuais”, a que se refere Kardec, que são as escolhas que fazemos no curso da presente encarnação. Não percebem também os riscos a que nos expomos e que as ciências desvendam a cada minuto, propondo, quando possível, meios de os evitar ou reduzir.
Kardec não propunha esse determinismo reencarnatório que às vezes vemos no discurso de alguns expositores, como por exemplo, na questão abaixo de O Livro dos Espíritos (os negritos são meus):
259. Do fato de pertencer ao Espírito a escolha do gênero de provas que deva sofrer, seguir-se-á que todas as tribulações que experimentamos na vida nós as previmos e escolhemos?
Todas, não, porque não escolhestes e previstes tudo o que vos sucede no mundo, até às mínimas coisas. Escolhestes apenas o gênero das provações. As particularidades são a consequência da posição em que vos achais e, muitas vezes, das vossas próprias ações. Escolhendo, por exemplo, nascer entre malfeitores, sabia o Espírito a que arrastamentos se expunha; ignorava, porém, quais os atos que viria a praticar. Esses atos resultam do exercício da sua vontade, ou do seu livre-arbítrio. Sabe o Espírito que, escolhendo tal caminho, terá que sustentar lutas de determinada espécie; sabe, portanto, de que natureza serão as vicissitudes que se lhe depararão, mas ignora se se verificará este ou aquele evento. Os acontecimentos secundários se originam das circunstâncias e da força mesma das coisas. Previstos só são os fatos principais, os que influem no destino. Se tomares uma estrada cheia de sulcos profundos, sabes que terás de andar cautelosamente, porque há muita probabilidade de caíres; ignoras, contudo, em que ponto cairás e bem pode suceder que não caias, se fores bastante prudente. Se, ao percorreres uma rua, uma telha te cair na cabeça, não creias que estava escrito, segundo vulgarmente se diz.




terça-feira, 21 de novembro de 2017

Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas[1]


 

A Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas foi o primeiro centro espírita oficialmente legalizado no mundo, fundada em 1º de abril de 1858, por Allan Kardec, que foi escolhido presidente por aclamação, com sede em Paris, França. Como o próprio nome indica, o objetivo da instituição era estudar o Espiritismo e pesquisar os fenômenos mediúnicos, conforme o primeiro artigo de seu regulamento: "A Sociedade tem por objeto o estudo de todos os fenômenos relativos às manifestações espíritas e suas aplicações às ciências morais, físicas, históricas e psicológicas". Contava com a colaboração de vários médiuns, pelos quais seus membros interagiam com os Espíritos comunicantes, tendo São Luís como o patrono espiritual de seus trabalhos.
O seu lançamento foi notificado na Revista Espírita, edição de maio de 1858 com a seguinte nota:
A extensão por assim dizer universal que a cada dia tomam as crenças espíritas fazia vivamente desejar-se a criação de um centro regular de observações; essa lacuna acaba de ser preenchida. A Sociedade, cuja formação temos o prazer de anunciar, composta exclusivamente de pessoas sérias, isentas de prevenções e animadas do sincero desejo de serem esclarecidas, contou, desde o início, entre seus associados, com homens eminentes por seu saber e posição social. Ela é chamada — disso estamos convencidos — a prestar incontestáveis serviços à comprovação da verdade. Seu regulamento orgânico lhe assegura uma homogeneidade sem a qual não há vitalidade possível; autorizada por portaria do Sr. Prefeito de Polícia, conforme o aviso de S. Exa. Sr. Ministro do Interior e da Segurança Geral, em data de 13 de abril de 1858.
 Baseia-se na experiência dos homens e das coisas e no conhecimento das condições necessárias às observações que são o objeto de suas pesquisas. Vindo a Paris, os estrangeiros que se interessarem pela Doutrina Espírita encontrarão, assim, um centro ao qual poderão dirigir-se para obter informações, e onde poderão também comunicar suas próprias observações.
— Allan Kardec
 
Em Obras Póstumas, Kardec conta que a entidade surgiu da necessidade de acolher o crescente número de adeptos ao Espiritismo que vinham participar das reuniões regulares que ele realizava em sua casa, na Rua dos Mártires, às terças-feiras. Os participantes propuseram então alugarem juntos um cômodo apropriado para comportar aqueles importantes trabalhos.
Mas, então, fazia-se necessária uma autorização legal, a fim de se evitar que a autoridade nos fosse perturbar. O Sr. Dufaux, que se relacionava pessoalmente com o Prefeito de Polícia, encarregou-se de tratar do caso. A autorização também dependia do Ministro do Interior. A tarefa de obter essa autorização coube então ao general X..., que, sem que ninguém o soubesse, era simpático às nossas ideias — embora sem as conhecer inteiramente. Graças à sua influência, a autorização pôde ser concedida em quinze dias, quando, normalmente, leva três meses para ser dada.
— Allan Kardec
Obras Póstumas – Segunda Parte, Fundação da Sociedade Espírita de Paris
 
Uma vez regulamentada a Sociedade, as sessões foram transferidas para uma sala alugada no Palais-Royal, inicialmente na galeria de Valois, depois, para uma sala maior, na Galeria Montpensier, quando suas sessões foram remarcadas para as sextas-feiras. Em 1860, a instituição foi relocada para sua sede própria, adquirida na Rua Saint-Anne, n° 59.
As suas sessões eram fechadas ao público, reservando-se aos seus sócios e, eventualmente, a convidados que fossem previamente apresentados por um membro e autorizados pelo presidente. A admissão de um associado seguia um rigoroso processo de aprovação que, entre outros critérios, exigia a fiança de dois membros titulares e conhecimentos prévios da doutrina.
O regulamento completo da entidade foi publicado em O Livro dos Médiuns, Segunda Parte, cap. XXX. As principais atividades e notas da Sociedade eram publicadas na Revista Espírita.
Reeleito sucessivas vezes presidente da entidade, Kardec lutou para a manutenção da rígida disciplina das sessões e não menos rigoroso cuidado na admissão dos associados, enquanto isso, nos corredores, muitos de seus correligionários cobravam uma abertura maior da instituição. Alegando sobrecarga de tarefas, o codificador chegou a pedir demissão de suas funções administrativas da Sociedade, o que não ocorreu devido o apelo geral dos membros em favor de sua permanência na presidência (Revista Espírita, Julho de 1859: "Discurso de encerramento do Ano Social").
Depois da desencarnação do seu fundador, a Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas ficou a cargo de uma comissão diretora composta de sete membros, dentre as quais Amélie Boudet, a viúva de Kardec, porém, não permanecendo ativa por muito tempo, uma vez que os continuadores da obra kardecista passaram a se concentrar nas atividades de uma organização, a Sociedade Anônima, que o codificador havia projetado para substituí-lo.
 
Referências
²  Obras Póstumas, Allan Kardec - especialmente 2ª Parte, "Fundação da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas" (ler online).
²  O Livro dos Médiuns, Allan Kardec- especialmente cap. XXX: "Regulamento da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas" (ler online).
²  Kardec, Marcel Souto Maior.
²  Revolução Espírita, Paulo Henrique de Figueiredo.
²  Em nome de Kardec, Adriano Calsone.