Miguel Vives y Vives
Disse o Senhor: Vós sois o
sal da terra; se o sal perder o seu sabor, com o que se há de salgar? E foi
como se dissesse que sois a luz do mundo; se a luz perder a sua claridade, com
o que se iluminará? Todo espírita que fez profissão pública de sua crença não
deve jamais esquecer-se de que, por onde passa, aonde vai, e onde frequenta,
está sendo observado e estudado.
Por que nos observam e estudam,
para ver como agimos nós, os espíritas, pois sabem que a nossa maneira de
pensar é bem diferente da maneira dos que não seguem as nossas ideias. De forma
que devemos ter bem presentes aquelas palavras de um grande espírito: Prudência
no pensar, prudência no falar, prudência no agir. Porque, se nos
esquecermos das regras que o Espiritismo nos prescreve, algumas das quais estão
anotadas nos capítulos anteriores, podemos cair no ridículo, por não estarem os
nossos atos de acordo com a moral que o mundo espera de nós.
Essa moral, quando bem
praticada, é o melhor meio de propagar e exaltar os nossos princípios; de
maneira que uma atitude correta e cheia de doçura tem grande poder de atração,
e podemos conquistar com ela a simpatia de muitos, fazendo-nos agradáveis pelo
nosso trato. Nossas maneiras e costumes são o primeiro instrumento que todo
espírita deve usar na propaganda doutrinária: primeiro agir, depois falar; a
não ser que a necessidade e as circunstâncias nos obriguem a falar primeiro.
Quando assim tivermos de fazer,
devemos ser muito prudentes e humildes, dando provas de uma excelente educação.
Porém, sempre que possível, devemos agir primeiro. Vale mais que nos conheçam
primeiro por nossas obras, do que por nossas palavras.
Assim, quando chegar a hora de
falarmos, nos escutarão com mais respeito e seremos atendidos.
Evitemos entrar na propaganda de
nossas ideias, aguardando a ocasião oportuna. Comecemos então por demonstrar o
que é a moral do Espiritismo, quais as suas tendências e os seus fins, que são
tornar os homens melhores, conquistar a paz para a humanidade e revelar um
porvir mais feliz do que aquele que nos espera na Terra. Só devemos entrar na
explicação dos fenômenos espíritas quando as pessoas a quem falamos já tenham
aceitado a moral, compreendendo algo de sua sublimidade. Nesses casos em que
pudermos falar dos fenômenos, devemos explicar aqueles que podem ser mais bem
compreendidos, de acordo com o alcance dos nossos ouvintes.
Temos ouvido, às vezes, alguns
espíritas exporem fenômenos entre pessoas estranhas à doutrina, dando
explicações de fatos que estão muito fora do alcance dos ouvintes. Isso quase
sempre resulta em burla ou em maior incredulidade, porque o espírita é logo
considerado como fanático, perdendo assim toda influência moral sobre essas
pessoas. Por isso, a propaganda moral é quase sempre bem recebida, e mais
ainda, se o espírita que a propaga sabe portar-se de maneira correta, o que é
muito fácil para todo espírita estudioso, que esteja bem compenetrado do que o
Espiritismo lhe prescreve.
Não se deve olvidar que um dos
primeiros mandamentos da lei é: Amarás ao próximo como a ti mesmo. Se
bem que seja muito difícil praticar este mandamento ao pé da letra, não é menos
verdade que os espíritas estão obrigados a praticar a caridade com os seus
irmãos de crença. Ora, se entre nós devemos ser indulgentes, benévolos, e
devemos ajudar, fechar os olhos e até perdoar, não haveremos de fazer menos
para a Humanidade.
Os não-espíritas empenham-se às
vezes em questões, alterações, disputas, rixas e não raro se maltratam. Devemos
fugir inteiramente de tudo isso. Se com boas maneiras podemos colocar as coisas
nos seus lugares, é assim que devemos fazer.
Mas, se para tanto devemos
afastar-nos das regras prescritas, é preferível calar, buscando a melhor
maneira de sairmos da dificuldade. E se, apesar da nossa prudência e do nosso
amor, não pudermos livrar-nos das contendas, devemos sofrer com paciência as
iras da ignorância e da má fé. Devemos perdoar sem reservas, do fundo de nossa
alma, e pagar o mal com o bem, sempre que possível.
Por isso, não podemos olvidar a
figura do Mestre e Senhor.
Ele é o modelo, a verdade e a
vida. Que disse Ele, quando o insultavam, apostrofavam, maltratavam e cuspiam?
Nada.
Baixava os olhos e perdoava em
seu coração. Pois se Ele, que era tão elevado e tanto podia, fez exatamente
como ensinou, faremos nós o contrário? Desgraçado do espírita que tem a
oportunidade de devolver o bem como pagamento do mal, e não o faz!
Desgraçado do espírita que pode
perdoar e não perdoa! Pois dias virão em que exclamará:
De que me serviu saber o que sabia, e de me haver
chamado espírita? Mais me valera nada saber, para não arcar com tamanha
responsabilidade!
Há espíritas que, guiados por
sua ardente caridade, se dedicam a curar enfermos por meios magnéticos, seja
com água, seja com passes. Quando a estas práticas não se misturam segundas
intenções, havendo apenas um amor ardente pelos enfermos e o desejo puro de
fazer o bem, com ardente fé no Pai, podem alcançar-se bons resultados.
Entretanto, deve-se considerar que, se o espírita deve usar de prudência em
todos os casos, muito mais deverá usá-la quando pretende dar saúde aos
enfermos. Deve ele levar uma vida muito pura, isenta de falhas e defeitos que
possam retirar-lhe a boa proteção, porque, do contrário, em lugar de fazer bem
aos enfermos, lhes fará mal, prejudicando-os.
Aquele que deseja aliviar ou
curar a Humanidade doente, mesmo que apenas no âmbito das suas relações
particulares, deve levar uma vida de santidade. Chamemo-la assim, para melhor
distinguir o que a pratica, tanto mais se o espírita que cura não for dotado de
conhecimentos médicos ou de outra ciência que o autorize a tanto. Os que,
porém, só o fazem por amor à Humanidade devem despojar-se de tudo o que possa
empanar o brilho de seus espíritos, para que o seu perispírito e o seu corpo
possam transmitir os bons fluidos. De maneira que devem aplicar-se
constantemente a seguinte máxima:
Se queres curar aos demais, cura primeiro o teu corpo e
a tua alma, pois, do contrário, como curarás aos outros, se estás enfermo?
Claro que devem ser observados
os costumes e as maneiras que atrás assinalamos, abstendo-se de fazer aos
enfermos promessas que não podem ser cumpridas. Pois o que se dedica a práticas
tão elevadas nunca deve confiar em suas próprias forças, mas conta apenas com o
seu bom desejo, a sua boa vontade, e sobretudo com a ajuda de Deus e dos bons
Espíritos, procurando ter fé n’Aquele que curou os cegos, os paralíticos, e
ressuscitou os mortos. Assim fazendo, muito poderá esperar do Todo poderoso, e
sua missão será uma consolação para os que choram e os que sofrem[2].
Mas não deve olvidar que precisa
dar de graça o que de graça recebe, porque é muito prejudicial e anti-espírita
fazer da proteção do Alto uma profissão lucrativa. É bom fazer a caridade, mas
é muito mau explorá-la.
Em resumo:
§
a Humanidade
geme, chora, desespera-se, pelo muito que sofre; o egoísmo tudo devora; as
vítimas da maldade se sucedem sem parar; as religiões se desviaram do caminho;
os homens de bem, intermediários entre a Humanidade e a Providência, são
escassos;
§
os espíritas
estão encarregados de trazer a luz, já que sabem porque a Humanidade sofre,
porque chora, porque se desespera;
§
sacrifiquemo-nos,
pois, para poder explicar-lhe a causa de seus sofrimentos, de suas lágrimas, de
seu desespero;
§
procedamos de
maneira a mostrar que a dor depura, eleva, santifica, exalta, e assim
cumpriremos a nossa missão.
O espírita que muito deseja
fazer por seus semelhantes não deve perder de vista o Senhor – quando o
açoitavam atado ao pilar, quando o coroavam de espinhos, quando carregava a
cruz, quando consumava o seu sacrifício –, para saber imitá-lo em seus atos de
amor pela Humanidade, de abnegação e de sacrifício.
Vós sois o sal da
terra; se o sal perder o seu sabor, com o que se há de salgar?
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