sexta-feira, 14 de julho de 2023

GRAVIDEZ NÃO DESEJADA E ENTREGA VOLUNTÁRIA: UMA OPÇÃO PELA VIDA[1]

 


Marcelo Anátocles Ferreira - julho/2023

 

Recentemente, uma jovem atriz de 21 anos foi vítima de estupro, engravidou e optou pela entrega voluntária da criança. Ela tentou manter o fato em sigilo, mas, sem a sua autorização, a história vazou e acabou publicada nas mídias. Sofrendo muito com o que tinha lhe acontecido e com a repercussão do caso, ela decidiu escrever uma carta, na qual afirma:

Entregar uma criança em adoção não é um crime, é um ato supremo de cuidado. Eu vou tentar me reconstruir, e conto com a compreensão de vocês para me ajudar a manter a privacidade que o momento exige. Com carinho, […]

Essa história real nos faz meditar sobre o tema e sua importância para todos nós. É muito importante que a entrega voluntária seja debatida para que possamos saber o que é exatamente, como se processa e suas repercussões, no campo íntimo e no social. Para nós, espíritas, é um tema fundamental por ser uma opção pela vida, o que se harmoniza com os ensinamentos de Cristo e com a Doutrina Espírita.

No aspecto jurídico, temos a previsão da entrega legal no artigo 19-A do Estatuto da Criança e do Adolescente, que dispõe que a mãe que manifeste interesse em entregar o filho para adoção, antes ou logo após o nascimento, será encaminhada à Justiça da Infância e da Juventude para obter informações sobre a melhor forma de proceder. Fica assim muito claro que é possível, compreensível e legal que a gestante entregue seu filho para adoção, sem que precise dizer os motivos que a levaram a tomar essa decisão. A lei garante todo o sigilo em relação à mãe e à entrega da criança. A Agência Brasil informou que em 2020 foram registradas 1.012 entregas voluntárias no país, número que aumentou para 1.238 no ano seguinte.

Vale refletir mais um pouco sobre a questão da entrega legal da criança gerada por uma vítima de estupro. Nossa Doutrina Espírita admite o aborto somente na hipótese de risco de morte da gestante, conforme previsto na questão 359, de O Livro do Espíritos[2]. Nas demais hipóteses, o aborto não é admitido por sabermos que a vida se inicia na concepção. Assim, apesar de a Lei Penal Brasileira admitir o aborto na hipótese de estupro, para nós, espíritas, a melhor solução sempre será preservar a vida.

O Espírito Camilo, pelas abençoadas mãos do médium José Raul Teixeira, ensina[3]:

Seja quem for o pai, amado ou odiado, a mulher será sempre mãe do filho que leva nas entranhas. E, se o seu caráter não tiver espaço para a sensibilidade materna e o seu anseio maior seja desfazer-se da criança, importante será que não a destrua, não lhe mate o corpinho. Deixe-a nascer e entregue-a a alguma instituição ou a pais adotivos que a desejem amar e dela cuidar.

Assim, é essencial que divulguemos nas Federativas e em nossa Casas Espíritas a possibilidade da entrega voluntária.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro promoveu dois eventos sobre o tema para disseminar detalhes da entrega voluntária, com distribuição de material explicativo, a fim de estimular líderes das diversas religiões a divulgarem entre seus adeptos a importância da entrega legal.

Como disse a atriz, a entrega voluntária é um ato de supremo cuidado. Muitas mulheres, sabendo dessa possibilidade, podem desistir do aborto, seja a gestação resultante ou não de estupro.  Os motivos que levam a mulher a optar pela entrega do filho não são questionados e o sigilo é preservado.

Não nos cabe, em hipótese alguma, julgar o que se passa no coração de uma mulher que pensa em abortar ou que já tenha praticado um aborto. Mas é nosso dever lutar com toda força e sensibilidade pela vida, pelo nascimento, pela reencarnação. Assim, divulguemos a ideia da entrega voluntária, prática que já salvou muitas vidas e poderá salvar muitas outras mais.



[2] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Brasília: FEB, 2013. pt. 2, cap. VII, q. 359.

[3] TEIXEIRA, J. Raul. Justiça e Amor. Pelo Espírito Camilo. Niterói: Fráter, 2013. cap. 15.

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