José Carlos da Silva Silveira
Estudar os livros de Allan
Kardec antes de palmilhar os caminhos da imensa bibliografia espírita já
existente é fator essencial para uma jornada doutrinária isenta de atropelos.
Isso porque ser espírita sem Kardec — admitamos a possibilidade a guisa de argumentação
— é andar sem destino, é navegar sem bússola, é levantar um edifício sem cuidar
do lançamento dos alicerces.
Claro está que os ensinamentos
espirituais codificados pelo mestre de Lyon têm tido seus desdobramentos, uma
vez que os ensinos dos Espíritos Superiores são aprofundados a partir do grau
de maturidade dos espíritas, que se desenvolve pelo estudo e pela prática das
verdades reveladas. Todavia, sem a análise meticulosa; o exame sério e detido
das páginas escritas por Allan Kardec, que retratam a mensagem dos Orientadores
Espirituais da Humanidade, priva-se do discernimento indispensável para separar
os reais desdobramentos — que acrescentam pormenores sem desnaturar a essência
— do desvio, do erro, da fantasia, em que se comprazem os chamados “mentores”,
nos dois planos da vida.
Espiritismo foi termo criado por
Allan Kardec para titular a nova doutrina, que surgia dos ensinos dados pelo
Espírito de Verdade, doutrina codificada sob a ótica de dois princípios
básicos: o crivo da razão e a universalidade e concordância daqueles ensinos.
Tais princípios devem balizar a ação dos espíritas em todos os tempos como
garantia de segurança doutrinária.
A opinião de um Espírito,
desencarnado ou encarnado, só adquire relevância no sentido de inserção no conteúdo
do Espiritismo à medida que vai sendo absorvida pela razão e recebendo o
beneplácito dos Espíritos Superiores, que continuam a se comunicar em todos os
recantos do Planeta. Esse o critério do Codificador, o “bom senso encarnado”,
no dizer de Camille Flammarion. Tal deve ser o nosso critério, se pretendemos
ser seus discípulos.
“Bem examinada, a Codificação do
Espiritismo apresenta-se como bússola norteadora dos nossos estudos
doutrinários”.
A precipitação no trato com o
ensino dos Espíritos poderá acarretar danos plenamente evitáveis na divulgação
do Espiritismo. A mentira, a fantasia, o erro introduzidos, por descuido, na
propagação da Doutrina Espírita, comprometem o trabalho, em que todos nos
empenhamos, de levar aos homens uma mensagem simples e pura, que lhes sirva de
roteiro seguro em meio das dificuldades da existência.
Por outro lado, a verdade,
mantida em suspenso por imaturidade nossa, voltará mais tarde, sem maiores
percalços, com a força redobrada pela aceitação geral.
O trabalho de divulgação do
Espiritismo traz-nos imensa responsabilidade diante da própria consciência,
pois que estamos levando aos outros uma doutrina que não nos pertence e sim aos
Espíritos Superiores, como mandatários do Cristo.
Estudar Kardec, antes, é uma
garantia de melhor compreensão dessa doutrina, sempre clara, simples, objetiva
e, ao mesmo tempo, sublime, escoimada de toda sorte de misticismo, que,
frequentemente, mantém a atenção na forma, em detrimento do conteúdo da
mensagem.
O estudo das obras da
Codificação leva-nos a separar o que vem dos Espíritos, constituindo-se, por
isso mesmo, em revelações do Plano Superior, das ilações e comentários de
Kardec, que, embora inegavelmente inspirado pelo Espírito da Verdade, não
poderia deixar de emitir seus conceitos também com base nos conhecimentos da
época e no seu próprio juízo de valor como homem. Essa distinção é importante
para não se tomar a palavra de Kardec por ensino dos Espíritos, levando-se em
conta que o próprio Codificador foi peremptório ao afirmar ser a doutrina dos
Espíritos e não dele.
Outro ponto fundamental para o
estudioso é a necessidade de se fazer a interpretação sistemática das
instruções dos espíritos, para que seja, examinadas, não isoladamente, mas no
conjunto. Somente a Adoção desse procedimento evita radicalizações, sempre
perniciosas diante de nossas responsabilidades dentro do Movimento Espírita, em
especial na tarefa da Unificação.
Bem Examinada, a Codificação do
Espiritismo apresenta-se como bússola norteadora dos nossos estudos
doutrinários, ajudando-nos a discernir com maior acerto quanto às comunicações
recebidas através dos tempos por médiuns diversos, a fim de que sejam colocadas
no seu devido lugar: como repetição ou desenvolvimento da essência doutrinária
inserta na codificação; como inserindo informações, cuja veracidade não temos
ainda condições de constatar; ou como fantasias, que devem ser afastadas
liminarmente de nossos programas de divulgação do Espiritismo.
REFORMADOR, 1996
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