terça-feira, 22 de setembro de 2020

O TRABALHO[1]

 


(Extraído do jornal espírita italiano La Voce di Dio – Traduzido do italiano)

Allan Kardec

 

A medida do trabalho imposto a cada Espírito, encarnado ou desencarnado, é a certeza de ter realizado escrupulosamente a missão que lhe foi confiada. Ora, cada um tem uma missão a cumprir: este, numa grande escala, aquele em escala menor. Entretanto, relativamente, as obrigações são todas iguais e Deus vos pedirá conta do óbolo posto em vossas mãos. Se ganhastes uma vantagem, se dobrastes a soma, certamente cumpristes o vosso dever, porque obedecestes à ordem suprema.

Se, em vez de ter aumentado este óbolo o tivésseis perdido, é certo que teríeis abusado da confiança que o vosso Criador tinha depositado em vós; por isso, sereis tratado como um ladrão, porque tomastes e não restituístes; longe de aumentar, dissipastes. Ora, se, como acabo de dizer, cada criatura é obrigada a receber e dar, quanto mais, espíritas, tendes de obedecer a essa lei divina, tanto mais esforço deveis fazer para cumprir este dever perante o Senhor, que vos escolheu para partilhar seus trabalhos e vos convidou à sua mesa. Pensai, meus irmãos, que o dom que vos é dado é um dos soberanos bens de Deus. Não vos envaideçais por isto, mas envidai todos os esforços para merecer este alto favor. Se os títulos que poderíeis receber de um grande da Terra, se os seus favores são algo de belo aos vossos olhos, tanto mais vos deveríeis sentir felizes com os dons do senhor dos mundos; dons incorruptíveis e imperecíveis, que vos elevam acima de vossos irmãos e para vós serão a fonte de alegrias puras e santas!

Mas quereis ser os seus únicos possuidores? Como egoístas, quereríeis guardar só para vós tanta felicidade e alegria?

Oh! Não; fostes escolhidos como depositários. As riquezas que brilham aos vossos olhos não são vossas, mas pertencem a todos os vossos irmãos em geral. Deveis, pois, aumentá-las e distribuí-las.

Como o bom jardineiro que conserva e multiplica suas flores, e vos apresenta no rigor do inverno as delícias da primavera; como no triste mês de novembro nascem rosas e lírios, assim estais encarregados de semear e cultivar em vosso campo moral, flores de todas as estações, flores que desafiarão o sopro do aquilão e o vento sufocante do deserto; flores que, uma vez desabrochadas em seus pedicelos, não passarão nem jamais murcharão; mas, brilhantes e vivazes, serão o emblema da verdura e das cores eternas. O coração humano é um solo fértil em afeição e em doces sentimentos, um campo cheio de sublimes aspirações, quando cultivado pelas mãos da caridade e da religião.

Oh! Não reserveis apenas para vós esses pedúnculos sobre os quais crescem sempre tão doces frutos! Oferecei-os aos vossos irmãos, convidai-os a vir saborear, sentir o perfume de vossas flores, a aprender a cultivar os vossos campos. Nós vos assistiremos, encontraremos regatos frescos que, correndo suavemente, darão força às plantas exóticas, que são os germes da terra celeste. Vinde! Trabalharemos convosco, partilharemos vossa fadiga, a fim de que também possais acumular esses bens e deles fazer participar outros irmãos, em caso de necessidade. Deus nos dá e nós, reconhecidos por seus dons, os multiplicamos o mais possível. Deus nos incumbe da nossa própria melhoria e da dos outros; cumpriremos nossas obrigações e santificaremos sua vontade sublime.

Espíritas, é a vós que me dirijo. Preparamos o vosso campo; agora agi de maneira que todos que necessitarem possam fruir largamente. Lembrai-vos de que todos os ódios, todos os rancores, todas as inimizades devem desaparecer diante de vossos deveres: instruir os ignorantes, assistir os fracos, ter compaixão dos aflitos, defender os inocentes, lastimar os que estão no erro e perdoar aos inimigos. Todas essas virtudes devem crescer em abundância no vosso campo, e deveis implantá-las nos dos vossos irmãos. Recolhereis uma ampla colheita e sereis abençoados por vosso Pai, que está nos céus!

Meus caros filhos, quis dizer-vos todas essas coisas, a fim de vos encorajar a suportar com paciência todos aqueles que, inimigos da nova doutrina, buscam vos denegrir e vos afligir. Deus está convosco, não o duvideis. A palavra de nosso Pai celeste desceu ao vosso globo, como no dia da Criação. Ele vos envia uma nova luz, luz cheia de esplendor e de verdade.

Aproximai-vos, ligai-vos estreitamente a ele e segui corajosamente o caminho que se abre à vossa frente.

Santo Agostinho



[1] Revista Espírita – Junho/1866 – Allan Kardec

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