Ramiro Gama
A madrinha do Chico, por vezes, passava tempos entregue a
obsessão.
Assim é que, nessas fases, a exasperação dela era mais
forte.
Em algumas ocasiões, por isso, condenava o menino a vários
dias de fome.
Certa feita, já fazia três dias que a criança permanecia em
completo jejum.
À tarde, na hora da prece, encontrou a mãezinha desencarnada
que lhe perguntou o motivo da tristeza com a qual se apresentava.
— Então, a senhora não sabe — explicou o Chico — tenho
passado muita fome.
— Ora, você está reclamando muito, meu filho! — disse Dona
Maria João de Deus — menino guloso tem sempre indigestão.
— Mas hoje bem que eu queria comer alguma coisa...
A mãezinha abraçou-o e recomendou:
— Continue na oração e espere um pouco.
O menino ficou repetindo as palavras do Pai Nosso e daí a
instantes um grande cão da rua penetrou o quintal.
Aproximou-se dele e deixou cair da bocarra um objeto escuro.
Era um jatobá saboroso...
Chico recolheu, alegre, O pesado fruto, ao mesmo tempo que
reviu a mãezinha ao seu lado, acrescentando.
— Misture o jatobá com água e você terá um bom alimento.
E, despedindo-se da criança, acentuou:
— Como você observa, meu filho, quando oramos com fé viva
até um cão pode nos ajudar, em nome de Jesus.
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