Não procures Deus nos templos de
pedra e de mármore, ó homem que o queres conhecer, e sim no templo eterno da
Natureza, no espetáculo dos mundos a percorrer o Infinito, nos esplendores da
vida que se expande em sua superfície, na vista dos horizontes variados:
planícies, vales, montanhas e mares que a tua morada terrestre te oferece. Por
toda parte, à luz brilhante do dia ou sob o manto constelado das noites, à
margem dos oceanos tumultuosos, e assim na solidão das florestas, se te sabes
recolher, ouvirá as vozes da Natureza e os sutis ensinamentos que murmura ao
ouvido daqueles que frequentam suas solidões e estudam seus mistérios.
A Terra voga sem ruído na
extensão. Essa massa de dez mil léguas de circuito desliza sobre as ondas do
éter qual um pássaro no Espaço, qual um mosquito na luz.
Nada denuncia sua marcha
imponente. Nenhum ranger de rodas, nenhum murmúrio de vagas sob seus flancos.
Silenciosa, ela passa, rola entre suas irmãs do céu. Toda a potente máquina do
Universo se agita; os milhões de sóis e de mundos que a compõem, mundos perto
dos qual o nosso vale por uma criança, todos se deslocam, se entrecruzam,
prosseguem suas evoluções com velocidades aterradoras, sem que som algum ou
qualquer choque venha trair a ação desse gigantesco aparelho. O Universo
continua calmo. É o equilíbrio absoluto; é a majestade de um poder misterioso,
de uma Inteligência que não se impõe que se esconde no seio das coisas, e cuja
presença se revela ao pensamento e ao coração, e que atrai o pesquisador qual a
vertigem do abismo.
Se a Terra evolucionasse com
estrondo; se o mecanismo do mundo se regulasse com fracasso, os homens,
aterrorizados, curvar-se-iam e creriam. Mas, não! A obra formidável se executa
sem esforço. Globos e sóis flutuam no Infinito, tão livres quantas plumas sob a
brisa. Avante, sempre avante! O rondar das esferas se efetua guiado por uma
potência invisível.
A vontade que dirige o Universo
se disfarça a todos os olhares. As coisas estão dispostas de maneira que
ninguém é obrigado a lhes dar crédito. Se a ordem e a harmonia do Cosmos não
bastam para convencer o homem, este é livre no conjeturar. Nada constrange o
céptico para ir a Deus.
O mesmo acontece às coisas
morais. Nossas existências se desenrolam e os acontecimentos se sucedem sem
ligação aparente; mas a imanente justiça domina ao alto, e regula nossos
destinos segundo um princípio imutável, pelo qual tudo se encadeia em uma série
de causas e de efeitos. Seu conjunto constitui uma harmonia que o espírito
emancipado de preconceitos, iluminado por um raio da Sabedoria, descobre e
admira. Que nos sabemos do Universo? Nossa vista só percebe um conjunto
restrito do império das coisas. Somente os corpos materiais, à nossa
semelhança, a afetam. A matéria sutil e difusa nos escapa[2].
Vemos o que há de mais grosseiro, em tudo que nos cerca. Todos os mundos
fluídicos, todos os círculos onde a vida superior se agita a vida radiosa, se
eclipsam aos olhos humanos. Distinguimos apenas os mundos opacos e pesados que
se mova nos céus. O Espaço que os separa nos parece vazio. Por toda parte,
profundos abismos parecem abrir-se.
Erro! O Universo está cheio.
Entre essas moradas materiais, no intervalo desses mundos planetários, prisões
ou presídios flutuam no Espaço, outros domínios da Vida se estendem vida
espiritual, vida gloriosa, que nossos sentidos espessos não podem perceber
porque, sob suas radiações, quebraria qual se rompe o vidro ao choque de uma
pedra.
A sábia Natureza limitou nossas
percepções e nossas sensações. É degrau a degrau que ela nos conduz no caminho
do saber. É lentamente, trecho por trecho, vidas depois de vidas, que ela nos
leva ao conhecimento do Universo, seja visível, seja oculto. O ser sobe, um a
um, os degraus da escadaria gigantesca que conduz a Deus. E cada um desses
degraus representa para o ser uma longa série de séculos.
Se os mundos celestes nos
aparecessem de repente, sem véus, em toda a sua glória, ficaríamos aturdidos,
cegos. Mas, nossos sentidos exteriores foram medidos e limitados. Eles avultam
e se apuram à medida que o ser se eleva na escala da existência e dos
aperfeiçoamentos. O mesmo se dá com o conhecimento, a possessão das leis
morais. O Universo se desvenda os nossos olhos, à proporção que a nossa
capacidade de compreender as suas leis se desenvolve e engrandece. Lenta é a incubação
das Almas sob a luz divina.
*
É a ti, ó Potência Suprema!
Qualquer que seja o nome que te deem e por mais imperfeitamente que sejas
compreendida; é a ti, fonte eterna da vida, da beleza, da harmonia, que se
elevam nossas aspirações, nossa confiança, nosso amor.
Onde estão em que céus
profundos, misteriosos, tu te escondes? Quantas Almas acreditaram que bastaria,
para te encontrar, o deixar a Terra! Mas tu te conservas invisível no mundo
espiritual, quanto no mundo terrestre, invisível para aqueles que não
adquiriram ainda a pureza suficiente para refletir teus divinos raios.
Tudo revela e manifesta, no
entanto, tua presença. Tudo quanto na Natureza e na Humanidade canta e celebra
o amor, a beleza, a perfeição, tudo que vive e respira é mensagem de Deus. As
forças grandiosas que animam o Universo proclamam a realidade da Inteligência
divina; ao lado delas, a majestade de Deus se manifesta na História, pela ação
das grandes Almas que, semelhantes a vagas imensas, trazem às plagas terrestres
todas as potências da obra de sabedoria e de amor.
E Deus está, assim, em cada um
de nós, no templo vivo da consciência. É aquele o lugar sagrado, o santuário em
que se encontra a divina centelha.
Homens! Aprendei a imergir em
vós mesmos, a esquadrinhar os mais íntimos recônditos do vosso ser;
interrogai-vos no silêncio e no retiro. E aprendereis a reconhecer-vos, a
conhecer o poder escondido em vós. É ele que leva e faz resplandecer no fundo
de vossas consciências as santas imagens do bem, da verdade, da justiça, e é
honrando essas imagens divinas, rendendo-lhes um culto diário, que essa
consciência, ainda obscura, se purifica e se ilumina.
Pouco a pouco, a luz se
engrandece em nós outros. De igual modo que gradualmente, de maneira
insensível, as sombras dão lugar à luz do dia, assim a Alma se ilumina das
irradiações desse foco que reside nela e faz desabrochar, em nosso pensamento e
em nosso coração, formas sempre novas, sempre inesgotáveis de verdade e de
beleza. E essa luz é também harmonia penetrante, voz que canta na alma do
poeta, do escritor, do profeta, e os inspira e lhes dita as grandes e fortes
obras, nas quais eles trabalham para elevação da Humanidade. Mas, sentem essas
coisas apenas aqueles que, tendo dominado a matéria, se tornaram dignos dessa
comunhão sublime, por esforços seculares, aqueles cujo senso íntimo se abriu às
impressões profundas e conhece o sopro potente que atiça os clarões do gênio,
sopro que passa pelas frontes pensativas e faz estremecer os envoltórios
humanos.
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