Allan Kardec
O Sr. Delanne, que muitos de
nossos leitores já conhecem, tem um filho de oito anos. Esse menino, que a todo
instante ouve falar de Espiritismo em sua família, e que muitas vezes assiste
às reuniões dirigidas por seu pai e sua mãe, foi, assim, iniciado muito cedo na
doutrina, muitas vezes surpreendendo pela justeza com que raciocina seus
princípios. Isto nada tem de espantoso, pois é apenas o eco das ideias com que
foi embalado.
Também não é o objetivo deste
artigo: é apenas para entrar no assunto do fato que vamos relatar e tem seu
propósito nas circunstâncias atuais.
As reuniões do Sr. Delanne são
graves, sérias, e conduzidas com perfeita ordem, como devem ser todas aquelas nas
quais se quer colher frutos. Embora as comunicações escritas nelas ocupem o
primeiro lugar, aí também se cuida de manifestações físicas e tiptológicas, mas
como ensinamento e jamais como objeto de curiosidade. Dirigidas com método e
recolhimento, e sempre apoiadas em algumas explicações teóricas, estão, pela
impressão que produzem, habilitadas a levar à convicção.
É em tais condições que as
manifestações físicas são realmente úteis. Falam ao Espírito e impõem silencio
à zombaria.
A gente se sente em presença de
um fenômeno, cuja profundeza se entrevê, e que afasta até a ideia da
brincadeira. Se estes tipos de manifestações, de que tanto se tem abusado,
fossem sempre apresentados dessa maneira, e não como divertimento e pretexto para
perguntas fúteis, a crítica não as teria acusado de charlatanice.
Infelizmente, muitas vezes deram
ensejo a isto.
O filho do Sr. Delanne muitas
vezes se associava a essas manifestações e, influenciado pelo bom exemplo, as
considerava como coisa séria.
Um dia se encontrava com uma
pessoa de suas relações e brincava no pátio da casa com sua priminha, de cinco
anos, dois meninos, um de sete, outro de quatro anos. Uma senhora que morava no
térreo os compeliu a entrar em sua casa e lhes deu bombons. As crianças, como
se pode imaginar, não se fizeram rogadas.
A senhora perguntou ao filho do
Sr. Delanne:
Como te chamas, meu filho?
– Eu me chamo
Gabriel, senhora.
Que faz teu pai?
– Senhora, meu pai é
espírita.
Não conheço esta profissão.
Mas, senhora, não é
uma profissão. Meu pai não é pago para isto; ele o faz com desinteresse e para
fazer o bem aos homens.
Menino, não sei o que queres dizer.
‒ Como! Jamais
ouvistes falar das mesas girantes?
Muito bem, meu amigo, gostaria que teu pai estivesse aqui
para as fazer girar.
– É inútil, senhora;
eu mesmo tenho o poder de as fazer girar.
Então, queres experimentar e me fazer ver como se procede?
– Com muito gosto,
senhora.
Dito isto, ele se senta ao pé da
mesinha da sala e faz sentar os seus três amiguinhos; e eis os quatro,
gravemente pondo as mãos em cima. Gabriel fez uma evocação em tom muito sério e
com recolhimento. Mal terminou, e para grande estupefação da senhora e das
crianças, a mesinha ergueu-se e bateu com força.
– Perguntai,
senhora, quem vem responder pela mesa.
A vizinha interroga e a mesa soletra as palavras: teu pai.
A mulher torna-se pálida de emoção. E continua:
Pois bem! Dizei, meu pai, se devo enviar a carta que acabo
de escrever?
– A mesa responde: Sim,
sem falta.
Para provar que realmente és tu, meu pai, que estás aqui,
poderias dizer-me há quantos anos estás morto?
– Logo a mesa bate oito pancadas bem acentuadas. Era justamente
o número de anos.
Poderias dizer o teu nome e o da cidade em que morrestes?
– A mesa soletra os dois nomes.
As lágrimas jorraram dos olhos
daquela senhora que, consternada por esta revelação e dominada pela emoção, não
pôde mais continuar.
Seguramente este fato desafia
toda suspeita de preparação do instrumento, de ideia preconcebida e de charlatanismo.
Também não se podem pôr os dois nomes soletrados à conta do acaso. Duvidamos
muito que esta senhora tivesse recebido tal impressão numa das sessões dos Srs.
Davenport, ou qualquer outra do mesmo gênero. Aliás, não é a primeira vez que a
mediunidade se revela em crianças, na intimidade das famílias. Não é a
realização daquelas palavras proféticas:
Vossos filhos e vossas filhas profetizarão?
Atos dos Apóstolos, 2:17
Allan
Kardec
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