Marcelo Anátocles Ferreira - julho/2023
Recentemente, uma jovem atriz de
21 anos foi vítima de estupro, engravidou e optou pela entrega voluntária da
criança. Ela tentou manter o fato em sigilo, mas, sem a sua autorização, a
história vazou e acabou publicada nas mídias. Sofrendo muito com o que tinha
lhe acontecido e com a repercussão do caso, ela decidiu escrever uma carta, na
qual afirma:
Entregar uma criança em adoção não é um crime, é um ato
supremo de cuidado. Eu vou tentar me reconstruir, e conto com a compreensão de
vocês para me ajudar a manter a privacidade que o momento exige. Com carinho,
[…]
Essa história real nos faz
meditar sobre o tema e sua importância para todos nós. É muito importante que a
entrega voluntária seja debatida para que possamos saber o que é exatamente,
como se processa e suas repercussões, no campo íntimo e no social. Para nós,
espíritas, é um tema fundamental por ser uma opção pela vida, o que se
harmoniza com os ensinamentos de Cristo e com a Doutrina Espírita.
No aspecto jurídico, temos a
previsão da entrega legal no artigo 19-A do Estatuto da Criança e do
Adolescente, que dispõe que a mãe que manifeste interesse em entregar o
filho para adoção, antes ou logo após o nascimento, será encaminhada à Justiça
da Infância e da Juventude para obter informações sobre a melhor forma de
proceder. Fica assim muito claro que é possível, compreensível e legal que a
gestante entregue seu filho para adoção, sem que precise dizer os motivos que a
levaram a tomar essa decisão. A lei garante todo o sigilo em relação à mãe e à
entrega da criança. A Agência Brasil informou que em 2020 foram registradas
1.012 entregas voluntárias no país, número que aumentou para 1.238 no ano
seguinte.
Vale refletir mais um pouco
sobre a questão da entrega legal da criança gerada por uma vítima de estupro.
Nossa Doutrina Espírita admite o aborto somente na hipótese de risco de morte
da gestante, conforme previsto na questão 359, de O Livro do Espíritos[2].
Nas demais hipóteses, o aborto não é admitido por sabermos que a vida se inicia
na concepção. Assim, apesar de a Lei Penal Brasileira admitir o aborto na
hipótese de estupro, para nós, espíritas, a melhor solução sempre será
preservar a vida.
O Espírito Camilo, pelas
abençoadas mãos do médium José Raul Teixeira, ensina[3]:
Seja quem for o pai, amado ou odiado, a mulher será
sempre mãe do filho que leva nas entranhas. E, se o seu caráter não tiver
espaço para a sensibilidade materna e o seu anseio maior seja desfazer-se da
criança, importante será que não a destrua, não lhe mate o corpinho. Deixe-a
nascer e entregue-a a alguma instituição ou a pais adotivos que a desejem amar
e dela cuidar.
Assim, é essencial que
divulguemos nas Federativas e em nossa Casas Espíritas a possibilidade da
entrega voluntária.
O Tribunal de Justiça do Estado
do Rio de Janeiro promoveu dois eventos sobre o tema para disseminar detalhes
da entrega voluntária, com distribuição de material explicativo, a fim de
estimular líderes das diversas religiões a divulgarem entre seus adeptos a
importância da entrega legal.
Como disse a atriz, a entrega
voluntária é um ato de supremo cuidado. Muitas mulheres, sabendo dessa
possibilidade, podem desistir do aborto, seja a gestação resultante ou não de
estupro. Os motivos que levam a mulher a
optar pela entrega do filho não são questionados e o sigilo é preservado.
Não nos cabe, em hipótese
alguma, julgar o que se passa no coração de uma mulher que pensa em abortar ou
que já tenha praticado um aborto. Mas é nosso dever lutar com toda força e
sensibilidade pela vida, pelo nascimento, pela reencarnação. Assim, divulguemos
a ideia da entrega voluntária, prática que já salvou muitas vidas e poderá
salvar muitas outras mais.
[1] MUNDO ESPÍRITA - Julho de 2023 Número 1668 Ano
90 - http://www.mundoespirita.com.br/?materia=gravidez-nao-desejada-e-entrega-voluntaria-uma-opcao-pela-vida
[2] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Brasília: FEB,
2013. pt. 2, cap. VII, q. 359.
[3] TEIXEIRA, J. Raul. Justiça e Amor. Pelo Espírito
Camilo. Niterói: Fráter, 2013. cap. 15.
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