terça-feira, 30 de setembro de 2025

O ESPIRITISMO É UMA RELIGIÃO[1],[2]



Discurso de Abertura pelo Sr. Allan Kardec

 

Sociedade de Paris, 1º de novembro de 1868

 

O Espiritismo é uma religião?

Onde quer que se encontrem duas ou três pessoas reunidas em meu nome, aí estarei com elas.

S. Mateus, 18:20

 

Caros irmãos e irmãs espíritas,

Estamos reunidos, neste dia consagrado pelo uso à comemoração dos mortos, para darmos àqueles irmãos nossos que deixaram a Terra um testemunho particular de simpatia, para continuarmos as relações de afeição e de fraternidade que existiam entre eles e nós, quando eram vivos, e para invocarmos sobre eles a bondade do Todo-Poderoso. Mas, por que nos reunirmos? Não podemos fazer em particular o que cada um de nós propõe fazer em comum? Qual a utilidade de assim nos reunirmos num dia determinado?

Jesus no-lo indica pelas palavras que referimos acima.

Esta utilidade está no resultado produzido pela comunhão de pensamentos que se estabelece entre pessoas reunidas com o mesmo objetivo.

Comunhão de pensamentos! Compreendemos bem todo o alcance desta expressão? Seguramente, até este dia, poucas pessoas dela tinham feito uma ideia completa. O Espiritismo, que nos explica tantas coisas pelas leis que revela, ainda vem explicar a causa e a força dessa situação do espírito.

Comunhão de pensamento quer dizer pensamento comum, unidade de intenção, de vontade, de desejo, de aspiração.

Ninguém pode desconhecer que o pensamento é uma força; mas uma força puramente moral e abstrata? Não: do contrário não se explicariam certos efeitos do pensamento e, ainda menos, a comunhão de pensamento. Para compreendê-lo, é preciso conhecer as propriedades e a ação dos elementos que constituem nossa essência espiritual, e é o Espiritismo que no-las ensina.

O pensamento é o atributo característico do ser espiritual; é ele que distingue o espírito da matéria; sem o pensamento o espírito não seria espírito. A vontade não é um atributo especial do espírito; é o pensamento chegado a um certo grau de energia; é o pensamento transformado em força motriz. É pela vontade que o espírito imprime aos membros e ao corpo movimentos num determinado sentido. Mas, se tem a força de agir sobre os órgãos materiais, quanto maior não deve ser essa força sobre os elementos fluídicos que nos rodeiam! O pensamento atua sobre os fluidos ambientes, como o som age sobre o ar; esses fluidos nos trazem o pensamento, como o ar nos traz o som. Pode, pois, dizer-se com toda a verdade que há nesses fluidos ondas e raios de pensamentos que se cruzam sem se confundirem, como há no ar ondas e raios sonoros.

Uma assembleia é um foco onde irradiam pensamentos diversos; é como uma orquestra, um coro de pensamentos, onde cada um produz a sua nota. Disto resulta uma imensidão de correntes e de eflúvios fluídicos, dos quais cada um recebe a impressão pelo sentido espiritual, como num coro musical cada um recebe a impressão dos sons pelo sentido da audição.

Mas, assim como há raios sonoros harmônicos ou discordantes, também há pensamentos harmônicos ou discordantes. Se o conjunto for harmônico, a impressão é agradável; se discordante, a impressão será penosa. Ora, para isto, não é necessário que o pensamento seja formulado em palavras; a irradiação fluídica não deixa de existir, quer seja ou não expressa.

Se todas forem benéficas, os assistentes experimentarão um verdadeiro bem-estar e se sentirão à vontade; mas se se misturarem alguns pensamentos maus, produzirão o efeito de uma corrente de ar gelado num meio tépido.

Tal é a causa do sentimento de satisfação que se experimenta numa reunião simpática; aí reina uma espécie de atmosfera moral salubre, onde se respira à vontade; daí se sai reconfortado, porque aí nos impregnamos de eflúvios fluídicos salutares. Assim também se explicam a ansiedade e o mal-estar indefinível que se sente num meio antipático, onde os pensamentos malévolos provocam, a bem dizer, correntes fluídicas malsãs.

A comunhão de pensamentos produz, pois, uma sorte de efeito físico que reage sobre o moral; só o Espiritismo poderia fazê-lo compreender. O homem o sente instintivamente, já que procura as reuniões onde sabe encontrar essa comunhão. Nessas reuniões homogêneas e simpáticas haure novas forças morais; poder-se-ia dizer que aí recupera as perdas fluídicas perdidas diariamente pela irradiação do pensamento, como recupera pelos alimentos as perdas do corpo material.

A esses efeitos da comunhão de pensamentos, junta-se um outro que é a sua consequência natural, e que importa não perder de vista: é o poder que adquire o pensamento ou a vontade, pelo conjunto dos pensamentos ou vontades reunidos. Sendo a vontade uma força ativa, esta força é multiplicada pelo número de vontades idênticas, como a força muscular é multiplicada pelo número dos braços.

Estabelecido este ponto, concebe-se que nas relações que se estabelecem entre os homens e os Espíritos, haja, numa reunião onde reine perfeita comunhão de pensamentos, uma força atrativa ou repulsiva, que nem sempre possui o indivíduo isolado.

Se, até o presente, as reuniões muito numerosas são menos favoráveis, é pela dificuldade de obter uma homogeneidade perfeita de pensamentos, que se deve à imperfeição da natureza humana na Terra. Quanto mais numerosas as reuniões, mais aí se mesclam elementos heterogêneos, que paralisam a ação dos bons elementos, e que são como grãos de areia numa engrenagem. Não sucede assim nos mundos mais adiantados, e tal estado de coisas mudará na Terra à medida que os homens se tornarem melhores.

Para os espíritas, a comunhão de pensamentos tem um resultado ainda mais especial. Temos visto o efeito desta comunhão de homem a homem; prova-nos o Espiritismo que ele não é menor dos homens aos Espíritos, e reciprocamente. Com efeito, se o pensamento coletivo adquire força pelo número, um conjunto de pensamentos idênticos, tendo o bem por objetivo, terá mais força para neutralizar a ação dos Espíritos maus; também vemos que a tática destes últimos é levar à divisão e ao isolamento. Sozinho, um homem pode sucumbir, ao passo que se sua vontade for corroborada por outras vontades poderá resistir, conforme o axioma: A união faz a força, axioma verdadeiro, tanto do ponto de vista moral, quanto do físico.

Por outro lado, se a ação dos Espíritos malévolos pode ser paralisada por um pensamento comum, é evidente que a dos Espíritos bons será secundada; seus eflúvios fluídicos, não sendo detidos por correntes contrárias, espalhar-se-ão sobre os assistentes, precisamente porque todos os terão atraído pelo pensamento, não cada um em proveito pessoal, mas em benefício de todos, conforme a lei de caridade. Descerão sobre eles como línguas de fogo, para nos servirmos de uma admirável imagem do Evangelho.

Assim, pela comunhão de pensamentos os homens se assistem entre si e, ao mesmo tempo, assistem os Espíritos e são por estes assistidos. As relações entre os mundos visível e invisível não são mais individuais, mas coletivas e, por isto mesmo, mais poderosas em proveito das massas e dos indivíduos. Numa palavra, estabelecem a solidariedade, que é a base da fraternidade. Cada qual trabalha para todos, e não apenas para si; e trabalhando para todos, cada um aí encontra a sua parte. É o que o egoísmo não compreende.

Graças ao Espiritismo, compreendemos, então, o poder e os efeitos do pensamento coletivo; explicamo-nos melhor o sentimento de bem-estar que se experimenta num meio homogêneo e simpático; mas sabemos, igualmente, que se dá o mesmo com os Espíritos, porque eles também recebem os eflúvios de todos os pensamentos benevolentes que para eles se elevam, como uma nuvem de perfume. Os que são felizes experimentam maior alegria por esse concerto harmonioso; os que sofrem sentem maior alívio.

Todas as reuniões religiosas, seja qual for o culto a que pertençam, são fundadas na comunhão de pensamentos; com efeito, é aí que podem e devem exercer a sua força, porque o objetivo deve ser a libertação do pensamento das amarras da matéria. Infelizmente, a maioria se afasta deste princípio à medida que a religião se torna uma questão de forma. Disto resulta que cada um, fazendo seu dever consistir na realização da forma, se julga quites com Deus e com os homens, desde que praticou uma fórmula. Resulta ainda que cada um vai aos lugares de reuniões religiosas com um pensamento pessoal, por sua própria conta e, na maioria das vezes, sem nenhum sentimento de confraternidade em relação aos outros assistentes; fica isolado em meio à multidão e só pensa no céu para si mesmo.

Por certo não era assim que o entendia Jesus, ao dizer:

Quando duas ou mais pessoas estiverem reunidas em meu nome, aí estarei entre elas.

Reunidos em meu nome, isto é, com um pensamento comum; mas não se pode estar reunido em nome de Jesus sem assimilar os seus princípios, sua doutrina. Ora, qual é o princípio fundamental da doutrina de Jesus? A caridade em pensamentos, palavras e ações. Mentem os egoístas e os orgulhosos, quando se dizem reunidos em nome de Jesus, porque Jesus não os conhece por seus discípulos.

Chocados por esses abusos e desvios, há pessoas que negam a utilidade das assembleias religiosas e, em consequência, a das edificações consagradas a tais assembleias. Em seu radicalismo, pensam que seria melhor construir asilos do que templos, uma vez que o templo de Deus está em toda parte e em toda parte pode ser adorado; que cada um pode orar em casa e a qualquer hora, enquanto os pobres, os doentes e os enfermos necessitam de lugar de refúgio.

Mas, porque cometeram abusos, porque se afastaram do reto caminho, devemos concluir que não existe o reto caminho e que tudo quanto se abusa seja mau? Não, certamente. Falar assim é desconhecer a fonte e os benefícios da comunhão de pensamentos, que deve ser a essência das assembleias religiosas; é ignorar as causas que a provocam. Concebe-se que os materialistas professem semelhantes ideias, já que em tudo fazem abstração da vida espiritual; mas da parte dos espiritualistas e, melhor ainda, dos espíritas, seria um contrassenso. O isolamento religioso, assim como o isolamento social, conduz ao egoísmo. Que alguns homens sejam bastante fortes por si mesmos, largamente dotados pelo coração, para que sua fé e caridade não necessitem ser revigoradas num foco comum, é possível; mas não é assim com as massas, por lhes faltar um estimulante, sem o qual poderiam se deixar levar pela indiferença. Além disso, qual o homem que poderá dizer-se bastante esclarecido para nada ter a aprender no tocante aos seus interesses futuros? bastante perfeito para abrir mão dos conselhos da vida presente? Será sempre capaz de instruir-se por si mesmo? Não; a maioria necessita de ensinamentos diretos em matéria de religião e de moral, como em matéria de ciência.

Incontestavelmente, tais ensinos podem ser dados em toda parte, sob a abóbada do céu, como sob a de um templo; mas por que os homens não haveriam de ter lugares especiais para as questões celestes, como os têm para as terrenas? Por que não teriam assembleias religiosas, como têm assembleias políticas, científicas e industriais? Aqui está uma bolsa onde se ganha sempre. Isto não impede as edificações em proveito dos infelizes. Dizemos, ademais, que haverá menos gente nos asilos, quando os homens compreenderem melhor seus interesses do céu.

Se as assembleias religiosas – falo em geral, sem aludir a nenhum culto – muitas vezes se têm afastado de seu objetivo primitivo principal, que é a comunhão fraterna do pensamento; se o ensino ali ministrado nem sempre tem acompanhado o movimento progressivo da Humanidade, é que os homens não progridem todos ao mesmo tempo. O que não fazem num período, fazem em outro; à proporção que se esclarecem, veem as lacunas existentes em suas instituições, e as preenchem; compreendem que o que era bom numa época, em relação ao grau de civilização, torna-se insuficiente numa etapa mais avançada, e restabelecem o nível. Sabemos que o Espiritismo é a grande alavanca do progresso em todas as coisas; marca uma era de renovação. Saibamos, pois, esperar, não exigindo de uma época mais do que ela pode dar.

Como as plantas, é preciso que as ideias amadureçam, para que seus frutos sejam colhidos. Saibamos, além disso, fazer as necessárias concessões às épocas de transição, porque na Natureza nada se opera de maneira brusca e instantânea.

Dissemos que o verdadeiro objetivo das assembleias religiosas deve ser a comunhão de pensamentos; é que, com efeito, a palavra religião quer dizer laço. Uma religião, em sua acepção larga e verdadeira, é um laço que religa os homens numa comunhão de sentimentos, de princípios e de crenças; consecutivamente, esse nome foi dado a esses mesmos princípios codificados e formulados em dogmas ou artigos de fé. É nesse sentido que se diz: a religião política; entretanto, mesmo nesta acepção, a palavra religião não é sinônima de opinião; implica uma ideia particular: a de fé conscienciosa; eis por que se diz também: a fé política. Ora, os homens podem filiar-se, por interesse, a um partido, sem ter fé nesse partido, e a prova é que o deixam sem escrúpulo, quando encontram seu interesse alhures, ao passo que aquele que o abraça por convicção é inabalável; persiste à custa dos maiores sacrifícios, e é a abnegação dos interesses pessoais a verdadeira pedra-de-toque da fé sincera. Todavia, se a renúncia a uma opinião, motivada pelo interesse, é um ato de desprezível covardia, é, não obstante, respeitável, quando fruto do reconhecimento do erro em que se estava; é, então, um ato de abnegação e de razão. Há mais coragem e grandeza em reconhecer abertamente que se enganou, do que persistir, por amor-próprio, no que se sabe ser falso, e para não se dar um desmentido a si próprio, o que acusa mais obstinação do que firmeza, mais orgulho do que razão, e mais fraqueza do que força. É mais ainda: é hipocrisia, porque se quer parecer o que não se é; além disso é uma ação má, porque é encorajar o erro por seu próprio exemplo.

O laço estabelecido por uma religião, seja qual for o seu objetivo, é, pois, essencialmente moral, que liga os corações, que identifica os pensamentos, as aspirações, e não somente o fato de compromissos materiais, que se rompem à vontade, ou da realização de fórmulas que falam mais aos olhos do que ao espírito.

O efeito desse laço moral é o de estabelecer entre os que ele une, como consequência da comunhão de vistas e de sentimentos, a fraternidade e a solidariedade, a indulgência e a benevolência mútuas.

É nesse sentido que também se diz: a religião da amizade, a religião da família.

Se é assim, perguntarão, então o Espiritismo é uma religião? Ora, sim, sem dúvida, senhores! No sentido filosófico, o Espiritismo é uma religião, e nós nos vangloriamos por isto, porque é a Doutrina que funda os vínculos da fraternidade e da comunhão de pensamentos, não sobre uma simples convenção, mas sobre bases mais sólidas: as próprias leis da Natureza.

Por que, então, temos declarado que o Espiritismo não é uma religião? Em razão de não haver senão uma palavra para exprimir duas ideias diferentes, e que, na opinião geral, a palavra religião é inseparável da de culto; porque desperta exclusivamente uma ideia de forma, que o Espiritismo não tem. Se o Espiritismo se dissesse uma religião, o público não veria aí mais que uma nova edição, uma variante, se se quiser, dos princípios absolutos em matéria de fé; uma casta sacerdotal com seu cortejo de hierarquias, de cerimônias e de privilégios; não o separaria das ideias de misticismo e dos abusos contra os quais tantas vezes a opinião se levantou.

Não tendo o Espiritismo nenhum dos caracteres de uma religião, na acepção usual da palavra, não podia nem devia enfeitar-se com um título sobre cujo valor inevitavelmente se teria equivocado. Eis por que simplesmente se diz: doutrina filosófica e moral.

As reuniões espíritas podem, pois, ser feitas religiosamente, isto é, com o recolhimento e o respeito que

comporta a natureza grave dos assuntos de que se ocupa; pode-se mesmo, na ocasião, aí fazer preces que, em vez de serem ditas em particular, são ditas em comum, sem que, por isto, sejam tomadas por assembleias religiosas. Não se pense que isto seja um jogo de palavras; a nuança é perfeitamente clara, e a aparente confusão não provém senão da falta de uma palavra para cada ideia.

Qual é, pois, o laço que deve existir entre os espíritas?

Eles não estão unidos entre si por nenhum contrato material, por nenhuma prática obrigatória. Qual o sentimento no qual se deve confundir todos os pensamentos? É um sentimento todo moral, todo espiritual, todo humanitário: o da caridade para com todos ou, em outras palavras: o amor do próximo, que compreende os vivos e os mortos, pois sabemos que os mortos sempre fazem parte da Humanidade.

A caridade é a alma do Espiritismo; ela resume todos os deveres do homem para consigo mesmo e para com os seus semelhantes, razão por que se pode dizer que não há verdadeiro espírita sem caridade.

Mas a caridade é ainda uma dessas palavras de sentido múltiplo, cujo inteiro alcance deve ser bem compreendido; e se os Espíritos não cessam de pregá-la e defini-la, é que, provavelmente, reconhecem que isto ainda é necessário.

O campo da caridade é muito vasto; compreende duas grandes divisões que, em falta de termos especiais, podem designar-se pelas expressões Caridade beneficente e caridade benevolente.

Compreende-se facilmente a primeira, que é naturalmente proporcional aos recursos materiais de que se dispõe; mas a segunda está ao alcance de todos, do mais pobre como do mais rico. Se a beneficência é forçosamente limitada, nada além da vontade poderia estabelecer limites à benevolência.

O que é preciso, então, para praticar a caridade benevolente? Amar ao próximo como a si mesmo. Ora, se se amar ao próximo tanto quanto a si, amar-se-á muito; agir-se-á para com outrem como se quereria que os outros agissem para conosco; não se quererá nem se fará mal a ninguém, porque não quereríamos que no-lo fizessem.

Amar ao próximo é, pois, abjurar todo sentimento de ódio, de animosidade, de rancor, de inveja, de ciúme, de vingança, numa palavra, todo desejo e todo pensamento de prejudicar; é perdoar aos inimigos e retribuir o mal com o bem; é ser indulgente para as imperfeições de seus semelhantes e não procurar o argueiro no olho do vizinho, quando não se vê a trave no seu; é esconder ou desculpar as faltas alheias, em vez de se comprazer em as pôr em relevo, por espírito de maledicência; é ainda não se fazer valer à custa dos outros; não procurar esmagar ninguém sob o peso de sua superioridade; não desprezar ninguém pelo orgulho. Eis a verdadeira caridade benevolente, a caridade prática, sem a qual a caridade é palavra vã; é a caridade do verdadeiro espírita, como do verdadeiro cristão; aquela sem a qual aquele que diz: Fora da caridade não há salvação, pronuncia sua própria condenação, tanto neste quanto no outro mundo.

Quantas coisas haveria a dizer sobre este assunto! Que belas instruções não nos dão os Espíritos incessantemente! Não fosse o receio de alongar-me em demasia e de abusar de vossa paciência, senhores, seria fácil demonstrar que, em se colocando no ponto de vista do interesse pessoal, egoísta, se se quiser, porque nem todos os homens estão ainda maduros para uma completa abnegação, para fazer o bem unicamente por amor do bem, digo que seria fácil demonstrar que têm tudo a ganhar em agir deste modo, e tudo a perder agindo diversamente, mesmo em suas relações sociais; depois, o bem atrai o bem e a proteção dos Espíritos bons; o mal atrai o mal e abre a porta à malevolência dos maus. Mais cedo ou mais tarde o orgulhoso será castigado pela humilhação, o ambicioso pelas decepções, o egoísta pela ruína de suas esperanças, o hipócrita pela vergonha de ser desmascarado; aquele que abandona os Espíritos bons por estes é abandonado e, de queda em queda, finalmente se vê no fundo do abismo, ao passo que os Espíritos bons erguem e amparam aquele que, nas maiores provações, não deixa de se confiar à Providência e jamais se desvia do reto caminho; aquele, enfim, cujos secretos sentimentos não dissimulam nenhum pensamento oculto de vaidade ou de interesse pessoal. Assim, de um lado, ganho assegurado; do outro, perda certa; cada um, em virtude do seu livre-arbítrio, pode escolher a sorte que quer correr, mas não poderá queixar-se senão de si mesmo pelas consequências de sua escolha.

Crer num Deus Todo-Poderoso, soberanamente justo e bom; crer na alma e em sua imortalidade; na preexistência da alma como única justificação do presente; na pluralidade das existências como meio de expiação, de reparação e de adiantamento intelectual e moral; na perfectibilidade dos seres mais imperfeitos; na felicidade crescente com a perfeição; na equitativa remuneração do bem e do mal, segundo o princípio: a cada um segundo as suas obras; na igualdade da justiça para todos, sem exceções, favores nem privilégios para nenhuma criatura; na duração da expiação limitada à da imperfeição; no livre-arbítrio do homem, que lhe deixa sempre a escolha entre o bem e o mal; crer na continuidade das relações entre o mundo visível e o mundo invisível; na solidariedade que religa todos os seres passados, presentes e futuros, encarnados e desencarnados; considerar a vida terrestre como transitória e uma das fases da vida do Espírito, que é eterno; aceitar corajosamente as provações, em vista de um futuro mais invejável que o presente; praticar a caridade em pensamentos, em palavras e obras na mais larga acepção do termo; esforçar-se cada dia para ser melhor que na véspera, extirpando toda imperfeição de sua alma; submeter todas as crenças ao controle do livre-exame e da razão, e nada aceitar pela fé cega; respeitar todas as crenças sinceras, por mais irracionais que nos pareçam, e não violentar a consciência de ninguém; ver, enfim, nas descobertas da Ciência, a revelação das leis da Natureza, que são as leis de Deus: eis o Credo, a religião do Espiritismo, religião que pode conciliar-se com todos os cultos, isto é, com todas as maneiras de adorar a Deus. É o laço que deve unir todos os espíritas numa santa comunhão de pensamentos, esperando que ligue todos os homens sob a bandeira da fraternidade universal.

Com a fraternidade, filha da caridade, os homens viverão em paz e se pouparão males inumeráveis, que nascem da discórdia, por sua vez filha do orgulho, do egoísmo, da ambição, da inveja e de todas as imperfeições da Humanidade.

O Espiritismo dá aos homens tudo o que é preciso para a sua felicidade aqui na Terra, porque lhes ensina a se contentarem com o que têm. Que os espíritas sejam, pois, os primeiros a aproveitar os benefícios que ele traz, e que inaugurem entre si o reino da harmonia, que resplandecerá nas gerações futuras.

Os Espíritos que nos cercam aqui são inumeráveis, atraídos pelo objetivo que nos propusemos ao nos reunirmos, a fim de dar aos nossos pensamentos a força que nasce da união.

Ofereçamos aos que nos são caros uma boa lembrança e o penhor de nossa afeição, encorajamentos e consolações aos que deles necessitem. Façamos de modo que cada um recolha a sua parte dos sentimentos de caridade benevolente, de que estivermos animados, e que esta reunião dê os frutos que todos têm o direito de esperar.

Allan Kardec

 

Depois deste discurso, procedeu-se à leitura de uma comunicação espontânea, ditada pelo Espírito H. Dozon sobre a solenidade do Dia de Todos os Santos, em 1º de novembro de 1865, e que é lida todos os anos na sessão comemorativa.



[1] REVISTA ESPÍRITA – dezembro 1868 – Allan Kardec

[2] A primeira parte deste discurso é tirada de uma publicação anterior sobre a Comunhão de pensamentos, mas que era preciso relembrar, por causa de sua ligação com a ideia principal.


segunda-feira, 29 de setembro de 2025

PAULO ALVES GODOY[1]

 


 

Companheiro de grandes atividades no Movimento Espírita, especialmente no terreno jornalístico e como escritor.....

Paulo Alves Godoy nasceu na cidade de São Paulo SP, no dia 22 de setembro de 1914. Foram seus pais José Alves, português, e D. Cesarina Alves Godoy, brasileira. Foi casado com D. Olga Santos Alves, que lhe precedeu na Vida Espiritual, há pouco tempo. Deixou três filhos: Jeane, Míriam e Wagner, que lhe deram diversos netos.

Residiu por algum tempo em Araguari (MG), onde iniciou os seus estudos primários, concluindo o curso ginasial em São Paulo. Trabalhou durante 33 anos no Frigorífico Armour do Brasil S/A e, posteriormente no Frigorífico Bourbon, onde exerceu diversos cargos, inclusive o de chefia geral. Colaborou em diversos órgãos da imprensa paulistana.

Seus pais eram espíritas e o encaminharam ao Espiritismo desde sua infância, porém considerou-se praticante a partir de 1938, quando foi eleito pela primeira vez como secretário do Centro Espírita Bezerra de Menezes no bairro da Lapa, São Paulo. Exerceu cargo de diretoria em diversas instituições: União Federativa Espírita Paulista, delegado da Confederação Espírita Panamericana, em São Paulo, membro do conselho deliberativo da FEESP e conselheiro da USE e da Liga Espírita do Estado de São Paulo. Em 1940, juntamente com Francisco Arcari e Antônio Alves Pereira, lançou o boletim “O Semeador” (já extinto) no Centro Espírita Bezerra de Menezes. Em 1947 dirigiu a revista “O Revelador”, e no ano seguinte fundou o jornal “Unificação”, órgão da USE, sendo responsável pela edição. Em fevereiro de 1966, fundou o jornal “O Semeador”, órgão da Federação Espírita do Estado de São Paulo, onde permaneceu até sua desencarnação.

Paulo Alves Godoy viajou por todo o Estado de São Paulo e também Estados do sul do Brasil a serviço da Doutrina Espírita, como palestrante. Colaborou com inúmeros órgãos da Imprensa Espírita em quase todos os Estados e no exterior, especialmente Argentina e Portugal.

Constam de sua bibliografia os seguintes livros: “Personagens do Espiritismo”, de parceria com Antônio Lucena; “Crônicas Evangélicas”; “O Evangelho pede licença”; “Grandes vultos do Espiritismo”; “As maravilhosas parábolas de Jesus”; “Momentos de Prece”; “Os Padrões Evangélicos”; “Quando Jesus teria sido Maior?”; “Os quatro Sermões de Jesus”; “O Evangelho por dentro”; “Jesus Cristo, a Luz do mundo”; “Evangelho de Redenção”; “Os Casos Controvertidos do Evangelho e Evangelho misericordioso”.

No dia 19 de abril de 2001, em sua terra natal, regressou à Pátria Espiritual, tranquilo e sereno, na certeza de que bem cumpriu o seu mandato, como seguidor de Jesus.

 



[1] FEDERAÇÃO ESPÍRITA DO PARANÁ - http://www.feparana.com.br/topico/?topico=696

sexta-feira, 26 de setembro de 2025

O QUE ACONTECE COM NOSSO CORPO MOMENTOS ANTES DA MORTE[1]

 


André Biernath - Role, da BBC News Brasil em Londres - 18 agosto 2025

 

Sonolência, falta de fome ou de sede, pele seca e azulada, respiração barulhenta... A chegada da morte pode ser marcada por uma série de sinais — e saber identificá-los é uma das chaves para um fim mais suave e tranquilo.

Se a morte é a única certeza que temos na vida, chama a atenção uma generalizada falta de conhecimento sobre o que realmente acontece quando o fim está próximo.

Especialistas em cuidados paliativos ouvidos pela BBC News Brasil dizem que até mesmo médicos e outros profissionais de saúde muitas vezes não sabem como agir nesse momento e apelam a procedimentos que são supérfluos, que mais atrapalham que ajudam.

O processo conhecido como fase ativa da morte acontece durante os últimos dias, ou as últimas horas, de uma pessoa.

Obviamente, ele não é igual para todo mundo — e está geralmente relacionado às enfermidades de longo prazo, como o câncer e a demência, em que a pessoa passa meses, ou até anos, fazendo tratamentos, até chegar ao ponto em que os órgãos e sistemas que constituem o organismo não são mais capazes de manter a vida adiante.

Entenda a seguir quais são as manifestações mais comuns de uma morte iminente, por que elas acontecem e o que pode ser feito para que esse evento seja suave, com poucos incômodos e significativo para que vai (e também para quem fica).

 

O desligar da terra

A médica Ana Claudia Quintana Arantes, referência nos estudos sobre o envelhecimento, os cuidados paliativos e a morte no Brasil, faz uma analogia didática, quase poética, entre os estágios finais da vida e os quatro elementos clássicos da natureza: terra, água, fogo e ar.

Seguindo a linha de raciocínio dela, a primeira etapa da morte ativa é simbolizada pela terra, uma representação do material, do físico, daquilo que a gente toca e pisa.

A terra é o primeiro elemento que vai embora. Dá um cansaço estranho, que pesa nos olhos, diz a especialista, autora do livro “A Morte é um Dia que Vale a Pena Viver” (Editora Sextante).

Há também um peso no corpo. Por mais magrinho que esteja, você não consegue movimentar um braço, não consegue se virar na cama. Você precisa de ajuda, e quando essa ajuda vem, ela percebe que esse corpo, mesmo que frágil, mesmo que pequenino, pesa muito, pesa tanto quanto o mundo, complementa Arantes, que também atua no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo.

É comum então que a pessoa fique mais reclusa, sonolenta e entre num estado de inconsciência por alguns momentos.

Aqui, o corpo dela está começando a se desligar aos poucos, então alguns órgãos ou sistemas funcionam mais devagar e deixam de ser relevantes.

O médico Arthur Fernandes, secretário-geral da Academia Nacional de Cuidados Paliativos, compara esse momento ao apagar das luzes de um prédio, ou ao desligamento das máquinas que compõem uma fábrica.

Uma das primeiras partes do corpo a entrar nessa marcha lenta é o sistema digestivo.

A pessoa que entrou na fase ativa da morte tem naturalmente menos necessidade de comer ou beber água. E ela não sente mais fome ou sede como antes.

Com isso, a necessidade de ir ao banheiro também diminui aos poucos.

Outro sinal típico nesse momento é a alteração da pele, que se torna cada vez mais pálida e gelada, além de sofrer eventuais inchaços.

A pele também pode ganhar um tom azulado ou arroxeado, principalmente nas extremidades, como mãos e pés, além dos lábios. Isso é normal e indica que a circulação sanguínea também entrou num ritmo mais lento.

Mesmo que a pessoa esteja sonolenta, os médicos encorajam que familiares e amigos tenham momentos para conversar e tocar suavemente nas mãos e nos braços do ente querido.

Estudos indicam que sentidos como a audição e o tato continuam ativos, e esse contato pode representar uma fonte de conforto.

 

A água que se esvai

Seguindo a linha de raciocínio de Arantes, a segunda onda de transformações que acontece no corpo está relacionada à água.

O corpo resseca, então os olhos, os lábios e a boca ficam secos. A saliva, escassa, lista a médica.

Segundo a especialista, na maioria das vezes não há necessidade de aplicar soro na veia para reidratar o corpo.

Mas é possível aumentar o conforto e o bem-estar da pessoa prestes a partir com algumas medidas básicas, como molhar os lábios com algodão ou pano umedecido, aplicar colírio nos olhos e passar hidratantes na pele.

É importante que esses cuidados sejam sempre discutidos com os profissionais da saúde, para que todos estejam a par do que está sendo feito.

Outra preocupação comum durante a morte ativa tem a ver com a dor. Será que morrer dói?

Os especialistas dizem que, sim, algumas pessoas têm uma piora nos incômodos físicos, e alguns dos remédios usados deixam de funcionar como antes.

Nas últimas horas de vida, essa dor pode descompensar e o paciente fica agitado. Além do desconforto, também pode acontecer falta de ar, enjoo, vômitos..., responde Fernandes.

Mas os profissionais de saúde podem prescrever medicamentos mais fortes, como a morfina, que dão alívio.

Ou seja, a dor é uma possibilidade no fim. Mas a medicina tem caminhos para lidar com ela.

Tanto os profissionais da saúde quanto a família precisam saber dessas possibilidades e deixar tudo organizado, como ter por perto as doses de medicações e saber as melhores formas de aplicá-las, para evitar sintomas muito desagradáveis, complementa o médico.

 

A melhora da morte

Há também uma etapa da morte ativa que pode ser simbolizada pelo fogo.

Esse é o momento em que a chama da vida ganha o seu último fôlego.

Trata-se de um período comumente chamado de "melhora da morte" ou "a visita da saúde".

Aqui, os sintomas que a pessoa estava sentindo costumam melhorar, para a surpresa de quem acompanha a situação.

Ela sai daquele estado de letargia e inconsciência, volta a se comunicar, quer comer e parece mais animada, como se o quadro tivesse melhorado de forma repentina.

Mas Fernandes pondera que essa mudança não é uma coisa da água para o vinho: um paciente acamado por muito tempo não vai andar de novo, por exemplo.

Mas a volta de uma chama um pouco mais forte pode representar uma oportunidade única.

O paciente que comia muito pouco pode agora comer mais. Ele pode experimentar uma comida que gosta muito, para sentir o sabor. Ele sai daquela sonolência para rever uma pessoa querida, destaca o especialista.

Esse pode ser o momento em que ele consegue se despedir, dizer que ama, receber perdão e pedir desculpas para alguém, complementa ele.

Não raro, os familiares e a própria equipe de saúde querem usar esse momento para fazer exames ou intervenções, numa tentativa de ampliar o tempo de vida daquela pessoa.

Mas, segundo Arantes, essas medidas geralmente são supérfluas — e ocupam o tempo valioso que seria usado para encontros e despedidas.

Esse tempo deveria ser utilizado para exercer a autoridade, a autonomia de deixar a sua marca, a forma de estar no mundo, para as pessoas que você ama, aponta ela.

Esse é o momento de fazer declaração de amor. De pedir perdão, de perdoar. E reconhecer que nem sempre foi possível fazer o que se queria ter feito.

Essa é a chance expressar a sua essência, sem nenhuma reserva, reflete ela.

A melhora da morte costuma durar pouco tempo — e logo a chama volta a ficar fraca de novo.

 

O sopro da vida

Para fechar a lista dos elementos elaborada por Arantes, chegou a hora de entender como o ar se encaixa nessa história.

E ele simboliza uma das alterações mais aparentes do corpo na hora da morte.

A respiração sai do padrão que estamos acostumados. Às vezes, ela fica rápida e curta. Depois, longa e pausada. Às vezes, até parece que a pessoa deixou de respirar.

Outros eventos comuns nessa etapa é permanecer com a boca aberta, pelo relaxamento dos músculos que seguram a mandíbula, e uma respiração bem barulhenta, como se a pessoa estivesse roncando alto.

Isso acontece porque, naquele processo de desligamento das funções vitais, o corpo acumula alguns fluidos na garganta, que geram um ruído quando o ar passa por ali.

Esse sinal pode até ser incômodo para quem está vendo aquela cena, mas, segundo os médicos, não representa necessariamente uma aflição para quem está à beira da morte.

Em alguns casos, os profissionais da saúde podem indicar uma aspiração desses fluidos ou usam remédios que melhoram esse fluxo de entrada e saída do ar.

Arantes reflete que, quando nascemos, a primeira coisa que fazemos é respirar, ou puxar a primeira leva de ar que enche nossos pulmões.

E um de nossos últimos atos em vida é fazer justamente o movimento contrário: devolver o ar, numa expiração final.

Você pode entregar esse sopro sagrado que te foi dado quando nasceu. Se você fez bom uso desse sopro, se você teve uma vida que valeu a pena ser vivida, essa última expiração é um presente, acredita ela.

Daí esse fôlego cessa. E você tem um silêncio, relata a médica.

Nos segundos depois da última expiração, o coração para de bater. O cérebro apaga. E as células do corpo que ainda estavam ativas desligam aos poucos.

A vida daquele indivíduo chegou ao fim.

Arantes orienta às pessoas que testemunharam esse momento que informem os profissionais de saúde, caso eles não estejam por perto, mas não há necessidade de fazer tudo com pressa.

Permaneça por um momento nesse instante sagrado, que parece até fora do tempo normal, sugere ela.

Aquela pessoa que você ama parou de respirar, está livre da matéria. Ela deixa de existir naquele corpo e passa a viver no coração de todo mundo que a ama.

Já para Fernandez, a porção final da vida não deveria ser tratada como algo tão extraordinário — e é vital que a gente fale mais sobre isso.

É importante que as pessoas conversem sobre esse assunto em casa, para que a gente construa cada vez mais uma cultura que abraça a vida sem excluir a morte, pensa ele.

Até porque a morte não é o contrário da vida. A morte é o antônimo de um processo que a gente chama de nascimento.

Já a vida é tudo aquilo que está incluído dentro desse tempo bonito que a gente tem pra viver, conclui ele.

quinta-feira, 25 de setembro de 2025

OS ESQUECIDOS[1]

 


Miramez

 

 Comemoração dos mortos. Funerais

E os esquecidos, cujos túmulos ninguém vai visitar, também lá, não obstante, comparecem e sentem algum pesar por verem que nenhum amigo se lembra deles?

Que lhes importa a Terra? Só pelo coração nos achamos a ela presos. Desde que a aí ninguém mais lhe vota afeição, nada mais prende a esse planeta o Espírito, que tem para si o Universo inteiro.

Questão 322 / O Livro dos Espíritos

 

No Dia de Finados existem os esquecidos, aqueles cujos parentes não têm condições nem mesmo de se alimentar convenientemente, quanto mais de comprar flores, como lembranças para os que já se foram, e sentem vergonha de ir ao cemitério com as mãos limpas, visto que lá encontram multidão de outras pessoas com buquês e mesmo coroas caríssimas.

Os que chamamos de desvalidos da sorte não comparecem na mesma situação dos seus ex-familiares, a não ser os Espíritos que já se libertaram das ilusões. Esses se aproximam dos que ali choram para os consolar e alegrar nas suas tarefas de cada dia. Os ricos que ali se postam, derramando lágrimas e doando flores, também são visitados quase sempre pelos seus entes queridos, que já se foram para o além. Muitos não atendem aos pensamentos das famílias, tendo uma espécie de alergia espiritual por cemitérios, procurando esquecer os restos mortais que ali deixaram.

É, pois, uma profusão de entidades movimentando esse dia, são encontros e mais encontros, choros e mais choros, que pouco significam para o adiantamento dos Espíritos. Esperemos que, no futuro, todo o dinheiro gasto em coroas e ramalhetes de duração efêmera seja mais bem utilizado, deixando-se as flores em suas hastes, fincadas na terra, em sua beleza natural.

Nesse dia, infelizmente, poucos trabalham, ficando a descansar sem necessidade e a chorar inconvenientemente. Esse procedimento demonstra ignorância das leis divinas, sendo um erro que se despede do século vinte, mais um laço inferior que se desamarra dos corações em trevas.

Talvez os esquecidos estejam em melhores condições que os bem-lembrados. Velas e mais velas são acesas nos túmulos vazios que pouco significam para o Espírito. Não será o fogo brando de uma vela que irá melhorar suas condições espirituais. A melhor vela para os que se foram é a prece sentida ao Senhor, a transformação interna dos que ficaram. Essa luz tem o poder de atingir todos os corações dos familiares de um lado e de outro da vida, porque inspira aos que não realizaram sua renovação íntima para fazê-la nos caminhos que percorre, mesmo no mundo espiritual.

Quem não deseja se adentrar na área do Cristo para alcançar Deus na consciência? Todos foram feitos iguais, com o mesmo interesse de liberdade e de amor, e para esse despertar veio Jesus, enviado diretamente da Luz Maior, para que os homens e os Espíritos humanos acordem do sono milenar das paixões e vivam as virtudes que se enraízam nas leis divinas do divino amor.

Todos nós precisamos nos conscientizar de que não existe alguém esquecido da Bondade Superior; todos nós recebemos o que merecemos, onde estivermos. O homem deste século está sendo chamado e escolhido para a luz da compreensão em Cristo. O Evangelho está divulgado por todos os países e dialogado por todos os povos, para que o interesse impulsione os corações e as criaturas passem a vivê-lo, ou, pelo menos, se esforcem para tal.

Não existem esquecidos, repetimos, todos estamos e continuamos vivendo no seio do Criador. Se sofremos, é porque o sofrimento tem o poder de nos acordar para a luz, que nos mostra os caminhos da felicidade.



[1] FILOSOFIA ESPÍRITA – Volume 7 – João Nunes Maia

quarta-feira, 24 de setembro de 2025

PESQUISA EM PSICOCINESE[1]

 


Dr. Michael Duggan

 

Este artigo descreve a evolução dos estudos experimentais sobre a interação mente-matéria, comumente chamada de psicocinese (PK). Aborda desde os primeiros estudos com dados até os efeitos em geradores de números aleatórios (RNGs), tanto em laboratório quanto em campo. Conclui com uma descrição de investigações recentes sobre o papel da consciência em processos quânticos, como o emaranhamento de fótons. Evidências meta-analíticas são apresentadas para compreender a força das descobertas. Considerações teóricas também são abordadas.

 

Fundo

Apesquisa de PK abrange uma ampla gama de fenômenos psi aparentes, desde os primeiros estudos de médiuns físicos da era vitoriana, como Daniel Dunglas Home[2], investigações de poltergeists, como o caso Enfield[3], até a influência em sistemas biológicos, de enzimas[4] à fisiologia humana[5], e perturbações em sistemas não vivos, como o comportamento de dados rolando[6] e geradores de números aleatórios[7]. O comportamento estatístico do sistema é observado em preferência a manifestações visíveis, como uma colher entortada, e a evidência consiste em efeitos cumulativos de muitos estudos em vez de estudos únicos.

 

Lançamento de dados

Em 1933, Joseph Banks Rhine iniciou uma pesquisa psi experimental no então Laboratório de Psicologia da Universidade Duke. Naquele mesmo ano, ele foi abordado por um jovem jogador que acreditava que às vezes podia influenciar o resultado do lançamento de um dado simplesmente desejando-o[8]. Rhine estava inicialmente cético, e os resultados dos testes informais foram inexpressivos. Mas ele se encantou com a viabilidade desse método e lançou um experimento formal com 25 indivíduos tentando influenciar a queda de um par de dados. Eles foram instruídos a desejar que a soma excedesse 7. A probabilidade de isso ocorrer por puro acaso é de 5 em 12, ou 41,7%: em 562 rodadas de 12 tentativas cada. De fato, eles obtiveram uma pontuação média de 5,53 vezes por rodada, ligeiramente acima da expectativa de acaso, mas estatisticamente altamente significativa[9].

Buscando uma explicação convencional, Rhine especulou que a corrosão adicional em faces de alto valor poderia enviesar a distribuição de pesos, fazendo com que estes aparecessem com mais frequência. Para eliminar essa possibilidade, no experimento seguinte[10], nove participantes foram solicitados a determinar um total inferior a 7, ou exatamente 7, para garantir que isso funcionaria contra qualquer efeito de enviesamento. No entanto, os resultados foram novamente muito significativos, sugerindo que o viés dos dados não era a explicação para os efeitos de probabilidade acima em nenhum dos experimentos.

Rhine continuou a experimentar o PK com dados sob condições mais rigorosas, por exemplo, usando dados de cassino de alta qualidade e escolhendo aleatoriamente a face desejada. Para eliminar qualquer possibilidade de influência física direta, foram introduzidas máquinas que lançavam os dados, os liberavam automaticamente e fotografavam o resultado. Com o tempo, o processo foi padronizado para uma sequência de 24 lançamentos, onde o número esperado de acertos seria 4 (1/6*24).

Em 1943, Rhine publicou uma visão geral de 20 experimentos realizados ao longo de 9 anos[11].  Os primeiros foram marcados por falhas, mas, no geral, os resultados foram significativos. Porém, mais evidente do que a pontuação acima da probabilidade foi o surgimento de um padrão inesperado nos dados. As planilhas de registro foram divididas em trimestres, e uma análise detalhada revelou uma queda acentuada nas taxas de acerto à medida que cada trimestre avançava. Esse "efeito de declínio trimestral" foi extremamente significativo, na proporção de 100 milhões para um, e, sendo difícil de explicar em termos de erros de registro ou artefatos de projeto, foi considerado por Rhine como uma forte evidência de um efeito mente-matéria.

Esse trabalho continuou no laboratório Duke, com os controles sendo ainda mais reforçados e variáveis ​​que supostamente modulam o efeito, como o método de tombamento e o número de faces do dado, sendo examinadas. 

Infelizmente, um artigo mordaz do psicólogo Edward Girden[12], em 1962, que apontava fragilidades nos trabalhos iniciais – que já haviam sido corrigidos – prejudicou consideravelmente a pesquisa nessa área, à medida que os parapsicólogos voltavam sua atenção para outras áreas. Isso fomentou a percepção de que se tratava de uma área de pesquisa infrutífera e moribunda. Seria necessário o desenvolvimento de uma maneira revolucionária de analisar grandes quantidades de dados experimentais em um todo unificado – um processo denominado meta- análise–antes que a importância dos dados cumulativos de dados farmacocinéticos fosse revelada.

 

Meta-análise do trabalho de Dice-PK

A meta-análise foi aplicada pela primeira vez a descobertas parapsicológicas em 1940[13], mas foi aplicada pela primeira vez ao trabalho com dados em 1990 com um artigo intitulado “Efeitos da Consciência na Queda de Dados” por Dean Radin e Diane Ferrari[14]. Eles rastrearam um total de 148 estudos realizados por 39 pesquisadores envolvendo cerca de 2,5 milhões de lançamentos de dados e calcularam o nível coletivo de significância em um astronômico 1070 para um (um dez seguido por 70 zeros). Para controlar artefatos causados ​​por metodologia ruim, eles então analisaram os 69 estudos mais bem controlados, encontrando um efeito estatístico de um milhão para um contra o acaso. Ponderar todos os 148 estudos por qualidade reduziu o tamanho do efeito pela metade, mas o efeito ainda foi altamente significativo, confirmação de que não foi o resultado de relatos seletivos ou do trabalho de alguns experimentadores bem-sucedidos.

 

Geradores de números aleatórios (RNGs)

No início da década de 1970, uma nova linha de pesquisa de PK automatizada foi iniciada por Helmut Schmidt, um físico e ex-pesquisador líder da Boeing que havia se juntado ao Instituto de Parapsicologia (como o laboratório de Parapsicologia Duke havia sido renomeado). Em um experimento inicial, um participante era apresentado a uma caixa de metal, com cerca de um pé quadrado, no topo da qual um círculo de nove lâmpadas piscava em sequência. Sua tarefa era tentar influenciar a sequência de luzes em uma direção específica - no sentido horário ou anti-horário, durante as execuções experimentais. Este foi o início de um novo paradigma na pesquisa psi que envolvia influenciar eventos atômicos. O visor da lâmpada era conectado a um gerador de números aleatórios (RNG) em outra sala. O RNG continha um contador que oscilava entre um e dois a uma taxa de um milhão de vezes por segundo: quando um elétron de uma amostra de estrônio-90 radioativo dentro da caixa era detectado por um tubo Geiger, o contador na posição um ou dois, fazendo com que o visor girasse no sentido horário ou anti-horário, respectivamente[15].

Este experimento piloto produziu resultados opostos às expectativas: em 27.648 testes binários (216 execuções de 128), os dados estavam quase significativamente abaixo do acaso. Tais efeitos de "psi ausente" são comuns em parapsicologia e frequentemente sugerem processos ou condições subjacentes que não foram inicialmente planejados ou esperados. Para seu segundo experimento, Schmidt decidiu prever uma pontuação negativa, recrutando[16]  pessoas com pontuação negativa do primeiro. O resultado mostrou probabilidades altamente significativas contra o acaso de mais de mil para um, e uma taxa de pontuação de 49%, contra os 50% esperados.

Nos anos seguintes, Schmidt relatou um grande número de estudos com o objetivo de desvendar o mistério das interações mente-matéria. Tais estudos são conhecidos como "orientados a processos", pois visam compreender a base de um efeito, em vez de simplesmente acumular mais evidências de que um efeito existe (pesquisa orientada a provas).

Em um desses estudos, Schmidt descobriu que a velocidade com que um RNG opera influencia o nível de sucesso, com velocidades mais altas produzindo taxas de pontuação mais baixas[17]. Em outro experimento, alternar entre um RNG complexo e um simples – sem o conhecimento do sujeito – não fez diferença nos resultados, com resultados igualmente significativos em ambos. Ele concluiu que a habilidade de PK é um fenômeno orientado a objetivos. Desde que o sistema seja fundamentalmente aleatório, as especificações técnicas fazem pouca diferença no resultado; o fator determinante é o estado psicológico do participante. Schmidt denominou isso de Princípio da Equivalência[18].

Se tivermos dois geradores [estruturalmente diferentes, mas] verdadeiramente aleatórios, operando de forma que os geradores sejam fisicamente indistinguíveis do exterior, então um esforço de PK afeta [cada] sistema no mesmo grau, ou seja, os sistemas também são indistinguíveis em sua resposta a um esforço de PK.

Ele continua

A PK pode não ser entendida corretamente em termos de algum mecanismo pelo qual a mente interfere na máquina de uma forma inteligentemente calculada... pode ser mais apropriado ver a PK como um princípio orientado a objetivos, que visa com sucesso um evento final, não importa quão complexas sejam as etapas intermediárias.

Ao estender o Princípio da Equivalência para operar em diferentes escalas de tempo, Schmidt inaugurou uma nova linha de pesquisa: a da psicocinese retroativa, ou retro-PK. Schmidt argumentou que, se os efeitos da PK fossem verdadeiramente orientados a um objetivo, o momento da geração do alvo não deveria constituir barreira à sua operação, sendo seu raciocínio fortemente influenciado pelas teorias da mecânica quântica (ver abaixo). Para testar isso empiricamente, em seu primeiro experimento de retro-PK, conduzido em 1976, metade da saída do RNG foi apresentada como cliques audíveis por meio de fones de ouvido. O participante não sabia que a outra metade era de um RNG pré-gravado: a saída havia sido gravada em fita um ou dois dias antes. Nesse experimento engenhoso, e sob condições psicológicas idênticas, a taxa de acerto foi a mesma de antes, com probabilidades contra o acaso de pouco menos de mil para um[19].

O próximo experimento de Schmidt buscou capitalizar esse efeito recém-descoberto intercalando repetidamente cliques pré-gravados com cliques em tempo real. Aqui, a exposição aos cliques pré-gravados resultou em uma taxa de acerto várias vezes maior do que com os cliques em tempo real, evidência de um efeito aditivo da consciência na mesma saída RNG[20].

Schmidt continuou, ao longo das décadas de 1970 e 1980, a acumular evidências que apoiavam a operação da retro-PK, frequentemente em colaboração com outros. A probabilidade geral contra o acaso para o conjunto de trabalhos era de cerca de 10.000 para 1, um alto nível de significância alcançado em condições bem controladas[21].

Percebendo que os cientistas tradicionais não seriam facilmente persuadidos, Schmidt adaptou sua metodologia pré-gravada para incorporar observadores céticos. Nesses experimentos de alta segurança, o observador externo mantinha uma cópia do resultado pré-gravado e determinava aleatoriamente quais execuções Schmidt usaria. As execuções não utilizadas serviam como controle. Uma vez concluído o experimento, os resultados eram comparados e sempre se verificava que coincidiam. Cinco estudos desse tipo, conduzidos no início da década de 1990, produziram probabilidades gerais contra o acaso de cerca de 4.000 para 1[22].

Como físico, Schmidt não hesitou em especular sobre a base teórica para esses resultados. De acordo com a interpretação padrão de Copenhague da física quântica, o conjunto nebuloso de valores potenciais para um dado processo quântico torna-se "fixo" em valores definidos assim que uma medição ocorre no sistema. Não há distinção entre um dispositivo de medição e um observador humano consciente: ambos devem "colapsar o vetor de estado" e fixar a realidade. Schmidt, por outro lado, argumentou que a mente humana era um elemento necessário para que o colapso ocorresse. Em um experimento retro-PK, os cliques gerados pelo gerador de números aleatórios um dia ou uma semana atrás existem simplesmente como uma mistura ou "superposição" de probabilidades: somente quando alguém ouve a saída é que o sistema colapsa para um determinado valor, um clique esquerdo ou direito, representando um ou dois produzidos pelo RNG.

Hoje, muitos pesquisadores em parapsicologia vão além, argumentando que, para explicar os vieses estatísticos em experimentos com RNG, a consciência precisa injetar informações no sistema – direcionando a realidade, por assim dizer. O estado psicológico do sujeito é de extrema importância, em oposição às especificações técnicas do RNG, de acordo com o Princípio da Equivalência de Schmidt. (Mais sobre questões teóricas abaixo.)

Schmidt foi um pesquisador prolífico e bem-sucedido. Ao longo de três décadas, publicou cinquenta estudos de pesquisa em mais de vinte publicações, das quais 75% foram independentes e metade altamente significativas[23]. O que explicaria o sucesso nesse nível?

Uma possível razão é que Schmidt buscou sujeitos promissores, como médiuns e pessoas que haviam se saído bem em experimentos anteriores. Para identificar potenciais pontuadores altos, ele realizou uma pré-triagem em testes piloto. Ele também era bom em criar uma atmosfera acolhedora e encorajadora, condições amplamente reconhecidas como propícias à psi. Essa abordagem é apoiada por alguns pesquisadores atuais, que presumem que a habilidade psi é encontrada em um segmento restrito da população. De acordo com essa visão "elitista", o efeito dos testes em massa na população em geral é meramente enfraquecer os resultados obtidos por poucos talentosos. Em contraste, os defensores da abordagem universalista presumem que a habilidade psi é normalmente distribuída dentro da população, e os "sujeitos especiais" de Schmidt representam a extremidade final da curva de distribuição (veja abaixo).

 

Replicações Schmidt

O resultado de Schmidt estimulou a comunidade parapsicológica a replicar seus esforços. Alguns seguiram seu caminho elitista, mas a maioria preferiu a abordagem universalista, recrutando entre a população em geral ou, mais comumente, estudantes de psicologia. No entanto, descobriu-se rapidamente que isso resultava em resultados erráticos e tamanhos de efeito baixos, e por isso foi combinado com a pesquisa de processos para descobrir as condições ideais para a manifestação das interações mente-matéria. 

Como as condições psicológicas do sujeito parecem primordiais, este tem sido um tema central de pesquisa em estudos de Farmacocinéticos (FC), com a motivação emergindo como talvez o ingrediente mais importante. Um excelente estudo nessa área foi conduzido por Broughton e Perlstrom em 1987 na Foundation for the Research of the Nature of Man (FRNM) (hoje Rhine Research Institute). A dupla disfarçou um teste de FC como um jogo de dados competitivo (basicamente uma máquina Schmidt RNG conectada a um computador) e convidou estudantes locais da Universidade Duke para jogar contra seus arquirrivais da vizinha Universidade da Carolina do Norte (UNC) – uma competição que provavelmente seria acirrada.

Foi dito aos participantes que fariam um aquecimento seguido de uma partida competitiva (na verdade, ambas foram disputadas contra o RNG). Contrariamente à expectativa dos pesquisadores, o elemento competitivo fez pouca diferença no resultado. No entanto, eles também pontuaram indivíduos em medidas padrão de personalidade e descobriram que aqueles com pontuação alta para ansiedade perturbaram o RNG, produzindo resultados abaixo do esperado, com ausência significativa de psi. Como era de se esperar, isso ocorreu apenas na condição competitiva, não no aquecimento[24].  Tal resultado faz todo o sentido intuitivo, quando se leva em conta a natureza indutora de ansiedade das situações competitivas: aqueles naturalmente ansiosos se tornarão ainda mais ansiosos sob pressão e influenciarão o RNG negativamente, se tais habilidades forem genuínas. 

Outras evidências de influências motivacionais — em experimentos com dados, assim como em outras áreas de pesquisa psi — são encontradas nos efeitos de declínio, onde os sujeitos começam bem, mas veem um declínio gradual no desempenho à medida que o tédio e a fadiga se instalam. Esse efeito foi encontrado em experimentos individuais, em séries experimentais e até mesmo em programas de pesquisa inteiros. 

Pesquisadores também relataram que meditadores são excelentes sujeitos, com a duração da experiência em meditação tendendo a se correlacionar com o nível de habilidade de PK. De forma mais geral, uma mentalidade relaxada, porém engajada – denominada "esforço passivo" – parece crucial, tendo sido confirmada a tal ponto que pesquisadores rotineiramente criam condições que possam provocá-la.

 

PEAR (1979-2007)

Outra abordagem consiste simplesmente em coletar grandes quantidades de dados de centenas de indivíduos ao longo de várias décadas, como foi feito na Universidade de Princeton. Em 1978, Robert Jahn, então professor de engenharia aeroespacial, concordou com a proposta de um projeto estudantil para projetar um gerador de números aleatórios capaz de registrar a intenção humana. Inicialmente cético, Jahn ficou intrigado quando o empreendimento apresentou evidências positivas a favor de um efeito, e o testou ele mesmo, obtendo também resultados positivos. Jahn viu isso como um problema de engenharia que não podia ser ignorado e fundou o Princeton Engineering Anomalies Research  Laboratory (PEAR). Ao longo de quase três décadas, ele e sua equipe acumularam enormes quantidades de dados experimentais que documentam de forma persuasiva a existência de efeitos mente-matéria a partir de diversos programas de pesquisa[25].

A principal fonte foi o experimento "Benchmark". Tratava-se de um RNG de alta qualidade equipado com sensores e alarmes ambientais, calibrado extensivamente antes, durante e após a execução dos experimentos. No centro do RNG estava um diodo Zener que produzia saltos quânticos aleatórios. Essa atividade era amostrada 200 vezes por segundo, de modo que o valor médio por teste fosse 100. O laboratório utilizou um protocolo tripolar rigoroso, no qual os operadores (sujeitos) realizavam testes de "intenção" mirando tanto alto quanto baixo, e estes eram intercalados aleatoriamente com testes de controle. Isso garantiu que qualquer influência ambiental no RNG fosse anulada nos testes de intenção e detectada nos testes de controle.

Utilizando essa metodologia rigorosa, a equipe do PEAR conduziu dezenas de milhares de testes ao longo dos anos e, embora o desvio fosse minúsculo – da ordem de 1 bit em 10.000, as probabilidades concatenadas aumentaram para mais de um trilhão para um contra o acaso. O efeito PK também foi encontrado em estudos de influência remota, nos quais operadores conseguiram influenciar as máquinas à distância, em alguns casos a milhares de quilômetros de distância. Os participantes foram recrutados na população local, embora muitos dos dados positivos tenham sido, na verdade, contribuídos por apenas dois indivíduos. O laboratório do PEAR também descobriu características secundárias nos dados, como efeitos de posição e declínio, diferenças com base no sexo e o efeito do pareamento de operadores – casais de sexos opostos apresentaram melhor desempenho. 

Em meados da década de 1990, o banco de dados estava bem estabelecido, e o sucesso motivou uma replicação em larga escala[26], em consórcio, entre três laboratórios alemães e o laboratório PEAR. Os efeitos foram menores e estatisticamente insignificantes (veja abaixo), embora muitos dos efeitos secundários tenham sido replicados.

A PEAR também utilizou outros dispositivos, notadamente a Random Mechanical Cascade[27], 26 um dispositivo vertical de 2,7 metros que lançava 9.000 pequenas bolas de poliestireno sobre uma grade de 336 pinos de náilon uniformemente espaçados e as coletava em recipientes digitais de contagem na parte inferior. Os operadores eram incentivados a influenciar a queda das bolas para a esquerda ou para a direita. Os resultados estavam, em geral, de acordo com os dados da RNG, minúsculos, mas altamente significativos, e com efeitos secundários semelhantes.

 

Meta-Análise

Em 1987, um grande número de estudos sobre RNG havia sido realizado, o suficiente para realizar uma meta-análise significativa. Radin e Nelson vasculharam a literatura existente[28], incluindo anais de congressos (uma rica fonte para recuperação de estudos), e identificaram 597 estudos em 152 artigos conduzidos por 68 pesquisadores. O efeito geral foi astronomicamente significativo, com uma proporção de 1035 para 1 (10 seguido de 35 zeros).

Para controlar estudos mal planejados, Radin e Nelson codificaram a qualidade de cada estudo, mas não encontraram relação entre o resultado do estudo e as pontuações de qualidade. Em seguida, testaram o efeito "gaveta de arquivo", determinando que seriam necessários 54.000 estudos não relatados e não significativos para reduzir os resultados gerais ao nível do acaso (cerca de 90 vezes o número de estudos publicados).

Radin e Nelson realizaram uma segunda meta-análise em 2000 que incluiu 176 estudos adicionais[29]. Aqui, o trabalho PEAR em larga escala, cerca de 258 estudos e as replicações do consórcio PEAR foram compactados em pontos de dados únicos, para evitar que esses conjuntos de dados influenciassem excessivamente os resultados da meta-análise. Os 176 novos estudos – dos quais 92 foram realizados após 1987, a data limite para a meta-análise de 1989 – foram combinados com os 339 estudos de 1989 para produzir um total de 515 estudos. O efeito geral foi 0,7% acima do acaso, pequeno, mas novamente astronomicamente significativo, com chances de menos de 1050 de que poderia ter ocorrido por acaso. Verificou-se que a qualidade metodológica melhorou substancialmente ao longo do tempo, mas, ao contrário das expectativas céticas, isso não levou a uma mudança significativa no resultado.

Uma terceira meta-análise pelos psicólogos Bosch, Steinkamp e Boller foi publicada no prestigiado periódico Psychological Bulletin em 2006[30]. Ela   encontrou um efeito geral bastante reduzido de cerca de 4 sigma, 10.000 para 1. Os autores também alegaram ter encontrado evidências de relatos seletivos, que, quando levados em consideração, anulariam até mesmo esse nível de significância.

Essa descoberta foi criticada em um artigo do mesmo ano por Radin, Nelson, Dobyns e Houtkooper[31]. Eles apontaram que Bosch et al. confirmaram muitas de suas próprias descobertas anteriores: que os estudos existentes fornecem evidências estatísticas para a psicocinese, que as evidências são geralmente de alta qualidade metodológica e que os tamanhos de efeito são distribuídos de forma heterogênea. No entanto, eles rejeitaram a afirmação dos autores de que a heterogeneidade é atribuível a relatos seletivos, que eles atribuíram a um mal-entendido. Eles escrevem:

Bösch et al. presumiram que o tamanho do efeito é totalmente independente do tamanho da amostra. Para esses experimentos, essa suposição é incorreta; ela também garante heterogeneidade. Os autores sustentam que o relato seletivo é uma explicação implausível para os dados observados e, portanto, que esses estudos fornecem evidências de um efeito psicocinético genuíno.

Radin et al. também apontaram que a meta-análise de Bosch impôs critérios rigorosos, excluindo estudos de farmacocinética animal e impondo restrições estatísticas. De 372 relatórios, apenas 117 foram selecionados, menos de um terço das meta-análises anteriores. Eles consideraram essas exclusões questionáveis, introduzindo fatores importantes que o leitor não seria capaz de avaliar.

Ainda mais preocupante é que, quando um estudo extremamente amplo e especializado, o "Mega-REG", do laboratório PEAR, que utilizou taxas de contagem extraordinariamente altas (até um milhão de bits por segundo), é incluído, o efeito meta-analítico geral desaparece completamente (na verdade, torna-se significativamente negativo ). Tal impacto da inclusão de poucos estudos é um sinal de alerta, mas indicadores mais alarmantes foram encontrados.

O físico e psicólogo alemão Wilfried Kugel[32] solicitou mais detalhes aos autores da meta-análise e identificou falhas potencialmente graves. Por exemplo, ele descobriu que eles haviam incluído acidentalmente dados de controle de PES (Percepção Extra Sensorial), que não seriam considerados significativos, e também eram culpados pela seleção tendenciosa de resultados negativos extraídos de experimentos geralmente positivos, uma prática que reduziria significativamente o tamanho do efeito estimado.

Em suma, a única meta-análise RNG que apresenta efeitos fracos é, ela própria, vulnerável à suspeita de metodologia inadequada por parte dos analistas, e não a deficiências inerentes aos dados reais. Mas a disparidade, que também apareceu em outras áreas da pesquisa psi experimental, destaca a fragilidade da meta-análise como ferramenta para identificar de forma confiável a existência de um efeito. Para lidar com isso, parapsicólogos estão agora elaborando meta-análises prospectivas, que lidam com questões de critérios de inclusão e medidas estatísticas antes da realização dos experimentos.

 

Meta-análise Retro-PK

Os estudos de retro-PK de Schmidt não foram incluídos em nenhuma dessas meta-análises, visto que o protocolo é substancialmente diferente. No entanto, estes também constituem fortes evidências de PK, principalmente porque o controle é necessariamente mais rigoroso do que os ensaios clínicos regulares de PK em tempo real, tendo os alvos sido gerados antes da realização do ensaio. Bierman compilou 26 experimentos de retro-PK conhecidos, e o efeito geral foi de um sigma de 5,31, ou seja, uma significância de cerca de 20.000.000 para 1.

Este estudo também revelou uma enorme variação entre os tamanhos de efeito positivo e negativo, o que é altamente significativo, com chances de 630 bilhões para um de ocorrer por acaso[33].  As razões para isso não são bem compreendidas, mas parece que os efeitos retro-PK são especialmente sensíveis a fatores que afetam a direcionalidade, como o estado psicológico dos participantes.

 

Hidden-RNG: Pesquisa PK Implícita e de Campo

Os testes RNG-PK descritos até agora são volitivos: o sujeito faz um esforço consciente para influenciar a saída do RNG. Uma área separada da pesquisa mente-matéria utiliza RNGs para captar influências inconscientes. Os primeiros experimentos desse tipo foram baseados na teoria da Resposta Instrumental Mediada por Psi (PMIR) de Rex Stanford, desenvolvida em 1974[34]. Esta teoria tenta explicar experiências psi espontâneas através do prisma da experimentação cuidadosa: Stanford formulou a hipótese de que nossos desejos e necessidades utilizam inconscientemente nossa capacidade psi para atingir seus objetivos.

A teoria tem três pilares principais:

§  as pessoas podem usar a percepção extra-sensorial em experimentos sem qualquer consciência de que o estão fazendo e sem qualquer intenção de usá-la

§  A PES pode ser usada, sem intenção ou consciência, para satisfazer necessidades

§  PK, como PES, também pode ser usado, sem intenção ou consciência, para satisfazer necessidades

Stanford encontrou fortes evidências de que a percepção extra-sensorial pode ser usada de forma não intencional para satisfazer necessidades. Mas e quanto à psicocinese?

Em um experimento engenhoso[35], 40 homens foram testados quanto à sua capacidade de usar PK involuntariamente. Primeiro, eles foram solicitados a realizar um teste de PK consciente e volitivo em uma máquina do tipo Schmidt RNG. Em seguida, foram informados de que fariam um experimento psicológico sobre a coordenação do movimento, conhecido como rastreamento do rotor de perseguição; uma tarefa tediosa que levava até 45 minutos. Eles não sabiam que um RNG havia sido instalado nas proximidades, calibrado para produzir dez pulsos aleatórios em um dos seis canais diferentes a cada dez segundos. Se a máquina produzisse sete ou mais pulsos em um canal por um determinado período de dez segundos (um evento extremamente improvável), a tarefa era encerrada e o indivíduo era recompensado com a exibição de material erótico. Este é um teste de psicocinese baseada na necessidade, em que o sujeito recebe inconscientemente uma oferta de um meio de se livrar de uma tarefa tediosa.

Os resultados foram claros. Esperava-se que pouco mais de 7% dos indivíduos alcançassem esse objetivo por acaso, mas, na verdade, 20% o fizeram – uma evidência poderosa de que necessidades humanas inconscientes podem se manifestar em sistemas aleatórios. Esses tipos de experimentos foram replicados por Stanford e outros. (O modelo de psi onipresente que pode se manifestar involuntariamente é discutido em First Sight: ESP and Parapsychology in Everyday Life, de James Carpenter[36])

 

RNGs no campo

Se um RNG consegue registrar as necessidades inconscientes de um indivíduo, será que consegue fazer o mesmo com grupos de pessoas envolvidas em uma única atividade altamente coesa? Roger Nelson, da PEAR, desenvolveu RNGs portáteis para tentar detectar flutuações anômalas em locais e eventos religiosos e espirituais, como as pirâmides, festivais pagãos e similares. Como ele previu, os dispositivos frequentemente registravam desvios de comportamento aleatório, geralmente durante períodos de máximo envolvimento emocional. Ele encontrou o efeito em shows de rock, reuniões políticas e retiros de meditação, eventos que cultivavam a atenção concentrada de um grande grupo de pessoas[37].

Nos anos seguintes, a tecnologia possibilitou estudos de RNG portáteis ainda mais acessíveis, e outros grupos replicaram o trabalho inicial de Nelson. Mais de cem estudos de RNG de campo acumularam evidências convincentes de efeitos coesivos de grupo. Por exemplo, Dean Radin treinou grupos de 20 pessoas para se conectarem psicologicamente entre si ouvindo batidas binaurais e, durante essas sessões, testou os efeitos coletivos nos RNGs, encontrando uma correlação entre o nível de coerência do grupo registrado subjetivamente e a saída do RNG, com probabilidades de 120 para 1 contra o acaso[38].

 

Projeto Consciência Global

The Global Consciousness Project (GCP) evoluiu a partir do trabalho de campo com geradores de números aleatórios (RNG), baseado na hipótese de que a energia gerada por certos eventos importantes poderia ser captada por geradores de números aleatórios. Foi iniciado em 1998, após uma pesquisa realizada um ano antes, na qual geradores de números aleatórios (RNGs) nos EUA e na Europa registraram, coletivamente, desvios significativos do comportamento aleatório durante o funeral da Princesa Diana. Ao final, um total de 75 RNGs em todo o mundo estavam enviando dados para um servidor em Princeton, mantido por Nelson.

Muitos exemplos de eventos mundiais que geraram tais anomalias podem ser encontrados no site do GCP http://noosphere.princeton.edu/ . Talvez o mais impressionante seja o dos ataques de 11 de setembro ao World Trade Center, quando o GCP registrou comportamento não aleatório ao longo de vários dias. Os RNGs começaram a se desviar várias horas antes do primeiro avião atingir a rede, sugerindo algum tipo de influência precognitiva coletiva na rede.

O projeto GCP foi encerrado após registrar exatamente 500 eventos globais. O foco então mudou para a análise dos dados para explicar a natureza do efeito. O nível geral de significância é superior a 7 sigma, cerca de um trilhão para um[39]. Características estruturais subjacentes foram identificadas, como uma correlação de distância inversa entre RNGs, com maior separação resultando em correlações mais fracas; e uma tendência para desvios mais fortes ocorrerem durante o dia, quando as pessoas estão acordadas.

 

Pesquisa do Festival Burning Man

The Institute of Noetic Sciences (IONS) realizou pesquisas durante o evento anual Burning Man, um festival de 8 dias no deserto de Nevada que atrai cerca de 50.000 frequentadores, futuristas e gurus da tecnologia. A área se transforma em uma paisagem onírica de arquitetura surreal, exposições bizarras e meios de transporte inusitados, culminando com a queima de um enorme homem de madeira e um templo. Os pesquisadores previram que o enorme foco de atenção e liberação seria um teste adequado para efeitos de RNG de campo. Ao longo de cinco anos, a partir de 2012, eles coletaram dados de RNG durante os principais eventos, usando uma variedade de protocolos e tipos de RNG, e relataram evidências significativas de efeitos semelhantes aos de campo. Eles também encontraram efeitos intrigantes com base na distância e no tempo.

 

RNGs portáteis

O hardware de um telefone pessoal pode potencialmente servir como um RNG portátil, abrindo a possibilidade de milhões desses dispositivos estarem funcionando simultaneamente. Isso está sendo explorado pelo projeto Entangled , de Adam Curry , baseado em um aplicativo para celular. Uma vez desenvolvido, este experimento em massa investigará questões relacionadas aos efeitos da consciência coletiva; também permitirá que os usuários monitorem sincronicidades individuais com ocasiões emocionalmente significativas. Esses dados complementarão – e provavelmente eventualmente eclipsarão – os do trabalho anterior de campo com RNG e do Global Consciousness Project [40].

 

Pesquisa atual usando RNGs

Vários grupos estão atualmente usando RNGs para complementar seus programas de pesquisa, mas agora geralmente como um complemento a outras abordagens, em vez de como foco único. Os holandeses

O grupo de Groningen, liderado por Jacob Jolij, realizou uma replicação em larga escala para testar sua observação anterior de que a precisão era maior em alvos gerados aleatoriamente do que em alvos gerados pseudoaleatoriamente. O resultado foi estatisticamente significativo, com peso adicional do experimento previamente registrado[41].

O professor Markus Maier, do University of Munich’s Emotion and Motivation laboratory, realizou pesquisas sobre PK, além de pesquisas sobre precognição. Seu grupo questiona o que acontece quando grupos especiais são testados sob condições que manipulam a necessidade, ecoando a pesquisa PMIR de Rex Stanford (acima). Em um estudo, Maier e Deschamps expuseram fumantes a material relacionado ao tabagismo, em que as imagens são controladas por um RNG. Isso resultou em um enviesamento significativo do RNG, produzindo menos imagens do que o acaso poderia prever. Os autores explicam isso pelo modelo de "transgressão emocional": os impulsos inconscientes do sujeito tentam manipular o eu consciente para que ele deseje exatamente o que o inconsciente deseja; nesse caso, reduzir a quantidade de material sobre o fumo gerará maior desejo de fumar.

Este experimento inicial foi altamente significativo, atingindo um sigma de 4 (cerca de 10.000 para 1). Em uma tentativa de replicação, o efeito desapareceu, embora o resultado agregado ainda fosse apenas significativo, com um sigma de 2 (tais declínios são comuns em pesquisas psi, veja abaixo). Maier modelou seus dados de vários experimentos e encontrou uma oscilação harmônica, na qual o efeito parece se recuperar após um declínio inicial, mas em menor grau do que antes[42].

Outros grupos utilizam geradores de números aleatórios como "sensores" adicionais em pesquisas sobre cura. Por exemplo, Radin encontrou desvios altamente significativos na saída de RNG quando um curador tentou projetar energia de cura em células cerebrais em crescimento em meio de cultura[43]. Curiosamente, os efeitos nos geradores de números aleatórios foram estatisticamente mais pronunciados do que o efeito nas próprias células. Curadores também têm sido testados regularmente no Rhine Research Centre e na Division of Perceptual Studies (DOPS) da Universidade da Virgínia. Os resultados desses programas em larga escala serão divulgados em breve[44].

Inspirado pelo trabalho do laboratório PEAR, o Psyleron  foi criado por John Valentino com o objetivo de desenvolver aplicações comercializáveis ​​para os efeitos mente-matéria. Uma das mais bem-sucedidas é uma "lâmpada mental", na qual um gerador de números aleatórios (RNG) determina a sequência de cores exibidas.

O recém-fundado Evanlab, de Patrizio Tressoldi, na Itália, é um dos vários laboratórios interessados ​​em aplicações como dispositivos de controle mental. Alguns de seus trabalhos são detalhados aqui . Se essas e outras abordagens produzirem aplicações confiáveis, isso representará um enorme avanço para a área.

 

Questões teóricas

As implicações para a pesquisa de RNG-PK do ato de observação do colapso quântico (ver Helmut Schmidt, acima) podem ser ampliadas com aquelas relacionadas ao emaranhamento quântico. Aqui, qualquer sistema que tenha um passado compartilhado, mas que se separa através do tempo ou do espaço, retém uma conexão mensurável: quando um par de elétrons é ejetado em direções opostas, a medição de um deles fixará instantaneamente as propriedades do outro. Além disso, se o spin de um elétron for influenciado a girar em uma direção, o outro elétron girará instantaneamente na direção oposta, mesmo a distâncias que excederiam a velocidade da luz.

Em 2002, Atmanspacher, Römer e Wallach formularam sua Generalized Quantum Theory (TGQ), propondo a existência de correlações de emaranhamento não locais como a causa subjacente dos efeitos psi. Correlações entre indivíduos resultavam em telepatia; aquelas entre a mente de um indivíduo e estados mentais futuros, ou outros sistemas, levavam à precognição; aquelas entre mente e matéria eram expressas como psicocinese.

Os autores desenvolveram sua teoria em conjunto com o Modelo de Informação Pragmática de Walter von Lucadou[45], tentando explicar o efeito de declínio generalizado em testes repetidos de fenômenos psi[46]. Isso não ocorre apenas na pesquisa psi: uma queda nos efeitos em testes repetidos é comum nas ciências sociais e até mesmo na pesquisa médica. (Deve-se enfatizar que os efeitos gerais em vários domínios psi permanecem amplamente significativos mesmo com os declínios). Uma possibilidade é que haja uma razão mais fundamental para os declínios do que tédio e fadiga. Pode residir no próprio objeto de estudo, ou seja, na física subjacente aos fenômenos em análise.

Um princípio fundamental do emaranhamento é a impossibilidade de transmitir um sinal entre sistemas emaranhados. Tal sinal levaria à desintegração das correlações emaranhadas sensíveis, um processo denominado decoerência, a fim de satisfazer a segunda lei da termodinâmica. Essa lei afirma que a entropia (a aleatoriedade de um sistema) aumenta com o tempo, enquanto a transferência de informações em estados emaranhados levaria a menos incerteza estatística, ou seja, a menos entropia com o tempo. Wallach, Atmanspacher e Römer levantam a hipótese de que essa é a razão pela qual os resultados psi são frequentemente proeminentes no início de um paradigma experimental, já que as correlações estão apenas começando a aparecer, mas como a ameaça de uma transferência de sinal ilícita aumenta com replicações adicionais, o efeito de declínio intervém para evitar uma violação tão grosseira das leis da física. Os processos subjacentes ao efeito de declínio ainda são um mistério, mas este é o assunto de um esforço de pesquisa multilaboratorial que está atualmente em andamento[47].

 

Experimento de Matriz Correlacional (CMM)

Embora o efeito de declínio tenha impedido que os estados emaranhados não locais originais transmitissem um sinal, ele não impede o desenvolvimento de outras correlações, permitindo assim uma potencial "saída" para a manifestação do efeito psi. Se for esse o caso, deve ser possível projetar experimentos para testar isso.

A partir de meados da década de 1980, Walter von Lucadou desenvolveu um experimento RNG-PK com uma peculiaridade. Os participantes são instruídos a influenciar o resultado como em um experimento PK tradicional; no entanto, a principal preocupação não é obter evidências de um efeito direto, mas sim as correlações entre variáveis ​​psicológicas, identificadas por um teste de personalidade, e variáveis ​​físicas, como picos de voltagem ou medidas de autocorrelação. Lucadou encontrou mais que o dobro de correlações durante as sessões experimentais do que nas sessões de controle: o efeito foi enorme, com um sigma de 5,5 (1.000.000 para 1)[48].

A metodologia foi reforçada em experimentos posteriores, onde as variáveis ​​psicológicas foram refinadas em medidas mais simples, como a frequência de pressionamentos de botões e as variáveis ​​físicas de interesse tornaram-se mais à prova de viés, mas ainda assim, o efeito ainda foi visto no mesmo nível de significância de antes.

A primeira grande replicação independente por Harald Wallach encontrou a mesma preponderância de correlações na condição experimental versus controle[49]. Mais recentemente, sua aluna de doutorado baseada na Unidade Koestler de Edimburgo, Ana Borges Flores, replicou esse experimento, obtendo duas vezes sigmas maiores que 6 – na casa dos bilhões para um contra o acaso, mesmo usando análises de permutação mais conservadoras[50]. Físicos tradicionais estão tomando nota e começaram a incorporar essa abordagem em seus programas de pesquisa: por exemplo, Hartmut Grote, do Instituto Max Planck de Física Gravitacional, publicou recentemente uma tríade de experimentos mente-matéria, o mais bem-sucedido testando esse paradigma[51].

Resumindo 13 experimentos até o momento, Von Lucadou constatou que quase todos eles expressaram significância[52]. Normalmente, em parapsicologia, para um determinado programa de pesquisa, de 20% a 40% dos estudos são significativos, então esta parece ser uma via promissora de exploração. Um consórcio de pesquisa com cerca de 20 pesquisadores, financiado pela Fundação Bial, está planejando uma série de replicações em larga escala em breve. (Tais projetos estão se tornando mais frequentes na pesquisa psi, pois permitem que fundos sejam canalizados para pesquisas de alto impacto que se beneficiam da contribuição de cientistas tradicionais de diversas disciplinas.)

 

Pesquisa atual não-RNG

Pesquisas recentes realizadas sobre as influências da PK em sistemas não vivos não envolvem geradores de eventos aleatórios. Em 2008, Dean Radin iniciou uma série de experimentos baseados no clássico experimento das duas fendas da mecânica quântica. O experimento tradicional demonstra a natureza complementar das partículas subatômicas como partícula e onda. Fótons disparados contra uma placa com fendas paralelas serão encontrados caindo na tela atrás dela em grupos paralelos correspondentes às fendas – mas somente se estiverem sendo observados ou medidos. Se não estiverem sendo observados ou medidos, eles se comportarão não como partículas, mas como ondas, formando um padrão de interferência de faixas claras e escuras alternadas na tela.

Radin procurou verificar se a influência causada pela observação também poderia ocorrer remotamente, com os indivíduos direcionando esporadicamente sua atenção para um conjunto selado de duas fendas localizado à distância. Ele concluiu que, se a atenção focada pudesse obter informações sobre a trajetória dos fótons, pelo menos em alguns casos, isso contaria como "observação" e enfraqueceria o padrão de interferência típico das faixas de luz e escuridão.

Revisando 16 experimentos realizados até 2014, Radin relatou um sigma de 8 (bilhões para um contra o acaso) para o resultado composto[53]. Ele também descreveu trabalhos orientados a processos, por exemplo, encontrando correlações entre o tamanho do efeito e certos ritmos de EEG. Radin também encontrou efeitos altamente significativos em estudos realizados pela internet, que não podiam ser descartados como artefatos locais. O efeito foi recentemente replicado por Gabriel Guerrer, da Universidade de São Paulo, Brasil, em cinco estudos ao longo de dois anos, com um nível coletivo de 5 sigma. Guerrer está refinando e expandindo seu programa de pesquisa[54].

 

Da Dualidade Onda-Partícula ao Emaranhamento

Radin ampliou este trabalho explorando o papel da mente no entrelaçamento de um par de fótons. A análise de um estudo online está em andamento e os resultados são considerados promissores; replicações em larga escala em laboratório no IONS também estão planejadas. Este experimento está sendo replicado por Peter Bancel[55].

 

Tabela 1: Uma revisão das evidências dos efeitos Mente-Matéria

 

Pesquisadores

Data

Revisão ou

Meta Análise

Número de

Estudos

Assunto

Resultados e Conclusões

Rhine

1943

Revisão

20

Estudos iniciais sobre dados

Efeitos confiáveis com declínios de quartis

Radin and Ferrari

1990

Meta Análise

69

Estudos posteriores de dados

Extremamente significativo neste subconjunto de alta qualidade

Schmidt

1997

Revisão

50

Estudos RNG

¾ significativo.

Radin and Nelson

2003

Meta Análise

515

Estudos RNG

1050 para 1. (Dados do PEAR reduzidos a apenas um estudo)

Nelson

2007

Revisão

1000,s

Dados RNG do laboratório PEAR

1012 para 1.

Von Lucadou

2017

Revisão

13

RNG – experimento de matriz correlacional

1013 para 1.

Radin

2015

Revisão

17

Fenda dupla

1012 para 1.

 

 

Literatura

§  Atmanspacher, H,  Römer. H., Walach, H. (2002).  Weak Quantum Theory: Complementarity and Entanglement in Physics and Beyond. Foundations of Physics 32(3), March

§  Bösch, H. (2004). Reanalyzing a meta-analysis on extra-sensory perception dating from 1940, the first comprehensive meta-analysis in the history of science. In S. Schmidt (Ed.), Proceedings of the 47th Annual Convention of the Parapsychological Association, University of Vienna, (pp. 1–13).

§  Bösch, H., Steinkamp, F., & Boller, E. (2006). Examining psychokinesis: The interaction of human intention with random number generators – A meta-analysis. Psychological Bulletin, 132(4), 497-523.

§  Broughton, R. S. and Perlstrom, J. R. (1986). PK experiments with a competitive computer game. Journal of Parapsychology 50, 193-211.

§  Bunnell, T. (1999). The Effect of “Healing with Intent” on Pepsin Enzyme Activity.  Journal of Scientific Exploration 13/2, 139-148.

§  Carpenter, J. (2012). First Sight: ESP and Parapsychology in Everyday Life. Lanham, Maryland: Rowman and Littlefield

§  Fodor, N. (1934).  An Encyclopaedia of Psychic Science. London: Arthur.

§  Girden, E. (1962). A review of psychokinesis (PK).  Psychological Bulletin 59, 353-388.

§  Grote, H.  (2017).  Multiple-Analysis Correlation Study between Human Psychological Variables and Binary Random Events. Journal of Scientific Exploration 31/2, 231–254.

§  Helfrich, H.  (2007). Is the Psychokinetic Effect as Found with Binary Random Number Generators Suitable to Account for Mind-Brain Interaction? Journal of Scientific Exploration 21/4, 689-705.

§  Kugel, W (2011) A Faulty PK Meta-Analysis. Journal of Scientific Exploration, Vol. 25, No. 1, pp. 47–62, 2011

§  Lucadou, W. V. (1987) A multivariate PK experiment. Part I. An approach combining physical and psychological conditions of the PK process. European Journal of Parapsychology 6/4, 305-45.

§  Nelson, R. D., Bradish, G. J., Dobyns, Y. H., Dunne, B. J., & Jahn, R. G. (1996). Field-REG anomalies in group situations. Journal of Scientific Exploration 10, 111-41.

§  Playfair, G. L.  (2011).  This House is Haunted. White Crow Books.

§  Radin, D,.  Ferrari, D.  (1991). Effects of Consciousness on the Fall of Dice: A Meta-Analysis. Journal of Scientific Exploration 5/1, 6 1-83.

§  Radin D, Yount G. J., (2004). Effects of healing intention on cultured cells and truly random events. Journal of Alternative and Complementary Medicine 10/1, 103-112.

§  Radin, D., Nelson, R., Dobyns, Y., & Houtkooper, J. (2006). Re-examining psychokinesis:  Comment on Bösch, Steinkamp, and Boller (2006). Psychological Bulletin, 132/4, 529-532.

§  Radin, D,. (2009).  Exploratory Evidence for Correlations Between Entrained Mental Coherence and Random Physical Systems.  Journal of Scientific Exploration 23/3, 1-10.

§  Rebman, J. (1995). Remote influence of human physiology by a ritual healing technique.  Subtle Energies  6/2, 112.

§  Rhine, J. B.  (1943).  Dice Thrown by Cup and by Machine in PK Tests. Journal of Parapsychology 7, 207-17.

§  Schmidt, H. (1970). A PK test with electronic equipment. Journal of Parapsychology 34/3, 175-181.

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§  Schmidt, H and Pantas, L, (1972). PK tests with internally different machines. Journal of Parapsychology 36/3, 222-232.

§  Schmidt, H. (1976). PK Effect on Pre-Recorded Targets.  Journal for the American Society for Psychical Research 70, 267-291.

§  Schmidt, H.  (1987). The Strange Properties of Psychokinesis Journal of Scientific Exploration 1/2.

§  Schmidt, H. (1993). Observation of a psychokinetic effect under highly controlled conditions. Journal of Parapsychology 57, Dec. 351-372.

§  Stanford, R. G. (1974a). An experimentally testable model for spontaneous psi events: I. Extrasensory events. Journal of the American Society for Psychical Research 68/1, 34-57.

§  Stanford, R. G. (1974b). An experimentally testable model for spontaneous psi events: I. Extrasensory events. Journal of the American Society for Psychical Research 68/4, 321-356.

§  Walach, H., Horan, M. (2014). Capturing PSI: Replicating von Lucadou’s Correlation Matrix Experiment using a REG Micro-PK. Presentation at the BIAL Conference, Porto, March 2014

 

 

Traduzido com Google Tradutor


[2] Fodor, N. (1934).

[3] Playfair, G.L. (2011).

[4] Bunnell, T. (1999).

[5] Rebman, J. (1995).

[7] Helfrich, J. (2007).

[11] Rhine, J.B. ( 1943 ).

[12] Girden, E. (1962).

[13] Bösch, H. (2004).

[14] Radin, D., Ferrar, D. (1991).

[15] Schmidt, H. (1970).

[16] Schmidt, H. (1970).

[17] Schmidt, H e Pantas. L. (1972).

[19] Schmidt, H. (1976).

[20] Schmidt, H. (1976).

[21] Schmidt, H. (1987).

[22] Schmidt, H. (1993).

[24] Broughton, R.S. e Perlstrom, L. (1986).

[30] Bösch, H., Steinkamp, F. e Boller, E. (2006).

[31] Radin, D., Nelson, R., Dobyns, Y., & Houtkooper, J. (2006).

[32] Kugel, 2011

[34] Standford, RG (1974).

[35] Stanford, RG (1974b).

[36] Carpenter, J. (2012).

[37] Nelson, R.D., Bradish, G..J., Dobyns, Y.H., Dunne, B.J., e Jahn, R.G. (1996).

[38] Radin, D. (2009).

[40] Em branco, apagar depois

[42] Comunicação pessoal: Maier. Setembro de 2017.

[43] Radin, D ,  Yount, G . (2004).

[44] Comunicação pessoal: Kruth. Agosto de 2017.

[46] Atmanspacher, H, Römer. H., Walach, H. (2002).

[48] Lucadou, Virgínia Ocidental (1987).

[49] Walach, H., Horan, M. (2014).

[50] Comunicação pessoal. Ana Borges Flores. Agosto de 2017.