Léon Denis
Todo ser humano traz os
rudimentos da lei moral gravados em si. É neste mundo mesmo que ela recebe um
começo de sanção. Qualquer ato bom acarreta para o seu autor uma satisfação
íntima, uma espécie de ampliação da alma; as más ações, pelo contrário, trazem,
muitas vezes, amargores e desgostos em sua passagem. Mas essa sanção, tão
variável segundo os indivíduos, é muito vaga, muito insuficiente do ponto de
vista da justiça absoluta. Eis por que as religiões transferiram para a vida
futura, para as penas e recompensas que ela nos reserva, a sanção capital de
nossos atos. Ora, tais dados, carecendo de base positiva, foram postos em
dúvida pela maioria das massas, pois, embora tivessem eles exercido uma séria
influência sobre as sociedades da Idade Média, já agora não bastam para desviar
o homem dos caminhos da sensualidade.
Antes do drama do Gólgota, Jesus
havia anunciado aos homens um outro consolador, o Espírito de Verdade, que
devia restabelecer e completar o seu ensino. Esse Espírito de Verdade veio e
falou à Terra; por toda parte fez ouvir a sua voz.
Dezoito séculos depois da morte
do Cristo, havendo-se derramado pelo mundo a liberdade de palavra e de
pensamento, tendo a Ciência sondado os céus, desenvolvendo-se a inteligência
humana, a hora foi julgada favorável. Legiões de Espíritos vieram ensinar a
seus irmãos da Terra a lei do progresso infinito e realizar a promessa de
Jesus, restaurando a sua doutrina, comentando as suas parábolas.
O Espiritismo dá-nos a chave do
Evangelho e explica seu sentido obscuro ou oculto. Mais ainda: traz-nos a moral
superior, a moral definitiva, cuja grandeza e beleza revelam sua origem
sobre-humana.
Para que a verdade se espalhe
simultaneamente por todos os povos, para que ninguém a possa desnaturar,
destruir, não é mais um homem, não é mais um grupo de apóstolos que se
encarrega de fazê-la conhecida da Humanidade. As vozes dos Espíritos
proclamam-na sobre todos os pontos do mundo civilizado e, graças a esse caráter
universal, permanente, essa revelação desafia todas as hostilidades, todas as
inquisições. Pode-se destruir o ensino de um homem, falsificar e aniquilar suas
obras, mas quem poderá atingir e repelir os habitantes do espaço? Estes
aplanarão todas as dificuldades e levarão a preciosa semente até às mais
escuras regiões. Daí a potência, a rapidez de expansão do Espiritismo, sua
superioridade sobre todas as doutrinas que o precederam e que lhe prepararam a
vinda.
Assim, pois, a moral espírita
edifica-se sobre os testemunhos de milhões de almas que, em todos os lugares,
vêm, pela interferência dos médiuns, revelar a vida de além-túmulo, descrever
suas próprias sensações, suas alegrias e suas dores.
A moral independente, essa que
os materialistas tentaram edificar, vacila ao sabor dos ventos, por falta de
base. A moral das religiões, como incentivo, adstringe-se sobretudo ao terror,
ao receio dos castigos infernais: sentimento falso, que só pode rebaixar e
deprimir. A filosofia dos Espíritos vem oferecer à Humanidade uma sanção moral
consideravelmente elevada, um ideal eminente, nobre e generoso. Não há mais
suplícios eternos; a consequência dos atos recai sobre o próprio ser que os
pratica.
O Espírito encontra-se em todos
os lugares tal como ele mesmo se fez. Se violenta a lei moral, obscurece sua consciência
e suas faculdades, materializa-se, agrilhoa-se com suas próprias mãos. Mas,
atendendo à lei do bem, dominando as paixões brutais, fica aliviado e vai-se
aproximando dos mundos felizes.
Sob tais aspectos, a lei moral
impõe-se como obrigação a todos os que não descuram dos seus próprios destinos.
Daí a necessidade de uma higiene d'alma que se aplique a todos os nossos atos e
conserve nossas forças espirituais em estado de equilíbrio e harmonia. Se
convém submetermos o corpo, este invólucro mortal, este instrumento perecível,
às prescrições da lei física que o mantém em função, urge desde já vigiarmos o
estado dessa alma que somos nós, como eu indestrutível e de cuja condição
depende a nossa sorte futura. O Espiritismo fornece-nos os elementos para essa
higiene da alma.
O conhecimento do porquê da
existência é de consequências incalculáveis para o melhoramento e a elevação do
homem. Quem sabe aonde vai pisa firme e imprime a seus atos um impulso
vigoroso.
As doutrinas negativistas
obscurecem a vida e conduzem, logicamente, ao sensualismo e à desordem. As
religiões, fazendo da existência uma obra de salvação pessoal, muito
problemática, consideram-na de um ponto de vista egoísta e acanhado.
Com a filosofia dos Espíritos,
modifica-se, alarga-se a perspectiva. O que nos cumpre procurar já não é a
felicidade terrestre, pois neste mundo a felicidade não passa de uma quimera,
mas, sim, a melhoria contínua. O meio de a realizarmos é a observação da lei
moral em todas as suas formas.
Com esse ideal, a sociedade é
indestrutível: desafia todas as vicissitudes, todos os acontecimentos.
Avigora-se nos infortúnios e encontra sempre meios para, no seio da
adversidade, superar-se a si mesma. Privada de ideal, acalentada pelos sofismas
dos sensualistas, a sociedade só poderá esperar o enfraquecimento; sua fé no
progresso e na justiça extingue-se com sua noção de virilidade; muito em breve,
será um corpo sem alma e, fatalmente, tornar-se-á vítima dos seus inimigos.
Ditoso quem, nesta vida cheia de
trevas e embustes, caminha corajosamente para o fim almejado, para o ideal que
descortina, que conhece e do qual está certo. Ditoso quem, inspirado em boas
obras, se sente impelido por um sopro do Altíssimo. Os prazeres são-lhe
indiferentes; as tentações da carne, as miragens enganosas da fortuna não mais
dispõem de ascendência sobre ele. Viajor em marcha, só aspira ao seu alvo e
para ele se lança!
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