26 julho 2016
A morte é inevitável.
Mas podemos prevê-la?
Alguns cientistas acreditam que
sim. Segundo eles, experimentos com moscas-das-frutas revelaram uma nova e
distinta fase da vida que anuncia seu fim: um estágio que chamam de espiral da
morte ‒ na sua opinião, humanos também passam por ele.
Até 25 anos atrás, biólogos
assumiam que havia apenas duas fases fundamentais da vida: infância e vida
adulta, uma divisão que todos nós reconhecemos.
A infância é marcada pelo rápido
crescimento e desenvolvimento, um estágio que precede nossa maturidade sexual.
Durante essa fase, as chances de morrermos são constantemente pequenas.
A vida adulta começa quando
atingimos a maturidade sexual, e a chance de morrermos nela também é pequena:
nessa fase, estamos em nosso auge e mais propensos a procriar.
Mas, na medida em que o tempo
avança, nossos corpos envelhecem e se degradam: a cada ano que passa, nossa
probabilidade de morrer aumenta.
Complexidade
Nos anos 90, cientistas
perceberam que a vida era um pouco mais complexa do que isso. E identificaram
outra fase dela, pela qual os membros mais velhos de nossa sociedade passam ‒ a
terceira idade.
A distinção da terceira idade
para o restante da vida adulta é o padrão único de mortalidade. Se um homem de
60 anos tem uma chance muito maior de morrer que um de 50, uma pessoa com 90
tem praticamente a mesma chance que uma de 100.
"As taxas de mortalidade de
estabilizam", explica Laurence Mueller, da Universidade da Califórnia, nos
EUA.
A razão pela qual a
estabilização ocorre ainda é alvo de intenso debate ‒ não há um argumento definitivo.
Mueller e seu colega de
pesquisas, Michael Rose, dedicaram-se a procurar por sinais biológicos.
"Queríamos saber se a reprodução ou a fecundidade feminina seguiam o mesmo
padrão", explica.
Eles concentraram seus estudos
no animal de laboratório preferido dos biólogos ‒ a mosca-das-frutas.
"Usamos 2.828 fêmeas e
colocamos cada uma em um recipiente com dois machos. Todos os dias movíamos as
fêmeas para um novo recipiente e contávamos quantos ovos tinham posto. Fizemos
isso até que todas tivessem morrido".
As moscas normalmente vivem por
diversas semanas, e os resultados iniciais pareciam ser desapontadores: as
taxas de fertilidade não se estabilizaram de forma óbvia quando as moscas
chegaram perto do final de suas vidas.
Mas eles notaram depois que uma
mosca próxima da morte não tinha a mesma taxa de fertilidade de uma de mesma
idade que teria mais algumas semanas de vida ‒ o número de ovos postos
despencou nos 15 dias finais.
Mueller e Rose batizaram essa
fase de "a espiral da morte", e desde 2007 vêm procurando por mais
evidências dela.
Cinco anos mais tarde,
descobriram que o ciclo de fertilidade de moscas macho seguia o mesmo padrão de
declínio. E neste ano, conseguiram prever se uma mosca morreria em determinado
dia apenas avaliando o quão fértil tinha sido nos três dias anteriores ‒
ignorando outras informações, como a idade do inseto.
E os pesquisadores não são os
únicos a estabelecer conexões entre fertilidade e morte.
James Curtsinger, da
Universidade de Minnesota (EUA), também faz experiências com envelhecimento e
morte em moscas-das-frutas, e seu trabalho tem conclusões semelhantes.
Mas o cientista também descobriu
que essa queda de fertilidade não depende da idade ‒ por isso, ele acredita que
a espiral da morte é um conceito vago.
Sua terminologia é aposentadoria
‒ e ela é fácil de identificar em fêmeas. Começa no momento em que uma falha em
colocar um único ovo.
Uma fêmea é capaz de colocar 1,2
mil ovos durante sua vida. Então, se passa um dia inteiro sem fazê-lo, isso é
sinal de que algo está muito errado.
Mas Curtsinger não tem uma
explicação para essa ligação forte entre fertilidade e morte.
James Carey, da Universidade da
Califórnia, acredita que isso seja mais um sinal de que a reprodução tem um
custo para pais, em especial para as fêmeas ‒ mulheres podem ter problemas
dentais, por exemplo, como consequência de terem muitos filhos.
Mais de dez anos atrás, Carey e
seus colegas demonstraram que conseguiam alterar a longevidade de ratos se
alterassem seu ciclo reprodutivo ‒ fizeram transplantes de ovários em fêmeas, e
as ratas viveram mais do que o esperado após a cirurgia.
"Encontramos sinais de que
fêmeas com novos ovários tinham corações mais saudáveis do que as que não
passaram por transplantes", diz Carey.
Mueller continua convicto de que
pessoas destinadas a morrer de causas naturais passarão por um momento
"espiral".
Ele cita um estudo na Dinamarca
em que um grupo de voluntários nonagenários de um asilo passou por uma bateria
de testes para checar força, coordenação e agilidade mental.
Anos mais tarde, eles voltaram
ao local e descobriram que as pessoas que tinham morrido eram as que tinham
registrado os piores resultados.
Ele acredita que seu trabalho
com as moscas pode revelar estratégias para atrasar a morte, de forma que o
declínio comece dias antes, em vez de semanas. "Seria interessante
ficarmos saudáveis que nem todo mundo até bem perto de nossa morte".
O sucesso dessa empreitada pode
representar mais qualidade de vida para humanos.
Leia a versão original dessa reportagem
(em inglês) no site BBC Earth
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