Esboroam-se, sob os camartelos
das revoluções hodiernas, os edifícios da tradição ultramontana, cedendo lugar
às apressadas construções do desequilíbrio, sem memória ancestral, sem alicerce
cultural.
Ruem, diante dos abalos da
ciência tecnológica, o empirismo passadista e as obras da arbitrária dominação
totalitária, substituídos pelo alucinar das novas maquinações de aventureiros
desalmados, perseguindo suas ambições imediatistas a prejuízo da sociedade, do
indivíduo.
A política desgovernada exibe os
seus corifeus, que se fazem triunfadores de um dia, logo passando ao anonimato,
repletos de gozos e valores perecíveis, a intoxicar-se nos vapores dos vícios e
das perversões em que falecem os últimos ideais que ainda possuíam.
Os direitos humanos decantados em toda parte sofrem o vilipêndio
daqueles que os deveriam defender, em razão do desrespeito que apresentam
diante das leis por eles mesmos elaboradas, em desprezo flagrante às
Instituições que se comprometeram socorrer, por descrédito de si próprios.
A anarquia substitui a ordem e
as transformações sociais apressadas não têm tempo de ser assimiladas, porque
substituídas pelos modismos que se
multiplicam em velocidade ciclópica.
Velhos dogmas, nascidos e
cultivados no caldo da ignorância, são esquecidos e nascem as ideias liberais
revolucionárias, que instigam o homem fraco contra o seu irmão mais forte
gerando ódios, quando deveriam amansar o lobo
ameaçador, a fim de que, pacificado, pudesse beber na mesma fonte com o cordeiro sedento, que lhe receberia
proteção dignificadora.
As circunstâncias externas do
inter-relacionamento das criaturas, fenômeno consequente ao desequilíbrio do
indivíduo, engendram no contexto hodierno a insegurança, que fomenta as crises.
Sucedem-se, desse modo, as
crises de autoridade, de respeito, de honradez, de valores ético-morais, e a
desumanização da criatura assoma nos painéis do comportamento,
insensibilizando-a pelo amolentamento emocional ou exacerbação, na volúpia do
prazer e da violência conduzidos pelas ambições desmedidas.
As crises respondem pela
desconfiança das pessoas, umas em relação às outras, pelo rearmamento belicoso
de uns indivíduos contra os outros, pela agressividade automática e atrevida.
A queda do respeito que todos se
devem, respeito este sem castração nem temor, estimula a indisciplina que
começa na educação das gerações novas, relegadas a plano secundário, em que se
cuidam de oferecer coisas, em mecanismos sórdidos de chantagem emocional,
evitando-se dar amor, presença, companheirismo e orientação saudável.
A crise de autoridade responde pela corrupção em todas as áreas, sob
a cobertura daqueles que deveriam zelar pelos bens públicos e administrá-los em
favor da comunidade, pois que, para tal se candidataram aos postos de comando,
sendo remunerados pelos contribuintes para este fim. Como efeito, os maus
exemplos favorecem a desonestidade, discreta e pública, dos membros esfacelados
do organismo social enfermo, preparando os bolsões de miséria econômica, moral,
com todos os ingredientes para a rebelião criminosa, o assalto a mão armada, o
apropriamento indébito dos bens alheios, a insegurança geral. O que se nega em
compromisso de direito, é tomado em mancomunação da força com o ódio.
Mesmo os valores espirituais do
homem se apresentam em crise de pastores, e amigos, capazes de exercerem o
ministério da fé religiosa com serenidade, sem separativismo, com amor, sem
discórdia na grei, com fraternidade, sem disputas da primazia, sem estrelismo.
Nas várias escolas de fé espocam
a rebelião, as disputas lamentáveis, a maledicência ácida ou o distanciamento
formando quistos perigosos no corpo comunitário.
O homem apresenta-se doente, e a
sociedade, que lhe é o corpo grupal, encontra-se desestruturada em padecimento
total.
As crises gerais, que procedem
da insegurança individual, são, por sua vez, responsáveis por mais altas e
expressivas somas de desconforto, insatisfação, instabilidade emocional do
homem, formando um círculo vicioso que se repete, sem aparente possibilidade de
arrebentar as cadeias fortes que o constituem.
Vitimado por sucessivos choques
desde o momento do parto, quando o ser é expulso
do claustro materno, onde se encontrava em segurança, este enfrenta, desequipado,
inumeráveis desafios que não logra superar. Chegando a idade adulta, ei-lo receoso,
desestruturado para enfrentar a maquinaria insensível dos dias contemporâneos,
em que a eletrônica e a robótica são conduzidas, porém, avançam, tomando o
controle da situação e, lentamente, reduzindo-o a observador das respostas e
imposições digitadas, apertando ou desligando controles e submetendo-se aos
resultados preestabelecidos, sem emoção, sem participação pessoal nos dados recolhidos.
Noutras circunstâncias, ou em
estado fetal, experimenta os choques geradores de insegurança, no comportamento
da gestante revoltada diante da maternidade não desejada e até mesmo odiada. O
jogo de reações nervosas, as vibrações deletérias da revolta contra o ser em
formação, atingem-lhe os delicados mecanismos psíquicos, desarmonizando os núcleos
geradores do futuro equilíbrio, sob as chuvas de raios destruidores, que os afetam
irreversivelmente.
O que o amor poderia realizar
posteriormente e a educação lograr em forma de psicoterapia, ficam, à margem,
sob os cuidados de pessoas remuneradas, sem envolvimento emocional ou interesse
pessoal, produzindo marcas profundas de abandono
e solidão, que ressurgirão como traumas danosos no desenvolvimento da personalidade.
A par dos fatores
sóciomesológicos, outras razões são preponderantes na área do comportamento
inseguro, que são aquelas que procedem das reencarnações anteriores, malogradas
ou assinaladas pelos golpes violentos que foram aplicados pelo Espírito em
desconcerto moral, ou que os padeceu nas rudes pugnas existenciais.
Assinalando com rigor a
manifestação da afetividade tranquila ou desconfiada, aquelas impressões são
arquivadas no inconsciente profundo, graças aos mecanismos sutis do
perispírito. O homem é um ser inacabado,
que a atual existência deverá colaborar para o aperfeiçoamento a que se
encontra destinado. Faltando-lhe os recursos favoráveis ao ajustamento, torna-se
uma peça mal colocada ou inadaptada na complexidade da vida social, somando à
sua a insegurança dos outros membros, assim favorecendo as crises individuais e
coletivas.
Por desinformação ou fruto de um
contexto imediatista consumista, elaborou-se a tese de que a segurança pessoal
é o resultado do ter, que se
manifesta pelo poder e recebe a
resposta na forma de parecer. Todos
os mecanismos responsáveis pelo homem e sua sobrevivência se estribam nessas
propostas falsas, formando uma sociedade de forma, sem profundidade, de
apresentação, sem estrutura psicológica nem equilíbrio moral.
Trabalhando somente no exterior,
relega-se, a plano secundário ou a nenhum, o sentido ético do ser humano, da
sua realidade intrínseca, das suas possibilidades futuras, jacentes nele mesmo.
O homem deve ser educado para
conviver consigo próprio, com a sua solidão, com os seus momentâneos limites e
ansiedades, administrando-os em proveito pessoal, de modo a poder compartir
emoções e reparti-las, distribuir conquistas, ceder espaços, quando convidado à
participação em outras vidas, ou pessoas outras vierem envolver-se na sua área emocional.
Desacostumado à convivência
psíquica consciente com os seus problemas, mascara-se com as fantasias da
aparência e da posse, fracassando nos momentos em que se deve enfrentar,
refletido em outrem que o observa com os mesmos conflitos e inseguranças. As
uniões fraternais então se desarticulam, as afetivas se convertem em guerras
surdas, o matrimônio naufraga, o relacionamento social sucumbe disfarçado nos
encontros da balbúrdia, da extravagância, dos exageros alcoólicos, tóxicos,
orgíacos, em mecanismos de fuga da realidade de cada um.
A educação, a psicoterapia, a
metodologia da convivência humana devem estruturar-se em uma consciência de ser, antes de ter; de ser, ao invés de poder,
de ser, embora sem a preocupação de parecer.
Os valores externos são incapazes de resolver
as crises internas, aliás, não poucas vezes, desencadeando-as.
O que o homem é, suas
realizações íntimas, sua capacidade de compreender-se, às pessoas e ao mundo,
sua riqueza emocional e idealística, estruturam-no para os embates, que fazem
parte do seu modus vivendi e operandi
, neste processo incessante de crescimento e cristificação.
A coragem para os
enfrentamentos, sem violência ou recuos, capacita-o para os logros
transformadores do ambiente social, que deslocará para o passado a ocorrência
das crises de comportamento, iniciando-se a era de construção ideal e de reconstrução
ética, jamais vivida antes na sua legitimidade.
Os conceitos do poder e da força
estão presentes na sistemática governança dos povos. Sempre os militares
governaram mais do que os filosóficos, e o poder
sempre esteve por mais tempo nas mãos dos violentos do que na sabedoria dos pacíficos,
gerando as guerras exteriores, porque os seus apaniguados viviam em constantes
guerras íntimas, inseguros, aguardando a traição dos fracos que, bajuladores,
os rodeavam, e a audácia dos mais fortes, que lhes ambicionavam o poderio,
terminando, quase todos, vítimas das suas nefastas urdiduras.
A segurança íntima conseguida
mediante o autodescobrimento, a humanização e a finalidade nobre que se deve
imprimir à vida são fatores decisivos para a eliminação das crises, porquanto,
afinal, a descrença que campeia e o desconcerto que se generaliza são
defluentes do homem moderno que se encontra em crise momentânea, vitimado pela
insegurança que o aturde.
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