Flammarion foi um homem cujas
obras encheram de luzes o século XIX.
Camille Flammarion nasceu em 26
de fevereiro de 1842, em Val-de-Meuse, na França e faleceu em 3 de junho de
1925, na cidade de Juvisy-sur-Orge, também na França onde passou a sua
infância.
Ele era o mais velho de uma família de quatro filhos, entretanto,
desde muito jovem se revelaram nele qualidades excepcionais. Queixava-se
constantemente que o tempo não lhe deixava fazer um décimo daquilo que
planejava. Aos quatro anos de idade já sabia ler, aos quatro e meio sabia
escrever e aos cinco já dominava rudimentos de gramática e aritmética.
Tornou-se o primeiro aluno da escola onde frequentava.
Para que ele seguisse a carreira
eclesiástica, puseram-no a aprender latim com o vigário Lassalle. Aí Flammarion
conheceu o Novo Testamento e a Oratória. Em pouco tempo estava lendo os
discursos de Massilon e Bonsuet. O padre Mirbel falou da beleza da ciência e da
grandeza da Astronomia e mal sabia que um de seus auxiliares lhe bebia as
palavras. Esse auxiliar era Camille Flammarion, aquele que iria ilustrar a
letra e a significação galo-romana do seu nome - Flammarion: "Aquele que
leva a luz".
Nas aulas de religião era
ensinado que uma só coisa é necessária: "a salvação da alma", e os
mestres falavam: "De que serve ao homem conquistar o Universo se acaba
perdendo a alma?"
Foi dura a vida dos Flammarions,
e Camille compreendeu o mérito de seu pai entregando tudo aos credores.
Reconhecia nele o mais belo exemplo de energia e trabalho, entretanto, essa
situação levou-o a viver com poucos recursos.
Camille, depois de muito procurar,
encontrou serviço de aprendiz de gravador, recebendo como parte do pagamento
casa e comida. Comia pouco e mal, dormia numa cama dura, sem o menor conforto;
era áspero o trabalho e o patrão exigia que tudo fosse feito com rapidez.
Pretendia completar seus estudos, principalmente a matemática, a língua inglesa
e o latim. Queria obter o bacharelado e por isso estudava sozinho à noite.
Deitava-se tarde e nem sempre tinha vela. Escrevia ao clarão da lua e
considerava-se feliz. Apesar de estudar a noite, trabalhava de 15 a 16 horas
por dia. Ingressou na Escola de desenho dos frades da Igreja de São Roque, a
qual frequentava todas as quintas-feiras. Naturalmente tinha os domingos livres
e tratou de ocupá-los. Nesse dia assistia às conferências feitas pelo abade
sobre Astronomia. Em seguida tratou de difundir as associações dos alunos de
desenho dos frades de São Roque, todos eles aprendizes residentes nas
vizinhanças. Seu objetivo era tratar de ciências, literatura e desenho, o que
era um programa um tanto ambicioso.
Aos 16 anos de idade, Camille
Flammarion foi presidente da Academia, a qual, ao ser inaugurada, teve como
discurso de abertura o tema "As Maravilhas da Natureza". Nessa mesma
época escreveu "Cosmogonia Universal", um livro de quinhentas
páginas; o irmão, também muito seu amigo, tomou-se livreiro e publicava-lhe os
livros. A primeira obra que escreveu foi "O Mundo antes da Aparição dos
Homens", o que fez quando tinha apenas 16 anos de idade. Gostava mais da
Astronomia do que da Geologia. Assim era sua vida: passar mal, estudar demais,
trabalhar em exagero.
Um domingo desmaiou no decorrer
da missa, por sinal, um desmaio muito providencial. O doutor Edouvard Fornié
foi ver o doente. Em cima da sua cabeceira estava um manuscrito do livro
"Cosmologia Universal". Após ver a obra, achou que Camille merecia
posição melhor. Prometeu-lhe, então, colocá-lo no Observatório, como
aluno-astrônomo. Entrando para o Observatório de Paris, do qual era diretor
Levèrrier, muito sofreu com as impertinências e perseguições desse diretor, que
não podia conceber a ideia de um rapazola acompanhá-lo em estudos de ordem tão
transcendental.
Retirando-se em 1862 do
Observatório de Paris, continuou com mais liberdade os seus estudos, no sentido
de legar à Humanidade os mais belos ensinamentos sobre as regiões silenciosas
do Infinito.
Livre da atmosfera sufocante do
Observatório publicou no mesmo ano a sua obra "Pluralidade dos Mundos
Habitados", atraindo a atenção de todo o mundo estudioso. Para conhecer a
direção das correntes aéreas, realizou, no ano de 1868, algumas ascensões
aerostáticas.
Pela publicação de sua
"Astronomia Popular", recebeu da Academia Francesa, no ano de 1880, o
prêmio Montyon. Em 1870 escreveu e publicou um tratado sobre a rotação dos
corpos celestes, através do qual demonstrou que o movimento de rotação dos
planetas é uma aplicação da gravidade às suas densidades respectivas.
Ainda jovem e estudante,
Flammarion teve o seu primeiro contato com o Espiritismo, associando-se à
Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, fundada e dirigida por Allan Kardec.
Tornando-se espírita convicto, foi amigo pessoal e dedicado de Allan Kardec.
Nessa oportunidade escrevia ele o livro "A Pluralidade dos Mundos
Habitados" quando veio a conhecer O
Livro dos Espíritos identificando-se de imediato com a obra. Como as
sessões da Sociedade eram em parte dedicadas à psicografia, Flammarion iniciou
um treinamento, visando desenvolver esta faculdade, e conseguindo, trouxe à luz
o trabalho intitulado "Uranografia Geral" assinado por Galileu e que
faz parte da obra A Gênese de Allan
Kardec. Participando dos principais grupos espíritas parisienses e sendo
secretário de um deles Flammarion enriquecia o seu espírito e transcrevia para
os livros as maravilhas que os invisíveis lhes transmitiam. "A Terra não
tem nenhuma proeminência no sistema solar de maneira a ser o único mundo
habitado", comenta ao defender a teoria que muitos outros planetas seriam
habitados. Em 1865, sob o título "Forças Naturais Desconhecidas" ele
publicou o seu primeiro livro sobre pesquisas psíquicas que era um estudo
crítico a propósito dos fenômenos produzidos pelos irmãos Davenport e sobre
médiuns em geral.
Quando a 31 de março de 1869
desencarnou Allan Kardec, Flammarion foi convidado para proferir uma das 4
orações à beira do túmulo, o que o fez impressionando a todos ao afirmar o
caráter científico do Espiritismo, a excelência do trabalho de Kardec, a
realidade das ciências físicas no além, a existência da alma e da sua
indestrutibilidade, terminando por considerar o desencarnante como “o bom senso
encarnado”. Nesse mesmo ano a Sociedade Dialética de Londres iniciou suas investigações
sobre os fenômenos mediúnicos, havendo Flammarion apresentando-se perante a
comissão que concluiu como relatório final, ser o assunto digno de mais séria
atenção e cuidadosa investigação do que tinha sido até então.
Em 1879 é publicado o seu livro
"Astronomia Popular", considerada a melhor obra do gênero do século
XIX. Passa então a estudar o fenômeno mediúnico no que resultou mais um livro
de sua autoria, que levou o título de "Forças Psíquicas Misteriosas"
onde anota:
O fenômeno mediúnico
tem para mim a estampa de absoluta certeza e incontestabilidade e amplia o
suficiente para provar que as forças físicas desconhecidas existem fora do ordinário
e estabelecido domínio da filosofia natural.
Em 1882, já destacado como
profissional, instalou um observatório privado, sabedor de que a Ciência,
notadamente a Astronomia, como sendo velha conselheira das verdades
espirituais, muito ajudaria os homens em suas buscas para encontrar Deus. Nesse
mesmo ano ele fundou a revista "A Astronomia" e em 1887 a Sociedade
Astronômica da França.
Em 1899, Flammarion começou a
fazer um censo sobre alucinação. De 4.280 pessoas consultadas, 1.824
responderam que elas tinham tido visões de fantasmas. Deste total, 786 casos
foram coletados como de valor evidencial. Revisados e ampliados, estes artigos
formaram a substância do livro "O Desconhecido e os Problemas
Psíquicos", reforçando as provas de telepatia, aparições de mortos, sonhos
premonitórios e clarividência. Na citada obra, à vista do conjunto dos fatos,
Flammarion conclui:
·
a alma existe como personalidade real,
independente do corpo;
·
a alma é dotada de faculdades ainda
desconhecidas da ciência;
·
ela pode agir e perceber, à distância, sem os
sentidos como intermediários;
·
o futuro é de antemão preparado; determinado
pelas causas que o produzirão. A alma percebe-o algumas vezes.
Ao mesmo tempo em que se
dedicava às pesquisas psíquicas, Flammarion desenvolvia fecundos estudos no
campo da Astronomia. Além deste, abordava temas sobre Deus, reformas políticas
e sociais, evolução do homem, fenômeno da morte e as pesquisas psíquicas. Mas,
evidentemente, que, como popularizador de sua ciência predileta, muitas de suas
obras versaram sobre Astronomia. É o caso de "Urânia":
A missão de a
Astronomia ser mais elevada ainda. Depois de vos haver feito sentir e dado a
conhecer que a Terra não é mais do que uma cidade na pátria celeste, e que o
homem é cidadão do céu, ir mais longe. Descobrindo o plano sobre o qual o
universo físico está construído, mostrar que o universo moral se acha
alicerçado sobre esse mesmo plano; que os dois mundos não formam senão um mesmo
mundo, e que o Espírito governa a Matéria. (...) A Astronomia ser é pois,
eminentemente e antes de tudo, a diretriz da Filosofia. E a filosofia
astronômica ser a religião dos espíritos superiores.
Suas obras, de uma forma geral,
giram em torno do postulado espírita da pluralidade dos mundos habitados e são
as seguintes: "Os Mundos Imaginários e os Mundos Reais", "As
Maravilhas Celestes", "Deus na Natureza", "Contemplações
Científicas", "Estudos e Leitura sobre Astronomia",
"Atmosfera", "Astronomia Popular", "Descrição Geral do
Céu", "O Mundo antes da Criação do Homem", "Os
Cometas", "As Casas Mal- Assombradas", "Narrações do
Infinito", "Sonhos Estelares", "Urânia",
"Estela", "O Desconhecido", "A Morte e seus
Mistérios", "Problemas Psíquicos", "O Fim do Mundo" e
outras.
Assim foi Flammarion. Um poeta
dos céus, de Deus e da natureza, como o denominava Michelet. Um pesquisador que
tinha o sonho de tornar a religião científica e a ciência religiosa,
equilibrando o espírito em seus voos pelo infinito. Cientista emérito, escritor
de brilho, garimpeiro das galáxias, dedicou todo o seu talento em mostrar as
maravilhas que Deus criou para que pudéssemos definir e materializar a paz. Com
o olho no céu e a mão no papel foi poeta o bastante para transportar as
estrelas para a Terra, a fim de que ele viesse a ser apenas um minúsculo mundo
perdido no universo. Seu nome brilha entre os estudiosos do Espiritismo como os
sóis que pesquisou, e, não há névoa por mais espessa, que um dia lhe venha a
ofuscar a magnitude.
Camille Flammarion, segundo
Gabriel Delanne, foi um filósofo enxertado em sábio, possuindo a arte da
ciência e a ciência da arte. Flammarion tornou-se baluarte do Espiritismo,
pois, sempre coerente com suas convicções inabaláveis, foi um verdadeiro
idealista e inovador.
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