Miguel Vives y Vives
Para alcançar o grau de
moralidade de que necessita, a fim de bem cumprir a sua missão, ter paz na
Terra e conseguir alguma felicidade no espaço, o espírita deve cumprir a lei divina.
E onde está essa lei? No Evangelho do Senhor. Portanto, o espírita deve saber
de memória a sua parte moral, tanto quanto possível, pois como aplicará a lei,
se não a souber? Como usá-la, se não a recorda?
O espírita deve gravar na sua
alma a grande figura do Senhor.
Deve ter-lhe respeito e
gratidão. E não deve esquecer-se de que somente por Ele se vai ao Pai. Assim,
para o espírita, o Evangelho não pode ser letra morta, mas a lei moral vigente
em todos os tempos, em todas as idades. Porque a lei proclamada pelo grande
Mestre não sofrerá modificações em sua parte moral.
E do seu cumprimento depende o
nosso progresso espiritual, a nossa paz e a nossa felicidade na Terra e no
espaço.
Temos o costume, bastante
generalizado, de relegar ao esquecimento o que mais nos interessa. O mundo
quase sabe de memória as palavras do Senhor, mas constantemente as olvida.
Sabe-se que o Senhor disse que
devemos amar-nos como irmãos.
O homem menos instruído sabe que
o Senhor acrescentou que devemos amar os nossos inimigos, bendizer os que nos
maldizem, orar pelos que nos perseguem e caluniam, pagar o mal com o bem. A
Humanidade, que sabe todas essas coisas, por acaso as tem cumprido? Não. E qual
tem sido a consequência dessa falta de cumprimento? As guerras, as discórdias,
as infâmias, e tantos outros males que seria difícil enumerar.
Explica-se que os homens tenham
esquecido esses mandamentos pela ignorância da vida no Além, por seu atraso.
Mas, e os espíritas? Temos nós
cumprido esses mandamento?
Não. Se contamos algumas
exceções, no geral estes ensinos têm sido letra morta. Será, por acaso, que não
sabemos o que nos espera e a responsabilidade que temos no cumprimento desses
mandamentos? Vem o Espiritismo derrogar ou cumprir a lei do Senhor? Não vem
derrogá-la, mas cumpri-la. Então, por que nós, os espíritas, vivemos tão fora
dos ensinos do Senhor e Mestre?
Que o “amarás a teu inimigo,
pagarás o mal com o bem, orarás pelos que te perseguem e caluniam” não são
práticas muito arraigadas entre os espíritas, está evidente a plena luz.
Consulte cada espírita a sua
conduta na vida pública e privada, e logo verá quantas vezes deixou de cumprir
esses ensinos.
Consulte a própria consciência,
e veja o que se passou na vida familiar, nas suas relações sociais, ou dentro
dos Centros Espíritas, e verá que mesmo excluindo os demais, se houvesse
pessoalmente cumprido esses preceitos, talvez houvesse evitado desgostos,
rixas, dissensões e muitas outras coisas, em todos esses lugares.
Tudo isso, muitas vezes, sem
má-fé, mas apenas por falta de estar apercebido. Assim, uma falta produziu
outra e o resultado foi a queda. Como assinalei anteriormente, é necessário
estarmos apercebidos, termos a lei divina sempre presente, em todas as circunstâncias
de nossa existência planetária.
É verdade que haverá muitas
exceções entre os espíritas, que não terão do que se acusar. Muitos mais
haverá, porém, que estão incluídos no que acabo de dizer. É quase perdoável que
a Humanidade tenha deixado de cumprir o que o Senhor manda no seu Evangelho,
apesar de que o nosso juízo a respeito não a exime da responsabilidade que
contraiu. Porém, que entre os espíritas, em sua maioria, haja tão pouca atenção
para o cumprimento da lei divina, proclamada pelo Senhor, é uma falta grave,
que, se não procurarmos remediar, acarretará ao nosso meio muitas perturbações
e será causa de novas expiações.
Não pode ser em vão que o Pai
nos enviou o maior Espírito que já veio à Terra. Nem em vão que esse
elevadíssimo Espírito foi ultrajado, depois de haver provado sua grande missão
através de seus feitos e de sua doutrina. Não pode ser um vão que Allan Kardec
e os Espíritos de Luz no-lo apontaram como o nosso modelo. Ele é o caminho, a
verdade e a vida. Fora dos seus ensinamentos não há salvação possível. Por
isso, compreendendo a importância do Evangelho, Allan Kardec esclareceu algumas
parábolas e conceitos, para que estivessem ao alcance de todas as
inteligências, participando desses esclarecimentos, de maneira muito direta,
elevados Espíritos, que ditaram comunicações de ordem moral, tocando-nos a
alma. Dessa maneira, se nós, espíritas, fizermos omissão, daí resultando uma
falha de perfeição moral em nosso meio, não podemos culpar a ninguém, senão à
nossa própria indolência, à nossa ingratidão.
Há também a falta de
reconhecimento de um fato culminante, como a vinda do Senhor à Terra, e de
reconhecimento da sua lei, da sua abnegação, do seu sacrifício e do seu amor
para com todos os seus irmãos. Se a nossa indiferença é tanta, que apenas
lembramos a lei proclamada e selada com sangue no Calvário, o que esperamos
alcançar? Que fará o espírita que se esquece da lei? Em que fonte beberá? Onde
encontrará o consolo de que necessita, para suportar os embates da vida? A quem
apelará, quando estiver no mais rijo das provas? Quem lhe servirá de modelo?
Está provado, até à evidência, que, se o Senhor veio à Terra, foi para
servir-nos de guia. E quem o seguir não se perderá no caminho da existência
terrena. Porque Ele é o caminho, a verdade e a vida.
Por isso, todo espírita há de
ser admirador do Mestre; deve estudar as suas palavras, a sua moral, a sua lei,
os seus sacrifícios, a sua abnegação, o seu amor, a sua prudência e, sobretudo,
a sua elevadíssima missão, já que esta contém dois pontos essenciais, que são
de importância capital para o curso de nossa existência terrena.
Afirmei que era necessário
conhecer a lei divina para cumpri-la.
Isto é a primeira coisa que o
espírita deve fixar em sua mente, para seguir o caminho de justiça e de amor.
Mas há, na missão do Senhor, outro objetivo de capital interesse para o bem do
nosso espírito, que é o consolo, a resignação e a paciência que o seu
sacrifício nos pode inspirar.
Todos estamos na Terra para ser
provados, e muitos em expiação. Passam-se às vezes anos em que a prova não é
dura, nem a expiação é forte. Mas, quando a prova é daquelas que esmagam o
espírito e a expiação é tão dolorosa que mal a suportamos, então é de grande
utilidade recordar, não só os mandamentos, mas também o sofrimento e a
resignação do Senhor. Devemos lembrá-lo, então, perante o tribunal dos escribas
e fariseus; quando estava na prisão; quando o coroavam de espinhos; quando o
ataram à coluna e o flagelavam; quando levava a cruz às costas; quando se viu
desnudo e só no Calvário; quando o estenderam na cruz e lhe cravaram os pés e
as mãos; quando foi erguido no madeiro, desfigurado, ensanguentado, e em meio
de tanta aflição deu mostras de resignação e calma superiores, e ainda de que
amava e perdoava, como se tivesse sido tratado com a maior consideração e
respeito.
A recordação desses grandes
feitos nos induzirá à resignação, a sofrer as grandes dores sem nos queixarmos,
a suportar as grandes provas com ânimo sereno. Isto fará que procedamos como
espíritas. E não somente podemos tirar proveito dessas lembranças, mas ainda,
se unirmos à recordação o amor ao Senhor, a admiração e a súplica,
identificando-nos com Ele, poderemos receber grande proteção do Alto, e às
vezes a sua própria influência. Por que não? Não ouviu Ele a mulher pecadora?
Não curou os cegos, os mudos e os leprosos? Não há exemplos de que, nos séculos
já passados, muitos foram amparados diretamente por Ele?
Os apóstolos e os mártires do
cristianismo foram protegidos por Ele: Teresa de Ávila, Juan de La Cruz, Pedro
Alcântara e muitos outros tiveram a incomparável sorte de falar com Ele, de
vê-lo, de receber suas instruções e consolos. E pensais, porventura, que esse
elevadíssimo Espírito nos abandonou e está hoje indiferente às nossas súplicas
e às nossas lágrimas?
Acreditais que Ele, na sua
glória, trata apenas de passar o tempo gozando da bem-aventurança, sem praticar
a sacrossanta caridade, que tanto praticou enquanto estava aqui? Acreditais que
Ele só se interessa por viver entre Espíritos de grande luz, deixando
abandonados a nós que o amamos, que pensamos e confiamos nele? Não acreditais
nisso, irmãos! Ele não abandonará os seres que vivem na Terra e que o tomam por
exemplo. Não abandonará os que nele confiam como não abandonará os cristãos
sinceros de todas as épocas.
Dirão alguns, consigo mesmos,
que na Terra não há ninguém digno de tanta proteção. E por que não? Quem
deixaria de visitar um criminoso arrependido, que suplicasse proteção, pedisse
um conselho, uma palavra de amor, um olhar de carinho? Quem deixaria de atender
as súplicas de um enfermo, de um inválido, de uma criança perdida num
despovoado? Quem negaria a mão ao que cai, ao desfalecido, ao moribundo? Quem
negaria um pedaço de pão ao que morre de fome, ou um copo d’água ao que morre
de sede, ou não arrombaria uma janela para propiciar ar ao que morre asfixiado?
Pois se nós, sendo maus, não sabemos nem podemos negar a proteção em todos
esses casos, como quereis que o Mestre de bondade, o Grande, que tudo fez por
amor e abnegação, o que disse: “deixai vir a mim os pequeninos, porque deles é
o Reino dos Céus”, o que deu saúde aos enfermos, paz aos corações aflitos, o
que tanto sofreu para dar-nos exemplo, como quereis que Ele não ouça as nossas
súplicas? Como poderá Ele deixar de atendê-las, quando partem de almas
arrependidas, que clamam por misericórdia e proteção, se Ele é amor, se é a
caridade mais pura que já existiu em nosso planeta?
O que somo nós, senão criminosos
arrependidos, mulheres extraviadas que voltam ao redil, enfermos de corpo e
espírito, crianças desamparadas no deserto da vida, que clamamos:
“Senhor, Senhor, apiedai-vos de
nós, que sucumbimos!”
Ah, meus irmãos, não duvideis! O
Senhor ama a Humanidade terrena. Ele a quer, trabalha com fervor pelo seu
progresso e protege aos que o invocam com sinceridade. Temos exemplos do que
afirmamos, e todo aquele que siga as pegadas do Senhor, amando-o e cumprindo as
suas leis, poderá tê-los.
Por isso entendemos que o
espírita há de amar o Senhor; deve admirá-lo e segui-lo até aonde lhe for
possível, em suas leis e em seus exemplos; pois assim evitará quedas que
poderão ser muito graves, e que lhe podem acarretar a tribulação nesta vida e o
sofrimento no espaço.
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