segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

ARTHUR LINS DE VASCONCELLOS LOPES[1]

 


 

Sua vida terrena teve início no dia 27 de março de 1891, na cidade de Teixeira, alto sertão da Paraíba do Norte. Era sertanejo. Conheceu nos primeiros anos da meninice as dificuldades dos que vivem afastados das grandes cidades, sem recursos. Começou, assim, a lutar desde a infância, fortalecendo nos labores da vida o seu espírito empreendedor.

Enquanto outras crianças brincavam, despreocupadas, ele limpava com a enxada a plantação, ou roçava para a semeadura. Quando lhe sobrava tempo, aprendia a ler e a escrever. Já rapazinho, veio a ser tropeiro, a demandar as serranias do sul do Estado.

Moço feito, rumou para o Recife, onde exerceu atividade de caixeiro de casa comercial. Ali, porém, não ficou. Sentia-se atraído para as terras do sul do País, e é assim que se transfere para Curitiba, capital do Estado do Paraná, onde viveu longa parte de sua existência, e onde se entregou com todo o ardor ao estudo.

Alistando-se no exército, foi servir no 3º Regimento de Infantaria (3º R.I.) sediado naquela Capital, formando no 18º Batalhão. Em pouco tempo, pela sua dedicação e pelo seu esforço, alcançava o posto de sargento. Iniciou seus estudos superiores matriculando-se, em 1918, na Escola Superior de Agronomia de Curitiba, onde fez brilhantemente seu curso de engenheiro agrônomo.

Se os que não precisam pensar nas despesas vultosas com estudos nem sempre fazem com facilidade a escalada do monte da sabedoria. Imaginemos os que precisam pensar nos estudos e nos meios para custeá-los. Outras vezes foi necessário gratificar outros camaradas de caserna, que não se preocupavam com os livros, para não perder as aulas da Faculdade.

Mantendo desde moço uma independência religiosa, embora aceitando desde a infância a ideia da existência de Deus, Lins de Vasconcellos não se prendeu, nessa etapa da vida, a um conceito religioso definido.

Só um caminho poderia conduzi-lo à compreensão do por que da vida, das desigualdades sociais, do desequilíbrio na organização humana, que provoca a desventura e a infelicidade dos seres; todas as indagações de seu espírito empreendedor seriam respondidas mais tarde, quando, pelas mãos carinhosas de Antonio Duarte Veloso – dedicado servidor da Causa Espírita ‒, conheceu as belezas incomparáveis da Doutrina Espírita, isto em 1912. Era a base segura que lhe faltava para suportar o gigantesco edifício de sua formação humanitária e altruística, ansiosa de ver a felicidade de todos os seus irmãos em Humanidade.

Em 1915, como secretário geral da Federação Espírita do Paraná, ele participava, com a alma em regozijo, da inauguração do Albergue Noturno daquela entidade, inauguração que contou com a presença do então Governador do Estado, Sr. Carlos Cavalcanti de Albuquerque.

Em 1916, trabalhou ativamente no II Congresso Espírita Paranaense.

Criada a “Revista do Espiritualismo”, órgão da Sociedade Publicadora Kardecista do Paraná, Lins se tornou um dos seus diretores.

Em seu último estágio em Curitiba, Lins de Vasconcellos fora elevado à posição de escrevente juramentado em certo tabelionato daquela cidade. Exercia com probidade e competência suas funções, quando inesperadamente, se viu demitido. É que ele, na qualidade de presidente da Federação Espírita do Paraná, protestara contra ato inconstitucional do Governo do Estado, que doara terras para a instalação de dois bispados. O protesto de Lins de Vasconcellos foi secundado pelo do Prof. Dario Veloso, ilustre homem de letras e presidente do Instituto Néo-Pitagórico de Curitiba, bem como por outros livres-pensadores.

Lins de Vasconcellos sofre perseguição e muitos aborrecimentos, inclusive condenação judicial, mais tarde revogada pelo Tribunal. Embora desequilibrado em suas finanças, não caiu em desânimo. Possuído de alto tino comercial, lança-se ao comércio madeireiro. Começa a prosperar e a enriquecer.

Em 1930, resolve mudar-se para o Rio de Janeiro, e é nessa ocasião eleito presidente honorário da Federação Espírita do Paraná, pelos assinalados serviços a ela prestados.

Os bens materiais multiplicam-se rapidamente em suas mãos.

Consolidada a sua posição social e financeira com a fundação da Companhia Pinheiro Indústria e Comércio, da qual era diretor-presidente, não tendo dali por diante maiores preocupações de ordem econômica, mercê de uma independência que conquistara com sua visão de industrial operoso, dedicou-se inteiramente ao Espiritismo, a este dando tudo que lhe foi possível dar.

Sua cooperação humanitária, junto aos companheiros espíritas de vários Estados, foi multiforme: nos movimentos educativos da criança, no socorro às instituições de amparo à velhice e à infância abandonada, no empenho para a criação de Lares Infantis, Sanatórios, Hospitais, Ginásios, Creches, Institutos de Ensino etc., tudo em benefício do indivíduo e da coletividade, num trabalho contínuo que durou até aos seus últimos dias de vida terrena. “A maior glória de Lins” - escreveu um seu biógrafo – “é não ter sido ele corrompido pelo fascínio do ouro”.

Cremos tenha sido a Federação Espírita do Paraná a primeira entidade a receber sua colaboração doutrinária e econômica. Quando na sua presidência, traçou um longo programa de realizações em todos os setores de atividade daquela Instituição Estadual, nela incluindo, então, o programa de ensino do Espiritismo às crianças, antevendo a necessidade de prepará-las, para que investidas, no futuro, nas organizações espíritas, pudessem produzir mais e melhor.

Por volta de 1938, em passeio a Curitiba e presente à reunião do Conselho da Federação Espírita do Paraná, Lins de Vasconcellos propôs-se entrar com apreciável soma de recursos para o reinicio das obras do atual Hospital Espírita de Psiquiatria “Bom Retiro”, tendo mantido sua colaboração econômica até a inauguração do mesmo.

Participou ativamente da Coligação Nacional pró Estado Leigo, da qual foi presidente, dedicando-lhe todos os esforços para que a luta pela laicidade do Estado fosse uma batalha constante até à conquista da independência da nação na questão do campo religioso.

Em 1948, quando a “Gráfica Mundo Espírita” enfrentava uma crise seríssima, sua cooperação espontânea e sincera veio evitar o desaparecimento dela, e, assumindo a sua direção, enfrentou todas as dificuldades decorrentes de sua atitude salvadora. Imprimiu nova orientação doutrinária a “Mundo Espírita”, periódico fundado em 1932, evitando que suas colunas servissem de veículo de ideias destruidoras e separatistas.

Apesar dos grandes prejuízos causados pela publicação do jornal e de livros doutrinários, ele sustentou a luta e esteve à frente de “Mundo Espírita” até aos últimos momentos. Esse jornal passou a ser o órgão noticioso e doutrinário da Federação Espírita do Paraná.

Ainda em 1948 empenhou-se na realização do I Congresso de Mocidades Espíritas do Brasil, apoiando a ideia do Deputado Campos Vergal, transformada em realidade pela atuação de Leopoldo Machado. Foi uma de suas principais figuras, contribuindo, ainda, decisivamente na parte financeira. Por unanimidade, foi proclamado seu presidente de honra e, na sessão de instalação, na manhã do dia 18 de junho de 1948, proferiu discurso, fazendo a entrega simbólica do Congresso aos moços espíritas ali reunidos.

Em fevereiro de 1949, fundou Lins de Vasconcellos a Ação Social Espírita – sonho maior de sua vida – instituição que se destinava ao trabalho social do Espiritismo em todos os seus aspectos e sob todas as formas.

Graças ao seu espírito de colaboração e boa vontade, realizou-se a Primeira Festa Nacional do Livro Espírita, de 14 a 18 de abril de 1949.

Quando dos preparativos para a realização do II Congresso Espírita Pan-Americano, que se reuniu no Rio de Janeiro, no período de 3 a 12 de outubro de 1949, foi Lins de Vasconcellos chamado para participar da Comissão Organizadora, sendo-lhe entregue o cargo de Tesoureiro da Comissão, devendo-se ressaltar que da sua ação coordenadora e sensata deve-se o êxito alcançado por aquele certame.

A unificação da família espírita brasileira viria, mais cedo ou mais tarde, se essa era a vontade superior. Mas, talvez não viesse tão depressa, não fosse a ação e a atividade conciliatória e aproximativa de Lins de Vasconcellos. Ninguém, como ele, almejava reunir os seus irmãos em ideal para um trabalho em comum. Esse foi sempre seu grande sonho. Vivia para concretizar esse desejo e os mentores espirituais fizeram-no o instrumento sensato e prudente para que essa aproximação se desse.

Contribuiu largamente para a expansão do Espiritismo no Brasil. Levantou e apoiou inúmeras obras de caridade e beneficência, nas quais até hoje lhe abençoam o nome, devendo-se-lhe o prédio onde se acha instalada a Federação Espírita Paraibana. Desenvolveu obra de assistência social, sem paralelo no meio espírita nacional. Pacificador por excelência, padrão do verdadeiro homem de bem, tolerante em todos os sentidos, foi alçado à posição de líder pelos próprios espíritas brasileiros.

Sua existência foi um impressionante libelo contra a ociosidade e o desânimo.

Em 5 de outubro de 1949 foi, talvez o dia mais feliz da sua vida. Foi o dia do “Pacto Áureo”, o dia áureo da confraternização. Se nada mais houvesse feito em prol da Causa –e foram tantos os benefícios que prestou ao Espiritismo – sua ação para a união da família espírita brasileira, em torno da Casa de Ismael, lhe teria valido como uma certeza de que não fora vazia e inexpressiva sua vida no mundo.

Era ainda o Dr. Lins, no campo das atividades doutrinárias, representante da Federação Espírita do Paraná, no Conselho Federativo Nacional, membro efetivo da Assembleia Deliberativa da Federação Espírita Brasileira, vice-presidente da Liga Espírita do Estado da Guanabara, 1º Secretário da Sociedade de Medicina e Espiritismo do Rio de Janeiro e seu presidente de honra.

Não se pode dispensar a colaboração da mulher nas grandes Causas. Todos os grandes homens tiveram em suas vidas a influência da mulher. Lins de Vasconcellos não foi uma exceção à regra. Nada realizava sem que ouvisse sua esposa. Fazia questão que em tudo aparecesse aquela que partilhava de sua vida e conhecia as suas aspirações e desejos. E a esposa dedicada que foi Dona Hercília César de Vasconcellos Lopes retribuía-lhe essa justa consideração com o seu carinho e a sua afeição. Compreendia ele o papel da mulher na reforma do mundo e, sempre que se lhe oferecia oportunidade, concitava os homens ao amparo e proteção à mulher e à criança.

E a Companheira de longos anos de luta e realizações soube enfrentar o momento da partida do ente amado, demonstrando, na serenidade a resignação, que estava bem à altura do querido ausente.

Toda a família espírita sentiu o seu desaparecimento da vida física, em 21 de março de 1952, ficando a Seara do Senhor, no campo terreno, desfalcada de um de seus mais denodados e dedicados servidores, sendo o seu corpo sepultado, conforme seus desejos, no jardim do Sanatório “Bom Retiro”, em Curitiba, cidade que muito amou.

Respeitáveis nomes do Espiritismo no Brasil teceram longos e justos elogios à obra do benfeitor e do homem de ação, ouvindo-se, ainda, a palavra do grande médium brasileiro, Francisco Cândido Xavier, nessa afirmativa: “Era ele uma coluna firme da doutrina em nosso País e um companheiro abnegado de nosso movimento de unificação”.

Mais tarde, a Federação Espírita do Paraná, que tantos benefícios recebeu de Lins de Vasconcellos, inclusive através de testamento, prestou-lhe significativa homenagem, dando-lhe o inesquecível nome ao educandário por ela criado – “Instituto Lins de Vasconcellos”, – hoje, Colégio “Lins de Vasconcellos”.

Para mais detalhes consultar o livro "Lins de Vasconcellos ‒ o diplomata da unificação e o paladino do Estado leigo" de autoria de Ney Lobo, editado pela Federação Espírita do Paraná.

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