terça-feira, 8 de dezembro de 2020

COMUNICAÇÃO COM OS SERES QUE NOS SÃO CAROS[1]

 


Allan Kardec

 

Por que todas as mães que choram seus filhos, e que ficariam felizes se com eles se comunicassem, muitas vezes não o podem? Por que a visão deles lhes é recusada, mesmo em sonho, não obstante seu desejo e suas preces ardentes?

 

Além da falta de aptidão especial que, como se sabe, não é dada a todos, por vezes há outros motivos, cuja utilidade a sabedoria da Providência aprecia melhor que nós. Essas comunicações poderiam ter inconvenientes para as naturezas muito impressionáveis; certas pessoas poderiam delas abusar e a elas se entregarem com um excesso prejudicial à saúde. A dor, em semelhante caso, sem dúvida é natural e legítima; mas algumas vezes é levada a um ponto desarrazoado.

Nas pessoas de caráter fraco, muitas vezes essas comunicações tornam mais viva a dor, em vez de acalmá-la, razão por que nem sempre lhes é permitido receber, mesmo por outros médiuns, até que se tenham tornado mais calmas e bastante senhoras de si para dominar a emoção. A falta de resignação, em semelhante caso, é quase sempre um motivo de retardamento.

Depois, é preciso dizer que a impossibilidade de comunicar com os Espíritos que mais se ama, quando se o pode com outros, é muitas vezes uma prova para a fé e a perseverança e, em certos casos, uma punição. Aquele a quem esse favor é recusado deve, pois, dizer-se que sem dúvida mereceu; cabe-lhe procurar a causa em si mesmo, e não atribui-la à indiferença ou ao esquecimento do ser lamentado.

Finalmente, há temperamentos que, não obstante a força moral, poderiam sofrer o exercício da mediunidade com certos Espíritos, mesmo simpáticos, conforme as circunstâncias.

Admiremos em tudo a solicitude da Providência, que vela sobre os mínimos detalhes, e saibamos submeter-nos à sua vontade sem murmurar, porque ela sabe melhor que nós o que nos é útil ou prejudicial. Ela é para nós como um bom pai, que nem sempre dá a seu filho o que ele deseja.

Dão-se as mesmas razões no que concerne aos sonhos.

Os sonhos são as lembranças do que a alma viu no estado de desprendimento, durante o sono. Ora, essa lembrança pode ser interdita. Mas aquilo de que não nos lembramos não está, por isto, perdido para a alma; as sensações experimentadas durante as excursões que ela faz no mundo invisível, deixam ao despertar impressões vagas; e não referimos pensamentos e ideias cuja origem muitas vezes não suspeitamos. Podemos, pois, ter visto durante o sono os seres aos quais nos afeiçoamos, com os quais nos entretemos e não lhes guardar a lembrança. Então dizemos que não sonhamos.

Mas se o ser lamentado não pode manifestar-se de uma maneira ostensiva qualquer, nem por isso estará menos junto aos que o atraem por seu pensamento simpático. Ele os vê, ouve as suas palavras e, muitas vezes, adivinhamos a sua presença por uma espécie de intuição, uma sensação íntima, algumas vezes até por certas impressões físicas. A certeza de que não está no nada; de que não está perdido nas profundezas do espaço, nem nos abismos do inferno; de que é mais feliz, agora isento dos sofrimentos corporais e das tribulações da vida; de que o veremos, depois de uma separação momentânea, mais belo, mais resplandecente, sob seu envoltório etéreo imperecível, e não sob a pesada carapaça carnal – eis a imensa consolação que recusam os que creem que tudo acaba com a vida; e é o que dá o Espiritismo.

Em verdade, não se compreende o encanto que se pode encontrar em se comprazer na ideia do nada para si mesmo e para os seus, e a obstinação de certas pessoas em repelir até a esperança de que pode ser diferente, e os meios de adquirir a sua prova. Diga-se a um doente agonizante: “Amanhã estareis curado, vivereis ainda muitos anos, alegre, saudável”, ele aceitará o augúrio com alegria; o pensamento da vida espiritual, indefinida, isenta de enfermidades e preocupações da vida, não é muito mais satisfatória?

Pois bem! O Espiritismo dela não dá apenas a esperança, mas a certeza. É por isto que os espíritas consideram a morte completamente diferente da maneira por que o fazem incrédulos.



[1] Revista Espírita – Agosto/1866 – Allan Kardec

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