segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

ILDEFONSO PEREIRA CORREIA – Barão do Serro Azul[1]

 

 

Ildefonso Pereira Correia foi industrial, político e ardoroso patriota. Nasceu em Paranaguá, no dia 6 de agosto de 1845, projetando-se muito jovem no cenário paranaense, passando por Antonina e radicando-se na Capital.

Espírito progressista e empreendedor, concluiu seu curso de humanidades em Nova Friburgo, Província do Rio de Janeiro, com alta distinção.

Com uma esplêndida visão empresarial, muito avançada para sua época, logo lhe sorriram o sucesso e a fortuna. Absorveu todas as inovações tecnológicas que surgiam e não eram assimiladas pelas demais empresas ervateiras.

Não é nenhum exagero afirmar que Ildefonso Correia é um divisor de águas na produção paranaense. A partir dele se estabelece uma nova mentalidade empresarial na conjuntura do Estado.

Exerceu funções públicas como a presidência e vice-presidência da Câmara Municipal de Curitiba, deputado provincial em várias legislaturas, suplente de juiz em Antonina, assessor do presidente Taunay.

Nas artes e na cultura foi tesoureiro da Comissão que em 1885 angariava livros para a Biblioteca Pública.

Fez parte da Comissão Central que organizou a Pinacoteca Paranaense e colaborou com prêmios para os alunos que mais se distinguiam na vida estudantil de Curitiba.

Em dezembro de 1886, foi Delegado Especial de Instrução Primária Secundária, o que equivaleria hoje a Secretário da Educação.

Sua ação e dinamismo o levaram a atuar nos setores cultural e social.

Foi presidente do Conselho Fiscal da Caixa Econômica, dirigiu a Associação de Proteção à Infância Desamparada. Entre outras entidades que ajudou a fundar, está o Clube Curitibano, do qual foi o primeiro presidente.

Fundador da Associação Comercial do Paraná, se tornou o precursor de todas as demais federações, sindicatos patronais e associações que hoje existem. Plantou idéias e ideais para o progresso, que sabia poder conquistar para o Paraná que tanto amava.

Pelo esforço, na divulgação da erva-mate, recebeu em 1887, do Presidente da França a Medalha do Mérito Agrícola.

Ao longo de sua vida ponteada de dinâmica ação empresarial sentiram sua presença os setores da erva-mate, comércio, olaria, banco, transporte em bonde, feiras, exposições, associativismo e gráfica. Fundou a Impressora Paranaense, gráfica existente até hoje.

O traço, porém, que lhe ressalta a fisionomia moral é seu radiante espírito de caridade, seu lado afetivo, sua natureza sensível e piedosa.

Protegia eficazmente, sem alardes, nem ostentação, os que recorriam a ele. Antes, com uma modéstia e discrição de quem cumpre o dever mais simples do mundo. Observando o frio das crianças a vestir escassa camisa em pleno mês de junho, no inverno paranaense e a saciar a fome com pinhões somente, decide estabelecer uma serraria, para dar trabalho e ganho àquela pobre gente. Fundou uma indústria para beneficiar, industrializar e comercializar o pinho paranaense, entre a Vila de São José dos Pinhais e a freguesia de Piraquara.

Alma generosa e grande, amando o bem por índole, praticava a virtude normalmente, sem esforço, sem contrariedades, como se fizesse isso parte dos deveres de sua vida.

Homem inteligente e culto, possuía uma preciosa biblioteca, formada de livros na maioria clássicos. Apreciava a arte, principalmente a arquitetura e a escultura.

Mantinha a simplicidade de uma vida metódica. Adorava passear pelos jardins da casa, conduzindo pelas mãos os três filhos: Siroba, Carloca e Ildefonso, como a despertar-lhes o gosto pela natureza e pelo milagre da criação. O jardim era a sua vida. As camélias brancas, em especial.

De porte mediano, magro, barba sempre bem tratada, voz clara, afetado por ligeira surdez, caracterizava-o a aparência varonil.

Detinha costumes Austeros. Vestia-se com medida discrição.

O seu ar senhorial não passou despercebido a D. Pedro II em sua visita ao Paraná. Em 31 de agosto de 1880, o Imperador o agraciou, pelos relevantes serviços prestados ao Estado, com a Ordem da Rosa. Era a moeda de honra de que mais se utilizou D. Pedro II, premiando o professor, o homem de iniciativa na indústria e na lavoura, o senhor que alforriava escravos. Sintetizava Amor e Fidelidade. A partir daí, Ildefonso Pereira Correia passaria a usar o título de Comendador.

Tinha satisfação em ser útil. A sua bondade fez com que se lhe dessem o título póstumo de Pai dos Pobres.

Quando a campanha abolicionista inflamou a Província do Paraná, o Comendador Ildefonso Pereira Correia tomou-se de justo entusiasmo e declarou, em um discurso, comprometer-se, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Curitiba, a promover a emancipação dos escravos do município, a fim de que, na futura sessão magna dessa Associação, se pudesse afirmar que a capital da Província não tinha mais escravos.

Ele passou a comandar a campanha de arrecadação de fundos, que tantos benefícios prestou à causa da Abolição, indiferente à crise do pinho no mercado internacional, que o obrigou a liquidar sua empresa de comercialização de madeiras.

Caráter nobre. Homem laborioso. Amigo fiel.

Em 8 de agosto de 1888 foi agraciado pelo Imperador D. Pedro II, seu amigo a quem se devotava, com o título de Barão do Serro Azul. Reconhecia D. Pedro II todos os serviços prestados à Coroa pelo ilustre homem.

Como político, embora pertencesse ao Partido Conservador, foi sempre liberal e patriota. Sem possuir espírito partidário, procurava sempre conciliar e contornar as situações difíceis, embora, muitas vezes, prejudiciais aos seus negócios.

Assim aconteceu em janeiro de 1894. O assunto do dia era a Revolução Federalista e a iminente invasão da cidade. A população se inquietava nas ruas e praças, aterrorizada com as notícias e boatos que chegavam a todo instante.

Foi neste período que Ildefonso Pereira Correia exerceu papel de grande relevo, quer junto às forças legais, quer perante o exército federalista que invadira e dominara o Paraná. Disse o Barão que não consentiria, tacitamente, que a população indefesa de Curitiba sofresse as consequências do sítio e do bombardeio, sem empenhar todos os esforços para evitar essa calamidade.

Estou cumprindo o meu dever de brasileiro. Foram suas palavras.

Dr. Vicente Machado foi forçado a abandonar Curitiba, transferindo a capital paranaense para a cidade de Castro. Nessa dolorosa emergência, Ildefonso Correia tomou todas as providências para o policiamento da cidade, buscando evitar os inconvenientes da completa ausência de autoridades.

Para evitar saques, coube-lhe, como Presidente da Associação Comercial, presidir ao Empréstimo de Guerra lançado pelos vitoriosos revolucionários.

Colocado diante de um dilema − saque ou empréstimo de guerra − não vacilou. Aceitou o árduo encargo, lançando o empréstimo que, nas circunstâncias do momento, não poderia deixar de ser compulsório.

Era sua ação da não-violência. Ao irmão escreveria em maio de 1894:

Tenho consciência de que tudo quanto pratiquei, logo que o nosso Estado foi invadido pelas forças revolucionárias, somente obedeceu aos mais nobres e puros sentimentos. (...) Os tempos são de provações e eu a elas me subordino pacientemente.

Com a restauração da legalidade vieram as medidas de punição para os que tinham contribuído com a Revolução. Crescia o número de suspeitos e de presos.

O Barão do Serro Azul também foi feito prisioneiro, junto a outros companheiros. No dia 20 de maio do ano de 1894, às nove da noite, esses prisioneiros foram chamados. Acompanhados por uma escolta de doze soldados, deixaram o presídio.

Os prisioneiros se comunicavam silentes, pela expressão dos olhos, com certo ar de espanto. Tinha a marcha um toque sinistro, misturado ao barulho das espadas resvalando na calçada, em contraste com o silêncio tumular da noite.

Caía uma chuva fina, hibernal. Serro Azul parecia tranquilo, escudo e rocha de um grupo de homens desorientados e perplexos.

A convicção íntima da inocência infundia-lhes coragem. Poderiam enfrentar, sem receio, os juízes e as leis da República. Esse convencimento renovava-lhes a fortaleza do espírito e a confiança no amanhecer de um novo dia.

O que feria, naquela hora, mais profundamente a Ildefonso Correia era a lembrança da sua mulher grávida e desesperada, longe dos seus afetos e desvelos, indefesa e frágil na sua desdita. A criança, depois, nasceria morta.

Às dez e meia estavam no comboio que partiu da Estação Ferroviária, certos de que iniciavam a viagem ao Rio de Janeiro onde seriam julgados. Mas não foi tão longe...

O trem parou no Pico do Diabo. Lá, no silêncio da noite, ouviram-se tiros, gritos e barulho de corpos sendo arrastados.

O Barão do Serro Azul caiu de joelhos e orou. Meus filhos, foram suas últimas palavras. Uma descarga cortou-lhe a prece e a vida.

A notícia segura da execução não chegou logo a Curitiba. Somente seis dias depois puderam os amigos das vítimas, com reservas e precaução, ir até o km. 65 da Estrada de Ferro Curitiba-Paranaguá, para enterrar seus mortos.

Ninguém pode, até hoje, explicar o motivo de tão sangrento atentado. Todos os mortos eram cidadãos muito conceituados no Estado do Paraná.

O irmão de Ildefonso Correio pediu renúncia de seu cargo junto ao governo de Marechal Floriano Peixoto, ferido mortalmente em seu coração pelo que fizeram a quem tão bem servira à Pátria e aos homens. Nessa oportunidade, o Marechal Floriano Peixoto afirmou que jamais dera a ordem para eliminar Ildefonso e seus amigos. Pelo contrário, mostrou cópia de um telegrama que teria remetido ao Paraná, ordenando que, entrando triunfantes as tropas do governo, na Província paranaense, o governo fosse entregue a Ildefonso Pereira Correia.

O que aconteceu ao dito telegrama nunca se soube. No entanto, o nome de Ildefonso Pereira Correia deixou de ser pronunciado por décadas, até o momento em que se procedeu a um resgate de sua memória, conferindo-lhe os méritos de cidadão honrado, político correto e espírito cristão.

No ano de 1943, quando Centro Espírita localizado em Curitiba recebeu da Federação Espírita do Paraná a orientação de alterar a sua denominação, optaram os companheiros de então pelo nome de Ildefonso Pereira Correia.

Foi na análise da vida de Ildefonso que encontraram abundantes e sólidos motivos os idealistas daquela hora para tomar o seu nome para a nova denominação do Centro Espírita nascente: Centro Espírita Ildefonso Correia, fundado em 22 de setembro de 1936.

A presença serena e amiga de Ildefonso se faz sentir em dias de dificuldades mais intensas, honrando com sua palavra esclarecedora de cristão que ama, serve e passa, aos companheiros daquela Instituição Espírita.

Cidadão do Universo, como Espírito imortal que é, prossegue vinculado ao Bem e aos seus irmãos encarnados na Terra.

 

O Excelentíssimo Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sancionou a Lei de nº 11.863, no dia 15 de dezembro de 2008, 187º da Independência e 120º da República, inscrevendo o nome de Ildefonso Pereira Correia, o Barão do Serro Azul, no Livro dos Heróis da Pátria, nos seguintes termos:

Art. 1º É inscrito o nome de Ildefonso Pereira Correia, o Barão de Serro Azul, no Livro dos Heróis da Pátria, depositado no Panteão da Liberdade e da Democracia, em Brasília.

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

A publicação se deu no Diário Oficial da União do dia 16 de dezembro de 2008.

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