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Característica única
"Só os seres humanos usam a
linguagem verbal, algo que nos torna únicos entre todos os animais", diz
Maggie Tallerman, professora de linguística da Universidade Newcastle, na
Inglaterra.
Essa capacidade de conversar é
vista como uma das principais transições no processo de evolução. E, por isso,
as pessoas se interessam, há muito tempo, pelas origens da linguagem verbal.
"A língua é uma das
complexas características que nos tornam humanos", diz Robert Foley,
antropólogo e professor de evolução humana na Universidade Cambridge.
A linguagem verbal
pode ter meio milhão de anos
Se você acha que os hieróglifos
são 'antigos', você precisa repensar
Atualmente, existem mais de 6.500
idiomas no mundo. Como os cientistas podem descobrir qual é o mais antigo?
Quando se fala em "língua
antiga", podemos pensar no sânscrito, egípcio antigo ou no dialeto babilônico.
Mas isso não está nem perto do
início da história, diz Tallerman. A maioria das línguas que chamamos de
antigas não chega a ter mais de 6 mil anos e são fundamentalmente as mesmas
línguas de hoje.
A real origem da linguagem
verbal pode ser rastreada em um período que vai a até pelo menos 50 mil anos
atrás. Mas a maioria dos linguistas acha que a origem é bem mais antiga que
isso.
"Muitos de nós acreditam
que começou há mais de meio milhão de anos", diz Tallerman.
Ancestral comum
Evolução da linguagem falada
pode ser rastreada a até meio milhão de anos atrás
Apesar da riqueza na variedade
de línguas no mundo hoje, é "possível que todas as nossas línguas atuais
sejam descendentes de um ancestral comum", diz Foley.
Mapear isso é possível, em
parte, pela biologia da nossa evolução: a genética indica que todos nós viemos
de uma população relativamente pequena na África.
Embora possa ter havido outras
línguas fora dessa linhagem, as que vemos hoje provavelmente descendem de
modificações da mesma língua.
Evidência fóssil
Fósseis podem trazer mais
revelações do que você imagina
Os fósseis dos nossos ancestrais
dão algumas pistas de quando começamos a conversar.
"O discurso, de certa
forma, é uma respiração elaborada", diz Foley. "Estamos respirando,
com enorme controle, para produzir os sons".
Para conseguir fazer isso,
precisamos ter controle muscular preciso sobre nosso corpo.
"Nosso diafragma é mais
desenvolvido e tem muito mais nervos que o diafragma de nossos parentes mais
próximos e sem fala, os macacos".
O resultado de ter todos esses
nervos é que "nossa medula espinhal é um pouco mais grossa nessa área que
a dos macacos, e a coluna vertebral também precisa ser um pouco mais
larga".
Se você olhar para os
Neandertais, cerca de 600 mil anos atrás, eles têm essa expansão na coluna
vertebral.
Mas se você voltar um milhão de
anos, para o Homo erectus, uma
espécie anterior de humanos arcaicos, essa expansão na coluna vertebral não
existe.
Isso nos dá uma ideia de quando
os humanos começaram a usar a fala.
Genética
Qual foi o primeiro hominídeo a
falar?
Além do registro fóssil, os
avanços nos estudos na área de genética também estão fornecendo novos métodos
para encontrar a origem da fala.
"Existe um gene chamado
gene FOXP2, que é comum em todos os primatas", diz Foley. "Mas, como
seres humanos, temos uma versão mutante".
As mutações nesse gene podem
ajudar a explicar por que os humanos podem falar, mas os chimpanzés não,
segundo o professor.
"Sabemos que ele tem um
papel crucial no desenvolvimento da fala e do discurso, porque as pessoas que
têm a forma não mutante do gene geralmente têm problemas na elaboração do
discurso".
Os Neandertais tinham a mesma
variação do FOXP2 que os humanos modernos têm, o que reforça a teoria de que
eles possuíam alguma forma de fala.
Mas saber se eles chegaram a
desenvolver a fala é outra questão.
Tallerman diz que a fala (o som
da linguagem falada) não equivale à linguagem (todo um sistema de palavras e
símbolos). Por isso, segundo ele, é muito difícil detectar a linguagem a partir
de evidências genéticas.
Tamanho do crânio
O tamanho do crânio importa, mas
ser maior nem sempre significa ser melhor: os Neandertais foram extintos,
apesar de terem cérebros maiores.
O tamanho do crânio dos
primeiros humanos pode ajudar a encontrar a data de origem da língua? Na
verdade, não.
Pela simples razão de que não
sabemos o tamanho do cérebro necessário para criar uma língua.
"Na verdade, os Neandertais
tinham cérebros maiores que os nossos porque eram animais maiores", diz
Tallerman.
A primeira palavra
humana pode ter sido "oi!"
"Oi",
"Uau!", "Pst!" ou "Shh!" podem ter sido as
primeiras palavras que os humanos compartilharam.
Quando falamos de uma
protolíngua ‒ uma que veio antes do tipo de língua que você está lendo hoje ‒,
podemos dizer quais foram as primeiras palavras?
"A resposta honesta é: não
temos a menor ideia", diz Foley.
Analisando os primatas, em busca
de possíveis indicações, descobrimos que eles têm o que os primatologistas
chamariam de "palavras" para predadores: eles fazem sons que outros
membros do grupo reconhecerão, para indicar "águia", "leopardo",
ou talvez apenas "cuidado".
Você poderia argumentar que
essas coisas muito simples e concretas no ambiente ao nosso redor teriam sido
as primeiras palavras proferidas pelos humanos.
Uma teoria alternativa é que as
primeiras palavras eram como outras palavras básicas que temos hoje, como
"shh", "psst", "oi!", "uau",
"obrigada" ou "tchau".
Todas essas palavras aparecem em
todas as línguas. O que elas têm em comum é que elas não têm sintaxe ‒ que é a
regra de organização das palavras para criar frases bem formadas em uma língua.
Refeições podem estar
por trás do desenvolvimento da linguagem
Os primeiros seres humanos
"podem ter começado a cooperar ‒ e a falar mais ‒ para explorar o ambiente
e comer diferentes alimentos", segundo Tallerman.
Nossos ancestrais começaram a
vasculhar e a guardar carcaças de animais deixados por grandes predadores.
"Mas se você quiser se
deliciar com os restos de uma carcaça que um bando de hienas atacou, então é
melhor ter um monte de companheiros com você, porque será muito perigoso",
diz Tallerman.
A comunicação também é útil caso
você encontre uma boa carcaça e precise informar os outros membros do grupo que
há comida por perto.
Esta é outra característica da
comunicação humana: usar a linguagem para falar aos outros sobre coisas que não
estão presentes naquele momento, porque pode ter acontecido em um local
diferente ‒ ou em outro período de tempo.
A necessidade de comer e
sobreviver pode ter estimulado os seres humanos a desenvolver a capacidade de
dizer uns aos outros sobre "algo que eles não podem ver, mas que está
lá", como a presença de comida, explica Tallerman.
Fofocas
Saber como conquistar aliados
também é uma parte importante da evolução
Assim, melhorar nossa capacidade
de trabalhar em grupo foi fundamental para o desenvolvimento da língua, mas
nossas necessidades de comunicação não eram necessariamente sofisticadas.
"A cooperação é o cerne
disso. Uma grande parte do que dizemos está relacionado a fazer alianças e a
descobrir o que está acontecendo", diz Foley.
O valor da conversa casual não
pode ser subestimado. "Em grande parte, o bate-papo e a fofoca são o
corriqueiro, o básico da fala", diz a linguista Laura Wright, da
Universidade Cambridge.
Às vezes, mais do que se aliar
ao outro para fazer coisas, o objetivo principal da linguagem parece ser apenas
descobrir informações.
Quando começamos a
contar histórias?
Algo aparentemente tão simples
como contar uma história é uma conquista da evolução.
"Para conseguir construir
narrativas, contar histórias e criar rituais, precisávamos ter grande
capacidade de comunicação", diz Tallerman.
Então, pode ter levado centenas
de milhares de anos para que conversas tenham começado a acontecer.
O caminho de uma protolíngua até
a linguagem moderna foi um salto grande e trabalhoso, mas "todas as línguas
faladas hoje são igualmente complexas", diz Foley.
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