sexta-feira, 22 de março de 2024

ABORTO: ACOLHER OU CONDENAR?[1]

 


Mariana Corado

 

O assunto descriminalização do aborto no Brasil ou em qualquer outro lugar no mundo é sempre manchete nos meios de comunicação, suscitando diversas manifestações pró e contra o ato.

No dia 05/03/2023 foi publicada no site da BBC News Brasil uma reportagem cujo título chama a atenção de quem lê, pois infere-se um julgamento das mulheres que cometem tal ação: “Esse feto poderia ter sido seu filho”, os obstáculos que argentinas enfrentam para fazer o aborto legal. Na Argentina, em dezembro de 2020, o aborto foi legalizado. Com isso as mulheres passaram a ter o direito de acabar voluntariamente com sua gestação até a 14ª semana.

Para melhor entendimento é importante definir o que vem a ser a prática do aborto. De acordo com o Dicionário Online de Português, é a “interrupção voluntária ou provocada de uma gravidez; o próprio feto expelido ou retirado antes do tempo normal”. Pode-se classificar o aborto em natural ou espontâneo, que é a forma instintiva do organismo de interromper a gravidez e em provocado ou induzido, quando a gestação é finalizada de modo intencional.

Adentrando as bases espirituais sobre o assunto, o que é enriquecedor para o debate, verifique-se o que o Espiritismo esclarece nas obras básicas:

Em O Livro dos Espíritos, na questão 357, Allan Kardec pergunta aos Espíritos:

− Que consequência teria para o Espírito o aborto?

Eles respondem,

É uma existência nulificada e que ele (o espírito) terá de recomeçar.

Depreende-se da resposta que o Espírito tem uma programação divina predefinida e, ao ser abortado, tudo o que fora planejado não será mais possível por aquele espírito reencarnante, assim como para as pessoas de sua relação, especialmente seus familiares. Portanto, será necessária, uma outra oportunidade, para que seja retomada a vida e ocorram os devidos acertos.

Mas a quem culpar pelo aborto induzido? A quem responsabilizar por essa situação? Quem deve pagar por esse ato impensado de desesperança ou egoísmo de uma mãe e/ou dos genitores?

Novamente o Codificador aborda o assunto em O Livro dos Espíritos, a questão é a 358:

− É crime a provocação do aborto?

Na qual os Espíritos nos esclarecem,

− A prática do aborto é uma violação da lei natural e aquele que o faz atenta contra a Lei Divina.

Diante dessa situação, qual seria a atitude de um cristão? Como proceder perante os autores que afrontam a Lei de Deus? Condenar? Prisão perpétua? Pena de morte?

Faz-se necessário trazer aqui uma visão mais ampliada desse mérito, pois o ato em si é criminoso, contudo, como agir com justiça e condenar a mulher criminosa que realiza o aborto sem avaliar alguns itens, tais como: em que momento da vida ela toma essa decisão? Qual motivo ela teve para agir de forma tão intensa e cruel? Ela pensou em tudo sozinha? Teve uma rede de apoio? Foi influenciada ou obrigada a tomar tal atitude?

São vários pontos a serem analisados, contudo, como seguidores do Cristo, o que se deve fazer é auxiliar a mulher que vive essa angústia. Ampará-la nas suas necessidades materiais e orientá-la a procurar ajuda médica, psicológica e espiritual para que ela possa, por meio do acolhimento e direcionamento saudável, repensar suas atitudes. É preciso para ela e/ou eles que, antes de agir com desespero e impulsividade, sejam apresentados e, quem sabe, tocados pelo ensino de Jesus.

João, no Capítulo 8, versículo 7, registra o nobre ensinamento do Mestre quando diz: “aquele que tiver sem pecado que atire a primeira pedra”. Jesus, conhecedor dos corações e intenções dos presentes, sabia que ninguém executaria a sentença pela lapidação. Após se retirarem os acusadores, Jesus acolhe a mulher perguntando: "onde estão aqueles teus acusadores?" E completa após a resposta dela: "Nem eu também de condeno. ...vai-te, e não peques mais”.

Em momento algum o Cristo foi conivente com a atitude da “pecadora” e nem dos “acusadores”, porém aproveitou aquele instante para ensinar uma linda e importante lição: todas as pessoas estão sujeitas a cometer equívocos que contrariam as leis de Deus, mas a melhor forma de ação é fazer autoanálise dos próprios atos e ter empatia pela dor do próximo, sem condenações e julgamentos.

Nos ensinamentos da Doutrina Espírita, o que se encontra também é o consolo para nossas dores com esperança de poder vislumbrar um futuro promissor, pois ela afirma em O Evangelho Segundo o Espiritismo cap. 27, item 19 que: “a não eternidade das penas não implica a negação de uma penalidade temporária”, ou seja, o ato tem de ser repreendido, mas a penitência deve ser proporcional ao crime e não ser aplicado um castigo eterno, pois o erro que se comete poderá ser liquidado em novas oportunidades com as devidas sanções e reparações.

Ainda em O Livro dos Espíritos, questão 1000, Kardec questiona aos Espíritos:

− Já desde esta vida poderemos ir resgatando as nossas faltas?

− Sim, reparando-as. Só por meio do bem se repara o mal.

Temos, portanto, a nobre lição de que o trabalho é nas bases amorosas do bem. Ter ações positivas, tais como, ajudar a quem precisa, acolher as dores de outras pessoas, recomeçar com o aprendizado adquirido perante os erros cometidos.

Lembrem-se das palavras de Emmanuel dirigidas a Chico Xavier:

Embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim.

Basta dar o primeiro passo.

 

Bibliografia:

§  ABORTO. In: DICIO: Dicionário Online de Português. 7GRAUS, © 2009-2023.

§  KARDEC, Allan.  O Livro dos Espíritos.  Tradução: Guillon Ribeiro, Editora FEB, Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2006.

§  KARDEC, Allan.  O Evangelho Segundo o Espiritismo.  Tradução: Guillon Ribeiro, Editora FEB, Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 2010.

§  LATOURRETTE, Agustina.  “Esse feto poderia ter sido seu filho”: os obstáculos que argentinas enfrentam para fazer o aborto legal. BBC News Brasil, 05/03/2023. Disponível em: BBC News

 

 N.R.:

Artigo apresentado e selecionado no Concurso A Doutrina Explica 2023, promovido pelo Jornal Brasília Espírita – www.atualpa.org.br em parceria com a Revista Eletrônica O Consolador e a Rádio Estação da Luz - Estação da Luz



[1] O Consolador - Ano 17 - N° 866 - 17 de Março de 2024 - https://www.oconsolador.com.br/ano17/866/ca3.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário