Edson Gomes Tristão - outubro/2023
A fertilização assistida
(fecundação extrauterina) evoluiu muito, nos últimos 40 anos. Desde a primeira
criança nascida em 1978, em Bristol, na Inglaterra, as técnicas têm sido
aperfeiçoadas, sendo considerada hoje, uma das principais formas de nascimento,
contabilizando até o último ano mais de oito milhões de bebês em todo o mundo.
Chegamos, nos dias atuais, com a chamada ectogênese ou desenvolvimento de
gestação extracorpórea através do útero artificial.
O tema, noticiado em toda a
mídia, foi apresentado pelo biotecnólogo e comunicador científico Hashem
Al-Ghaili, um produtor, cineasta e comunicador de ciência, com mestrado em
biologia molecular, nascido no Iêmen e residindo na Alemanha, em Berlim.
Na justificativa do projeto, instalação
do primeiro útero artificial do mundo, ele relata inúmeras vantagens, onde
os pais poderiam escolher as características do bebê que vai nascer,
selecionando inteligência, cor dos olhos, cabelos, altura, eliminação de
doenças genéticas e hereditárias, além de outras. Possibilita, ainda, a
prevenção de mortes maternas no mundo, em decorrência da gravidez e parto,
relatado pelos marcadores da saúde em mais de trezentos mil por ano ou
oitocentas e setenta e duas mortes por dia[2].
Através dessa técnica, seria
possível a produção inicial de trinta mil bebês por ano, com os casais
inférteis se tornando os verdadeiros pais biológicos. Conforme o autor,
superadas as barreiras éticas para concluir as pesquisas, em aproximadamente
dez anos, o projeto poderia entrar em funcionamento efetivo.
Apesar de ser uma proposta
atraente e desafiadora e até um tanto exagerada, a opinião geral dos médicos da área da
reprodução humana, é de que o útero artificial não é uma técnica atualmente
disponível[3].
Existem, no entanto, várias
pesquisas científicas, demonstrando progresso na elaboração do futuro útero
artificial, levando-nos a crer que, cedo ou tarde, ele virá, deixando de ser
uma ficção científica.
O escritor inglês, Aldous Huxley[4],
em 1932, no seu livro Admirável Mundo Novo, descreveu fatos que se
passam no ano 2540, em Londres. Apresenta uma visão industrial e futurística na
geração humana, repleta de escolhas na manipulação genética, da criação de
indivíduos com potencial direcionado à necessidade do meio. O livro se tornou
um best seller.
Na década de 80, Yoshiro
Kuwabara, Chefe do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade de
Juntendo (Tóquio), citado no trabalho de Perri Klass[5], criou
uma placenta artificial, com líquido amniótico sintético, tentando
reproduzir o ambiente uterino fora do organismo materno. As pesquisas foram
realizadas com cabritos.
Helen Liu, pesquisadora da
Universidade de Cornell, Nova York, é citada por Bulletti C. e Cols.[6],
em 2011. Desenvolveu um endométrio artificial (onde o embrião adere) na mesma proveta
local em que ele vai evoluir. São subsídios para o útero extracorpóreo.
Em 2006, Henri Atlan2
em seu livro já citado, afirma que a tendência da Medicina Reprodutiva é fazer
com que os fetos, no início da gestação e próximo ao seu final, deverão estar
fora do útero materno, por precaução, frente intercorrências graves nesses
períodos.
Em 2018, Diana Coutinho[7]
relata em seu artigo O futuro da tecnologia reprodutiva, trabalho de Cousin–Frankl[8],
mostrando cordeiros prematuros mantidos em biobag (recipiente com
líquido amniótico, inclusive com cordão umbilical artificial). Os autores
afirmam que os testes com humanos poderiam começar em três anos.
Esses trabalhos, somados a
outros da literatura médica, mostram que o objetivo científico é realizar a fecundação
assistida e, na sequência, implantar o embrião no útero artificial até a sua
viabilidade como feto. Pode demorar, mas acreditamos que essa técnica virá.
Enquanto isso, as discussões
éticas, morais e filosóficas a respeito da maternidade e paternidade em todos
os arranjos familiares já começaram. Temos como exemplo o artigo do cirurgião e
urologista francês Laurent Alexandre[9],
que aborda, especificamente, as famílias homossexuais, onde o método
permitiria que eles pudessem ter filhos biológicos portadores de genes dos
dois genitores, ampliando assim os sentimentos de afetividade e
responsabilidade familiar. O autor, em seguida, envereda por várias dúvidas
éticas na sequência que, segundo ele, necessitará de muitas discussões futuras. Quais poderiam ser algumas observações
realizadas com o auxílio da Doutrina Espírita?
Pelas explicações em O Livro
dos Espíritos[10],
entende-se que a vida começa com o encontro do óvulo e espermatozoide formando
o ovo ou zigoto e desenvolvendo, a partir desse ponto, os agrupamentos
celulares específicos, que vão formar órgãos e sistemas distintos. Toda essa
evolução é comandada pelo corpo perispiritual (espécie de forma magnética) que
traz, em seu interior, memórias de outras existências, e agora, obedecendo um
planejamento prévio, vai passando para o corpo físico fatores intrínsecos da
personalidade do futuro ser. As questões da personalidade e inteligência não
são transmitidas geneticamente, pois fazem parte da alma imortal, não podem ser
controladas por decisões dos pais ou da ciência. Assim, como muitas doenças
genéticas e hereditárias, que aparecem apenas no transcorrer da gestação,
apresentarão mais um problema ético na condução de cada caso.
Os novos arranjos familiares se
beneficiarão com o método, fortalecendo vínculos e aumentando o amor entre
todos, que é a base fundamental da construção familiar. O carinho e afeto dos
genitores desde o começo, seria o padrão ouro, fundamental para o novo ser, sem
necessidades de tantas preocupações com a estética e aspecto físico. Devemos
lembrar que a doação do amor não sofre restrição, sendo a barreira física ou
artificial, na geração de uma nova vida. Os esforços e recursos direcionados
para esse tipo de gestação, além do envolvimento emocional profundo dos
cônjuges, demonstraria o desejo real deles terem o filho que, com certeza,
seria uma criança muito amada, ganhando pontos em sua evolução futura.
O útero artificial representará
uma nova fase da História da reprodução, seja complementando a gestação
natural, seja pela finalidade associada de salvar bebês prematuros, vidas
maternas e diminuir os conflitos ético-jurídicos sobre paternidades.
Que, um dia, os seres nascidos
pelo útero artificial, possam trazer
fraternidade, caridade e amor, ajudando a mudar para melhor o comportamento
dos seres humanos na Terra. Bem-vinda, evolução!
[1] MUNDO ESPÍRITA – Outubro/2023 - Número 1671 - Ano 91 - http://www.mundoespirita.com.br/?materia=utero-artificial-a-reencarnacao-extracorporea
[2] Saúde Materna –. OPAS/OMS-PAHO. https://busms.saude.gov.br em 20.7.2023.
[3] ATLAN, Henri. O útero artificial. Tradução de
Irene Ernest Dias. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2006.
[4] HUXLEY, Aldous. Admirável Mundo Novo. Tradução
de Lino Vallandro e Vidal Serrano. São Paulo: Globo, 1941.
[5] KLASS, Perry. The artificial womb is born. The
New York Times, Nova Iorque, 1996, sept 26; 117-9, 1996.
[6] BULLETTI, C; PALAGIANO, A; PACE; CERNI, A; BONINI, A;
ZIEGLER, D (2011). The artificial womb. Annals of the New York Academy of
Science, Nova Iorque (124-128).
[7] COUTINHO, Diana, O “futuro” da tecnologia
reprodutiva: O útero artificial. Universidade do Minho. Escola de Direito. https://hdl.handle.net/1822/56127 . março de 2018.
[8] COUSIN- FRANKL, Jennifer. Fluid filled “biobag” allows
premature lambs to develop outside the womb, “Science” consultado em
6.2.2018.
[9] LAURENT, Alexandre. Biologia e homogenitorialidade.
Instituto Humanitas Unisinos – IHU. publicado no caderno Science et Techno
do Jornal Le Monde em 3.11.2012.
[10] KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Rio de
Janeiro: FEB, 1974. pt.1, cap.II
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