Carlos de Brito Imbassahy
Ocorreu há mais de setenta anos.
Tenho contado o fato. Numa sessão mediúnica presidida pelo meu pai, que eu
estava presente, por intermédio de uma senhora médium excelente de
identificação, manifestou-se antigo companheiro seu ‒ já desencarnado,
obviamente ‒ que fora amigo dos primeiros momentos de doutrina.
A primeira coisa que ele disse,
após se apresentar, foi algo assim:
Sei, Imbassahy que,
para aceitar minha comunicação, você vai querer que eu me identifique. Pois vou
lhe contar três fatos da nossa época que, aqui, só nós dois conhecemos...
E, de fato, passou a comentar
essas ocorrências que só os dois, dali da sala, haviam testemunhado. Nem minha
mãe sabia, porque fora antes de se casarem.
Ciente de que não podia haver
dúvida a respeito da presença do amigo, meu pai lhe fez uma saudação, muito
comovido.
Depois de trocas de palavra,
este amigo vaticinou:
O espiritismo vai
sofrer terrível influência da falange jesuítica que está preparando uma nova
técnica para acabar com a doutrina. O objetivo deles é influir de tal forma em
nosso meio, até mesmo com alguns se encarnando para virem o fato, com o fito de
transformar o Espiritismo em mais uma seita evangélica e, dessa forma,
descaracterizá-lo de suas funções precípuas.
Nunca me esqueci de tais
palavras.
Hoje, realmente, vivo para
comprovar o que ele havia premunido.
Com raras exceções, até na
Internet impera o evangelismo no meio espírita. Quando estudam Kardec,
limitam-se a O Evangelho segundo o
Espiritismo porque na grande maioria dos casos, o estudo é feito à base de
debate de textos altamente evangelizados que são atribuídos a Emmanuel e a
Joana de Ângelis, dois servos da Igreja interpretando os textos do Novo
Testamento sem a conotação kardequiana da análise simples, como ensaio de
estudo, senão como verdade absoluta e insofismável que não se pode negar,
segundo estes analistas.
E ai de quem discordar deles: é
herege!
Estão acabando com o
Espiritismo.
Não conhecem, sequer, a
definição dada por Kardec (preâmbulo do livro O Que é o Espiritismo); ignoram os pontos mais comezinhos do estudo
científico e jamais pontificam dentro da filosofia doutrinária da codificação.
Tudo se resume em Jesus salvador, o da Bíblia, a quem temos que prestar rígida
obediência, sob pena de não merecer as graças de um Deus antropomórfico imposto
por este livro e aceito incondicionalmente pela grande plêiade de adoradores de
mensagens mediúnicas.
No meu ponto de vista, seria o
caso de separarmos as vertentes e continuarmos fraternalmente amigos, embora
seguidores de pontos distintos de ver a doutrina: nós, os espíritas, seguindo
Kardec dentro da sua postura doutrinária e os evangélicos seguindo esta nova
corrente que surgiu em nosso meio com o objetivo de mudar o rumo espírita. E
tudo pode-se fazer fraternalmente, sem que haja qualquer tipo de
desentendimento, afinal, os que têm bons propósitos chegarão a bom destino,
independente do caminho que sigam.
Este tumulto causado pela
evangelização no meio espírita só serve para desviar a codificação da sua
grande finalidade, que é a de atingir àqueles que não aceitam a religião
cristã, muito menos as demais como sendo uma orientação de vida e, como tal,
deparando-se com mais uma seita evangélica, jamais irão estudar o Espiritismo.
Perde, assim, sua finalidade
precípua todo trabalho que Kardec teve para estudar as mensagens mediúnicas que
lhe foram passadas com este objetivo, o de levar a luz aos que não compreendem
a Bíblia e permitir que os verdadeiros ensinamentos de Jesus lhes cheguem de
forma diferente, através da razão, pela compreensão da vida.
Seria tão bom se pudéssemos
pregar o Espiritismo como Kardec o codificou e não alterado da forma por que se
apresenta.
[1] Artigo publicado originariamente, há dezesseis anos, na
“Revista Espírita Harmonia”. Republicado aqui em função de que o panorama
relatado no final da década de 1940 não se alterou e até agravou. Cedido pelo
grupo Espiritismo com Kardec.
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