Guilherme Rosa[2]
Psiquiatra explica
como as crianças podem ser tão ou mais cruéis do que os adultos
A maldade não é mais segredo
para ciência. Hoje em dia, os pesquisadores já sabem que a crueldade se
manifesta de forma biológica, como uma falha nos circuitos cerebrais, e que
pode ter fatores sociais e genéticos. O psiquiatra Fábio Barbirato, chefe do setor
de Neuropsiquiatria da Infância e da Adolescência da Santa Casa de Misericórdia
do Rio de Janeiro, explicou à revista GALILEU como essa maldade aparece nas
crianças.
GALILEU: Uma criança
pode ser tão maldosa quanto um adulto?
Barbirato: Maldade pode ser definida como falta de empatia. Quando
você provoca algo mal a alguém, é porque você não está muito preocupado com que
essa pessoa venha se machucar fisicamente ou emocionalmente. Isso significa que
você não se importa com o outro. A gente sabe que essa falta de empatia está
ligada a algumas áreas do cérebro, como o córtex frontal. Ela também está
ligada, em seus casos mais extremos, ao que os antigos chamavam de psicopatia e
hoje nós chamamos de personalidade antissocial. O termo utilizado para definir
essa mesma falta de empatia em uma criança é transtorno de conduta.
Esse transtorno começa na
infância e pode ser diagnosticado até os 17 anos. Ele se caracteriza justamente
pela falta de empatia e remorso. Um paciente meu, por exemplo, foi proibido
pela mãe de sair de casa porque tirou notas baixas. Ele pegou o cachorro da mãe
e enfiou várias agulhas nele. Outro paciente pegou o cachorro da mãe e colocou
dentro do micro-ondas. E eles não se arrependem disso, falam sem nenhum tipo de
remorso. A violência dessa criança pode ser física, ele pode ser aquele garoto
que junta uma galera pra bater em outro menino porque ele é mais pobre ou
negro, ou tem características homossexuais. Mas essa violência pode aparecer de
outras formas – ele pode ser aquela criança que rouba a prova do amigo, por
exemplo. Essa violência pode ser observada partir dos 5 anos de idade.
Por que só
conseguimos perceber esse transtorno a partir dos 5 anos?
Barbirato: A gente só pode fazer o diagnóstico a partir dos 5 anos
de idade porque as áreas do cérebro ligadas ao comportamento inibitório só se
desenvolvem a partir dessa idade. Depois disso, a criança já sabe o que é
errado e certo. Sabe que, se machucar alguém, esse alguém vai sentir dor. Ela
já consegue se colocar no lugar do outro e já tem a capacidade de inibir seu
comportamento se perceber que vai fazer mal a alguém. Depois do diagnóstico,
temos que incentivar a família, para não reforçar esse comportamento agressivo
e não ser modelo dele.
Que tipo de
características iremos ver em uma criança com transtorno de conduta?
Barbirato: São crianças que têm comportamentos perversos,
agressivos. São aquelas que, quando podem roubar um brinquedo de alguém, vão lá
e roubam. Aquelas que batem ou mordem os amigos, mas que fazem de modo que
ninguém veja. São crianças que manipulam os adultos. Normalmente, elas são
muito sedutoras, conseguem transformar a situação a seu favor. São extremamente
inteligentes.
Essa criança vai
levar essas características para a vida adulta?
Barbirato: De 70% a 90% dessas crianças desenvolvem uma
personalidade antissocial.
Temos como prevenir
isso?
Barbirato: Quanto mais precoce for a identificação do transtorno,
melhor. É importante perceber que seu filho está muito agressivo, não demonstra
grandes arrependimentos. E aí procurar ajuda. Não há medicação nenhuma que
mostre resultado nesses casos. São quadros que precisam de uma reestruturação
familiar. A ideia não é ensinar e educar seu filho, mas mudar a dinâmica da
família. Comportamentos positivos trazem benefícios muito maiores do que
comportamentos negativos.
Então o papel dos
pais é importante no surgimento desses casos?
Barbirato: Não vou falar que eles são causadores, porque está
provado que é uma questão orgânica, uma alteração do funcionamento normal do
cérebro. Como a criança não tem freio inibitório, acaba tendo comportamentos
inadequados. Mas, se o jovem tiver uma família que é mais próxima, que o ajude
a perceber que esses atos são danosos aos outros, que o faça notar que o outro
se sente incomodado pelas suas atitudes, é possível mudar seu comportamento.
Para que, no futuro, esses jovens não tenham que passar por uma intervenção
médica ou até mesmo uma internação em uma instituição correcional, como as
antigas FEBEM. Porque, provavelmente, muitos dos jovens que estão internados
nestas instituições são jovens com transtorno de conduta que não tiveram a
facilidade de um diagnóstico precoce e uma ajuda familiar.
A internação nesse
tipo de instituição pode ajudar a recuperar a criança?
Barbirato: Os estudos mostram que é muito importante ter a família
junto, para reforçar positivamente cada memória que o jovem tenha. É importante
ele estar num ambiente que seja estimulante à melhora do comportamento. Nessas
instituições, pelo contrário, ele está convivendo com jovens que também são
agressivos, também são violentos e não mostram nenhum tipo de arrependimento.
Isso só vai reforçar aquela atitude.
Por parte de família,
que tipo de comportamento poderia aumentar a empatia da criança?
Barbirato: Não existe uma regra, uma receita de bolo. A família tem
que prestar atenção se o filho tem pouca empatia, pouco arrependimento, rouba
coisinhas da creche. Eles não devem ter preconceitos e procurar uma ajuda o
mais rápido possível. Devem procurar um profissional, psiquiatra ou psicólogo
especializado nisso, porque assim podem prevenir que no futuro ele venha a ter
problemas graves, desde agressividade até abuso de drogas.
A RESPONSABILIDADE
DOS PAIS NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS
A maldade nunca foi segredo para
nós espíritas. Sabemos que o corpo físico, apesar de ter sua formação
gerenciada pela combinação dos cromossomos dos seus genitores, tem sua
configuração final largamente influenciada pelo perispírito, que por sua vez
mantém registradas todas características psíquicas do indivíduo.
Esse efeito não se limita às
predisposições da psique. Segundo pesquisadores atuais, como o canadense Ian
Stevenson e o brasileiro Hernani Guimarães Andrade, até mesmo certos ferimentos
adquiridos na existência anterior, principalmente quando auto-infligidos,
mostram-se de diversas maneiras no veículo material que se forma
providencialmente a serviço do encarnado, segundo seu merecimento e suas
necessidades.
Os genitores do reencarnante,
quando conscientes de que seu filho recém-nascido já possui numerosos séculos
de experiências na terra, sabem que cabe a eles, como se fossem jardineiros,
buscar podar o quanto seja possível das más tendências que possam detectar nos
seus rebentos, no momento em que venham à tona, seja através da imposição de
limites, enquanto lhes seja possível representar alguma autoridade, ou através
do bom exemplo, que fala alto até mesmo às almas menos sensíveis.
Há um trecho de O
Livro dos Espíritos que trata do tema:
208. O Espírito dos
pais não exerce influência sobre o do filho após o nascimento?
— Exerce, e muito, pois, como já dissemos, os Espíritos
devem concorrer para o progresso recíproco. Pois bem: o Espírito dos pais tem a
missão de desenvolver o dos filhos pela educação; isso é para ele uma tarefa.
Se nela falhar, será culpado.
209. Por que pais
bons e virtuosos têm filhos perversos? Ou seja, por que as boas qualidades dos
pais não atraem sempre, por simpatia,
bons Espíritos como filhos?
— Um mau Espírito pode pedir bons pais, na esperança de que
seus conselhos o dirijam por uma senda melhor, e muitas vezes Deus o atende.
210. Os pais poderão,
pelos seus pensamentos e as suas preces atrair para o corpo do filho um bom
Espírito, em lugar de um Espírito inferior?
— Não. Mas podem melhorar o Espírito da criança a que deram
nascimento e que lhes foi confiada. Esse é o dever; filhos maus são uma prova
para os pais."
O mais importante é salientar
que a causa do transtorno sócio-emocional patológico está longe de ser
biológica, como supõe a ciência médica atual, que aos poucos se aproxima da já
secular Ciência Espírita. O diagnóstico realizado através do corpo físico
aponta simplesmente uma consequência da raiz do problema que só se pode
solucionar através do aprendizado nas encarnações sucessivas, onde o ser que é
desenvolvido intelectualmente, mas ainda bruto nos seus sentimentos, vai
aprendendo, preferencialmente com a ajuda do seu pai, de sua mãe e dos
educadores, a dar valor às necessidades alheias, incorporando em si as leis
naturais de amor e caridade.
Muito esclarecedor este texto! Agradeço imensamente a publicação!
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