O trabalho de renovação das
disposições íntimas vai exigir, de todo aquele que se proponha executá-lo, perseverança e determinação. Perseverança,
por causa da necessidade da repetição contínua e sistemática na correção do
desvio feito nos caminhos da existência, e determinação,
para que não se abandone o comprometimento com essa nova atitude.
As ideias fantasiosas que temos
sobre renovação deixam-nos manietados a outros erros, e iludidos na certeza de
que a estamos realizando. Quase sempre, por desconhecimento, apenas trocamos o
nome, o rótulo de antigos enganos, que insistimos em manter – nos apraz tal
situação –, distorcendo o verdadeiro significado de tal fato. Esse engano,
parece-nos, está ligado à noção equivocada de que estamos, realmente, comprometidos
com a mudança e que a estamos realizando. Mas a verdade é que, se observarmos
nossa conduta, poderemos perceber, muitas vezes, que insistimos em cometer os
mesmos erros, fazendo as mesmas escolhas e guardando a certeza de que já
havíamos superado essa fase. Todavia, a consciência dessa repetência permitirá
que nos coloquemos em alerta, porque nos permitirá saber que, ainda, estamos no
início da caminhada e distantes dessa superação.
As situações, nas quais somos
chamados a dar testemunho daquilo que já aprendemos – e quase sempre supomos
que já o fizemos –, constituem-se em excelentes vitrines para essas
observações. São armadilhas que surgem para que nos testemos, para que tenhamos
um parâmetro da nossa evolução, para que possamos medir o quanto, ainda, a
paciência, a tolerância com as diferenças, o entendimento fraterno a quem nos
agride, a capacidade de perdoar e esquecer e tantos outros, que imaginávamos já
dominar, estão longe do ideal da prática amorosa que Jesus nos ensinou.
São decepções que infligimos a
nós mesmos e que sacodem a nossa acomodação, no pouco que fizemos, mas que
supomos ser muito. É importante lembrar aqui que qualquer avanço na senda do
progresso é louvável e, às vezes, requer muito esforço de quem o executa. O que
não pode ocorrer é a estagnação desse movimento renovador, com a justificativa
de que muito já foi feito. Isso nos desequilibra e nos adoece física e
emocionalmente, permitindo que, inúmeras vezes, sejamos alvos fáceis de
aproximação de outras mentes em desalinho, sejam elas encarnadas ou
desencarnadas.
Por essa razão, a superação de
sentimentos inferiores, sob o ponto de vista de Jesus, como os de revide,
vingança, vaidade, personalismo, por exemplo – expressões do egoísmo na vida de
relação –, é de vital importância para a recuperação e manutenção do equilíbrio
e da harmonia no âmbito da vida íntima. É essa condição que nos permitirá não
sermos feridos pelas correntes aflitivas e conflitantes que nos cercam,
proporcionando um outro olhar sobre essas armadilhas, um olhar com
objetividade, dando a cada situação o justo peso de importância.
Para que isso ocorra, faz-se
mister buscar conhecer nossos sentimentos – raiz de nossas escolhas –,
dimensioná-los, estabelecendo prioridades para serem trabalhadas, com foco nas
suas transformações, partindo do mais simples e, portanto, do mais fácil –
aquele mais imediato, mais próximo, que está mais claro para nós – para o mais
complexo e mais difícil.
O mais importante nesse
processo, em última análise, é ter a coragem de identificar esses sentimentos
malsãos, iniciar a tarefa de renovação e, depois, permanecer nesse caminho.
Passeando entre a luz e a sombra, a razão e a emoção, nunca acertaremos a rota
se não nos comprometermos com a mudança e perseverar nela, mesmo que se tenha de
refazer os passos mil vezes.
Muitos de nós creem que somente
a fé em Deus seja suficiente para que essas mudanças ocorram. Entretanto, a
proposta de renovação, que Jesus nos convida a realizar, transcende a simples
fé divina. Ela vai além e toca na essência do Espírito, na vontade genuína de
realizá-la. Daí, a presença dessas duas
forças transformadoras em nós: a fé
humana e a fé divina, porque,
ainda que se aceite a soberana presença de Deus em nossa vida; ainda que a fé
nos leve a adorá-lO em Espírito e Verdade; ainda que a Natureza O revele
através das belezas que nos cercam, se não O sentirmos e mostrarmos ao mundo,
através de nossas atitudes, nada terá sentido. Aceitar a Sua presença e não
vê-lO no próximo é cegueira mental; adorá-lO em Espírito e Verdade e só
colocá-lO em altares terrenos é diminuir-Lhe a majestade; e vê-lO revelado em
Suas obras e não entendê-lO é olhar-se no espelho e não reconhecê-lO em si
mesmo.
É na busca dessa identidade com
o Criador que reside nossa luta renovadora. “O Pai e eu somos um só”, disse
Jesus, mostrando que somente pela superação de nós mesmos e da materialidade na
qual insistimos em permanecer, seremos livres e nos reconheceremos, finalmente,
como filhos de Deus.
Nenhum comentário:
Postar um comentário