outubro/2023 - Luciano Klein
Em 1875, a Sociedade de Estudos
Espiríticos – Grupo Confúcio, fundada em 1873, responsabilizou-se por verter,
em forma de livro, as primeiras obras espíritas ao português. Joaquim Carlos
Travassos (1839-1915) foi incumbido dessa missão. Com efeito, em janeiro de
1875, surgiu, na Corte Imperial do Rio de Janeiro, a primeira versão de O
Livro dos Espíritos, traduzido da 20ª edição francesa. Travassos utilizou o
pseudônimo Fortúnio[2],
sendo a obra publicada pela Editora B. L. Garnier.
Traduções anteriores
Entre as descobertas acidentais,
que fizemos em nossas buscas, encontramos uma tradução de O Livro dos
Espíritos, lançada, em folhetim, ao longo de 1874, pela folha carioca Jornal
dos Debates. Essas publicações podem ter fomentado o próprio Travassos e
seu editor Garnier a apressarem o lançamento, em livro, da obra em questão,
tendo em vista que Fortúnio se detinha na tradução, desde 1873, quando
do aparecimento do Grupo Confúcio.
O Jornal dos Debates
apareceu em 5 de fevereiro de 1874. Era de propriedade da firma E. Pessoa
& Baptista, constituída dos sócios Joaquim Baptista Rodrigues da Silva
e Cyrillo Eloy Pessoa de Barros. A Biblioteca Nacional só possui, em sua
hemeroteca, os números de 20 de abril e 2 de maio de 1874. Apesar disso, pela
leitura dos dois exemplares, pudemos aferir que a tradução de O Livro dos
Espíritos vinha sendo realizada desde o início de fevereiro. Essa dedução
deve-se ao fato de que, na edição do dia 20 de abril, estava sendo divulgada a
sequência da questão de número 425 até 438. Na edição de 2 de maio, as
perguntas de número 569 a 584.
A equipe do Jornal dos
Debates era formada pelos sócios Joaquim Baptista Rodrigues[3] e
os baianos Cyrillo Pessoa e Cyro Cardoso de Menezes[4]. A
redação ficava a cargo de Cyrillo e Cyro, professores de reputação na Corte.
Presumimos tenha essa tradução das questões de O Livro dos Espíritos,
disponibilizadas no aludido periódico, sido efetuadas pelo Professor de
português e francês[5],
Cyrillo Eloy Pessoa de Barros. Natural da Bahia, era engenheiro, advogado,
dramaturgo e professor. A folha fluminense A Reforma, em 6 de junho de
1874, ao pronunciar-se sobre o vespertino, menciona que Cyrillo, além de sócio,
era o redator principal do Jornal dos Debates.
Uma tradução ainda mais antiga
Surpreendentemente, existe uma
tradução ainda mais antiga, da lavra do médico e historiador Mello Moraes[6].
Quem primeiro nos dá essa informação é Leopoldo
Cirne, sucessor de Bezerra
na presidência da Federação Espírita Brasileira – FEB, em seu alentado trabalho
Anticristo Senhor do Mundo, publicado em 1935. Os pesquisadores Samuel
Nunes Magalhães e Jorge Brito, presentemente, debruçam-se sobre essa versão
pioneira que foi doada pelo médico alagoano à Biblioteca Nacional, em 1862.
A FEB possui o microfilme
completo desse documento. Segundo pudemos constatar, graças às informações
gentilmente cedidas pelos dois pesquisadores citados, trata-se da primeira
versão, de fato, ao português, feita, porém, a partir da primeira edição de O
Livro dos Espíritos. A obra traz uma dedicatória do tradutor, datada de
dezembro de 1862. A segunda edição de O Livro dos Espíritos, com
praticamente o dobro das questões da primeira, já havia sido lançada em 1860.
Ao que nos parece, o médico homeopata alagoano vinha estudando e traduzindo
essa primeira versão desde o final dos anos 1850. A obra, todavia, foi entregue
manuscrita, como outras tantas por ele deixadas, mas se constitui um marco
importante à História do Espiritismo no Brasil.
[1] MUNDO ESPÍRITA - Outubro de 2023 - Número 1671 - Ano 91 - http://www.mundoespirita.com.br/?materia=respingos-historicos-10
[2] Travassos, natural de Angra dos Reis/RJ, formou-se
pela Faculdade de Medicina fluminense, em 1862. Entre aqueles aos quais dedicou
sua tese de conclusão de curso, consta Dr. Adolfo Bezerra de Menezes, a quem
também ofereceria, no início de 1875, a obra magna do Espiritismo por ele
traduzida.
[3] O Advogado Joaquim Baptista Rodrigues da Silva
(1824-1897) era natural de São Paulo. Destacado nome da Maçonaria, em 1871,
militou e conviveu com Antônio da Silva Netto e Bittencourt Sampaio, espíritas
e maçons e também com o amigo Antônio Carlos Mendonça Furtado de Menezes, um
dos fundadores, a 3 de outubro de 1879, da Sociedade Acadêmica Deus, Cristo e
Caridade. Ele era espírita e integrava a primeira diretoria da Sociedade
Acadêmica Deus, Cristo e Caridade.
[4] Professor e Poeta, Cyro Cardoso de Menezes era baiano
e segundo redator do Jornal dos Debates. Bacharel em Ciências Naturais pela
Universidade de Edimburgo, lecionou no célebre Colégio Kopfe, em Petrópolis.
Lecionou inglês no Colégio Pedro II, em 1855. Foi professor de português,
alemão e inglês, do Ateneu Niteroiense (1874 e 1875). Lecionava, também, latim
e geografia.
[5] Almanak Lemmert de 1878, p. 653. À página 655, é dito
que ele também lecionava geografia, matemática e história. Encontramos,
igualmente, registros de que ensinava cosmografia, câmbio e gramática
filosófica. As aulas eram ministradas
(cinco disciplinas) nas residências, em sua própria casa ou em algumas escolas,
adotando, para algumas matérias, os compêndios de sua autoria.
[6] Alexandre José de Mello Moraes (1816–1882) nasceu em
Alagoas e desencarnou no Rio de Janeiro. Médico homeopata, atuou como
parlamentar e jornalista, escreveu biografias de figuras ilustres, crônicas da
História do Brasil e ficaria conhecido, especialmente, por seu trabalho de
reunir fontes e documentos históricos importantes.
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