sábado, 20 de junho de 2015

O fenômeno da Experiência de Quase Morte, EQM[1].




Características e Implicações

Detalhe do quadro "A Ascenção dos Abençoados", do pintor renascentista Hyeronimus Bosch, em que se apresenta a famosa visão do "túnel" relatada por grande parte das pessoas que passaram pela Experiência de Quase Morte (EQM).
Apresentamos aqui o vídeo produzido pela ASSEPE, Associação de Estudos e Pesquisa Espíritas da Paraíba, sobre o fenômeno da Experiência de Quase Morte. Abaixo do vídeo a transcrição de parte do texto introdutório, de Carlos Antonio Fragoso Guimarães, e uma discussão das características e implicações da EQM.
“Na natureza, nada se cria, nada se acaba. Tudo se transforma”. Estas conhecidas palavras do químico francês Antoine de Lavoisier nos aponta que, no mundo natural, todas as coisas estão em permanente estado de desenvolvimento, modificação, recomposição e este processo mantém e garante a vida.
 Toda a vida se expressa na Terra através de relações, interação e troca cíclica de elementos com seu meio, garantindo a renovação constante do fluxo de matéria e energia que formam os organismos vivos.
De fato, todos os elementos básicos que constituem os corpos vivos e que são formados por elementos atômicos que, unidos, constituem as moléculas que formaram os tecidos e órgãos do nosso corpo, são praticamente indestrutíveis. Eles são usados para constituir a base orgânica da vida e, depois, são devolvidos à natureza para que possam novamente ser reutilizados em novas manifestações vitais.
Também a energia obedece à lei de conservação e transformação. A energia do universo, em termos de quantidade, permanece sempre constante, mas se expressa sempre transformada. Uma energia potencial quando utilizada se transforma em energia mecânica, por exemplo, e em calor.
Diante desta perpetuidade dos elementos básicos do mundo físico, que, quando relacionados no fenômeno da vida, se apresentam como um ciclo de manifestação, poderíamos nos perguntar se o mesmo princípio também não valeria para a essência psíquica do ser humano, caracterizado pela sua consciência, senso de identidade, memória e afetividade.

A Crise da Morte
Em nossa cultura e no atual modo que temos de ver a vida, a morte é um momento de extrema crise.
Tendemos a interpretar a morte como o fim total da vida, a cessação definitiva de nossa identidade, de nossa consciência.
 No entanto será este realmente o fim de tudo?

 A EQM
Há algumas décadas, em especial nos últimos quarenta anos, diversos pesquisadores, entre médicos, psicólogos, enfermeiros e outros profissionais, vem coletando relatos de pessoas que, ao enfrentarem a crise da morte nas mais diversas situações, conseguiram retornar à vida com ajuda médica e, para surpresa das testemunhas, relatam ter observado as tentativas de ressuscitamento de um ponto de vista bem diferente de onde estava o seu corpo, e como se comportaram as pessoas ao redor, o que elas disseram e fizeram.
O termo EQM (NDE, em inglês) foi cunhado pelo médico americano Raymond Moody Jr., em meados dos anos 70, para englobar estes relatos. Em 1975 ele publica seu livro “Vida depois da Vida” relatando as experiências de uma parcela de pacientes que foram ressuscitados após terem tido morte clínica. No entanto, relatos parecidos eram conhecidos desde há muitos anos (citar um caso). Elizabeth Kübler-Ross (1926-2004) pesquisou relatos deste tipo em pessoas que viveram em campos de concentração na Polônia.
O resultado do interesse despertado pelos estudos de Moddy e Ross foi mais diretamente exposto na fundação da International Association for Near-Death Studies (Associação Internacional de Estudos do Quase-Morte), em 1978.
A associação faz um levantamento global de relatos de EQM, tanto de pacientes quanto da equipe médica e multidisciplinar associada aos pacientes ou pessoas que passam pela experiência, utilizando sempre a "near-death experience scale" ("escala de experiência de quase morte"), um método criado pelo psiquiatra, professor universitário e parapsicólogo Bruce Greyson para determinar as EQMs legítimas. Estas apresentam um conjunto de características, que se desenrolam em estágios, e que, se não todos os estágios, são encontradas quase sempre nos relatos das pessoas que vivenciaram o fenômeno.

Estágios da EQM:
a)      Todos os relatos de EQM possuem elementos de semelhança (possuem alguns pontos em comum). A imensa maioria consegue dos que vivenciaram a morte clínica e tiveram a experiências conseguem ver seu próprio corpo bem como os médicos, paramédicos ou, em caso de acidentes ou mortes súbitas, os amigos tentando reanima-lo, de um ponto de vista privilegiado, quase sempre acima destes. Muitos se surpreendem com esta visão. Vários chegam mesmo a estranhar o fato de que tentem reanimar um corpo doente quando se sentem plenamente vivos, com um corpo idêntico, porém mais saudável, que aquele embaixo, neste momento.
b)      Relatam ter deixado de sentir dores e, por vezes, sentem uma grande calma e uma sensação de maior conscientização de si e do ambiente, não se sentindo realmente "mortos". Em grande parte destes relatos, pode haver a sensação de uma presença espiritual amiga a apoiar o paciente, mas que nem sempre é visível, embora possam ouvi-la ou entende-la. Parentes ou amigos já falecidos também são normalmente vistos na ocasião, como pessoas normais, interagindo com o paciente, mas que não são percebidos pelas pessoas que tentam reanima-lo.
c)       Ocorre a visão – e por vezes, também a atração – de um túnel - provavelmente a contrapartida polar do canal de nascimento. A pintura de Hyeronimus Bosch sobre o tema é vista acima, no início desta home page.
d)      Pode ocorrer no correr da travessia deste túnel, ou logo depois de passá-lo, um flashback panorâmico e estranhamente rápido, mas integral, de toda a experiência vivida pelo paciente desde o nascimento (por vezes, desde a vida intrauterina) até o momento da morte.
e)       Muitos relatam que a experiência do túnel é encerrada com a visão de alguma espécie de barreira simbólica, indicando um ponto de não retorno. Esta barreira pode ser expressa por um portão, uma porta, uma ponte, um muro ou qualquer outra coisa que indica entrada ou limite de um outra realidade. Nesta ocasião é comum a visão de mais parentes e amigos já falecidos que amorosamente os recebem e que avisam que o cruzamento deste limiar representa a morte definitiva do corpo. Neste ponto, algumas pessoas são aconselhadas a voltar e, em outros relatos, lhes são perguntados se querem continuar no processo e ir além ou retornar ao corpo para cuidar de parentes, de assuntos pendentes ou para ajudar pessoas.
f)       Há a visão de “seres de luz” que, geralmente, são interpretados, de acordo com a origem religiosa ou a cultura onde a pessoa foi formada, como sendo Jesus, Buda, um anjo, etc. Estes seres também perguntam se a pessoa quer ficar ou retornar ao corpo e à vida física. Eles podem aconselhar o retorno, explicando algum motivo para voltar.
g)      Relutância a retornar ao corpo em boa parte dos casos. Muitas vezes, o retorno é feito com certa contrariedade por parte do sobrevivente (veja, no vídeo, o caso de Sam Reynolds)
h)      A personalidade da pessoa nunca mais é a mesma ao retornar. Perde-se geralmente o medo de morrer na maior parte dos casos e na grande maioria ocorre uma completa reformulação da percepção e concepção da vida, das prioridades e dos valores, quase sempre tornando-se mais calmos, espiritualizados e centrados (incluindo ateus).
i)        Apenas em uma parcela ínfima se tem notícias de uma EQM ruim (geralmente ocorrentes em casos de tentativas de suicídios, ou após a prática de crimes, etc.). Dos 150 relatos confirmados pelo Dr. Moody em seus dois livros clássicos, apenas 3 descrevem experiências negativas. A proporção permanece praticamente a mesma nas pesquisas de outros cientistas.
j)        As experiências religiosas, crenças ou cultura não afetam a probabilidade ou profundidade de uma EQM, apenas a forma de interpretá-las após o evento. Existe mesmo uma estatística que mostra que ateus tiveram mais EQMs que pessoas religiosas.
Apesar do impacto existencial e espiritual destas experiências nas pessoas que as vivenciaram e em muitas que as pesquisaram (Moody, Ross, Lommel, Fenwick, etc.) a interpretação de que a consciência não se reduz ao cérebro e que, portanto, pode sobreviver à crise da morte não é aceita (ao menos abertamente) pela maioria dos cientistas. As explicações mecanicistas para as EQMS são geralmente as que seguem:
A visão do túnel seria fruto da anóxia cerebral. O “falso” abandono do corpo é encontrado em pessoas que passam por situações de estresse e de interferência sináptica por conta de medicamentos ou por problemas neurológicos e de orientação. A sensação de paz é resultado da liberação de endorfinas.
Mas existem casos onde tais explicações não fazem sentido ou nada explicam. Houve ao menos um caso bem documentado em que todo o sangue do paciente foi drenado, estando o corpo em hipotermia e, ainda assim, a paciente relatou as práticas efetuadas pelo cirurgião vários minutos após o inicio da cirurgia, citando atos e até o que foi dito durante o procedimento.
Para entender o debate entre os pesquisadores pró e contra a explicação de que a EQM demonstraria a sobrevivência após a morte, vejamos o que sobre o assunto é descrito na Wikipédia:
 Pesquisadores explicitamente atrelados ao paradigma mecanicista, como a psicóloga britânica Susan Blackmore e o anestesiologista Lakhmir Chawla, acreditam, por uma questão de preferência e ideologia, na teoria de que as EQMs são alucinações complexas causadas pela falta de oxigênio no cérebro durante a etapa final do processo de morte. No entanto, muitos outros pesquisadores, como o neurologista Peter Fenwick, o cardiologista Pim van Lommel e os psiquiatras Raymond Moody e Bruce Greyson, discordam destas teorias reducionistas, defendendo as experiências como evidências de que a consciência do ser humano existe independentemente do cérebro, argumentando principalmente que muitas pessoas demonstram percepções extrassensoriais com precisão em seus relatos de EQM24 (como por exemplo o famoso caso de EQM da cantora Pam Reynolds) e que não há sinais de funções mentais prejudicadas nas situações clínicas em que as EQMs ocorrem. Como pode uma alucinação provocada por anóxia permitir a percepção de informações posteriormente confirmadas?
O físico Sir Roger Penrose e o anestesiologista Stuart Hameroff, baseados na teoria desenvolvida e denominada por eles como orchestrated objective reduction, defendem que em EQM a "alma quântica", ou seja, a consciência como um campo quântico, deixa o sistema nervoso e reentra no cosmos. De acordo com Hameroff, "é possível que a informação quântica que constitui a consciência possa mudar para planos mais profundos e continue a existir puramente na geometria do espaço-tempo, fora do cérebro, distribuída não-localmente", como uma "alma quântica" à parte do corpo.
Um dos primeiros estudos clínicos sobre experiências de quase morte em pacientes em estado de parada cardíaca foi feito pelo cardiologista holandês Pim van Lommel e sua equipe médica, tendo sido publicado em 2001 pela revista científica Lancet . De acordo com o cardiologista, dos 344 pacientes estudados que foram reanimados com sucesso depois de sofrerem parada cardíaca, 62 (18%) tiveram EQMs e lembraram com detalhes as condições que passaram quando estavam clinicamente mortos. Na conclusão de Lommel, nossa consciência existe independentemente do cérebro; este sendo um veículo físico de expressão da consciência mas não o produtor da mesma.
Entre os relatos intrigantes descritos por Moody em sua obra, encontra-se esse no livro A Luz do Além (1988): "Em Long Island, uma mulher de setenta anos cega desde os dezoito, foi capaz de descrever, com detalhes vívidos, o que aconteceu, enquanto os médicos tentavam ressuscitá-la de um ataque do coração. Ela conseguiu dar uma boa descrição dos instrumentos que foram utilizados, e até mesmo de suas cores. E o mais surpreendente para mim é que a maioria daqueles instrumentos sequer fora concebida na época em que ela ainda podia ver, havia cerca de cinquenta anos. Além de tudo isso, ela ainda disse ao médico que ele usava um jaleco azul quando começou a ressuscitá-la".
Mesmo diante de relatos que para muitos são surpreendentes, a visão materialista reducionista de que alterações funcionais e químicas no cérebro são as responsáveis pelas experiências de quase morte, ao menos até o momento é a dominante em virtude da vigência de um paradigma mecanicista, cuja visão subjacente é eminentemente materialista que, orientando o pensamento, impede uma percepção dos indícios que deem suporte a uma visão dualista mais ampla como científica; e em segundo devido a considerações levantadas quanto se busca definir de forma rigorosa o que é "consciência".

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