quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Evocação no Movimento Espírita: quem disse que não há?[1]


 
Alexandre Fontes da Fonseca - 10/12/2015


Uma das questões de maior interesse no movimento espírita diz respeito à evocação direta de Espíritos em reuniões mediúnicas. Kardec abre o capítulo XXV, “Das Evocações”, de O Livro dos Médiuns (LM) [2] , dizendo que:

 “Os Espíritos podem comunicar-se espontaneamente, ou acudir ao nosso chamado, isto é, vir por evocação. Pensam algumas pessoas que todos devem abster-se de evocar tal ou tal Espírito e ser preferível que se espere aquele que queira comunicar-se. Fundam-se em que, chamando determinado Espírito, não podemos ter a certeza de ser ele quem se apresente, ao passo que aquele que vem espontaneamente, (...), melhor prova a sua identidade,(...). Em nossa opinião, isso é um erro: primeiramente, porque há sempre em torno de nós Espíritos, as mais das vezes de condição inferior, que outra coisa não querem senão comunicar-se; em segundo lugar e mesmo por esta última razão, não chamar a nenhum em particular é abrir a porta a todos os que queiram entrar. (...) A chamada direta de determinado Espírito constitui um laço entre ele e nós; chamamo-lo pelo nosso desejo e opomos assim uma espécie de barreira aos intrusos. Sem uma chamada direta, um Espírito nenhum motivo terá muitas vezes para vir confabular conosco, a menos que seja o nosso Espírito familiar.” (item 269, grifos em negritos, meus).

            Essas palavras de Kardec, a primeira vista, fazem supor que seria imprescindível evocar determinados Espíritos em uma reunião mediúnica. Porém, um estudo mais atento do Cap. XXV do LM, permite perceber que a ideia não é bem essa. Ainda no item 269 Kardec diz:

“Cada uma destas duas maneiras de operar tem suas vantagens e nenhuma desvantagem haveria, senão na exclusão absoluta de uma delas.” (grifos em negrito, meus).

Kardec, então, considera que há “vantagens”, isto é, benefícios nas duas formas de operar a reunião mediúnica: em que há, e em que não há evocação. E complementa dizendo que “nenhuma desvantagem haveria” a menos que houvesse “exclusão absoluta de uma delas” (grifamos), isto é, que se fizesse reuniões onde não se faz nenhum tipo de evocação ou, o contrário, onde se recebe, apenas, comunicações de Espíritos evocados diretamente. Ainda neste item, Kardec complementa:

“As comunicações espontâneas inconveniente nenhum apresentam, quando se está senhor dos Espíritos e certo de não deixar que os maus tomem a dianteira. (...) O exame escrupuloso, que temos aconselhado, é, aliás, uma garantia contra as comunicações más. Nas reuniões regulares, naquelas, sobretudo, em que se faz um trabalho continuado, há sempre Espíritos habituais que a elas comparecem, sem que sejam chamados, por estarem prevenidos, em virtude mesmo da regularidade das sessões.” (grifos em negrito, meus).

            Kardec deixa, então, claro que quando seguimos a recomendação de fazer um “exame escrupuloso”, isto é, uma análise profunda das comunicações recebidas, não há inconveniente algum em aguardar por comunicações espontâneas numa reunião mediúnica. E acrescenta que nas “reuniões regulares”, isto é, naquelas que ocorrem com frequência regular, “Espíritos habituais” estão sempre presentes.

            Alguns companheiros têm usado esses comentários de Kardec para criticar a forma como os centros espíritas, em sua maioria, orientam e realizam as reuniões espíritas. Alegam, respeitosamente, que fazer evocações nas reuniões mediúnicas é exemplo de Kardec. Mas, será que realmente as reuniões mediúnicas dos centros espíritas estão ocorrendo de modo errado ou incompleto? Nosso propósito, aqui, é mostrar que, na verdade, os centros espíritas estão agindo corretamente e de acordo com essas e outras orientações de Kardec e dos bons Espíritos na Codificação. Para isso, analisemos, as citações de Kardec, acima destacadas.

Primeiro: Kardec está certo quando diz que é um erro não evocarmos os Espíritos em nossas reuniões mediúnicas. Mas quem disse que a evocação não é feita em todas as reuniões mediúnicas comuns das casas espíritas? Quando um companheiro do grupo mediúnico eleva o pensamento em preces para rogar ajuda, inspiração e amparo dos bons Espíritos para a reunião que se inicia, está fazendo uma evocação direta aos bons Espíritos! Jesus não disse: “onde quer que se encontrem duas ou três pessoas reunidas em meu nome, eu com elas estarei.” (MATEUS, XVIII, 20)? Se os membros do grupo estão em sintonia com aquele que, em voz alta, faz a prece, então Jesus será representado na reunião por bons Espíritos (ver o item 5 do capítulo XXVIII de O Evangelho Segundo o Espiritismo (ESE) [3]). Não é necessário nem correto evocar essa ou aquela entidade conhecida, pois sabemos que nem sempre um determinado Espírito pode nos atender (Cap. XXV do LM), e porque quando desejamos a presença e assistência de bons Espíritos, não importa o nome, nem a personalidade que foi conhecida quando encarnado, mas sim se detém conhecimento e bondade suficientes para nos conduzir ao progresso. Além disso, embora não constitua uma evocação direta, quando, em preces, rogamos ajuda para encarnados ou desencarnados, de certa forma estamos fazendo um tipo de evocação, isto é, estamos demonstrando em pensamento, e com respeito, que algumas pessoas são importantes para nós e desejamos que elas sejam ajudadas.

Segundo: Kardec está certo quando diz que a reunião mediúnica ideal é aquela em que se combina evocação com comunicações espontâneas. Quem disse que isso não ocorre nas reuniões mediúnicas comuns das casas espíritas? As evocações são feitas no momento da prece e nas vibrações pelos necessitados, enquanto que as comunicações espontâneas ocorrem ao longo da reunião. Como explica Kardec no capítulo XXV do LM, nem sempre os Espíritos com quem desejamos nos comunicar tem condições de atender nosso chamado. Logo, ao mesmo tempo que, em preces, rogamos ajuda para os Espíritos que sabemos estarem necessitados, deixamos para os bons Espíritos a escolha daqueles que estão em melhores condições de receberem os benefícios da comunicação mediúnica e do diálogo fraterno. Isso se chama organização para melhor servir, o que é condição necessária para a prática eficiente da caridade. No fundo, se analisarmos bem, não se pode nem chamar isso de comunicações espontâneas porque não será qualquer um que irá se comunicar, mas só aqueles que os bons Espíritos sabem que podem ser beneficiados através da reunião mediúnica. Para nós encarnados, parece que as comunicações são espontâneas, mas não o são na realidade. Tudo atende a organização e preparo prévios da espiritualidade.

Terceiro: as reuniões mediúnicas no movimento espírita são periódicas, isto é, ocorrem com frequência regular, geralmente semanal. Logo, nessas reuniões, há a presença de bons Espíritos habituais.

Em quarto lugar, não há com o que se preocupar com eventuais comunicações espontâneas porque os bons grupos mediúnicos realizam fidedignamente a recomendação espírita de realizar um “exame escrupuloso” das comunicações já que, segundo Kardec, essa é “uma garantia contra as comunicações más”.

Portanto, o movimento espírita já segue as orientações de Kardec no tocante às reuniões mediúnicas, comunicações com os Espíritos e, inclusive, evocações. É graças a essa conduta que os centros espíritas podem oferecer ajuda eficiente na realização de comunicações mediúnicas com Espíritos maus. A esse respeito, no item 278 do LM, Kardec diz:

“Uma questão importante se apresenta aqui, a de saber se há ou não inconveniente em evocar maus Espíritos. Isto depende do fim que se tenha em vista e do ascendente que se possa exercer sobre eles. O inconveniente é nulo, quando são chamados com um fim sério, qual o de os instruir e melhorar; é, ao contrário, muito grande, quando chamados por mera curiosidade ou por divertimento, ou, ainda quando quem os chama se põe na dependência deles, pedindo-lhes um serviço qualquer.” (Grifos em negrito, meus).

            Aqui vemos o quinto requisito satisfeito pelos grupos mediúnicos dos centros espíritas em todo o país. Os grupos mediúnicos de desobsessão ocorrem com o fim único e sério de “instruir e melhorar” os Espíritos necessitados de orientação, equilíbrio e paz. A evocação, no caso dos grupos de desobsessão, ocorre quando lembramos na prece inicial, de pessoas que estejam sofrendo influências negativas de certos Espíritos, de Espíritos que saibamos estarem sofrendo e influenciando algumas pessoas, ou quando pedimos aos bons Espíritos que sejamos úteis para ajudar aqueles Espíritos maus que, na análise deles, estão em condições de receberem ajuda através do grupo.

            Com base nas explicações acima, podemos entender a recomendação de Emmanuel na obra O Consolador [4], questão 369:

“369 – É aconselhável a evocação direta de determinados Espíritos”?

- Não somos dos que aconselham a evocação direta e pessoal, em caso algum. Se essa evocação é passível de êxito, sua exequibilidade somente pode ser examinada no plano espiritual. Daí a necessidade de sermos espontâneos, porquanto, no complexo dos fenômenos espiríticos, a solução de muitas incógnitas espera o avanço moral dos aprendizes sinceros da Doutrina. O estudioso bem-intencionado, portanto, deve pedir sem exigir, orar sem reclamar, observar sem pressa, considerando que a esfera espiritual lhe conhece os méritos e retribuirá os seus esforços de acordo com a necessidade de sua posição evolutiva e segundo o merecimento do seu coração. Podereis objetar que Allan Kardec se interessou pela evocação direta, procedendo a realizações dessa natureza, mas precisamos ponderar, no seu esforço, a tarefa excepcional do Codificador, aliada a necessidade de méritos ainda distantes da esfera de atividade dos aprendizes comuns.” (Grifos em negrito, meus).

            Ninguém é proibido de, em pensamento, pedir ajuda para determinado Espírito, rogar notícias de algum familiar ou amigo desencarnado, ou desejar orientação deste ou daquele mentor espiritual. Mas, a Doutrina Espírita esclarece que: i) nem sempre os Espíritos podem atender à evocação (questões 2, 3, 4 e 9 do item 282 do LM); ii) podem simplesmente não desejar atendê-las (questões 10 e 22 do item 282 do LM); e iii) outros Espíritos podem se fazer passar pelos que foram evocados (questões 23 e 26 do item 282 e questão 36a do item 283 do LM). Assim, pensando nos nobres objetivos de uma reunião mediúnica, a abstenção de se evocar, exigir ou esperar pela comunicação de determinado Espírito resguarda o grupo de possíveis mistificações. Em nota à questão 36a do item 283 do LM, Kardec diz: “Os Espíritos levianos se aproveitam sempre da inexperiência dos interrogantes; guardam-se, porém, de dirigir-se aos que eles sabem bastante esclarecidos para lhes descobrir as imposturas e que não lhes dariam crédito aos contos.” (Grifos em negrito, meus). Isso mostra que a preocupação de Emmanuel é mais do que justa. Como o centro espírita contém a presença de companheiros experientes na tarefa mediúnica, as razões acima mostram, também, porque é mais seguro que se pratique a mediunidade no ambiente das casas espíritas, e não nos lares ou em outros locais.

            Em conclusão, vemos que as reuniões mediúnicas que ocorrem nos centros espíritas, estão em pleno acordo com as orientações do Espiritismo. Se engana quem pensa que não ocorrem evocações nas reuniões mediúnicas ordinárias no movimento espírita.




[2] KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. Editora FEB, 96ª edição, Rio de Janeiro (1996).
[3] KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Editora FEB, 112ª Edição, Rio de Janeiro (1996).
[4] XAVIER, Francisco Cândido, por Emmanuel. O Consolador. Editora FEB, 11ª edição, Rio de Janeiro (1985).

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