quinta-feira, 12 de outubro de 2017

FAMÍLIA – Os primeiros passos[1]

 
Joanna de Ângelis


A família, sem qualquer dúvida, é bastião seguro para a criatura resguardar-se das agressões do mundo exterior, adquirindo os valiosos e indispensáveis recursos do amadurecimento psicológico, do conhecimento, da experiência para uma jornada feliz na sociedade.
Nem sempre compreendida, especialmente nos dias modernos, a família permanece como educandário de elevado significado para a formação da personalidade e desenvolvimento afetivo, mediante os quais se torna possível ao espírito encarnado a aquisição da felicidade.
Animal biopsicossocioespiritual, o ser humano não pode prescindir da convivência familiar, porque o instinto gregário que lhe comanda a existência, ido à busca do grupo, qual sucede entre outros animais que vivem em família, protegendo-se e preparando-a para a própria independência.
Escarnecida, no entanto, pelo cinismo filosófico de ocasião, que preconiza a desenfreada corrida pelas trilhas do prazer insaciável, permanece como organização insuperável para a construção da sociedade harmônica.
Examinada pela ótica distorcida daqueles que não experimentaram o convívio saudável no lar, acusam-na de ser responsável pelos conflitos que os assaltam.
Certamente, em muitas famílias, os fatores de desequilíbrio são dos indivíduos imaturos ou autoritários que descarregam os tormentos de que são vítimas, naqueles que, indefesos, encontram-se sob a sua guarda. Tal comportamento não é responsabilidade da família, em si mesma, porquanto, ao invés de acusação indevida, seria ideal que fossem trabalhados os fatores que geram desequilíbrios, corrigindo e orientando os membros que a constituem.
O lar é o celeiro de bênçãos, no qual se coletam as informações e a vivência edificante, tornando-se o primeiro núcleo de socialização da criança, que aí haure as experiências dos ancestrais, adquirindo os hábitos que deverão nortear a sua caminhada existencial.
Se, por acaso, e isso ocorre, não são saudáveis os recursos que lhe são dispensáveis, ao abandono ou à mercê das agressões do mundo em desgoverno, muito mais graves se lhe apresentam as conjunturas, dando-lhe informações destituídas de significado superior e levando-a a atitudes agressivas como mecanismo de defesa em razão dos contínuos enfrentamentos a que se vê constrangida suportar.
No lar, desenvolvem-se a afetividade, o respeito pelos direitos alheios, o despertamento para os próprios direitos sem as extravagâncias nem os absurdos de atribuir-se méritos a quem realmente não os possui.
Esse grupamento familiar, no entanto, não é resultado casual de encontros apressados no mundo físico, havendo ocorrido nas esferas espirituais antes do renascimento orgânico, quando são desenhadas as programações entre os espíritos comprometidos, positiva ou negativamente, para os ajustamentos necessários ao progresso a que todos se encontram submetidos.
Analisando-se, portanto, as necessidades evolutivas, aqueles que se encontram com responsabilidades a cumprir juntos, constatam a excelência do cometimento que lhes ensejará separação e crescimento intelecto-moral, em face dos erros transatos[2], facultando-se a tolerância e o perdão das ofensas como fundamentais para a aquisição da harmonia.
Nada obstante, quando ocorre a reencarnação, em face dos impulsos ancestrais que predominam em sua natureza animal, enquanto aguarda aquele espírito com o qual deverá edificar a família, compromete-se, por precipitação e indisciplina moral, com o primeiro ser que defronta e nele desperta os impulsos que favorecem as sensações fortes, terminando em lamentável fracasso.
Enquanto a sociedade, em geral, permanecer guindada aos interesses imediatistas, especialmente no que diz respeito às sensações, a afetividade expressando-se através dos impulsos malconduzidos, os resultados das uniões sexuais serão sempre frustrantes e amargos.
Em razão dessa falsa necessidade de atendimento das funções genésicas, os espíritos desviam-se dos caminhos anteriormente traçados, conduzidos pelos costumes fesceninos[3], pela permissividade exagerada, transitando em agonia, buscando, mesmo sem saber o que desejam...
Não poucas vezes, como decorrência dessa insânia, ao reencontrar o espírito afim, aquele com o qual houvera assumido o compromisso de união para a edificação da família, as possibilidades já não são favoráveis, o que se transforma em maior desconforto, dando lugar a conflitos tormentosos de efeitos deploráveis.
O excesso de liberdade moral que viceja na atualidade e as apetitosas ofertas do prazer, facultam experiências irresponsáveis por falta do necessário amadurecimento psicológico para os cometimentos sexuais, que se fazem apressados e extravagantes.
Não pensando nas suas consequências, quando ocorre a concepção de seres não desejados, logo se pensa em recorrer ao aborto criminoso, em hedionda conduta que deve ser gravemente enfrentada por todos os cidadãos conscientes da sua condição de humanidade.
É claro que, na estrutura emocional daquele que assim se comporta, não existe espaço mental nem moral para a construção do núcleo familiar.
Em face da situação em que se encontra, surgem as uniões e as separações, cada vez mais perturbadoras, porque logo passam os apetites vulgares, gerando comportamentos promíscuos, nos quais os indivíduos ansiosos mais se afligem.
Numa cultura social saudável, os primeiros relacionamentos afetivos têm por finalidade a vivência do companheirismo, o desabrochar da amizade, passo inicial para a manifestação do amor sem perturbação e com caráter duradouro.
O erotismo, porém, que grassa, não permite aos indivíduos a convivência que lhes faculta o desvelar-se, o conhecimento, sem a ocorrência dos violentos conúbios[4] sexuais de efeitos insatisfatórios, que dão lugar a decepções ou levam ao desbordar das paixões da libido mal direcionada.
Unem-se os solitários egoístas, preparados para a separação, mediante a cultura da indiferença afetiva, como consequência da filosofia consumista de que se vive em sociedade, na qual tudo é descartável, inclusive as afeições humanas. Este comportamento, dizem, para não sofrerem quando ocorrer a ruptura da frágil união.
Certamente há grandiosas e inumeráveis exceções, particularmente naqueles espíritos que se permitem esperar pelo ser que lhes proporcione emoção e alegria de viver, facultando-lhes a união feliz, coroada pela prole com a qual estão comprometidos.
O namoro, portanto, é o primeiro passo no caminho a percorrer afetivamente, quando há o respeito moral recíproco e o anelo pela convivência benéfica.
Embora seja essencial a união sexual, o fundamental é o sentimento de amor que pode resistir aos embates do relacionamento a dois, e depois, com o grupo de espíritos renascidos no corpo físico, constituindo o santuário doméstico.
Na primeira fase, ocorrem os fenômenos relacionados às necessidades afetivas sem os impulsos primários, nascidos no reconhecimento espiritual do outro.
Lentamente, planificam-se as aspirações e trabalha-se pela sua execução harmônica, o que propicia bem-estar e alegria com a presença física, sem qualquer tipo de tormento.
Quando, em sentido oposto, o namoro se transforma em convivência sexual, desaparece o interesse de permanência, enquanto a afetividade diminui, cedendo lugar ao hábito destituído de meta procriativa, construção familiar.
A constelação familiar, no namoro encontra a pedra angular para o futuro alicerce doméstico, que deverá resistir às tormentas do quotidiano.
Familiares difíceis e gentis procedem, portanto, da programação anteriormente traçada, que o amor do casal conseguirá conduzir com sabedoria.
... E quando o problema se apresentar entre os parceiros, a consciência do dever se encarregará de bem orientar o comportamento de ambos em favor do êxito do empreendimento familiar.




[1] Constelação Familiar – Joanna de Ângelis/Divaldo P. Franco
[2] Passados, pretéritos.
[3] Licencioso; burlesco.
[4] Ligação, união.
 
 

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