José Márcio de Almeida
Diz o provérbio popular: “A voz
do povo é a voz de Deus!” Se for assim, citemos outro: “À beira da estrada, a
árvore de frutas mais apetitosas é a mais apedrejada!”.
Perguntamo-nos então: por qual
razão o estudo do Evangelho encontra enorme resistência entre os cientistas e
sábios?
Seria porque não se pode aplicar,
ao estudo do Evangelho, o método científico? Ou, reformulando a pergunta:
acreditam não poder aplicar ao estudo do Evangelho o rigoroso método científico?
Se para a Ciência perseverar é
preciso e é a chave para o sucesso, convém não nos esquecermos do sábio
conselho legado por Schopenhauer: “Sempre que uma boa ideia não estiver sendo
aceita, lembre-se de checar as causas anteriores e guarde esta preciosa
citação: ‘Toda verdade passa por três etapas: primeiro é ridicularizada, depois
é violentamente antagonizada e, por último, é aceita universalmente como
autoevidente’” [2].
Na Ciência, como em tudo, o
método é determinante.
Num deles, a metodologia reducionista,
proposta por Descartes[3] e
posteriormente desenvolvida por Newton[4] ,
propõe-se chegar à verdade através da dúvida sistemática e da divisão do
“problema” em várias pequenas partes, de modo que, compreendendo o simples se possa
alcançar o entendimento do todo.
E, se os homens de Ciência se
propusessem estudar o Evangelho à luz dos princípios e pressupostos básicos da Doutrina
Espírita? Afinal, asseverou-nos o Codificador que “(...) Caminhando de par com
o progresso, o Espiritismo jamais será ultrapassado, porque, se novas
descobertas lhe demonstrarem estar em erro acerca de um ponto qualquer, ele se
modificará nesse ponto. Se uma verdade nova se revelar, ele a aceitará” [5].
Isto lhe parece desafiador?
Esclarecemos que no Espiritismo,
em seu viés científico (fenomenológico), há uma metodologia de análise, há
fatos concretos, há refutações, há hipóteses e explicações detalhadas das
causas e de seus efeitos.
Outrossim, corroborando esse entendimento,
diremos ainda que, se nem mesmo os fatos e teorias associados à mecânica quântica,
que trouxeram inúmeros debates sobre a validade ou não, acerca do método
científico, foram capazes de derrubar a validade dos princípios causal e da localidade,
como princípios básicos para descrição da natureza, como negar a possibilidade
de aplicá-los ao (i) exame dos fenômenos espíritas e (ii) ao estudo minucioso do
Evangelho?
Se a resposta for um rotundo
“Sim!”, como, então, estudar o Evangelho à luz do método científico e dos
ensinamentos legados pelos Espíritos Superiores? Como retirar da letra o
Espírito que vivifica![6]
Retirar da letra o Espírito que vivifica
eis o objetivo a ser alcançado!
Segundo Honório Onofre de Abreu[7] ,
para o estudo minucioso (científico) do Evangelho, cujo conteúdo pode ser identificado
a partir de um texto completo, um versículo, uma frase, uma expressão ou mesmo uma
só palavra, observado seu sentido no trecho sob análise, é preciso “Empenhar-se
no estudo intensivo da Doutrina Espírita, em especial de seus princípios fundamentais:
Deus; Jesus; Espírito; Perispírito; Evolução; Livre arbítrio; Pluralidade dos mundos
habitados; Imortalidade da alma; Vida futura; Plano espiritual; Mediunidade;
Influência dos Espíritos em nossa vida; e, Ação dos Espíritos na Natureza” [8].
“O primeiro passo será sempre
entender bem o aspecto literal do texto, através de uma leitura atenciosa, considerando
o significado exato: de cada palavra; tempo e pessoas dos verbos; lugar;
ocasião; circunstâncias; profissões e cargos; expressões e hábitos vigentes à
época de Jesus”. E, assim, “Buscar cuidadosamente o seu conteúdo espiritual”.
[Pois]
Este é o que dá vida,
universalidade e eternidade à Boa Nova “[9].
Por entre as montanhas de Minas
Gerais, o método científico do “Seu Honório” ficou conhecido como “Método Miudinho”,
pois que dedica uma grande atenção aos pormenores.
O “Método Miudinho” de estudo do
Evangelho busca dar, segundo uma análise trina, da conjunção de referências bíblicas
(Antigo Testamento), evangélicas (Novo Testamento) e doutrinárias (obras
fundamentais e subsidiárias da Doutrina Espírita), explicações detalhadas das
causas e de seus efeitos morais e materiais (temporais).
Vejamos um singelo exemplo:
Referência bíblica
(Antigo Testamento): “Clama a mim, e responder-te-ei, e anunciar-te-ei coisas
grandes e firmes que não sabes” [10].
Referência
evangélica (Novo Testamento): “Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que
o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará
lembrar de tudo quanto vos tenho dito” [11].
Referência
doutrinária (obras fundamentais): “Se o Cristo não disse tudo quanto poderia
dizer, é que julgou conveniente deixar certas verdades na sombra, até que os
homens chegassem ao estado de compreendê-las. Como ele próprio o confessou, seu
ensino era incompleto, pois anunciava a vinda daquele que o completaria; previra,
pois, que suas palavras não seriam bem interpretadas, e que os homens se
desviariam do seu ensino; em suma, que desfariam o que ele fez, uma vez que
todas as coisas hão de ser restabelecidas: ora, só se restabelece aquilo que
foi desfeito” [12].
Referência
doutrinária (obras subsidiárias): “Enquanto o espírito do homem se engolfa apenas
em cálculos e raciocínios, o Evangelho de Jesus não lhe parece mais que
repositório de ensinamentos comuns; mas, quando se lhe despertam os sentimentos
superiores, verifica que as lições do Mestre têm vida própria e revelam
expressões desconhecidas da sua inteligência, à medida que se esforça na edificação
de si mesmo, como instrumento do Pai. Quando crescemos para o Senhor, seus ensinos
crescem igualmente aos nossos olhos” [13].
São textos correlatos?
Uma análise possível: o profeta Jeremias
alerta sobre “coisas grandes e firmes” que não sabemos; o Cristo nos fala do
tempo em que o Consolador nos “ensinará todas as coisas”; Kardec esclarece que
“todas as coisas hão de ser restabelecidas”; e Narcisa, em sua fraterna orientação
a André Luiz, lhe diz que as lições do Mestre podem revelar ao espírito do
homem “expressões desconhecidas da sua inteligência”.
É assim que a Ciência irá
contribuir para a ampliação do entendimento da Boa Nova e a esta, bem
entendida, bem compreendida e bem vivida, irá impulsionar a Ciência e elevá-la a
patamares, ainda hoje, inimagináveis.
(Uma última consideração: René Descartes
foi um dos maiores estudiosos dos textos bíblicos, do Antigo e do Novo Testamento!)
“Cogito ergo sum” [14].
[1] O Fóton – Volume 9 – Janeiro/2018
[2] SCHOPENHAUER, Arthur. O mundo como vontade e como
representação. Trad. Jair Barboza. São Paulo: Ed. UNESP, 2005. ISBN 8571395861
(visualização no Google livros). Acesso em: 24 dez. 2017.
[4] ISAAC NEWTON (Woolsthorpe-by-Colsterworth, 4 de janeiro
de 1643 — Kensington, 31 de março de 1727).
[7] HONÓRIO ONOFRE DE ABREU (Belo Horizonte, 12 de junho de
1930 — Belo Horizonte, 13 de novembro de 2007). Foi presidente da União
Espírita Mineira.
[8] ABREU, Honório Onofre. Luz Imperecível. Estudo
Interpretativo do Evangelho à Luz da Doutrina Espírita. Belo Horizonte, União
Espírita Mineira, 6ª ed. 2009.
[9] http://www.febnet.org.br/blog/sem-categoria/como-estudar-o-evangelho/
. Acesso em: 24. Dez. 2017.
[12] KARDEC, Allan. A Gênese. Rio de Janeiro: FEB, 2007.
[13] XAVIER, Francisco Cândido. Os Mensageiros. Pelo
Espírito André Luiz. 45. ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
2007.
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