Octávio Caúmo Serrano -
RIE-Revista Internacional de Espiritismo – outubro de 2012
Observa-se que o pagamento da
promessa quase sempre está condicionado ao benefício recebido. Depois que a
moça arranja marido ou o jovem passa no vestibular é que ofertam ao santo as
velas ou fazem as penitências. Primeiro o favor e depois o pagamento!
Se para nada se aproveita, que
sentido pode ter para as divindades a despesa ou o sacrifício das pessoas?
Poderíamos fazer uma trova dizendo: A luz
que ilumina a alma é somente a da oração, porque a luz da vela acesa só gera
mais poluição.
O Espiritismo traz-nos clareza
sobre o assunto no Capítulo V, de O Livro
dos Espíritos, em Privações Voluntárias. Mortificações. A pergunta 720 é:
São meritórias aos
olhos de Deus as privações voluntárias com o objetivo de uma expiação
igualmente voluntária?
‒ Fazei o bem ao vosso semelhante e mais
mérito terás.
Na questão 721, temos:
É meritória, de
qualquer ponto de vista, a vida de mortificações ascéticas que desde a mais
remota antiguidade teve praticantes no seio de diversos povos?
‒ Procurai saber a quem ela aproveita e tereis
a resposta; se somente serve para quem a pratica e o impede de fazer o bem, é
egoísmo, seja qual for o pretexto com que entendam de colori-la. Privar-se a si
mesmo e trabalhar para os outros, tal a verdadeira mortificação, segundo a
caridade cristã.
A conclusão a que nos leva o
Espiritismo é que o dinheiro gasto nas velas, nas fitas, nas flores, deveria
ser gasto no pão para um faminto. A energia despendida para subir a escada de
joelhos ou para a longa caminhada, às vezes com o flagelo de uma cruz nos
ombros, deveria ser usada para ajudar alguém a erguer sua moradia, para cuidar
de uma criança pobre, para levar um doente até o hospital. Essa energia tem seu
gasto recompensado porque se fundamenta na caridade sem egoísmo e sem esperar
retribuições.
No que concerne às
autoflagelações que existem em muitas partes do mundo, quando o homem
crucifica-se ou agride-se com chicotadas ou outros petrechos, sangrando suas
costas, a questão 725 nos ensina:
Que se deve pensar
das mutilações operadas no corpo do homem ou dos animais?
‒ A que propósito, semelhante questão? Ainda
uma vez: perguntai sempre a vós mesmos se é útil aquilo de que porventura se
trate. A Deus não pode agradar o que seja inútil e o que for nocivo Lhe será
sempre desagradável. Porque, ficai sabendo, Deus só é sensível aos sentimentos
que elevem para ele a alma. Obedecendo-lhe a lei e não a violando é que podereis
forrar-vos ao jugo da vossa matéria terrestre.
Pensamos que basta apenas um
pouco de bom senso para saber que as oferendas ou as penitências visando
benefícios próprios não têm o menor sentido.
Quanto às romarias ou procissões
a locais santos, além do valor turístico e cultural outra finalidade não têm.
Se para nos livrarmos dos pecados temos de ir a Santiago de Compostela, a
Jerusalém ou Roma, a Fátima ou Lourdes, a Meca ou Medina, a grande maioria que
é pobre neste planeta ficará sem acesso a esses benefícios. Quando o homem tem
o coração aberto e se abriga na simplicidade e na solidariedade, Deus – e seus
emissários – vem até ele, sem que precise viajar. A única viagem que deve fazer
é para dentro de si mesmo, renovando-se na fé e acreditando que é filho dileto
do Criador e merecedor de toda a Sua proteção. A sintonia com a divindade não
se faz em lugares determinados, mas na intimidade do próprio coração.
Para reforçar o que dissemos,
ainda em O Livro dos Espíritos, na
questão 726, está dito que:
Os sofrimentos voluntários para nada servem,
quando não concorrem para o bem de outrem. Supões que se adiantam no caminho do
progresso os que abreviam a vida, mediante rigores sobre-humanos, como fazem os
bonzos, os faquires e alguns fanáticos de muitas seitas? Vistam o indigente,
consolem o que chora, trabalhem pelo que está enfermo; sofram privações para
alívio dos infelizes e então suas vidas serão úteis e, portanto, agradáveis a
Deus. Sofrer alguém voluntariamente, apenas para seu próprio bem, é egoísmo;
sofrer pelos outros é caridade: tais os preceitos do Cristo.
Para finalizar, dizemos que quem
deseja progredir, que trabalhe e estude sempre e muito. Quem deseja ter
felicidade, que modifique sua maneira de ser e de pensar. Convém recordar a
passagem da mãe que pediu ajuda ao preto velho para seu filho passar nos exames
escolares. O bom homem mandou o seguinte recado: Fala pro menino enfiar a cara nos livros, dia e noite, que preto velho
vai ajudar. Receita simples para o sucesso!
Que nossa penitência seja sempre
a de esforçar-nos para melhorar e combater os nossos defeitos; e nossa
promessa, a de trabalhar pelo semelhante para ajudar na harmonia do mundo. O
resto é tempo perdido e pura ilusão.
A soberana proposta do
Espiritismo é que lutemos pela nossa renovação. É esta a finalidade que nos
traz de volta ao mundo material. Nada tem mérito se não for conquistado com o
próprio esforço, porque cada virtude adquirida corresponde à superação de um
defeito. Não se pode ser humilde e orgulhoso ao mesmo tempo. Imaginar que
podemos comprar nossa reforma íntima com uma vela acesa, um buquê de flores ou
uma penitência sem proveito é pura tolice. São os talismãs e patuás usados por
espíritos atrasados. Quem quer receber o bem, faça o bem. Não há outro caminho!
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