Uma de nossas amigas, a Sra.
Schutz, que pertence a este mundo e que parece não querer deixá-lo tão cedo,
havendo sido evocada durante o sono, mais de uma vez deu-nos a prova da perspicácia
de seu Espírito em tal estado.
Um dia, ou melhor, uma noite,
depois de uma longa conversa, disse: “Estou fatigada; tenho necessidade de
repouso; estou quase a dormir, meu corpo precisa descansar”.
Diante disso, fiz-lhe notar o
seguinte: “Vosso corpo pode repousar; falando-vos, eu não o prejudico; é vosso
Espírito que está aqui e não o vosso corpo. Podeis, pois, entreter-vos comigo,
sem que o corpo sofra”.
Ela respondeu: “Enganai-vos,
pensando assim; meu Espírito se destaca um pouco de meu corpo, tal como se fora
um balão cativo retido por cordas. Quando o balão é agitado pelo vento, o poste
que o mantém cativo ressente-se dos abalos transmitidos pelas amarras. Meu
corpo representa o papel de poste para o meu Espírito, com a diferença de que
experimenta sensações desconhecidas do poste e que tais sensações fatigam
bastante o cérebro. Eis por que o meu corpo, assim como o Espírito, necessita de
repouso”.
Conforme nos declarou aquela
senhora, durante a vigília jamais havia pensado em tal explicação, o que vem
mostrar perfeitamente as relações existentes entre o corpo e o Espírito, enquanto
este último desfruta uma parte de sua liberdade.
Sabíamos perfeitamente que a
separação absoluta só ocorre depois da morte e, até mesmo, algum tempo depois.
Jamais, porém, essa ligação nos havia sido descrita por uma imagem tão clara e
tão interessante. Por isso felicitamos sinceramente aquela senhora por haver
tão bem demonstrado as suas faculdades espirituais enquanto dormia. Entretanto,
para nós isto não passava de uma comparação engenhosa; ultimamente, porém, a
imagem tomou proporções de realidade.
O Sr. R., antigo
ministro-residente dos Estados Unidos junto ao rei de Nápoles, homem muito
esclarecido sobre o Espiritismo, fazendo-nos uma visita perguntou-nos se, nos fenômenos
de aparição, já tínhamos observado uma particularidade distintiva entre o
Espírito de uma pessoa viva e o de um morto.
Numa palavra, se teríamos um
meio seguro de reconhecer se a pessoa está morta ou viva quando um Espírito
aparece espontaneamente, em vigília ou durante o sono. Ao responder-lhe que não
tínhamos outro meio senão perguntando ao Espírito, disse-nos que conhecia, na
Inglaterra, um médium vidente dotado de grande poder que, toda vez que se lhe
apresentava o Espírito de uma pessoa viva, notava um rastro luminoso que partia
do peito e atravessava o espaço, sem
ser interrompido por nenhum obstáculo material, indo terminar no corpo. Era uma
espécie de cordão umbilical que unia as duas partes momentaneamente separadas
do ser vivo. Nunca o observou quando a vida corporal já se havia extinguido e
era por esse sinal que reconhecia se o Espírito pertencia a uma pessoa morta ou
a alguém que ainda vivia.
A comparação da Sra. Schutz nos
veio à mente e encontramos a sua confirmação no fato que acabamos de relatar.
Faremos, todavia, uma observação
a respeito.
Sabe-se que no momento da morte
a separação não é brusca; o perispírito se desprende pouco a pouco e, enquanto
dura a perturbação, conserva uma certa afinidade com o corpo. Não seria
possível que o laço observado pelo médium vidente, de que acabamos de falar,
persistisse ainda quando o Espírito aparece, no exato momento da morte, ou
poucos instantes depois, como acontece tantas vezes? Nesse caso, a presença do
cordão não seria um indicativo de que a pessoa estivesse viva. O Sr. R. não
soube dizer se o médium teria feito essa observação. Em todo caso, ela não é
menos importante e lança uma nova luz sobre aquilo que podemos chamar de
fisiologia dos Espíritos.
[1] Revista
Espírita – Maio/1859 – Allan Kardec
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