Allan Kardec
(Paris,
abril de 1866 – Médium: Srs. M. e T., em sonambulismo)
Os acontecimentos se precipitam
com rapidez, de modo que não vos dizemos mais, como outrora: “Os tempos estão próximos”;
agora dizemos: “Os
tempos são chegados”.
Por estas palavras não entendais
um novo dilúvio, nem um cataclismo, nem uma perturbação geral. Convulsões
parciais do globo ocorreram em todas as épocas e ainda se produzem, porque inerentes
à sua constituição, mas são sinais dos tempos.
Entretanto, tudo quanto está
predito no Evangelho deve realizar-se e se cumpre neste momento, como
reconhecereis mais tarde. Mas não tomeis os sinais anunciados senão como figuras,
dos quais é preciso captar o espírito, e não a letra. Todas as Escrituras encerram grandes verdades sob
o véu da alegoria, e é porque os exegetas se apegaram à letra que se
extraviaram. Faltou-lhes a chave para a compreensão de seu verdadeiro sentido. Esta
chave está nas descobertas da Ciência e nas leis do mundo invisível, que o
Espiritismo vos vem revelar. Doravante, com o auxílio desses novos
conhecimentos, o que era obscuro torna-se claro e inteligível.
Tudo segue a ordem natural das
coisas e as leis imutáveis de Deus não serão alteradas. Assim, não vereis
milagres, nem prodígios, nem nada de sobrenatural, no sentido vulgar ligado a
estas palavras.
Não olheis o céu para aí buscar
sinais precursores, pois não os vereis e os que vo-los anunciam vos enganarão;
mas olhai em torno de vós, entre os homens; é aí que os encontrareis.
Não sentis como um vento que
sopra na Terra e agita todos os Espíritos? O mundo está à espera e como tomado
por um vago pressentimento à aproximação da tempestade.
Contudo, não acrediteis no fim
do mundo material; a Terra progrediu desde a sua transformação; deve progredir
ainda, e não ser destruída. Mas a Humanidade chegou a um de seus períodos de
transformação e a Terra vai elevar-se na hierarquia dos mundos.
Não é, pois, o fim do mundo
material que se prepara, mas o fim do mundo moral; é o velho mundo, o mundo dos
preconceitos, do egoísmo, do orgulho e do fanatismo que se desmorona; cada dia
leva consigo os seus destroços. Tudo acabará para ele com a geração que se vai,
e a geração nova erguerá o novo edifício que as gerações seguintes consolidarão
e completarão.
De mundo de expiação, a Terra
está fadada a tornar-se um dia um mundo feliz, e nela habitar será uma
recompensa, ao invés de uma punição. O reinado do bem aí deve suceder o do mal.
Para que os homens sejam felizes
na Terra, é necessário que esta só seja povoada de Espíritos bons, encarnados e
desencarnados, que não quererão senão o bem. Sendo chegado esse tempo, uma
grande emigração se realiza neste momento entre os que a habitam; os que fazem
o mal pelo mal e não são tocados pelo
sentimento do bem por não serem dignos da Terra transformada, dela serão
excluídos, porque aí trariam novamente a perturbação e a confusão e seriam um
obstáculo ao progresso. Irão expiar seu endurecimento nos mundos inferiores,
para onde levarão os conhecimentos adquiridos e terão por missão fazê-los progredir.
Serão substituídos na Terra por Espíritos melhores, que farão reinar entre eles
a justiça, a paz e a fraternidade.
Já dissemos que a Terra não deve
ser transformada por um cataclismo, que aniquilaria subitamente uma geração. A
geração atual desaparecerá gradualmente, e a nova a sucederá, sem que nada seja
mudado na ordem natural das coisas. Tudo se passará, pois, exteriormente, como
de hábito, com uma única diferença, mas esta diferença é capital: uma parte dos
Espíritos que aí se encarnavam não mais encarnarão. Numa criança que nascer, em
vez de um Espírito atrasado e devotado ao mal que tivesse encarnado, será um Espírito
mais adiantado e devotado ao bem.
Trata-se, pois, muito menos de uma nova geração corporal que de uma nova
geração de Espíritos. Assim, os que esperavam ver a transformação operar-se por
efeitos sobrenaturais e maravilhosos ficarão decepcionados.
A época atual é de transição; os
elementos das duas gerações se confundem. Colocados em ponto intermediário, assistis
à partida de uma e à chegada da outra, e cada um já se assinala no mundo pelos
caracteres que lhes são próprios.
As duas gerações que sucedem uma
à outra têm ideias e pontos de vista opostos. Pela natureza das disposições
morais, mas, sobretudo, das disposições intuitivas
e inatas, é fácil distinguir a qual das
duas pertence cada indivíduo.
Devendo fundar a era do
progresso moral, a nova geração se distingue por uma inteligência e uma razão
geralmente precoces, aliadas ao sentimento inato
do bem e das crenças espiritualistas, o que é sinal indubitável de certo grau
de progresso anterior. Não será composta exclusivamente de Espíritos eminentemente
superiores, mas daqueles que, tendo já progredido, estão predispostos a
assimilar todas as ideias progressivas, e aptos a secundar o movimento
regenerador.
Ao contrário, o que distingue os
Espíritos atrasados é, primeiro, a revolta contra Deus pela negação da
Providência e de todo poder superior à Humanidade; depois, a propensão instintiva às paixões degradantes, aos
sentimentos antifraternos do egoísmo, do orgulho, do ódio, do ciúme, da
cupidez, enfim, a predominância do apego a tudo o que é material.
Tais os vícios de que a Terra
deve ser expurgada pelo afastamento dos que se recusam a emendar-se, porque são
incompatíveis com o reinado da fraternidade e porque os homens de bem sempre
sofrerão com o seu contato. A Terra ficará livre deles e os homens marcharão
sem entraves para o futuro melhor, que lhes está reservado aqui, como prêmio
por seus esforços e por sua perseverança, esperando que uma depuração ainda mais
completa lhes abra a entrada dos mundos superiores.
Por esta emigração de Espíritos
não se deve entender que todos os Espíritos retardatários serão expulsos da
Terra e relegados a mundos inferiores. Muitos, ao contrário, a ela voltarão, porque
muitos cederam ao arrastamento das circunstâncias e do exemplo; neles a casca
era pior que a essência. Uma vez subtraídos à influência da matéria e dos
preconceitos do mundo corporal, a maioria verá as coisas de maneira
completamente diferente do que quando vivos, do que tendes numerosos exemplos.
Nisto são ajudados pelos Espíritos benevolentes, que por eles se interessam e que
se desvelam em esclarecê-los e em lhes mostrar o falso caminho que seguiram.
Por vossas preces e exortações, vós mesmos podeis contribuir para sua melhoria,
porque há solidariedade perpétua entre os mortos e os vivos.
Aqueles, pois, poderão voltar,
com o que serão felizes, pois isto será uma recompensa. Que importa o que
tiverem sido ou feito, se forem animados de melhores sentimentos! Longe de
serem hostis à sociedade e ao progresso, serão auxiliares úteis, porque pertencerão
à nova geração.
Assim, só haverá uma exclusão
definitiva para os Espíritos rebeldes por natureza, aqueles que o orgulho e o
egoísmo, mais que a ignorância, tornam-se surdos à voz do bem e da razão.
Mas, mesmo estes não estão
votados a uma inferioridade perpétua, e dia virá em que repudiarão o seu
passado e abrirão os olhos à luz.
Orai, pois, por esses
endurecidos, a fim de que se emendem enquanto é tempo, pois o dia da expiação
está próximo.
Infelizmente, por desconhecer a
voz de Deus, a maioria persistirá em sua cegueira e sua resistência marcará o
fim de seu reino por lutas terríveis. Em seu desvario, eles próprios cavarão a sua
ruína; impelirão à destruição, que engendrará uma porção de flagelos e
calamidades, de sorte que, sem o querer, apressarão o advento da era da
renovação.
E como se a destruição não
marchasse bastante depressa, ver-se-ão os suicídios multiplicando-se em
proporção nunca vista, até entre as crianças. A loucura jamais terá ferido
maior número de homens que, mesmo antes da morte, serão riscados do número dos
vivos. São estes os verdadeiros sinais dos tempos. E tudo isto se realizará
pelo encadeamento das circunstâncias, assim como dissemos, sem que em nada
sejam derrogadas as leis da Natureza.
Todavia, através da nuvem
sombria que vos envolve, e em cujo seio brame a tempestade, já vedes surgirem
os primeiros raios da era nova! A fraternidade assenta os seus fundamentos em todos
os pontos do globo e os povos se estendem as mãos; a barbárie se familiariza ao
contato da civilização; os preconceitos de raças e de seitas, que derramaram
rios de sangue, se extinguem; o fanatismo e a intolerância perdem terreno,
enquanto a liberdade de consciência introduz-se nos costumes e se torna um
direito. Por toda parte fermentam as ideias; vê-se o mal e experimentam-se os remédios,
mas muitos marcham sem bússola e se perdem nas utopias. O mundo está num imenso
processo de gestação, que durará um século. Nesse trabalho, ainda confuso,
vê-se, no entanto, dominar uma tendência para um objetivo: o da unidade e da uniformidade
que predispõem à fraternização.
São ainda sinais do tempo. Mas,
enquanto os outros são os da agonia do passado, estes últimos são os primeiros
vagidos da criança que nasce, os precursores da aurora que o próximo século verá
levantar-se, porque, então, a nova geração estará em toda a sua força. Tanto a
fisionomia do século dezenove difere da do século dezoito, sob certos pontos de
vista, quanto a do século vinte será diferente da do dezenove, sob outros
pontos de vista.
Um dos caracteres distintivos da
nova geração será a fé inata; não a
fé exclusiva e cega, que divide os homens, mas a fé raciocinada, que esclarece
e fortifica, que os une e os confunde num comum sentimento de amor a Deus e ao
próximo. Com a geração que se extingue desaparecerão os últimos vestígios da incredulidade
e do fanatismo, igualmente contrários ao progresso moral e social.
O Espiritismo é o caminho que
conduz à renovação, porque destrói os dois maiores obstáculos que a ela se
opõem: a incredulidade e o fanatismo. Dá uma fé sólida e esclarecida; desenvolve
todos os sentimentos e todas as ideias que correspondem às vistas da nova
geração. Por isto é como que inato e em estado de intuição no coração de seus
representantes. A era nova vê-lo-á, pois, crescer e prosperar pela força mesma
das coisas.
Tornar-se-á a base de todas as
crenças, o ponto de apoio de todas as instituições.
Mas, daqui até lá, quantas lutas
terá ainda de sustentar contra os seus dois maiores inimigos: a incredulidade e
o fanatismo, que, coisa bizarra, se dão as mãos para abatê-lo! Eles pressentem seu
futuro e sua ruína, razão por que o temem, pois já o veem plantar, sobre as
ruínas do velho mundo egoísta, a bandeira que deve unir todos os povos. Na
divina máxima: Fora da caridade não há
salvação, leem sua própria condenação, porque é o símbolo da nova aliança
fraternal proclamada pelo Cristo[2].
Ela se lhes mostra como as palavras fatais do festim de Baltazar. E, contudo, deviam
bendizer esta máxima, porque os garante contra todas as represálias da parte
dos que perseguem. Mas não, uma força cega os impele a rejeitar a única coisa
que os poderia salvar!
Que poderão eles contra o
ascendente da opinião que os repudia? O Espiritismo sairá triunfante da luta,
não o duvideis, porque, estando nas leis da Natureza é, por isto mesmo, imperecível.
Vede por que multidão de meios a ideia se espalha e penetra em toda parte;
crede bem que esses meios não são fortuitos, mas providenciais; aquilo que, à
primeira vista, pareceria dever prejudicá-lo, é precisamente o que ajuda a sua
propagação.
Logo verá surgirem campeões
altamente reconhecidos entre os homens mais considerados e mais acreditados,
que o apoiarão com a autoridade de seu nome e de seu exemplo, e imporão
silêncio aos seus detratores, porque não ousarão tratá-los de loucos. Esses
homens o estudam no silêncio e se mostrarão quando chegar o momento propício.
Até lá, convém que se mantenham afastados.
Logo também vereis as artes aí beber,
como numa fonte fecunda, e traduzir seus pensamentos e os horizontes que descobre
pela pintura, a música, a poesia e a literatura. Já vos foi dito que haveria um
dia a arte espírita, como houve a arte pagã e a arte cristã, e é uma grande
verdade, porque os maiores gênios nele se inspirarão. Em breve vereis os seus
primeiros esboços, e mais tarde ele ocupará o lugar que deve ter.
Espíritas, o futuro é vosso e de
todos os homens de coração e devotamento. Não vos assusteis com os obstáculos,
pois nenhum deles poderá entravar os desígnios da Providência.
Trabalhai sem descanso e
agradecei a Deus por vos ter colocado na vanguarda da nova falange. É um posto
de honra que vós mesmos pedistes, e do qual vos deveis tornar dignos por vossa
coragem, perseverança e devotamento. Ditosos os que sucumbirem nesta luta
contra a força; mas a vergonha será, no mundo dos Espíritos, para os que
sucumbirem pela fraqueza ou pela pusilanimidade. Aliás, as lutas são
necessárias para fortificar a alma; o contato do mal faz apreciar melhor as
vantagens do bem. Sem as lutas que estimulam as faculdades, o Espírito
deixar-se-ia arrastar por uma indiferença funesta ao seu adiantamento. As lutas
contra os elementos desenvolvem as forças físicas e a inteligência; as lutas
contra o mal desenvolvem as forças morais.
Observações
1º – A maneira pela qual se opera a transformação é muito
simples e, como se vê, é toda moral e em nada se afasta das leis da Natureza.
Por que, então, os incrédulos repelem essas ideias, já que nada têm de sobrenatural?
É que, segundo eles, a lei de vitalidade cessa com a morte do corpo, ao passo
que para nós ela prossegue sem interrupção; eles restringem sua ação e nós a
estendemos. Eis por que dizemos que os fenômenos da vida espiritual não saem
das leis da Natureza. Para eles o sobrenatural começa onde acaba a apreciação
pelos sentidos.
2º – Quer os Espíritos da nova geração sejam novos Espíritos
melhores, quer os antigos Espíritos melhorados, o resultado é o mesmo. Desde o
instante que trazem melhores disposições, é sempre uma renovação. Os Espíritos
encarnados formam, assim, duas categorias, conforme suas disposições naturais:
de uma parte, os Espíritos retardatários que partem; de outra, os Espíritos
progressistas que chegam. O estado dos costumes e da sociedade estará, pois,
num povo, numa raça ou no mundo inteiro, na razão das duas categorias que tiver
a preponderância.
Para simplificar a questão,
consideremos um povo, num grau qualquer de adiantamento, e composto de vinte
milhões de almas, por exemplo. Fazendo-se a renovação dos Espíritos à medida
das extinções, isoladas ou em massa, necessariamente houve um momento em que a
geração dos Espíritos retardatários ultrapassava em número a dos Espíritos
progressistas, que apenas contavam raros representantes sem influência, e cujos
esforços para fazer predominar o bem e as ideias progressistas estavam paralisados.
Ora, partindo uns e chegando outros, após um dado tempo as duas forças se
equilibram e sua influência se contrabalança. Mais tarde, os recém-chegados são
maioria e sua influência torna-se preponderante, conquanto ainda entravada pela
dos primeiros; estes, continuando a diminuir, enquanto os outros se multiplicam,
acabarão por desaparecer. Chegará, então, o momento em que a influência da nova
geração será exclusiva.
Assistimos a esta transformação,
ao conflito que resulta da luta das ideias contrárias, que procuram
implantar-se. Umas marcham com a bandeira do passado, outras com a do futuro.
Se se examinar o estado atual do mundo, reconhecer-se-á que, tomada em seu
conjunto, a Humanidade terrestre ainda está longe do ponto intermediário, em
que as forças se contrabalançam; que os povos, considerados isoladamente, estão
a uma grande distância uns dos outros, nesta escada; que alguns alcançam este
ponto, mas nenhum ainda o ultrapassou. Aliás, a distância que o separa dos pontos
extremos está longe de ser igual em duração, e uma vez transposto o limite, o
novo caminho será percorrido com tanto mais rapidez, quanto uma imensidão de
circunstâncias o virão aplainar.
Assim se realiza a transformação
da Humanidade. Sem a emigração, isto é, sem a partida dos Espíritos
retardatários, que não devem voltar, ou que só voltarão depois de se terem melhorado,
nem por isto a Humanidade terrena ficará indefinidamente estacionária, porque
os Espíritos mais atrasados por sua vez progridem; mas, teriam sido precisos
séculos, talvez milhares de anos, para atingir o resultado que meio século
bastará para realizar.
Uma comparação vulgar fará se
compreenda melhor ainda o que se passa nessa circunstância. Suponhamos um regimento,
em sua grande maioria composto de homens turbulentos e indisciplinados: estes
provocarão incessantes desordens, que a severidade da lei penal muitas vezes
terá dificuldade em reprimir. Esses homens são os mais fortes, porque mais
numerosos; sustentam-se, encorajam-se e se estimulam pelo exemplo. Os poucos
bons não têm influência; seus conselhos são desprezados; são ultrajados,
maltratados pelos outros e sofrem este contato. Não é a imagem da sociedade
atual?
Imaginemos que tais homens sejam
retirados do regimento, um a um, cem a cem, e substituídos por igual número de
bons soldados, mesmo pelos que tiverem sido expulsos, mas que se tenham
emendado seriamente: ao cabo de algum tempo ter-se-á sempre o mesmo regimento,
mas transformado; a boa ordem nele terá sucedido a desordem. Dar-se-á o mesmo
com a Humanidade regenerada.
As grandes partidas coletivas
não apenas terão como objetivo ativar as saídas, mas transformar mais
rapidamente o espírito da massa, desembaraçando-a das más influências, e dar maior
ascendente às ideias novas.
Eis por que muitos partem, a
despeito de suas imperfeições, a fim de se retemperarem numa fonte mais pura, porque
estão maduros para esta transformação. Se tivessem ficado no mesmo meio e sob
as mesmas influências, teriam persistido em suas opiniões e em sua maneira de
ver as coisas. Basta uma estada no mundo dos Espíritos para lhes abrir os
olhos, porque aí veem o que não podiam ver na Terra. O incrédulo, o fanático, o
absolutista poderão, assim, voltar com ideias inatas de fé, de tolerância e de liberdade. Em seu regresso,
encontrarão as coisas mudadas e sofrerão o ascendente do novo meio onde
nascerem. Em vez de fazer oposição às ideias novas, serão seus auxiliares.
Assim, a regeneração da
Humanidade não necessita absolutamente da renovação integral dos Espíritos:
basta uma modificação em suas disposições morais. Esta modificação se opera em
todos os que a isto forem predispostos, quando subtraídos à influência
perniciosa do mundo. Nem sempre os que voltarem serão outros Espíritos, mas,
muitas vezes, os mesmos Espíritos, pensando e sentindo diversamente.
Quando essa melhora é isolada e
individual, passa despercebida e não tem influência ostensiva no mundo. Outro será
o efeito, quando operada simultaneamente em grandes massas, porque, então,
conforme as proporções, em uma geração as ideias de um povo ou de uma raça
poderão ser modificadas profundamente.
É o que se nota quase sempre
depois dos grandes abalos que dizimam as populações. Os flagelos destruidores
só destroem o corpo, mas não atingem o Espírito; ativam o movimento de vaivém
entre o mundo corporal e o mundo espiritual e, em consequência, o movimento
progressivo dos Espíritos encarnados e desencarnados.
É um desses movimentos gerais
que se opera neste momento, e que deve desencadear o remanejamento da Humanidade.
A multiplicidade das causas de destruição é um sinal característico dos tempos,
porque deve apressar a eclosão dos novos germes. São as folhas de outono que
caem, e às quais sucederão novas folhas, cheias de vida, pois a Humanidade tem
as suas estações, como os indivíduos as suas idades. As folhas mortas da
Humanidade caem, levadas pela ventania, para renascer mais vivazes, sob o mesmo
sopro de vida, que não se extingue, mas se purifica.
Para o materialista, os flagelos
destruidores são calamidades sem compensação, sem resultados úteis, porquanto, segundo
ele, aniquilam os seres sem retorno.
Mas para o que sabe que a morte apenas destrói o envoltório, eles não têm as
mesmas consequências e não lhe causam o menor pavor, porque compreende o seu
objetivo e sabe também que os homens não perdem mais morrendo em conjunto do
que isoladamente, uma vez que, de uma ou de outra maneira, é preciso sempre lá
chegar.
Os incrédulos rirão destas
coisas e as tratarão como quimeras. Mas, digam o que disserem, não escaparão à
lei comum; cairão por sua vez, como os outros e, então, o que acontecerá? Dizem:
nada. Mas viverão, a despeito de si
mesmos, e um dia serão forçados a abrir os olhos.
Nota – A comunicação seguinte nos foi dirigida durante a viagem que
acabamos de fazer, da parte de um de nossos caros protetores invisíveis. Embora
tenha um caráter pessoal, também se liga à grande questão que acabamos de
tratar, e que a confirma. Por isso é colocada aqui. As pessoas perseguidas em
razão de suas crenças espíritas nela encontrarão úteis encorajamentos.
Paris, 1º de
setembro de 1866.
Já faz bastante
tempo que não me mostro em vossas reuniões, dando uma comunicação assinada com
o meu nome. Não julgueis, caro mestre, que seja por indiferença ou por
esquecimento, mas eu não via necessidade de manifestar-me e deixava a outros mais
dignos o cuidado de vos dar instruções úteis. Entretanto lá estava e seguia com
o maior interesse os progressos desta cara Doutrina, à qual devo a felicidade e
a calma dos últimos anos de minha vida. Eu lá estava, e o meu bom amigo, o Sr.
T... deu-vos mais de uma vez a certeza, durante as suas horas de sono e de êxtase.
Ele inveja minha felicidade e também aspira a vir para o mundo que habito
agora, quando o contempla brilhando no céu estrelado e refere o seu pensamento
às suas rudes provas.
Eu também as tive
muito penosas. Graças ao Espiritismo eu as suportei sem me queixar e as bendigo
agora, pois lhes devo o meu adiantamento. Que ele tenha paciência. Dizei-lhe que
para cá virá um dia, mas que antes ainda deve voltar à Terra, para vos ajudar
na inteira realização de vossa tarefa. Mas, então, como tudo estará mudado!
Imaginar-vos-ei ambos num mundo novo.
Meu amigo, enquanto
puderdes, repousai o espírito e o cérebro fatigados pelo trabalho; reuni forças
materiais, pois em breve muito tereis que gastar. Os acontecimentos, que de
agora em diante vão suceder-se com rapidez, vos chamarão à liça. Sede firme de
corpo e de espírito, a fim de estardes em condições de lutar com vantagem.
Então será preciso trabalhar sem descanso. Mas, como já vos disseram, não
estareis só para levar o fardo; auxiliares sérios aparecerão, quando for tempo.
Escutai, pois, os conselhos do bom doutor Demeure e evitai toda fadiga inútil
ou prematura. Aliás, lá estaremos para vos aconselhar e advertir.
Desconfiai dos dois
partidos extremos que agitam o Espiritismo, quer para prendê-lo ao passado,
quer para precipitar sua corrida para frente. Temperai os ardores prejudiciais
e não vos deixeis sofrear pelas tergiversações dos timoratos, ou, o que é mais perigoso,
mas que infelizmente é muito verdadeiro, pelas sugestões dos emissários
inimigos.
Marchai com passo
firme e seguro, como tendes feito até agora, sem vos inquietar com o que digam
à direita ou à esquerda, seguindo a inspiração dos vossos guias e da vossa
razão, e não vos arriscareis fazer sair dos trilhos o carro do Espiritismo. Muitos
empurram esse carro cobiçado, para precipitarem sua queda. Cegos e presunçosos!
Ele passará, apesar dos obstáculos, e não deixará no abismo senão os seus
inimigos e os que o invejam, embaraçados por terem servido ao seu triunfo.
Os fenômenos vão
surgir de todos os lados, sob os mais variados aspectos, e já surgem.
Mediunidade curadora, moléstias incompreensíveis, efeitos físicos inexplicáveis
pela Ciência, tudo se reunirá num futuro próximo, para assegurar nossa vitória
definitiva, para a qual concorrerão novos defensores.
Mas, quantas lutas
ainda a sustentar e, também, quantas vítimas! Não sangrentas, sem dúvida, mas
feridas em seus interesses e em suas afeições. Mais de um desfalecerá ao peso
das inimizades, desencadeadas contra tudo quanto leve o nome de espírita. Mas,
também, ditosos os que tiverem conservado sua firmeza na adversidade! Por isto
serão bem recompensados, mesmo aqui, materialmente. As perseguições são as
provas da sinceridade de sua fé, de sua coragem e de sua perseverança. A confiança
que tiverem posto em Deus não será vã. Todos os sofrimentos, todos os vexames,
todas as humilhações que tiverem suportado pela causa serão títulos, dos quais
nenhum será perdido. Os Espíritos bons velam por eles e os contam, e saberão
bem separar os devotamentos sinceros das dedicações artificiais. Se a roda da
fortuna os trair momentaneamente e os lançar no pó, logo os erguerá mais alto
que nunca, dando-lhes a consideração pública e destruindo os obstáculos
amontoados em seu caminho. Mais tarde se regozijarão por terem pago seu tributo
à causa, e quanto maior esse tributo, mais bela será sua parte.
Nesses tempos de
provas será preciso que prodigalizeis a todos vossa força e vossa firmeza; a
todos serão precisos encorajamentos e conselhos. Também se faz necessário fechar
os olhos sobre as defecções dos tíbios e dos covardes. Por vossa própria conta,
também tereis muito a perdoar...
Mas eu paro aqui, porque se posso adivinhar o conjunto
dos acontecimentos, nada me é permitido precisar. Tudo quanto vos posso dizer é
que não sucumbiremos na luta. Podem cercar a verdade com as trevas do erro, mas
é impossível sufocá-la. Sua chama é imortal e, cedo ou tarde, aparecerá.
Viúva
F...
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