Orson Peter Carrara
O título da presente abordagem é
o mesmo utilizado por Allan Kardec no capítulo XVII de A Gênese, obra integrante da Codificação Espírita e publicada em
1868. A significativa expressão engloba estudos de Kardec sobre diferentes
passagens anotadas pelos evangelistas e com a perspectiva de previsão, ou
anúncio do que vai acontecer, predito, previsto até por conjectura, em recurso
didático bastante utilizado por Jesus nos diálogos com seus discípulos.
O capítulo em referência traz
diversos subtítulos com essa finalidade de estudo e análise dos textos dos
Evangelhos. No item 30, no texto do subtítulo “Parábola dos Vinhateiros
Homicidas”, traz importante advertência às nossas distrações ou negligências
com a evolução moral.
Peço ao leitor ler novamente a
parábola [vide Parábola dos Lavradores
Maus ou dos Rendeiros Infiéis,
publicada neste blog em 20/04/2017], que bem é uma predição do comportamento
geral humano frente às lições de amor enviadas por Deus aos filhos, por meio de
mensageiros diversos em todos os tempos, culminando com a presença viva de
Jesus, que não foi compreendido e morto pela ignorância reinante.
O notável texto de Kardec é de
uma atualidade impressionante. Ele inicia assim no item citado (30): “O pai de
família é Deus; a vinha que plantou é a lei que estabeleceu; os vinhateiros aos
quais arrendou a sua vinha são os homens que devem ensinar e praticar a sua
lei; os servidores que enviou para eles são os profetas que fizeram perecer;
seu filho que enviou, enfim, é Jesus, que fizeram perecer do mesmo modo.
(...)”.
Depois prossegue no texto que
desejamos destacar pensando nas desorientações generalizadas que encontramos na
atualidade do planeta:
“(...) Que fizeram os homens das
máximas de caridade, de amor e de tolerância de Jesus? Que fizeram das
recomendações que fez a Seus apóstolos para que convertessem os homens pela
brandura e pela persuasão; da simplicidade, da humildade, do desinteresse e de
todas as virtudes que Ele exemplificou?! Em Seu nome, os homens se
anatematizaram mutuamente e reciprocamente se amaldiçoaram; estrangularam-se em
nome d`Aquele que disse: “Todos os homens são irmãos”. Do Deus infinitamente
justo, bom e misericordioso que Ele revelou, fizeram um Deus cioso, cruel,
vingativo e parcial; àquele Deus, de paz e de verdade, sacrificaram nas
fogueiras, pelas torturas e perseguições, muito maior número de vítimas do que
as que em todos os tempos os pagãos sacrificaram aos seus falsos deuses;
venderam-se as orações e as graças do Céu em nome d`Aquele que expulsou do
Templo os vendedores e que disse a Seus discípulos: “Dai de graça o que de
graça recebestes”.
E conclui com sabedoria:
“Que diria o Cristo, se viesse
hoje entre nós? Se visse os que se dizem Seus representantes a ambicionar as
honras, as riquezas, o poder e o fausto dos príncipes do mundo, ao passo que
Ele, mais rei do que todos os reis da Terra, fez a Sua entrada em Jerusalém
montado num jumento? Não teria o direito de dizer-lhes: “Que fizestes dos meus
ensinos, vós que incensais o bezerro de ouro, que dais a maior parte das vossas
preces aos ricos, reservando uma parte insignificante aos pobres, sem embargo
de haver eu dito: Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros
no Reino dos Céus?”. Mas se aqui não está carnalmente, ele o está em Espírito,
e, como o senhor da parábola, virá pedir contas aos seus vinhateiros do produto
de sua vinha quando o tempo da colheita houver chegado”.
Valemo-nos, diante de tanta
clareza, todavia, do capítulo XV – Fora da Caridade não há salvação, de O Evangelho Segundo o Espiritismo, onde
estão os belíssimos textos da “Parábola do Bom Samaritano”, da Necessidade da
caridade segundo São Paulo e a extraordinária “bandeira” do Espiritismo: Fora
da Caridade não há salvação.
É desse luminoso capítulo que
extraímos do comentário de Kardec, no item 3: “Toda a moral de Jesus se resume
na caridade e na humildade, quer dizer, nas duas virtudes contrárias ao egoísmo
e ao orgulho (...)”. É aqui que queríamos chegar. As desorientações em curso,
com as perturbações sociais de variados graus de intensidade, com
desdobramentos desafiadores, provém do egoísmo e do orgulho.
E Kardec abrilhanta com seu
raciocínio objetivo, no mesmo item: “(...) Em todos os seus ensinamentos, ele
mostra essas virtudes como sendo o caminho da felicidade eterna.
Bem-aventurados, disse ele, os pobres de espírito, quer dizer, os humildes
(...)”.
A humildade é a virtude que nos
tem faltado ao coração; o egoísmo ainda nos avassala os sentimentos. Paulo, o
Apóstolo, nos chama a atenção em sua conhecida Epístola sobre o sentimento
contrário ao egoísmo em trecho também destacado por Kardec no mesmo capítulo:
“(...) A caridade é paciente, é doce e benfazeja; a caridade não é invejosa;
não é temerária e precipitada; não se enche de orgulho; não é desdenhosa; não
procura seus próprios interesses; não se melindra e não se irrita com nada; não
suspeita mal; não se regozija com a injustiça, mas se regozija com a verdade;
tudo suporta, tudo crê, tudo espera, tudo sofre (...)”.
Percebe-se com clareza que o
momento aflitivo, de conturbação, com guerras, conflitos, prevalência dos
interesses pessoais em detrimento do interesse coletivo, é fruto do egoísmo
ainda imperante no comportamento humano. A parábola em referência é bem uma
advertência para que prestemos atenção aos "chamados” de fraternidade,
incessantemente enviados ao nosso sentimento individual e coletivo.
A conclusão da parábola – que
necessita ser entendida além das palavras – é verdadeiramente um predição:
“(...) o senhor (...) arrendará a sua vinha a outros vinhateiros, que lhe
entregarão os frutos em sua época.”, conforme anotou Mateus no capítulo XXI, v.
de 33 a 41.
Por isso, para aqueles que nós
consideramos cristãos, o apelo é direto, como afirma o mesmo Paulo, igualmente
no mesmo capítulo XV de O Evangelho
Segundo o Espiritismo, item 10: “(...) Submetei todas as vossas ações ao
controle da caridade; (...) não somente ela vos evitará fazer o mal, mas vos
levará a fazer o bem: porque não basta uma virtude negativa, é preciso uma
virtude ativa; para fazer o bem, é preciso sempre a ação da vontade; para não
fazer o mal, frequentemente, a inércia e a negligência (...)”.
Ação da vontade! Afinal, conclui
o apóstolo: “(...) todos aqueles que praticam a caridade são os discípulos de
Jesus, qualquer seja o culto a que pertençam”.
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