segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

PEDRO LAMEIRA DE ANDRADE[1]


Pedro Lameira de Andrade a direita


Nascido na cidade do Rio de janeiro, em 16 de setembro de 1880, e desencarnado em São Paulo, no dia 1º de março de 1938.
Numa época quando o Espiritismo era ainda muito mal compreendido, e quando reinava verdadeira desunião entre os seus adeptos e até no seio de suas instituições, um vulto notável e infatigável surgiu no cenário da divulgação doutrinária, constituindo-se num dos mais salientes espíritas da época.
Nos anais da História do Espiritismo, os registros biográficos do Dr. Pedro Lameira de Andrade são bastante escassos, em flagrante contraste com o vulto da obra que tão bem soube desempenhar, e que projetou o seu nome na posteridade. A exemplo do que sucedeu com outros grandes missionários, cujas obras foram legadas aos homens das futuras gerações, através dos informes de discípulos dedicados, a missão fulgurante de Lameira de Andrade somente é suficientemente conhecida por aqueles que com ele conviveram, os quais a ele se referem como um autêntico benfeitor da Humanidade, um homem que procurou impulsionar seus companheiros de jornada terrena, na senda do aprimoramento espiritual e do aculturamento, poderosas alavancas que atuam no laborioso processo de reforma íntima das criaturas humanas.
Seus pais foram Boaventura Plácido Lameira de Andrade e Carolina Levereuth de Andrade, tendo o seu nascimento corrido no bairro de Vila Isabel, no antigo Distrito Federal. Aos 17 anos de idade, perdeu seu pai e, atendendo a um convite de seu padrinho foi para São Paulo, ingressando no Colégio Mackenzie, onde se formou em Teologia. Não chegou a ordenar-se pastor protestante, em virtude de haverem surgido algumas divergências entre ele e o reitor do Seminário.
Lameira era exímio tenor e, em 1904, casou-se com D. Elvira Silveira, pianista e professora de Pedagogia e Psicologia da Escola Normal. Desse consórcio teve seis filhas. Nessa época ele era também professor de português, grego e latim, lecionando na escola da Força Pública, atual Polícia Militar de S. Paulo. Ingressando na Faculdade de Direito de S. Paulo, formou-se em 1912. Dessa data em diante deixou de lecionar para consagrar-se à profissão de advogado, tendo montado escritório em S. Paulo.
A desencarnação de sua filha mais idosa deixou-o desolado e revoltado, passando a descrer de tudo. Aconselhado por amigos procurou o Espiritismo, doutrina que lhe trouxe o consolo e a certeza da imortalidade da alma.
Na década de 1920, Lameira de Andrade já antevia a necessidade da instrução como fator decisivo para a libertação do Espírito, através do conhecimento da verdade, por isso sonhava com a fundação de escolas primárias e ginásios, que viessem a funcionar alicerçados nos postulados da Doutrina Espírita. Nos idos de 1928 e 1929, com vistas ao desenvolvimento de um programa nesse sentido, ao lado de outros companheiros que estavam inspirados do mesmo ideal, lutou arduamente para a implantação de um instituto de ensino que servisse de modelo para as futuras organizações do gênero. Seu sonho concretizou-se quando viu funcionar o Liceu Espírita Brasileiro, entidade que teve vida efêmera, durando pouco mais de um ano.
Entretanto, a semente ficou lançada.
Homem dotado de um dinamismo invulgar, arrojado em seus cometimentos e animado de um idealismo inquebrantável, Lameira tornou-se figura bastante conhecida em todo o Brasil e principalmente no Estado de S. Paulo e no Rio de Janeiro, em cujo cenário, teve a oportunidade de desempenhar a sua gigantesca tarefa.
A missão de Lameira de Andrade, no seio do Espiritismo, foi desenvolvida, em grande parte, ao lado do Dr. Augusto Militão Pacheco, renomado médico e um dos grandes baluartes espíritas da época. Através dos seus escritos, das suas conferências, esse infatigável seareiro não media esforços em suas peregrinações. Muitas cidades brasileiras foram por ele visitadas e seu nome conseguiu empolgar grandes auditórios, pois sabia abordar, com raro descortino, os ensinamentos evangélicos à luz da Doutrina Espírita.
Foi procurador do "Abrigo Batuíra", tendo sido um dos seus fundadores.
Durante 19 anos prestou inestimáveis serviços a "Instituição Verdade e Luz". Embora não conhecesse pessoalmente o grande missionário que foi Antônio Gonçalves da Silva Batuíra sucedeu-o na direção da revista "Verdade e Luz", fundada no ano de 1890. Foi membro da diretoria da Associação Espírita São Pedro e São Paulo, onde trabalhou intensamente e com raro devotamento, ao lado de grandes seareiros. Teve também marcante atuação no campo da assistência social, tendo nesse afã, chegado até o sacrifício.
Foi ainda sócio benemérito da Cruz Azul de S. Paulo, tendo prestado a esse organismo o fruto de seu esforço, dando viva demonstração do seu Espírito magnânimo, sempre pronto a servir e a cooperar na implantação e desenvolvimento de obras altruísticas.
Em 12 de julho de 1936, ao ser fundada a Federação Espírita do Estado de S. Paulo, Lameira de Andrade foi eleito seu orador oficial, em sua primeira diretoria, passando a representar aquela egrégia instituição em quase todas as solenidades promovidas pelas associações espíritas do Estado. Na própria Federação, ele era invariavelmente requisitado pelos frequentadores, para proferir palestras, as quais eram bastante concorridas.
Certa ocasião, chegada a hora designada para a realização de uma conferência sobre o tema "O Perdão", na Sede da Associação "Verdade e Luz" choveu torrencialmente. Apenas estavam na sede da instituição o orador, Elói Lacerda e outros dois companheiros. Lameira, vendo o salão vazio, aventou a ideia de fazer uma prece e encerrar a reunião, sugestão prontamente repelida pelos presentes. A palestra foi proferida, portanto, como se o salão estivesse repleto. A determinada hora entrou no recinto uma pobre mulher, toda molhada, esperando resguardar-se da chuva.
Assentando-se nas últimas cadeiras, passou a prestar inusitada atenção às palavras do conferencista.
Ao finalizar a palestra, ela aproximou-se do orador e lhe disse: "Graças a Deus entrei nesta casa e ouvi suas palavras. Eu estava decidida a cometer um crime nesta noite. Entretanto, agora compreendo as razões de minha desorientação e vou tomar rumo diferente, vou lutar contra as forças negativas que quase me desviaram do caminho do bem”. Lameira abraçou-a comovido, alegrando-se intimamente pelo fato de ter servido de ponte para que aquela criatura se reencontrasse e viesse a descortinar novos horizontes.
Lameira de Andrade viveu na Terra pouco menos de 58 anos, desencarnando vítima de fulminante derrame cerebral que o prostrou em poucas horas. Ele soube aproveitar bem esses curtos anos de trabalho, desenvolvendo tarefa de gigante, no sentido de distribuir, em profusão, tudo aquilo que era patrimônio de seu Espírito esclarecido e evangelizado. Ele soube assimilar, em sua plenitude, os ensinamentos de Jesus Cristo, no sentido de colocar a luz sobre o velador. Foi o bom obreiro que soube restituir ao Senhor, em dobro, os talentos recebidos.
Sua desencarnação representou irreparável perda para os espíritas de São Paulo e do Brasil, uma lacuna que dificilmente seria preenchida.




[1] Os Grandes Vultos do Espiritismo – Paulo Alves Godoy

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