A academia assim define essa
palavra: “Diz-se dos Espíritos que se supõe voltarem do outro mundo”. Ela não
diz que voltam; só os espíritas podem ser bastante loucos para ousarem afirmar
semelhante coisa. Seja como for, pode dizer-se que a crença nos fantasmas é
universal.
Evidentemente se funda na intuição
da existência dos Espíritos e na possibilidade de comunicação com eles. A esse
título, todo Espírito que manifesta sua presença, seja pela escrita de um
médium, ou simplesmente batendo numa mesa, seria um fantasma. Mas esse nome
quase sepulcral geralmente é reservado para os que se tornam visíveis e que se
supõe, como diz com razão a Academia, vir em circunstâncias mais dramáticas.
São histórias de comadres? O fato em si, não; os acessórios, sim. Sabe-se que
os Espíritos podem manifestar-se à vista, mesmo em forma tangível – eis o que é
real. [ver “Os Agêneres”, publicado
neste blog em 11/07/2017]
Mas o que é fantástico são os
acessórios; o medo, que tudo exagera, ordinariamente acompanha esse fenômeno,
em si tão simples, o qual se explica por uma lei muito natural; consequentemente,
nada tem de maravilhoso ou de diabólico. Por que, então, se tem medo dos
fantasmas? Precisamente por causa desses mesmos acessórios, que a imaginação se
apraz em tornar apavorantes, porque ela se assustou e talvez acreditasse ter
visto o que não viu. Em geral são representados sob aspecto lúgubre, vindo de
preferência à noite, sobretudo nas noites mais sombrias, em horas fatais, aos
lugares sinistros, revestidos de mortalhas extravagantes. O Espiritismo ensina,
ao contrário, que os Espíritos podem mostrar-se em todos os lugares, a qualquer
hora, de dia como de noite; que em geral o fazem sob a aparência que tinham em
vida, e que só a imaginação criou os fantasmas; que os que aparecem, longe de
ser temidos, na maioria das vezes são parentes ou amigos que vêm a nós por afeição,
ou Espíritos infelizes que podemos assistir. Também são, algumas vezes,
galhofeiros do mundo espiritual, que se divertem à nossa custa e se riem do
medo que causam. Compreende-se que com estes o melhor meio é rir também, e
provar-lhes que não se os teme. Aliás, limitam-se quase sempre a fazer barulho
e raramente se tornam visíveis. Infeliz de quem os leva a sério, pois redobram
nas travessuras; seria o mesmo que exorcizar um moleque de Paris.
Mesmo supondo que seja um
Espírito mau, que mal poderia fazer?
Um valentão vivo não seria cem
vezes mais temível do que um morto que se tornou Espírito? Aliás, sabemos que
estamos constantemente rodeados por Espíritos, que só diferem dos que chamamos
fantasmas porque não os vemos.
Os adversários do Espiritismo
não deixarão de acusá-lo por dar crédito a uma crença supersticiosa. Mas sendo
o fato das manifestações visíveis, constatado, explicado pela teoria e confirmado
por inúmeras testemunhas, não se pode dizer que não existam, e todas as
negações não o impedirão de se reproduzir, porquanto poucas pessoas há, que
consultando suas lembranças, não se recordem de algum fato dessa natureza e que
não podem pôr em dúvida. É preferível, portanto, que nos esclareçamos sobre o
que há de verdadeiro ou de falso, de possível ou de impossível nas narrativas
desse gênero. É explicando uma coisa, raciocinando, que nos premunimos contra o
medo pueril. Conhecemos muitas pessoas que tinham pavor dos fantasmas. Hoje,
graças ao Espiritismo sabem o que é isto, e seu maior desejo é ver um.
Conhecemos outras que tiveram
visões que as terrificaram; agora, que as compreendem, não mais se inquietam.
Conhecem-se os perigos do mal do medo para os cérebros fracos. Ora, um dos resultados
do conhecimento do Espiritismo esclarecido é precisamente curar esse mal, e não
é esse um dos seus menores benefícios.
[1] Revista
Espírita – Julho/1860 – Allan Kardec
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