segunda-feira, 22 de julho de 2019

Adélia Rueff[1]




Nascida em Pinhal, Estado de São Paulo, no dia 5 de Junho de 1868 e desencarnada na mesma cidade, no dia 2 de Fevereiro de 1953, com 84 anos de idade.
Desde o seu surgimento na Terra, no ano de 1857, o Espiritismo enfrentou tenaz resistência por parte da religião majoritária do Brasil. Entretanto, na década de 1930, essa pressão acentuou-se de maneira inusitada, fazendo-se sentir em toda a sua intensidade.
Na cidade de Pinhal, o clima não era diferente. Entretanto, como Deus situa em cada cidade um Espírito que desenvolve tarefas pioneiras e santificantes, aquele núcleo populacional do Estado de São Paulo, não poderia constituir exceção, por isso ali reencarnou o Espírito missionário de Adélia Rueff, mais conhecida por "tia Adélia", que teve a oportunidade ímpar de desenvolver santificante trabalho em favor do esclarecimento dos seus semelhantes, alicerçada na recomendação de Jesus do "Amai-vos uns aos outros".
A fim de propiciar aos nossos leitores uma apagada súmula biográfica dessa grande vida, passamos a transcrever um substancioso trabalho elaborado pelo confrade João Batista Laurito, atual presidente da Federação Espírita do Estado de São Paulo, que teve a oportunidade feliz de com ela conviver, locupletando-se com os frutos sazonados que ela tão bem sabia doar aos que usufruíram de sua benfazeja orientação espiritual.
Foi exatamente em 1936 que tive os meus olhos abertos para as claridades fulgurantes da Doutrina Consoladora. Embora nascido em berço espírita, foi somente nesse ano que, indo residir em Pinhal, a fim de estudar na "Escola Agrícola", conheci o "Centro Espírita Estrela da Caridade", brilhante fanel de luzes na Região Mojiana, centro de irradiação de caridade e amor a todos os que tinham a oportunidade de frequentá-lo.
Essa Casa foi fundada em 11 de janeiro de 1911 e, desde o dia de sua fundação até 1950, ininterruptamente, foi essa célula de fraternidade, sábia e amorosamente presidida por sua fundadora Adélia Rueff (Tia Adélia), assim chamada, porque solteira, abrigou em seu lar enorme contingente de sobrinhos de outras cidades, que na idade própria buscavam Pinhal, para aculturamento escolar, fato que durou muitos anos. E esses sobrinhos eram tantos, que generalizaram entre outras pessoas, a alcunha "Tia Adélia. (João Batista Laurito)
O Dr. Francisco Silviano de Almeida Brandão, por ocasião de sua colação de grau como médico, houvera feito uma promessa no final do século 19 que se tudo transcorresse bem por ocasião de sua formatura, abriria um Centro Espírita, pois já nessa época professava a crença reencarnacionista. Mas como as coisas na ocasião eram, além de difíceis, o espírito popular muito antagônico, foi postergando a ideia até desencarnar. No mundo espiritual, viu a necessidade do cumprimento da promessa, e surgindo a primeira oportunidade, comunicou-se com Tia Adélia, pedindo- lhe que cumprisse por ele a promessa. Assim nasceu o "Centro Espírita Estrela da Caridade".
Durante cinco anos, moramos com ela. E às terças e sábados, às 19:30 horas, lá estávamos no "Estrela da Caridade", e a sua voz, firme, inflexível, embora mansa e doce, ainda ecoa em nossos ouvidos, quando iniciava a sessão declamando: "Deus nosso Pai, que sois todo poder e bondade... e ao encerrar: Sublime estrela, farol das imortais falanges...
Nasceu no dia 5 de junho de 1868, ali mesmo em Pinhal, predestinada a somente servir, não casou. Durante toda a sua fértil existência, amou e deu tanto de si aos outros, que formou em seu derredor uma auréola de inenarrável admiração. Médium de exuberantes proporções bastava a imposição de suas compassivas mãos, para aliviar instantaneamente as pessoas, que a procuravam com tanta avidez, sem lhe permitir sossego ou descanso.
Certa feita ela viajou. E nós, que aos domingos aproveitávamos para dormir até bem mais tarde, sem nenhuma alegria ou boa vontade, atendemos 17 pessoas que a procuraram para tomar passes, das 8 às 12 horas. Uma ocasião, um confrade de Jacutinga ‒ Minas Gerais ‒, viajou, a pé, 26 quilômetros para presenteá-la com um saquinho de feijão verde, numa atitude de comovedora gratidão.
A mesa diretora dos trabalhos era formada. Na cabeceira principal sentava Tia Adélia, sob uma iluminada Estrela de lâmpadas coloridas, símbolo do Centro. Na outra cabeceira, o Vice-Presidente, Zé Café. As laterais para os médiuns, Dona Ordalha, Tereza, Idalina, Dona Eugênia, e a extraordinária Dona Adélia Neto, que quando recebia o Guia Espiritual do Centro "Irmão Silviano", se colocava de pé, abria os olhos, e de uma criatura tímida e simples, embora bela, se transformava num tribuno imponente e erudito. Pudera, médium inconsciente dando passividade ao Espírito Dr. Francisco Silviano de Almeida Brandão, médico, Presidente do Estado de Minas Gerais. Na porta de entrada, controlando com vigilância e severidade a admissão dos frequentadores, a Mariana e a Rosa Domiciano, zeladoras do grupo.
Viajando em charretes, excepcionalmente em automóveis e quase sempre a pé, lá ia Tia Adélia, à periferia Pinhalense e aos sítios vizinhos, cumprindo a predestinação de sua encarnação como lídima missionária do Cristo: atendendo aos aflitos, curando os obsediados, levantando os caídos, vestindo as viúvas, alimentando as crianças e amparando os velhos.
Que criatura extraordinária! Doce, mansa, boa. Jamais a vimos encolerizada, jamais a vimos levantar a voz. À medida que envelhecia, fruto de dois acidentes graves, se curvava, se encarquilhava, tornando-se menor. Fatos que nunca a fizeram perder a paciência. Olhos vivos, argutos, mente clara, pensamento limpo, conselheira oficial de quase toda a população pinhalense.
Fato que lhe proporcionou tributo de grande admiração, respeito e afeição por seus contemporâneos.
Descrever fatos do desenvolvimento espírita de "Tia Adélia" no campo da benemerência, seria tarefa que preencheria um enorme livro.
Médium de determinação na crença do trabalho doutrinário, deixava sempre para segundo plano a necessidade de repouso físico, aproveitando todo tempo disponível no atendimento dos mais necessitados do caminho.
Por ocasião das festividades comemorativas no "Estrela da Caridade", Tia Adélia, com muito carinho e inteligência, preparava seus discursos e em pé, inflamada, ereta, impressionava os presentes ao transmitir seus inequívocos conhecimentos a respeito da Doutrina. Empolgava tanto as suas palestras, que os menos avisados, desconhecedores das virtudes mediúnicas, não conseguiam reconhecê-la na oradora.
Os frequentadores do "Centro Espírita Estrela da Caridade", chegavam a venerar a tal ponto o Guia Espiritual do Grupo, Irmão Silviano, que narraremos um acontecimento inusitado para o conhecimento dos leitores:
Em determinada ocasião, brincávamos com um grupo de crianças, quando uma garota nos contou algo muito sério. Exigimos dela que jurasse se aquilo era verdade. E ela, jurou por Deus que tudo quanto dissera representava a expressão da verdade. Não aceitamos o juramento e retrucamos: jurar por Deus não interessa; você jura pelo "Irmão Silviano"? ‒ Era exigir demais dela, que não teve coragem de ratificar o juramento, pois para jurar em nome do "Irmão Silviano" só se fosse inabalável verdade.

A residência de Tia Adélia era mais frequentada que o Centro Espírita. Era gente que entrava, era gente que saía, uns tomando passes, outros recebendo conselhos e orientações. Aos domingos verdadeiras filas se formavam, alguém querendo ser grato empunhava uma cesta de laranjas, um feixe de verduras; outro, uma braçada de flores, pacotes de cereais, frangos, ovos, lenha rachada, frutas etc... Guardávamos tudo. Na segunda-feira, iniciávamos a caminhada inversa dos presentes. Eram necessitados de toda sorte que iam visitá-la, e após o passe reparador, a palavra conselheira e amiga, e um agradozinho representado por ovos, frutas, legumes, flores. Tudo que vinha no domingo saía na segunda-feira, numa vivência "Dai de graça o que de graça receberdes".




[1] Os Grandes Vultos do Espiritismo – Paulo Alves Godoy

Nenhum comentário:

Postar um comentário