quarta-feira, 5 de outubro de 2022

ANNA PRADO [1]

 

Everton de Oliveira Maraldi

 

Anna Rebello Prado (1883-1923) foi uma médium espírita brasileira conhecida por produzir escrita direta, levitações, aportes e fenômenos de materialização. Seu caso foi investigado por seguidores do espiritismo kardecista no Brasil. Ela também atraiu a atenção de pesquisadores psíquicos e espiritualistas franceses, como Pascal Forhuny e Gabriel Delanne.

 

Vida

Anna Rebello Prado nasceu na cidade amazônica de Parintins, provavelmente por volta de 1883 (sua data exata de nascimento é desconhecida). Era filha de Francisco Maximiano de Sousa Rebello e Ermelinda de Carvalho Rebello.

Não há informações sobre a infância e adolescência de Anna em Parintins. Tudo o que se sabe é que sua família esteve envolvida com o espiritismo muito antes de suas experiências mediúnicas surgirem pela primeira vez, em 1918. Dois de seus tios maternos (Emiliano Olympio de Carvalho Rebello e Jovita Olympio de Carvalho Rebello) ocuparam cargos importantes no movimento espírita amazônico. A mãe de Anna também conhecia o livro de Allan Kardec O Evangelho segundo o Espiritismo[2].

Em 1901 Anna casou-se com Eurípedes de Albuquerque Prado, empresário, jornalista, professor e político (ocupou o cargo de prefeito de Parintins de 1911 a 1913). Eurípedes foi criado como católico, mas depois aderiu ao espiritismo. Como jornalista, publicou traduções de obras de autores espíritas, incluindo Allan Kardec, Léon Denis e Gabriel Delanne, no jornal amazônico “O Tacape”. Mais tarde, Eurípedes mudou-se de Parintins com sua esposa e quatro filhos para a cidade de Belém, no estado do Pará, onde passaram a realizar sessões espíritas[3].

 

Sessões

Tendo lido sobre o fenômeno das mesas girantes na literatura espírita, Eurípedes decidiu realizar sessões espíritas em sua casa com a colaboração de sua família. Sua esposa a princípio se recusou a participar, duvidando que esses fenômenos fossem possíveis, mas por insistência dele ela acabou concordando e se assustou quando ruídos repentinos foram ouvidos na mesa (Eurípedes não teve sucesso quando tentou anteriormente com seus filhos mais velhos). Em tentativas subsequentes, a mesa se moveu e uma perna subitamente se elevou. Por meio de batidas na mesa, tentavam se comunicar com o espírito supostamente responsável pelos fenômenos, recebendo o nome de um falecido conhecido da família. Em ocasiões posteriores, os movimentos da mesa tornaram-se mais intensos e os objetos domésticos foram levantados e jogados no chão[4].

Entre os muitos fenômenos físicos atribuídos à mediunidade de Prado estavam materializações de mortos, aportes, levitação de objetos, escrita direta, tipologia (suposta comunicação de espíritos por meio de batidas ou sons inusitados em mesas ou outros móveis), desmaterialização (e posterior reaparecimento) de sua próprio corpo, psicografia cutânea, em que palavras ou frases inteiras apareciam 'impressas' em sua pele, efeitos luminosos e germinação anômala (germinação de sementes incrivelmente rápida). Durante as sessões, Prado relatou alterações na consciência e visões de espíritos. Dada a variedade de fenômenos, o escritor espírita brasileiro Samuel Nunes Magalhães, autor da mais completa biografia do médium, classificou-a com Eusapia Palladino e Daniel Dunglas Home como um dos médiuns mais importantes da história da pesquisa psíquica.

As sessões espíritas de Prado logo chamaram a atenção dos jornalistas e as reportagens posteriores dos jornais levaram membros da elite paraense a participar, incluindo médicos, farmacêuticos, artistas, advogados e políticos, além de leigos. Ettore Bosio, maestro brasileiro, forneceu um registro detalhado da maioria dessas sessões e escreveu um livro intitulado “O Que Eu Vi”. Bosio foi o principal fotógrafo das sessões; a maioria das reuniões acontecia em sua casa. Em uma ocasião, Bosio convidou Virgílio de Mendonça, senador, Antônio Chermont, diretor do jornal O Estado do Pará e João Alfredo de Mendonça, jornalista e secretário do jornal Folha, e pediu que assinassem seus nomes nas chapas fotográficas antes da sessão, para garantir que não seriam trocadas por cópias adulteradas. As impressões foram feitas alguns momentos após a exposição das chapas, nas quais Bosio foi auxiliado por um fotógrafo profissional. Eurípides Prado declarou mais tarde que a figura fotografada evidenciava os mesmos traços do senhor Joaquim Prado, seu pai, falecido alguns anos antes[5].

Com o tempo, os atendentes adicionaram controles adicionais para fraudes em algumas sessões. Estes incluíram:

1)      exame da sala para qualquer evidência de trapaça;

2)      exame físico da médium e suas roupas;

3)      remoção de móveis;

4)      mudança de local de reunião e

5)      o uso de uma gaiola de ferro para isolar o médium do público e diferenciá-la dos supostos espíritos materializados.

Comissões foram formadas para garantir que os controles experimentais fossem observados, com a cooperação ativa de Prado e seu marido muitas vezes solícitos. Mas os relatórios mostram que ela geralmente ficava exausta após as sessões e se sentia desconfortável realizando os experimentos dentro da gaiola. Em algumas ocasiões, João e os outros espíritos determinavam os procedimentos a serem seguidos: as sessões espíritas eram geralmente realizadas em escuridão parcial ou total, alegadamente em resposta aos seus pedidos. No entanto, às vezes, os participantes foram autorizados a tocar as figuras materializadas e interagir com elas. Algumas figuras beijaram os rostos dos presentes, tocaram suas mãos e até conversaram com eles[6], [7].

Foram feitos experimentos em que as figuras materializadas colocaram as mãos ou os pés dentro de um balde contendo parafina líquida para criar moldes para modelos de gesso. Foram obtidas fotografias desses objetos. Um espécime supostamente da mão de Raquel Figner, filha falecida de Frederico Figner (ex-presidente da Federação Espírita Brasileira) e Ester Figner, passou a fazer parte do acervo particular de sua família (pelo menos até a publicação do livro de Magalhães em 2012) .

 

Críticas e polêmicas

Como todos os médiuns físicos, Prado foi muitas vezes acusada de fraude. Seu crítico mais persistente foi Florêncio Dubois, um padre católico. Dubois afirmou que as assinaturas supostamente inscritas nas chapas fotográficas antes das sessões poderiam ter sido feitas mais tarde, e que as chapas poderiam ter sido adulteradas antes de serem expostas. Bosio respondeu lacrando a moldura que segurava as placas e entregando-a a um jornalista, João Alfredo de Mendonça; foi inspecionado por outros participantes antes da sessão e encontrado intacto[8]; ele também conseguiu que o dono da gráfica confirmasse que nenhuma evidência de adulteração havia sido encontrada. Outros depoimentos de apoio assinados pelos intelectuais presentes foram recolhidos por Bosio[9].

Dito isto, algumas das fotografias são obscuras ou borradas e sua validade seria difícil de insistir. A defesa do Prado por Magalhães baseia-se fortemente na veracidade dos depoimentos dos participantes da sessão de 'caráter imaculado e honra reconhecida'[10], mas não levou em conta as limitações desse tipo de prova. Por exemplo, nenhuma suspeita parece ter sido levantada quando se descobriu que uma mensagem fornecida por um espírito parecia ter sido plagiada de uma passagem de um livro de Allan Kardec[11].

Tentando demonstrar que a médium e os supostos espíritos eram pessoas diferentes, o Dr. Renato Chaves, médico, comparou suas impressões digitais com as do espírito materializado de João. No entanto , as amostras foram consideradas idênticas. Chaves argumentou que, se os fenômenos observados durante as sessões não fossem fruto de fraude, eles poderiam ser explicados em termos de 'hipnotismo' ou outra explicação natural[12]. Alguns artigos de jornal tentaram explicar o fenômeno em termos de sugestão coletiva, como foi o caso da Gazeta de Notícias[13]. Tais explicações, no entanto, podem não abranger todos os fenômenos relatados e mais investigações seriam necessárias para ajudar a entender as muitas alegações feitas em relação à mediunidade de Prado.

 

Interesse Internacional

A mediunidade de Prado acabou chamando a atenção de pesquisadores psíquicos e espiritualistas franceses, como Paschal Forhuny e Gabriel Delanne. Forhuny publicou dois artigos descrevendo brevemente o caso na “Revue Métapsychique”[14],[15], publicada pelo Institut Métapsychique International. A primeira apresenta o caso aos leitores, onde Forhuny manifesta interesse em obter um relatório médico mais detalhado sobre os fenômenos observados; na segunda, cita uma carta de Frederico Figner descrevendo com mais detalhes os fenômenos. Menções de Prado também são encontradas no estudo da reencarnação de Delanne e na Revue Spirite, um periódico fundado por Allan Kardec[16].

 

Morte

Prado tinha 39 anos quando faleceu em 23 de abril de 1923, em decorrência de queimaduras em um acidente com um fogão[17]. Boatos de detratores de que ela teria cometido suicídio foram negados por Matta Bacelar, o médico que a atendeu[18].

 

 

Literatura

§  Faria, R. N. (1921). O Trabalho dos Mortos. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira.

§  Faria, R. N. (1924). Renascença da Alma. Belém: Instituto Lauro Sodré.

§  Forthuny, P. (1922). Chronique Etrangere: Expériences avec Mme Prado, Médium Brésilien. Revue Métapsychique 1.

§  Forthuny, P. (1923). Chronique Etrangere: Expériences avec Mme Prado, Médium Brésilien. Revue Métapsychique 2.

§  Magalhães, S. N. (2012). Anna Prado: A mulher que falava com os mortos. Brasília: Federação Espírita Brasileira.



[2] Magalhães (2012).

[3] Magalhães (2012).

[4] Magalhães (2012).

[5] Faria (1921).

[6] Faria (1921).

[7] Magalhães (2012).

[8] Faria (1921).

[9] Magalhães (2012), 210ss.

[10] Faria (1921).

[11] Magalhães (2012), 89.

[12] Faria (1921).

[13] Magalhães (2012), 285.

[14] Fortune (1922).

[15] Fortune (1923).

[16] Magalhães (2012).

[17] Magalhães (2012).

[18] Faria (1924).

Nenhum comentário:

Postar um comentário