terça-feira, 8 de junho de 2021

LINCOLN E SEU ASSASSINO[1]

 

Allan Kardec

 

Extraído do Banner of Light, de Boston

(Análise de uma comunicação de Abraão Lincoln por um médium de Ravenswood)

 

Quando Lincoln voltou de seu atordoamento e despertou no mundo dos Espíritos, ficou muito surpreendido e perturbado, porque não fazia a menor ideia de que estivesse morto.

O golpe que o feriu suspendeu instantaneamente toda sensação, e ele não compreendeu o que lhe havia acontecido. Esta confusão e esta perturbação, contudo, não duraram muito. Ele era bastante espiritualista para compreender o que é a morte e, como muitos outros, não ficou admirado da nova existência para a qual fora transportado. Viu-se cercado por muitas pessoas, que sabia mortas há bastante tempo, e logo soube a causa de sua morte. Foi recebido cordialmente por muita gente por quem tinha simpatia.

Compreendeu sua afeição por ele e, num olhar, pôde abarcar o mundo ditoso no qual havia entrado.

 

No mesmo instante experimentou um sentimento de angústia pela dor por que devia passar sua família, e uma grande ansiedade a propósito das consequências que sua morte poderia acarretar ao país. Esses pensamentos o trouxeram violentamente à Terra.

Tendo sabido que John Wilkes Booth estava mortalmente ferido, veio a ele e curvou-se sobre seu leito de morte. Nesse momento, Lincoln tinha recobrado a perfeita consciência e a tranquilidade de seu Espírito, e esperou com calma o despertar de Booth para a vida espiritual.

Booth não ficou espantado ao despertar, porque esperava a morte. O primeiro Espírito que encontrou foi Lincoln; olhou-o com muita petulância, como se se glorificasse do ato que havia cometido. O sentimento de Lincoln a seu respeito, entretanto, não respirava nenhuma ideia de vingança, muito ao contrário; este se mostrou suave e bom e sem a mais leve animosidade. Booth não pôde suportar este estado de coisas, e o deixou cheio de emoção.

O ato que ele cometeu teve vários motivos; primeiro, sua falta de raciocínio, que o fazia considerar esse ato como meritório e, depois, seu amor desregrado aos louvores que o tinham convencido de que seria cumulado de elogios e olhado como um mártir.

Depois de ter vagado, sentiu-se de novo atraído para Lincoln. Às vezes enchia-se de arrependimento, outras vezes seu orgulho o impedia de emendar-se. Entretanto compreendia quanto seu orgulho era vão, sabendo sobretudo que não podia esconder, como em vida, nenhum dos sentimentos que o agitavam, e que seus pensamentos de orgulho, de vergonha ou de remorso são conhecidos dos que o cercam. Sempre em presença de sua vítima, e dela não recebendo senão marcas de bondade, eis o seu estado atual e a sua punição. Quanto a Lincoln, sua felicidade ultrapassa o que poderia ter esperado.

 

Observação – A situação desses dois Espíritos é, em todos os pontos, conforme àquela que diariamente vemos exemplos nos relatos de além-túmulo. Ela é perfeitamente racional e em relação com o caráter dos dois indivíduos.



[1] Revista Espírita – Março/1867 – Allan Kardec

Nenhum comentário:

Postar um comentário