Os Travassos existem de norte a
sul do Brasil, acreditando-se serem descendentes longínquos de três irmãos
portugueses que, perseguidos durante a dominação espanhola, se refugiaram em
terras brasileiras. Um destes irmãos localizou-se na Ilha Grande (Estado do Rio
de Janeiro), e possivelmente é ele o tronco do qual muito mais tarde, após
várias gerações, surgiria, em 1839, Joaquim Carlos Travassos, que nasceu no
município de Angra dos Reis, na Fazenda da Longa (Ilha Grande), de propriedade
de seus pais, Cel. Pedro José Travassos e D. Emília Rita Travassos.
A família era composta de sete
irmãos: quatro homens e três mulheres. Todos receberam boa educação, e Joaquim,
ao término dos estudos preparatórios, ingressou na antiga Faculdade de Medicina
do Rio de Janeiro, com cerca de dezessete anos. Estudou com afinco e dedicação
as dezoito cadeiras do curso, e a 30 de Agosto de 1862 apresentava sua tese à
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, sustentando-a com brilhantismo.
Aos 27 de Novembro de 1862, na
presença de Suas Majestades Imperiais, conferia-se o grau de doutor aos novos
doutorandos, entre ele o Dr. Joaquim Carlos Travassos.
Em 1862 ou 1863, contraía ele
núpcias com Srta. Maria Antônia de Oliveira, que deu à luz duas filhas.
Aceitara as ideias espíritas
numa época em que, de Kardec, só se achavam traduzidos para o português dois
opúsculos: O Espiritismo na sua expressão mais simples e Introdução
ao Estudo da Doutrina Espírita. Os livros básicos da Codificação eram
estudados no próprio francês de origem, língua, aliás, que todas as pessoas
cultas obrigatoriamente deviam saber.
Antes de ser espírita,
Travassos, de acordo naturalmente com a crença de seus pais, dizia-se católico.
Entretanto, era, em verdade, um livre pensador, desprendido de dogmas e voltado
para a Verdade, acrescentando que uma compreensão superior da vida o impedia de
cair nas garras do fanatismo, seja religioso, científico ou político.
Não sabemos o motivo que o
levara a ingressar no Espiritismo, mas foi pelo estudo ponderado das obras de
Kardec e de outros autores, que ele, em pouco tempo, se tornou fervoroso adepto
da Terceira Revelação. Tanto o francês quanto o inglês eram línguas que
Travassos lia e traduzia com perfeição, e isto muito lhe facilitou o
conhecimento da Doutrina.
Uniu-se a outros estudiosos dos
fenômenos espíritas, formando-se um grupo de criteriosos e cultos observadores,
grupo que coexistia com outros espalhados pelo País. Não havia ainda, no Rio de
Janeiro, uma associação central que orientasse a propaganda e estabelecesse a
união entre os poucos espíritas existentes. Somente a 2 de Agosto de 1873 se
erigiu uma sociedade nesses moldes, a segunda em todo o território nacional,
tomando o nome de " Grupo Espírita Confúcio".
Sua primeira Diretoria, da qual
o Dr. Joaquim Carlos Travassos fora secretário geral, ficou assim constituída :
Dr. Siqueira Dias, presidente; Doutor da Silva Netto, vice-presidente; Sr.
Eugênio Boulte, 2º secretário; Sr. Marcondes Pestana, 3º secretário Dr. Bittencourt
Sampaio, Mme. Perret Collard e Mme. Rosa Molteno, membros do Conselho
Fiscal.
Todos os adeptos cultos sentiam
a necessidade urgente de serem traduzidos para o vernáculo as obras
fundamentais de Kardec. O povo não conhecia o francês e a disseminação do
Espiritismo encontrava, por isso mesmo, sérios embaraços. Além do mais, estavam
surgindo vários grupos, onde os seus componentes mal conheciam os princípios
mais elementares da Doutrina, tudo isto por falta de obras espíritas na língua
nacional.
Travassos examinou todo este
estado de coisas, e resolveu empreender a árdua tarefa de traduzir do francês
as obras capitais de Allan Kardec.
Portanto, é a Travassos que o
Brasil espirita deveu a primeira tradução das principais obras do Codificador,
ou sejam: O Livro dos Espíritos, com o pseudônimo de Fortúnio, traduzido
da 20ª edição francesa, sem data de publicação; O Livro dos Médiuns, em
1875, traduzido da 12ª edição francesa, sem o nome do tradutor; O Céu e o
Inferno, em 1875, traduzido da 4ª edição francesa, sem o nome do tradutor; O
Evangelho segundo o Espiritismo, em 1876, traduzido da 16ª edição francesa,
sem o nome do tradutor.
A modéstia e a simplicidade de
Travassos, qualidades que nos foram confirmadas por ilustre pessoa que com ele
privou, impediram que o seu nome aparecesse. Todas essas quatro obras foram
dadas à luz por intermédio da Editora B. L. Garnier, que igualmente, pelo muito
que fez em prol da propaganda do Espiritismo pelo livro, merece a nossa
admiração e o nosso reconhecimento.
Não foi tão somente a tradução
das obras kardequianas a magna e importantíssima contribuição que Joaquim
Carlos Travassos trouxe ao Espiritismo nascente no Brasil. A ele deve-se,
também, o Doutor Adolfo
Bezerra de Menezes. Logo que O Livro dos Espíritos saiu do prelo, o
Dr. Travassos ofereceu ao seu grande amigo Bezerra, a quem sinceramente
admirava, um exemplar da obra. E foi esta que atraiu o então ilustre político
para a Doutrina Espírita.
Com o advento da República,
Travassos foi eleito senador na primeira Legislatura do Estado do Rio de
Janeiro. Os Anais do Senado desse Estado (1891) registram os fatos ocorridos
durante o curto período de existência dessa Casa Legislativa. A 1ª sessão preparatória
realizou-se em 27 de Julho de 1891, e a sessão de instalação ocorreu a 4 de
Agosto do mesmo ano, sob a presidência do Senador Demerval da Fonseca.
Travassos, na falta do Presidente, assumiu a presidência nas sessões de 28 de
Julho e de 15 de Setembro, e por várias vezes atuou como 1º e 2º secretário.
Na sessão ordinária de 28 de
Agosto de 1891, o nosso ilustre biografado apresenta um projeto de lei
regulamentando a colonização e a imigração no Brasil, já declarando, naquele
tempo, num longo e belo discurso, que a imigração é necessária, urgente, mas que
seja posta em prática "sem empirismo e com todo o cuidado, a fim de que
não venha a causar-nos maiores males futuros". Entra numa bem argumentada
exposição no que diz respeito à seleção do imigrante colonizador, e o seu verbo
se desdobra em páginas cheias de vibração e sabedoria, nelas revelando o
coração de um brasileiro que pulsa com força e carinho pelos problemas
nacionais.
Este bem elaborado trabalho
recebeu elogios de um dos homens mais competente na matéria, naquela época: o
Visconde de Taunay, então presidente da Sociedade de Imigração do Brasil.
Após a queda do marechal Deodoro
da Fonseca, subiu à Presidência da República Floriano Peixoto, que depôs todos
os governadores que aderiram ao golpe de 3 de Novembro de 1891. O governo
Portella, do Estado do Rio, caiu e o Congresso fluminense foi extinto.
Travassos, contrário ao procedimento do "Marechal de Ferro",
abandonou a política, retirando-se à vida privada. Desde então dedicou todas as
suas energias, com sinceridade e entusiasmo, aos estudos de pecuária e de
agricultura, relacionando-os à economia do País, por compreender que o
desenvolvimento do Brasil depende em larga escala da boa solução desses
problemas.
A última parte da vida de
Travassos foi acidentada e cheia de percalços. Basta dizer que no Rio de
Janeiro, em menos de quinze anos, residiu nas ruas de São Carlos, José
Bonifácio, Frei Caneca, Benjamim Constant (junto à Igreja Positivista), e
cremos que na Praça Niterói . Em 1913 mudou-se para a rua Correia Dutra, onde,
à 1 hora e 35 minutos da madrugada do dia 6 de Fevereiro de 1915, desencarnava
com a idade de 76 anos, vitimado pela arteriosclerose.
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