José Marcelo Gonçalves Coelho[2]
Sempre nos despertou grande
curiosidade a sorte das crianças após a “morte”, bem como a possibilidade de
intercâmbio com aqueles que tenham se despojado prematuramente de suas
roupagens carnais.
Iniciando nossa explanação a
respeito do tema, citemos a questão n°. 381, de O Livro dos Espíritos, em que Kardec assim indagava:
Por morte da criança, readquire
o Espírito, imediatamente, o seu precedente vigor?
Ao que responderam os Espíritos:
“Assim tem que ser, pois que se
vê desembaraçado de seu invólucro corporal. Entretanto, não readquire a
anterior lucidez, senão quando se tenha completamente separado daquele
envoltório, isto é, quando mais nenhum laço exista entre ele e o corpo.”
Ocorre que esse desligamento
será tanto mais rápido quanto mais elevado for o grau evolutivo do Espírito em
questão. Vejamos alguns exemplos:
Na quarta obra basilar da
Codificação, O Céu e O Inferno,
publicada pela primeira vez em 1865, temos, precisamente na segunda parte,
capítulo VIII, a oportunidade de analisar uma comunicação de alto teor
filosófico, que revela a rápida emancipação do Espírito Marcel, desencarnado
alguns meses antes, aproximadamente aos oito anos de idade, após atrozes
sofrimentos que ele havia superado de maneira exemplar.
Anos mais tarde, já no Brasil,
um triste episódio marcaria sensivelmente a vida do casal Francisco e Terezinha
Cruañes.
Foi em tarde ensolarada, numa
fazenda do interior de São Paulo, quando a pequena Fernanda Cruañes, de apenas
quatro anos de idade, caía do trator em que se encontrava, vindo a desencarnar
em 08 de agosto de 1981. Menos de doze meses após o ocorrido, exatamente em 30
de julho de 1982, Fernanda se manifestava através da mediunidade segura de
Francisco Cândido Xavier, em comunicação reproduzida na obra "Estamos no
Além", solicitando aos seus pais que não se entregassem tanto ao
desespero, como frequentemente vinham fazendo, posto que todas aquelas
sensações de sofrimento lhe eram integralmente transmitidas. Declarava, ainda,
que sua avó Jenny, também desencarnada, conduzia-lhe as mãos durante a
comunicação, pois que ela se ressentia da dificuldade de “não saber escrever”,
revelando um condicionamento psíquico comumente observado na maioria dos
espíritos precocemente desencarnados, sem prejuízo, porém, da consistência de
sua mensagem, que acusava uma situação evolutiva satisfatória.
Também pode se dar, ainda que
raramente, encontrarmos “crianças” em funções espirituais de grande relevância,
conforme relatado por Rafael Ranieri em sua obra Materializações Luminosas, em
que ele discorre sobre diversas reuniões de materialização de espíritos em que
tomou parte, inclusive com a presença de Chico Xavier.
Naquelas memoráveis sessões, o
Espírito Araci, Guia Espiritual do conceituado médium Francisco Peixoto Lins
(Peixotinho), tangibilizava-se sob a aparência de uma criança de
aproximadamente três anos de idade. Assim também, para sua surpresa e
satisfação, descobre que a dirigente espiritual daqueles trabalhos de alta
importância era exatamente sua filha Heleninha, desencarnada quando contava
apenas um ano e oito meses. Por vezes, ela se apresentava na forma infantil;
noutras ocasiões, mostrava-se sob aparência adotada em encarnação pregressa,
demonstrando grande domínio sobre suas informações igualmente preciosas nos deu
André Luiz, em sua obra intitulada Entre a Terra e o Céu, psicografada por
Francisco Cândido Xavier.
Conta-nos ele que, em
determinado momento no plano espiritual, passa a ouvir uma suave melodia; ao se
aproximar, percebe que a música era entoada por um coro de crianças felizes e
sorridentes, em meio a paisagens de rara beleza. Ele se encontrava no Lar da
Bênção — um misto de escola de preparação para a maternidade e abrigo para
espíritos que haviam desencarnado na infância. Alguns deles, naquele exato
momento, recebiam a visita de suas mães, ainda encarnadas, que para lá se
deslocavam por ocasião do sono físico. André Luiz, então, fascinado com o que
via, questiona se haveria ali cursos primários de alfabetização; ao que a
dirigente daquele educandário responde afirmativamente, pois que se tratava de
um verdadeiro estabelecimento de ensino no além, que abrigava, à época, cerca
de dois mil espíritos desencarnados em tenra idade, que lá permaneciam até
reunir condições para retornar ao plano físico, o que se dava, na maioria das
vezes, antes que o Espírito retomasse sua compleição adulta.
Surge, então, a instigante
questão do “crescimento das crianças no plano espiritual”, que estará
intimamente atrelada à retomada de consciência por parte do Espírito
desencarnado, o que lhe permitirá plasmar as modificações necessárias em seu
corpo fluídico.
Exemplo disso encontramos
novamente na obra "Estamos no Além", através do relato mediúnico de
Sandra Regina Camargo. Desencarnada aos nove anos de idade, após ter padecido
durante três anos em virtude de pertinaz leucemia. Menos de quatro anos após
seu desencarne, na noite de 17 de janeiro de 1981, ela se comunicaria com seus
entes queridos, através de Chico Xavier, declarando: “saibam também que cresci.
Isso aconteceu na medida de meu desejo de me fazer pessoa grande...”.
Assim também se deu com Upton,
desencarnado com apenas três meses de vida. Em carta psicografada por Chico
Xavier, e publicada na obra Reencontros, demonstrava ter recobrado sua
maturidade espiritual em poucos anos de regresso à Vida Maior.
Há, portanto, espíritos que,
tendo desencarnado na infância, em retorno ao plano espiritual reassumem em
curtíssimo prazo a forma adulta que tinham antes de reencarnar, ou, ainda, outra
apresentação perispiritual que lhes convenha, sempre de acordo com suas
potencialidades anímicas.
Entretanto, o Espírito André
Luiz, ainda na obra Entre a Terra e o Céu, nos afirma que essas são exceções,
pois que a maioria dos seres que estagiam no planeta Terra necessitam de longo
espaço de tempo e total amparo da Espiritualidade para se desvencilharern dos
impositivos da forma infantil, a que se encontram mentalmente fixados. Ademais,
são em grande número aqueles que, ao desencarnarem precocemente, adentram o
plano espiritual em extremo desequilíbrio, razão pela qual são recolhidos em
alas isoladas, com o fito de receberem cuidados especiais.
Certamente que a temática não se
esgota neste breve estudo, todavia, desde já podemos concluir, mais uma vez, que
o Espiritismo é, irrefutavelmente, o Consolador prometido por Jesus, por nos
brindar com a realidade da sobrevivência da alma, notadamente em relação
àqueles que retornaram às esferas espirituais quando ainda ensaiavam seus
primeiros passos no mundo.
Kardec, Allan: O Livro dos
Espíritos, Editora FEB, 76 ª edição.
Kardec, Allan: O Céu e o
Inferno, Segunda Parte, cap. VIII, Editora FEB, 76ª edição.
Ranieri, Rafael R.:
Materializações Luminosas, cap. IX, XIII e XXVI, Edições FEESP, 1989.
Xavier, Francisco Cândido
(Espíritos diversas); Estamos do Além-Instituto de Difusão
Espírita, cap. 2 e 10, 1986.
Xavier, Francisco Cândido
(Espíritos diversos): Reencontros-Instituto de Difusão Espírita, cap. 10,1987.
Xavier, Francisco Cândido (André
Luiz): Evolução em Dois Mundos, Segunda Parte, cap. IV, FEB, 1991.
Xavier, Francisco Cândido (André
Luiz): Entre a Terra e o Céu, cap. X e XI, FEB, 1991.
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