Allan Kardec
Certamente algumas pessoas
esperam encontrar aqui uma resposta a certos ataques pouco respeitosos, dos
quais a Sociedade, nós pessoalmente, e os partidários do Espiritismo, em geral,
temos sido vítimas nos últimos tempos. Pedimos que se reportem ao artigo sobre
a Polêmica
Espírita, que encabeça o nosso número de novembro último, em que fizemos
profissão de fé a esse respeito. Apenas acrescentaremos algumas palavras, já
que não nos ocupamos com discussões ociosas. Os que têm tempo a perder para
sorrir de tudo, mesmo daquilo que não compreendem; tempo para a maledicência,
para a calúnia ou para o deboche, que fiquem satisfeitos: não lhes criaremos
nenhum obstáculo. A Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, composta de
homens honrados pelo saber e por suas posições, tanto franceses quanto
estrangeiros, médicos, escritores, artistas, funcionários, oficiais,
negociantes etc.; recebendo diariamente as mais altas notabilidades sociais e
correspondendo-se com todas as partes do mundo, está acima da pequenez das
intrigas, do ciúme e do amor-próprio; ela prossegue seus trabalhos na calma e
no recolhimento, sem se inquietar com as piadas de mau gosto, que não poupam
sequer as organizações respeitáveis.
Quanto ao Espiritismo em geral,
que é uma das forças da Natureza, a zombaria será destruída, como aconteceu
contra muitas outras coisas que o tempo já consagrou. Essa utopia, essa
maluquice, como o chamam certas pessoas, já deu a volta ao mundo e nenhuma
diatribe impedirá sua marcha, do mesmo modo que outrora os anátemas não
impediram a Terra de girar.
Deixemos, pois, que os
zombeteiros riam à vontade, visto ser isso que lhes apraz; fá-lo-ão à custa do
espírito. Riem bastante da religião: por que não haveriam de rir do
Espiritismo, que é apenas uma ciência? Esperamos que nos prestem mais serviços
do que prejuízos e nos façam economizar despesas com publicidade, porque não há
um só de seus artigos, por mais espirituosos que sejam, que não tenha
estimulado a venda de alguns de nossos livros ou não nos tenha proporcionado
algumas assinaturas. Obrigado, pois, a eles pelo serviço que nos prestam
involuntariamente.
Igualmente temos pouco a dizer
quanto ao que nos toca pessoalmente; se aqueles que nos atacam, quer de maneira
ostensiva, quer disfarçada, imaginam que nos perturbam, perdem seu tempo; se
pensam em nos barrar o caminho, enganam-se do mesmo modo, pois nada pedimos e
apenas aspiramos a nos tornar úteis, no limite das forças que Deus nos
concedeu. Por mais modesta seja a nossa posição, contentamo-nos com aquilo que
para muitos seria mediocridade; não ambicionamos posição, nem honras, nem
fortuna; não procuramos o mundo nem os seus prazeres; o que não podemos ter não
nos causa nenhum desgosto e o vemos com a mais completa indiferença. Visto não
fazerem parte de nossos gostos, não invejamos aqueles que possuem tais
vantagens, se vantagens há, o que aos nossos olhos é um problema, porquanto os
prazeres efêmeros deste mundo não asseguram melhor lugar no outro; pelo
contrário. Nossa vida é toda de labor e de estudo e consagramos ao trabalho até
os momentos de repouso. Aí nada há que cause inveja. Como tantos outros, trazemos
a nossa pedra ao edifício que se levanta; entretanto, coraríamos se disso
fizéssemos um degrau para alcançar o que quer que fosse. Que outros tragam mais
pedras que nós; que outros trabalhem tanto e melhor que nós e os veremos com
sincera alegria. O que queremos, antes de tudo, é o triunfo da verdade, venha
de onde vier, pois não temos a pretensão de ver sozinho a luz; se disso deve
resultar alguma glória, o campo a todos está aberto e estenderemos a mão a
quantos nesta rude caminhada nos seguirem com lealdade, abnegação e sem
segundas intenções particulares.
Sabíamos muito bem que,
empunhando abertamente o estandarte das ideias de que nos fizemos propagadores
e afrontando preconceitos, atrairíamos inimigos, sempre prontos a desferir
dardos envenenados contra quem quer que levante a cabeça e se ponha em evidência.
Há, entretanto, uma diferença capital entre eles e nós: não lhes desejamos o
mal que nos procuram fazer, porque compreendemos a fragilidade humana e é
somente nisso que a eles nos julgamos superior; nós nos rebaixamos pela inveja,
pelo ódio, pelo ciúme e por todas as paixões mesquinhas, mas nos elevamos pelo
esquecimento das ofensas: eis a moral Espírita. Não vale ela mais do que a das
pessoas que dilaceram o próximo? Ela nos foi ditada pelos Espíritos que nos
assistem e por aí podemos julgar se eles são bons ou maus. A moral espírita
mostra-nos as coisas do alto tão grandiosas e as de baixo tão pequenas que não
podemos senão lamentar os que voluntariamente se torturam para proporcionar a
si mesmos alguma satisfação efêmera ao seu amor-próprio.
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