Conta-se que o Dr. Adolfo Bezerra de Menezes orientava, no Rio, uma
reunião de estudos espíritas, com a palavra livre para todos os circunstantes,
quando, após comentários diversos, perguntou se mais alguém desejava
expressar-se nos temas da noite.
Foi então que renomado materialista, seu amigo pessoal, lhe dirigiu
veemente provocação:
Bezerra, continuo ateu e,
não somente por meus colegas, mas também por mim, venho convidá-lo a debate
público, a fim provarmos a inexpugnabilidade de Materialismo contra as pretensões
do Espiritismo. E previno a você que o Materialismo já levantou extensa lista
de médiuns fraudulentos; de chamados sensitivos que reconheceram os seus próprios
enganos e desertaram das fileiras espíritas; dos que largaram em tempo o suposto
desenvolvimento das forças psíquicas e fizeram declarações, quanto às mentiras piedosas
de que se viram envoltos; dos ilusionistas que operam em nome de poderes imaginários
da mente; e, com essa relação, apresentaremos outro rol de nomes que o Materialismo
já reuniu, os nomes dos experimentadores que demonstraram a inexistência da
comunicação com os mortos; dos sábios que não puderam verificar as fictícias ocorrências
da mediunidade; dos observadores desencantados de qualquer testemunho da
sobrevivência; e dos estudiosos ludibriados por vasta súcia de espertalhões...
Esperamos que você e os
espíritas aceitem o repto.
Bezerra concentrou-se em preces, alguns instantes, e, em seguida,
respondeu, aliando energia e brandura:
- Aceitamos o desafio, mas
tragam também ao debate aqueles que o Materialismo tenha soerguido moralmente
no mundo; os malfeitores que ele tenha regenerado para a dignidade humana; os
infelizes aos quais haja devolvido o ânimo de viver; os doentes da alma que
tenha arrebatado às fronteiras da loucura; as vítimas de tentações escabrosas que
haja restituído à paz do coração; as mulheres infortunadas que terá arrancado
ao desequilíbrio; os irmãos desditosos de quem a morte roubou os entes mais
caros, a cujo sentimento enregelado na dor terá estendido o calor da esperança;
as viúvas e os órfãos, cujas energias terá escorado para os caluniados aos
quais terá ensinado o perdão das afrontas; os que foram prejudicados por atos
de selvageria social mascarados de legalidade, a quem haverá proporcionado
sustentação para que olvidem os ultrajes recebidos; os acusados injustamente,
de cujo espírito rebelado terá subtraído o fel da revolta, substituindo-o pelo
bálsamo da tolerância; os companheiros da Humanidade que vieram do berço cegos
ou mutilados, enfermos ou paralíticos, aos quais terá tranquilizado com
princípios de justiça, para que aceitem pacificamente o quinhão de lágrimas que
o mundo lhes reservou; os pais incompreendidos a quem deu força e compreensão
para abençoarem os filhos ingratos e os filhos abandonados por aqueles mesmos
que lhes deram a existência, aos quais auxiliou para continuarem honrando e
amando os pais insensíveis que os atiraram em desprezo e desvalimento; os
tristes que haja imunizado contra o suicídio; os que foram perseguidos sem
causa aparente, cujo pranto terá enxugado nas longas noites de solidão e
vigília, afastando-os da vingança e da criminalidade; os caídos de toda as
procedências, a cujo martírio tenha ofertado apoio para que se levantem...
Nesse ponto da resposta, o velho lidador fez uma pausa, limpou as
lágrimas que lhe deslizavam no rosto e terminou:
- Ah! Meu amigo, meu
amigo!... Se vocês puderem trazer um só dos desventurados do mundo, a quem o
Materialismo terá dado socorro moral para que se liberte do cipoal do sofrimento,
nós, os espíritas, aceitaremos o repto.
Profundo silêncio caiu na pequena assembleia, e, porque o autor da
proposição baixasse a cabeça, Bezerra, em prece comovente, agradeceu a Deus as
bênçãos da fé e encerrou a sessão.
[1] Estante da
Vida – Irmão X / Psicografado por
Francisco C. Xavier
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