terça-feira, 13 de julho de 2021

MISSÃO DA MULHER[1]

 

Allan Kardec

 

(Lyon, 6 de julho de 1866 – Grupo da Sra. Ducard – Médium: Sra. B...)

 

Cada dia os acontecimentos da vida vos trazem ensinamentos susceptíveis de vos servir de exemplo e, contudo, passais sem os compreender, sem tirar uma dedução útil das circunstâncias que os provocaram. Entretanto, nesta união íntima da Terra e do espaço, dos Espíritos livres e dos Espíritos cativos, ligados à realização de sua tarefa, há desses exemplos, cuja lembrança deve perpetuar-se entre vós: é a paz proposta na guerra.

Uma mulher, cuja posição social atrai todos os olhares, vai-se, humilde irmã de caridade, levar a todos a consolação de sua palavra, a afeição de seu coração, a carícia de seus olhos. Ela é imperatriz; sobre sua fronte brilha a coroa de diamantes, mas ela esquece a sua posição, esquece o perigo para acorrer ao meio do sofrimento e dizer a todos: “Consolai-vos; eis-me aqui! Não sofrais mais: eu vos falo; não vos inquieteis: eu tomarei conta de vossos órfãos!...” O perigo é iminente, o contágio está no ar e, contudo, ela passa, calma e radiosa, em meio a estes leitos, onde jaz a dor. Nada calculou, nada temeu, foi aonde a chamava o coração, como a brisa vai refrescar as flores murchas e endireitar suas frágeis hastes.

Este exemplo de devotamento e de abnegação, quando os esplendores da vida deveriam engendrar o orgulho e o egoísmo, por certo é um estimulante para as mulheres que sentem vibrar em si essa delicadeza de sentimento que Deus lhes deu para cumprir sua tarefa; porque elas estão encarregadas principalmente de espalhar a consolação e, sobretudo, a conciliação. Não têm a graça e o sorriso, o encanto da voz e a doçura da alma? É a elas que Deus confia os primeiros passos de seus filhos; ele as escolheu como as nutrizes das meigas criaturas que vão nascer.

Este Espírito rebelde e orgulhoso, cuja existência será uma luta constante contra a desgraça, não lhes vem pedir que lhe inculque ideias diferentes das que traz ao nascer? É para elas que estende suas mãozinhas; sua voz, outrora rude, e seus acentos, que vibravam como o cobre, se abrandarão como um doce eco, quando disser: mamãe.

É a mulher que ele implora, esse doce querubim, que vem aprender a ler no livro da Ciência; é para lhe agradar que fará todos os esforços para se instruir e tornar-se útil à Humanidade. É ainda para ela que ele estende as mãos, esse jovem que se transviou na estrada e quer voltar ao bem; não ousaria implorar a seu pai, cuja cólera receia, mas sua mãe, tão doce e tão generosa, não terá para ele senão esquecimento e perdão.

Não são elas as flores animadas da vida, os devotamentos inalteráveis, essas almas que Deus criou mulheres?

Atraem e encantam. Chamam-nas a tentação, mas deviam chamá-las a lembrança, porque sua imagem fica gravada em caracteres indeléveis no coração de seus filhos, quando não mais existem; não é no presente que são apreciadas, mas no passado, quando a morte as restituiu a Deus. Então seus filhos as buscam no espaço, como o marinheiro busca a estrela que o deve conduzir ao porto. Elas são a esfera de atração, a bússola do Espírito que ficou na Terra e que espera encontrá-las no céu. São ainda a mão que conduz e sustenta, a alma que inspira e a voz que perdoa; e, assim como foram o anjo do lar terreno, elas se tornam o anjo consolador que ensina a orar.

Oh! Vós que tendes sido oprimidas na Terra, mulheres que sois tidas como escravas do homem, porque vos submetestes à sua dominação, vosso reino não é deste mundo! Contentai-vos, pois, com a sorte que vos está reservada; continuai vossa tarefa; ficai como medianeiras entre o homem e Deus, e compreendei bem a influência de vossa intervenção. Este é um Espírito ardente, impetuoso; o sangue lhe ferve nas veias; vai se exaltar, será injusto; mas Deus pôs a doçura em vossos olhos, a carícia em vossa voz; olhai-o, falai-lhe: a cólera se apaziguará e a injustiça será afastada.

Talvez tenhais sofrido, mas tereis poupado uma falta ao vosso companheiro de jornada e vossa tarefa foi cumprida. Aquele ainda é infeliz, sofre, a fortuna o abandona, julga-se um pária!... Mas aí há um devotamento à prova, uma abnegação constante para levantar esse moral abatido, para restituir a esse Espírito a esperança que o havia abandonado.

Mulheres, sois as companheiras inseparáveis do homem; com ele formais uma cadeia indissolúvel que a desgraça não pode romper, que a ingratidão não deve manchar, e não poderia quebrar-se, porque o próprio Deus a formou e, embora às vezes tenhais na alma essas preocupações sombrias, que acompanham a luta, contudo rejubilai-vos, porque nesse imenso trabalho de harmonia terrestre, Deus vos deu a mais bela parte.

Coragem, pois! Ó vós que viveis humildemente, trabalhando pela vossa melhora íntima, Deus vos sorri, porque vos deu essa amenidade que caracteriza a mulher; sejam imperatrizes, irmãs de caridade, humildes trabalhadoras ou doces mães de família, estão todas envolvidas na mesma bandeira, e trazem escrito na fronte e no coração estas duas palavras mágicas, que enchem a eternidade: Amor e Caridade.

 

Cárita



[1] Revista Espírita – Abril/1867 – Allan Kardec

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