Sebastião Clóvis Tavares nasceu
no distrito de São Sebastião, em Campos dos Goytacazes, interior do Rio de
Janeiro, em 20 de janeiro de 1915. Era dia de São Sebastião e, por isso, seus
pais deram-lhe o nome de batismo em homenagem ao padroeiro, embora sempre tenha
sido tratado, em casa e em todos os ambientes, simplesmente por “Clóvis”.
Desde a infância, demonstrou
pendores religiosos. Era comum, na região de São Sebastião, ver seus irmãos
jogando bola ou brincando de cabra-cega e ele lendo ou rezando em seu oratório
particular.
Afeiçoou-se ao padre da Igreja
de São Sebastião, chamado Émille Dés Touches, francês de nascimento, de família
nobre e abastada. Ele teria abandonado a sua herança para dedicar-se à vida
religiosa, tendo decidido vir para o Brasil seguindo uma inspiração ou
determinação do Alto. Foi o seu professor de Francês e seu primeiro orientador
espiritual. Do padre Dés Touches, o público espírita conhece Petição de
Servo[2],
eivada de beleza e sabedoria espiritual.
Na adolescência, estudando no
célebre Liceu de Humanidades de Campos, integrou um grupo de jovens
idealistas que decidiram mudar o Mundo. Inscreveram-se no Partido Comunista do
Brasil e viveram um sonho de liberdade.
Dois desses jovens eram Nina
Arueira e Clóvis Tavares, que enamoraram-se e tornaram-se noivos. Os dois
viviam intensamente a vida partidária, sendo líderes de greves operárias e
movimentos estudantis. Inesperadamente, Nina é acometida de uma febre tifoide e
Clóvis passa a fazer plantão ao seu lado, passando noites acordado, em
vigilância, mas sem oração.
Por um destes ‘mistérios da
vida’, ela conheceu, já doente, um homem chamado Virgílio de Paula, que a
recebeu em sua casa para prestar-lhe tratamento. Era um profundo conhecedor de
Teosofia e Espiritismo. Nina interessa-se inicialmente pela Teosofia. Lê Do
Recinto Interno, de Annie Bésant e decide, já no leito, renunciar à
política partidária. Conta a Clóvis a sua decisão. Este, que também estava a
discordar da direção partidária quanto a rumos decididos que feriam a sua
ética, passou a escutar de Nina as lições que ela ouvia do ‘Vovô Virgílio’.
Virgílio de Paula, por sua vez,
aos poucos introduziu um pouco de Evangelho em suas conversações com Nina. Ela
maravilhou-se com a visão de um Jesus Cristo amigo dos pobres e dos sofredores.
Um Jesus Cristo amigo da Justiça e da Caridade e entregou-se, de alma inteira,
ao Evangelho, explicado pela racionalidade Espírita. Foram apenas alguns meses,
mas ela desencarnou considerando-se espírita.
Após o seu desenlace é que
Clóvis começou a ler os livros que ela lera no seu estágio derradeiro. E como
ocorreu com Nina, ele também apaixonou-se pela cosmovisão espiritista. Quando
leu pela primeira vez os versos de Olavo Bilac, Cruz e Souza, Fagundes Varella,
Augusto dos Anjos, Castro Alves, João de Deus, Auta
de Souza, entre outros, então declarou-se espírita. E com o mesmo afinco
que se dedicara há apenas alguns meses à política partidária, passa a militar
ativamente no meio espírita. Começa a frequentar o Grupo Espírita João
Batista, dirigido pelo Sr. Virgílio de Paula e outros companheiros da
primeira hora do Espiritismo em Campos.
Em pouco tempo, Clóvis passa a
realizar palestras doutrinárias que a muitos atraíram por sua fluência
evangélica e pelo ardor de seu verbo. Paralelamente a essas atividades, fundou
uma escola de Doutrina Espírita para crianças, na casa da mãe de sua antiga
noiva, Dona Didi Arueira. Passaram a chamar essa casa de Escola Infantil
Jesus Cristo.
Mais uma vez, o inesperado
ocorre. Os frequentadores do Grupo Espírita João Batista, somados aos
pais das crianças da Escola Infantil, afluíram em número crescente para escutar
suas palestras na casa de Dona Didi.
Decide, então, a diretoria do Grupo
Espírita João Batista autodissolver-se e passar a integrar os quadros da
nascente Escola Jesus Cristo, já sem o qualificativo de “Infantil”.
Repetiu-se, em escala
institucional, o mesmo que acontecera entre João Batista e Jesus Cristo. “É
necessário que eu diminua para que Ele cresça”, e o Grupo precursor João
Batista dissolveu-se e seus seguidores, assim como os seguidores de João,
passaram a seguir a Escola Jesus Cristo. Iniciou-se uma Era nova para o
Espiritismo local, até então conhecido apenas pelas sessões mediúnicas.
Com Clóvis, alvorece, em 1935, o
Espiritismo da cultura e da prática da caridade. Clóvis sempre priorizou na Escola
Jesus Cristo o serviço de amor ao próximo e o estudo doutrinário. Na Escola
Jesus Cristo, ele fundou dois orfanatos: um de meninas, dirigido
inicialmente pela filha de Virgílio de Paula, Inaiá de Paula, e outro para
meninos, dirigido por ele mesmo e por seu companheiro de ideais, Medeiros
Correia Júnior. Fundou, ainda, um Culto de Assistência, onde um grupo de
irmãos visitava duas favelas de Campos, para distribuição de gêneros e para a
realização de um culto de Evangelho no Lar dos assistidos.
Fundou, ainda, a Sopa dos
Domingos com a ajuda dos irmãos portugueses Inocêncio Noronha, Bonifácio de
Carvalho, D. Candinha e D. Mariquinhas, portugueses que sempre estiveram
presentes na história da Escola Jesus Cristo.
Surge, ainda, por seu ideário, o
Curso Elzinha França para orientação espiritual às crianças. A escolha
do nome Elzinha França deveu-se ao fato de que a Mocidade Espírita de Campos,
da qual fazia parte a jovem Hilda Mussa, com quem se casaria mais tarde, e sua
amiga Zenith Pessanha, visitava as famílias pobres da Escola Jesus Cristo na
busca do sofrimento a fim de mitigá-lo. Numa dessas peregrinações, na favela,
encontram desvalida menina recém-nascida, abandonada. Como não havia, na época,
nenhum órgão oficial de amparo à criança e nem de longe pensava-se no Estatuto
da Criança e do Adolescente, decidiram trazer a menina para a Casa da
Criança. Apesar de Clóvis ter providenciado todos os cuidados médicos, a
menor desencarnou em pouco tempo.
Todavia, em uma de suas
habituais viagens a Pedro Leopoldo para encontrar-se com Chico
Xavier, obteve do médium a informação de que o visitava um espírito de
muita luz, chamado Elzinha França. Clóvis Tavares, a princípio pasmo, contou ao
médium quem era a menina, que Chico identificou como sendo uma professora que
estava integrando a equipe espiritual de serviço na Escola Jesus Cristo
e que trabalharia na educação dos menores.
Fundou o Clube da
Fraternidade, espaço artístico e lúdico para a realização de jogos
infantis, teatros e coros musicais nos domingos à tarde, numa época em que não
havia televisão.
Passou a visitar semanalmente os
presos, recordando o ensino de Paulo aos hebreus:
Lembrai-vos dos encarcerados, como se vós mesmos
estivésseis presos com eles. E dos maltratados, como se habitásseis no mesmo
corpo com eles.
Hb, 13:3
Uma vez por ano, pregava o
Evangelho Consolador no cemitério, no dia 2 de novembro, iniciando uma prática
consoladora e esclarecedora na nossa terra.
Outra particularidade da Escola
Jesus Cristo foi abrigar em suas dependências, na década de 60, uma escola
de educação formal: o Instituto Allan Kardec.
Paralelamente a essa atividade
espírita, Clóvis Tavares lecionava História em duas escolas e Direito
Internacional Público na Faculdade de Direito de Campos. Foi autor de livros
espíritas, renunciando, todavia, aos direitos autorais, pois, aprendeu com Chico
Xavier a doá-los às editoras que se dedicavam à difusão doutrinária. Escreveu: Sementeira
Cristã[3];
Vida de Allan Kardec para a Infância; Meu Livrinho de Orações; Os Dez
Mandamentos, e Histórias que Jesus Contou, para o público infantil, e Vida
de Pietro Ubaldi[4],
Trinta Anos com Chico Xavier, Amor e Sabedoria de Emmanuel, Tempo e Amor, De
Jesus para os que Sofrem, e Mediunidade dos Santos[5],
para o público em geral.
Tornou-se amigo íntimo de Chico
Xavier, com quem conviveu por 50 anos, o que é relatado nos referidos livros do
parágrafo anterior. Frequentava com assiduidade as reuniões do Grupo Meimei,
em Pedro Leopoldo. Visitou, também, Belo Horizonte várias vezes, onde travou
contato com Arnaldo Rocha, Joaquim Alves, Cícero
Pereira e tantos outros que dignificaram o Espiritismo nas Minas Gerais e
no Brasil.
Na década de 1950, passou a se
corresponder com o sábio italiano Pietro Ubaldi, a quem promoveu duas vindas ao
Brasil − a última das quais, definitiva. Traduziu do italiano os seguintes
livros do referido autor: As Noúres, Ascese Mística, Grandes
Mensagens e Fragmentos de Pensamento e Paixão[6].
Clóvis veio a casar-se somente
20 anos após da desencarnação de Nina, e a jovem Hilda Mussa, que o ajudava na
pesquisa sobre a vida dos santos católicos, passou a ser também a sua fiel
colaboradora nos trabalhos da Escola Jesus Cristo. Deste matrimônio
nasceram cinco filhos: Carlos Vítor, que desencarnou aos 17 anos, após uma vida
de sofrimentos para ele e para os pais – o que está relatado no livro: A
Morte é Simples Mudança[7]
–, Margarida, Flávio, Luís Alberto e Celso Vicente.
Desencarne
Clóvis Tavares desencarnou no
dia 13 de abril de 1984, na Santa Casa de Campos. Exatamente na semana
posterior ao nascimento de seu primeiro neto, Pedro, primogênito de Flávio
Mussa Tavares, que traz o relato (base para este escorço biográfico) em
depoimento:
Foi a semana de maior conteúdo emocional de minha vida.
No dia 6 de abril, às 18 horas , eu me tornava pai. Pedro nasceu na Santa Casa
de Campos, em parto realizado por minha prima Neusa, obstetra, que o entregou
nas minhas mãos tão logo seccionou o cordão umbilical, para que eu
providenciasse os primeiros cuidados.
Sete dias após, no mesmo hospital e na mesma hora, meu
pai é internado, e na cama onde fez a radiografia abdominal, segurando as
minhas mãos, ele desencarnou. Em uma semana nasceu meu filho e desencarnou meu
pai, no mesmo lugar, na mesma hora, ambos nas minhas mãos... Em apenas sete
dias vivenciei intensamente a experiência de ser um ajudador de dois espíritos
que atravessavam o Portal da Vida no sentido inverso: um se recorporificando na
Terra... outro, se despedindo deste mundo e reentrando na dimensão do Espírito.
Espero, este ano, publicar Saudade é o Metro do Amor,
que é uma apresentação das seis comunicações mediúnicas do meu pai, obtidas
através do seu querido amigo Chico Xavier, com quem ele mantinha uma relação de
amizade que não pode ser medida pelos padrões humanos. Papai nos dera, antes de
desencarnar, uma senha.
Somente se comunicaria mediunicamente através de Chico.
Nós mantivemos nossa fidelidade à sua senha e ao nosso querido Chico e
reconhecemos nas seis cartas a integridade de sua personalidade, pois têm as
marcas indeléveis de sua racionalidade e de sua emotividade. Estas cartas nos
fazem reconstruir psiquicamente seu retrato!
A Escola Jesus Cristo, em nossa Campos, vive
intensamente a sua proposta de Espiritismo à luz do Evangelho de Jesus,
reconhecendo que a Luz é sempre do Cristo e é por ele que a Doutrina
Consoladora existe, para esclarecê-Lo, para divulgá-Lo, para plenificá-Lo entre
os homens, de uma forma racional e razoável, capaz de converter-nos
psiquicamente em seres mais dignos de nossa existência no Planeta.
[1] TAVARES, Flávio Mussa. In: “O Espírita Mineiro”, nº
291, maio/junho, 2006.
[2] Inserta nos livros Trinta Anos com Chico Xavier,
Clóvis Tavares, IDE, Araras-SP; e Escultores da Alma, Francisco Cândido
Xavier/Espíritos Diversos
[3] Edição esgotada. Federação Espírita Brasileira, Rio de
Janeiro, 1942.
[4] Editados pela Livraria Allan Kardec Editora, LAKE, São
Paulo.
[5] Editados pelo Instituto de Difusão Espírita, IDE,
Araras-SP.
[6] Editados pelo Instituto Pietro Ubaldi, Campos-RJ.
[7] A Morte Simples Mudança. F.C.Xavier e Carlos
Vitor M. Tavares, USE/Madras Espírita. São Paulo, 2005.
Nenhum comentário:
Postar um comentário