quarta-feira, 24 de junho de 2020

ASPECTOS ESPIRITUAIS DA REPRODUÇÃO ASSISTIDA[1]



Por Wilson Ayub Lopes - Associação Médico-Espírita do Brasil

Compreende-se como reprodução assistida a todos os procedimentos e técnicas empregados para auxiliar as mulheres que não estão conseguindo engravidar pelos métodos naturais.
O ano de 1978 marcou um fato importante para a reprodução humana. Nasceu naquele ano, na Inglaterra, Louise Brown, o primeiro bebê de proveta, ou seja, um bebê que iniciou sua vida num tubo de ensaio, acenando com uma nova possibilidade para os 15% de casais inférteis do mundo.
Desde então, várias técnicas foram surgindo, que vão da inseminação artificial, passando pela fertilização in vitro (os chamados bebês de proveta), o GIFT, o ZIFT, as gestações de substituição (barrigas de aluguel) e por último, recentemente, já se conseguiu a reprodução de um animal (ovelha) através de uma célula adulta (clonagem), com possibilidade de ser efetuada na raça humana.

A visão espírita
O homem, servindo de instrumento da Misericórdia Divina, tem auxiliado a mulher na nobre tarefa de procriar por diversas maneiras.
O que acontece, frequentemente, é que muitas mulheres e homens ainda carregam um certo grau de desequilíbrio e desarmonia no contexto sexual, consequência de um passado de negligências, nesta ou em outras vidas, e, embora possam estar arrependidos e superados daqueles erros e desvios, isso ainda não foi traduzido num restabelecimento completo do seu aparelho reprodutor. Dessa forma, necessitam do auxílio de técnicas e procedimentos laboratoriais para que alcancem o êxito de gerar o seu próprio filho.
Considerando que os desequilíbrios energéticos no contexto sexual  são frequentemente causas de insucesso nas tentativas de engravidar, o primeiro passo seria se harmonizar, se equilibrar, buscando os recursos de meditação, do autocontrole, da oração, do trabalho junto às crianças carentes e do auxílio através do passe magnético e tratamento espiritual ministrados nos centros espíritas.
Geralmente, o processo de reprodução, seja ele natural ou não, possui assistência do Plano Espiritual.
Assim, o termo reprodução assistida poderia ser estendido a todas as formas de reprodução, sob o aspecto espiritual.
Vemos nas citações de André Luiz, no livro “Missionários da Luz”, que existe no Plano Espiritual um departamento que cuida do processo reencarnatório, que ele denominou de Ministério da Reencarnação. Ele relatou, na sua obra, como a Espiritualidade Superior interferiu na reencarnação de Segismundo, preparando o casal que o iria acolher, estabelecendo sintonia vibratória do espírito reencarnante com a futura mãe, logo a seguir com o óvulo, magnetizando-o envolvendo-o pelos seus fluidos perispirituais. Por sua vez, o espermatozoide que será o eleito, entre milhões contidos numa ejaculação, para fecundar o óvulo, será aquele que mais sintonizar energeticamente com o mesmo, sintonia essa que vai determinar não o mais apto, mas o que carrega a carga genética mais apropriada para aquela futura reencarnação.
Esse fato já vem sendo demonstrado pela Ciência oficial. O jornal “O Globo”, em uma edição de 1991, estampou a seguinte manchete: “Óvulos falam com espermatozoides”. A matéria tratava do trabalho realizado por cientistas dos Estados Unidos e Israel, descobrindo que óvulos maduros comunicam-se com espermatozoides, enviando-lhes sinais para guiá-los até às trompas de Falópio, propiciando a fecundação[2].

Religião x Ciência
Existem muitas pessoas e seitas religiosas que são contrárias ao emprego desses métodos auxiliares da fecundação, alegando que os homens estão violando um processo natural. Argumentam que são técnicas frias, realizadas em laboratório, carecendo do amor e da relação sexual entre os parceiros. “Mas, só quem convive com um casal que passa por cima de vários obstáculos para ter um filho é que tem capacidade de quantificar o Amor que depositam neste ato”, afirmou o biólogo Irineu Degasperi, da Clínica de Reprodução Huntington, em Vitória.
O avanço das técnicas de reprodução assistida e da engenharia genética é visto com naturalidade pela doutrina espírita. Kardec deixou claro que o Espiritismo caminharia junto com a Ciência, portanto, não há porque se opor ao seu desenvolvimento. Deus, através da evolução intelectual da humanidade, permite que surjam técnicas novas para auxiliar a natureza no seu processo criativo. O homem evolui intelectualmente, descobrindo e compreendendo como funciona a natureza, em suas várias manifestações, e, através do conhecimento das leis naturais, passa a interferir e contribuir com Deus, tornando-se co-criadores. Contudo, os cientistas devem ter a humildade de reconhecer que estão somente manuseando e favorecendo processos naturais, mas não criando vida.
A doutrina espírita ressalta que as descobertas devem servir para o bem da humanidade e as pesquisas devem ter a finalidade de enobrecer o ser humano. Infelizmente, muitas vezes o homem as utiliza de forma inadequada.
Em O Livro dos Espíritos, pergunta 780, encontramos que o progresso moral segue o intelectual, mas nem sempre imediatamente. À medida que progredimos com as descobertas científicas, torna-se maior a nossa responsabilidade. Assim aconteceu com a energia nuclear, que inicialmente foi utilizada para fins bélicos (bomba atômica) e atualmente serve como fonte riquíssima de energia, e com outras descobertas científicas.
As descobertas científicas não são boas ou más em si mesmas. Bom ou mal é o uso que se faz delas.
No livro “Uma Janela para a Vida”, Emmanuel foi inquirido sobre se os espíritos que reencarnavam através da reprodução assistida vinham precedidos de um preparo espiritual, e ele respondeu que sim, desde que a Ciência, na Terra, evitasse abusos e extravagâncias nas suas experimentações.
Certa vez, perguntaram a Chico Xavier se o ser humano seria desenvolvido no laboratório. Ele respondeu:

Olha gente, a Ciência vai desenvolver o ser humano no laboratório. Eles (os cientistas) vão fabricar um enorme ‘útero’ no laboratório e aí dentro vão gerar o ser[3]. Levarão talvez de duzentos a quatrocentos anos até conseguirem realizar. Mas vão realizar. Aí, libertarão a mulher do parto.
E tem outra coisa. Nesse útero, os espíritos vão reencarnar, tudo direitinho, sem problema. Esse fato não vai alterar coisa alguma, a Ciência vai conseguir isso.
Ora, o avanço da Ciência é obra da Espiritualidade através dos missionários[4].

Não importa de que modo a criança tenha vindo ao mundo, se por meio naturais ou não; o que importa é se vai ser bem recebida e criada com amor e dedicação.

O congelamento de embriões
Durante o procedimento da fertilização in vitro (FIV), geralmente são fecundados diversos óvulos, com a formação de um número excessivo de embriões. Como a lei brasileira só permite que sejam implantados no útero materno, no máximo quatro embriões por vez, os embriões excedentes são congelados a uma temperatura de –196°C. Poderão ser utilizados posteriormente na própria mãe doadora do óvulo ou serem implantados em outra mãe receptora.
O que fazer com esses embriões? Essa pergunta vem intrigando cientistas, médicos, religiosos e juristas do mundo todo. A polêmica se acendeu na Inglaterra, onde existe uma lei em vigor desde 1991, que estabelece um prazo máximo de cinco anos para a conservação desses embriões. Os primeiros lotes já foram dissolvidos em água e álcool.
No centro da polêmica, está a complicada questão sobre o momento em que começa a vida. Embriões humanos podem ser destruídos impunemente, como um objeto qualquer, um subproduto de laboratório ou estaríamos diante de um aborto?
Nós sabemos, através da pergunta 344 de O Livro dos Espíritos e do capítulo XI, de A Gênese, que a união da alma ao corpo começa no momento da concepção, quando o espírito se sente atraído por uma força irresistível e se liga ao corpo por um laço fluídico, que nada mais é que uma expansão do seu perispírito.
Sabemos também que essa união é definitiva, no sentido de que um outro espírito não poderá substituir aquele que está designado para este corpo.
Por outro lado, vamos encontrar na pergunta 356 que podem existir natimortos que jamais tiveram espíritos designados para os seus corpos, podendo inclusive chegar a termo, porém não sobrevivem.
É descrito que embriões congelados podem permanecer viáveis por vários anos, com relato do caso de uma mulher que gerou um filho a partir de um embrião congelado por cinco anos. Como a união do espírito ao corpo se faz no momento da concepção, deduzimos que o espírito permaneceu ligado a esse corpo (embrião), durante todo esse tempo.
O espírito que está ligado ao embrião pode também recuar diante da prova, e romper os laços que o prende; nesse caso, o embrião não sobrevive.
Na pergunta 351, de O Livro dos Espíritos, vamos encontrar que o espírito, durante o desenvolvimento do feto, goza parcialmente de suas faculdades no plano espiritual. Ele se encontra num estado de perturbação que vai crescendo até o nascimento, à medida que o laço fluídico vai se apertando.
Conforme a doutrina espírita, o espírito que vai animar aquele corpo tem existência fora dele, ou seja, ele ainda não está encarnado, mas apenas ligado ao novo corpo. Então, concluímos que, como o espírito reencarnante está apenas ligado por um cordão fluídico ao embrião, ele usufrui de certo grau de liberdade, de acordo com o seu estado evolutivo, como confirma Emmanuel no livro “O Consolador”. Isso permite que, mesmo se encontrando com certo grau de perturbação, ele possa desenvolver algumas atividades no plano espiritual.
Outra possibilidade, aventada por Raul Teixeira num artigo publicado na “Revista Espírita Allan Kardec”, seria que

entidades espirituais devedoras da sociedade se oferecem para vir atender ao progresso da Ciência. Dessa forma, são ligadas a esses embriões para que vivam hermeticamente vinculadas a eles, num processo de mutismo, enquanto o embrião estiver congelado. Nesse trabalho de servir à Ciência, possam conseguir o progresso, ao invés de renascerem na Terra e sofrerem situações de enfermidades variadas durante largos anos.

De qualquer forma, analisando à luz da doutrina espírita, não podemos aceitar, sob qualquer pretexto, a eliminação pura e simples desses embriões, assim como somos contra o aborto ou qualquer outro ato contrário à vida.
Talvez, os cientistas consigam congelar óvulos maduros e espermatozoides, minimizando os problemas éticos e espirituais relativos ao congelamento de embriões.
Outra linha de pesquisa que já se comenta é a possibilidade de detectar se já existe um espírito ligado ao embrião, através das emanações do seu perispírito, mas ainda não existe nada desenvolvido.

A utilização das células-tronco em pesquisas científicas
A equipe da Revista Cristã de Espiritismo aproveitou a presença do médium e orador Divaldo Pereira Franco no 3º Encontro Amigos da Boa Nova, realizado no dia 21 de abril, para perguntar sua opinião sobre a utilização das células-tronco em pesquisas científicas.
Alguns companheiros espíritas têm se manifestado receosos em relação à questão das células-tronco, pelo fato de um espírito poder estar ligado ao embrião. Como o senhor analisa essas pesquisas que a Ciência vem desenvolvendo na área?
Os espíritos nobres são unânimes em abençoar os esforços da Ciência quando procura dignificar a criatura humana, promovendo o progresso da sociedade e tornando o mundo melhor. Toda descoberta recente torna-se polêmica porque estão, ainda, os investigadores, nos pródromos de suas próprias propostas.
É natural que, não possuindo ainda resultados determinantes, tudo se encontre no plano do plausível e do possível. Os espíritos são unânimes em dizer que interromper a vida do ser em formação, seja sob qual pretexto que se apresente, é aborto delituoso. No entanto, a própria Ciência, que encontra no zigoto as células mais favoráveis para a adaptação e a formação dos órgãos, já consegue detectá-las na medula óssea do próprio paciente, assim como também no cordão umbilical do recém-nascido.
Aguardamos que no momento próprio os cientistas consigam novas descobertas que possam contribuir para libertar a criatura de resgates profundamente angustiantes, como anomalias de diversas naturezas, mas sem que se torne necessário para tanto a interrupção da vida do ser em formação.
E no caso de alguns seres desenvolverem a formação de um corpo sem espírito unido (bebês natimortos), como aborda a questão 136 de O Livro dos Espíritos?
A dificuldade é saber discernir entre o corpo que é apenas fenômeno biológico da fatalidade molecular, daquele que já traz o vínculo com o espírito. Desde o momento em que o espermatozoide invade o óvulo e dá lugar à célula ovo, começa a reencarnação. A pílula do dia seguinte ou outro instrumento qualquer que interrompa a vida são considerados aborto.
Kardec respondeu a essa questão demonstrando que a matéria é espontânea e podem acontecer fenômenos em que os elementos moleculares se aglutinem e por falta de alma não tenham vida. É provável que também tenha se referido à fecundação na trompa, quando normalmente acontece o que nós podemos chamar de uma espécie de tumor, mas não nos é licito generalizar.
O senhor acredita que essa resposta só virá quando existir uma união maior entre a Ciência e a Espiritualidade Superior?
Não necessariamente. O que falta é uma bioética para que sejam estabelecidos os limites até onde a investigação seja ética.
Quando Adolf Hitler tornou-se o primeiro mandatário da Alemanha, em 1935, de imediato tornou o aborto legal. Na chamada “noite dos cristais” ele liberou o assassinato em massa de milhões de indivíduos e a seguir, pediu aos pais que se tivessem filhos deficientes, que os mandassem para as câmaras de gás. Então, crianças foram mortas em nome de uma super raça que estava apenas na imaginação delirante do psicopata.
A função da doutrina religiosa não é dizer à Ciência o que fazer. Quando os cientistas acreditarem na existência de Deus, saberão onde avançar, mas não cabe aos espíritos dizerem se determinado corpo em formação está ou não unido a um espírito. A ética será: matar jamais!




[2] Vide ESPERMATOZOIDE FECUNDA O ÓVULO, CERTO? NÃO É TÃO SIMPLES ASSIM, publicado neste blog em 08/01/2020.
[3] Vide ÚTERO ARTIFICIAL. FOI CRIADO, TESTADO E FUNCIONA, publicado neste blog em 26/06/2019.
[4] Esse fato foi narrado por Ranieri no livro: “Chico Xavier – o Santo de Nossos Dias” (2ª edição – 1973).

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