sábado, 1 de junho de 2019

OS SÓCIOS INVÍSIVEIS DOS VÍCIOS[1]



Rogério Coelho

(…) Espíritos que perderam o corpo físico e, que abandonam-se à viciação, transformam-se em vampiros, à procura de quem lhes aceite as sugestões infelizes[2].
O mestre lionês perguntou[3] aos Benfeitores Espirituais se o mal não se torna um arrastamento irresistível, quando o homem se acha, de certo modo, mergulhado na atmosfera do vício. Ao que os Espíritos responderam: arrastamento sim; irresistível não!
Realmente nada pode resistir à força de vontade e à motivação para o bem. Quando com vontade firme empreendemos o combate, não há arrastamento que não ceda.
Em que pese a ostensiva influência espiritual, o livre-arbítrio fica sempre preservado. Os Espíritos, portanto, não possuem o irresistível poder de nos induzir ao vício e muito menos de alimentá-lo, a não ser que o permitamos, pois há quem se compraza em comportamentos deletérios. Aqui vige a lei de sintonia. É como dizia o velho axioma popular: assombração sabe pra quem aparece.
De uma maneira eufêmica e elegante, Jesus colocou a mesma linha de pensamento desses axiomas, quando afirmou[4]: Onde está o tesouro, ali se encontra o coração.
Faz-se necessária a ampliação do conceito da palavra vício, vez que não constitui vício tão somente o tabagismo, a alcoofilia, as drogas e quejandos, mas tudo que, de uma forma ou de outra, caracteriza uma compulsão irresistível, como por exemplo: comer mais do que o necessário, um joguinho inocente de baralho etc. Tudo isso pode ter como corolário uma arruinadora viciação de lamentáveis consequências.
Eis a declaração feita por um Espírito viciado em jogo, evocado em uma reunião mediúnica:
Fui um viciado no jogo de cartas. Destruí minha vida por causa disso. Sem o saber, eu era um doente da Alma e jamais atendi aos apelos de meus familiares para parar com o hábito.
Minha iniciação deu-se na infância, vendo meu pai envolvido com esse “entretenimento”. Quando me vi adulto, depois de cuidar de minha vida profissional, dediquei-me totalmente ao baralho.
No princípio, apostava pequenas quantias com os amigos, apenas por brincadeira, mas o que era prazer virou necessidade e as importâncias das apostas cresceram junto com a compulsão de jogar sem parar. Só parava alguns minutos para atender – apressadamente – às necessidades fisiológicas. Acabei perdendo todo o meu patrimônio penosamente amealhado em uma vida inteira de trabalho. Desencarnei deixando minha família em péssima situação financeira.
Aportei no Mundo Espiritual num dos piores estados psíquicos que se possa imaginar.
Depois de ter sido recolhido pelos Benfeitores Amigos, demorei muito em situação de letargia e, mais tarde, eles me ensinaram que o Bem não tem duas faces, e que uma árvore não pode dar frutos bons e maus ao mesmo tempo. Lembrei-me, então, que Jesus já havia dito isso, só que não atinei em aplicar essas palavras em minha vida, como, aliás, nada apliquei do que Ele ensinou ao preço de Sua própria vida.
O jogo é pernicioso ao crescimento das criaturas em toda e qualquer situação.
Quisera ter condições de ajudar aos irmãos, que ainda estão se iniciando nesse caminho traiçoeiro; conscientizá-los dos malefícios causados por essa moléstia tão amplamente acoroçoada pela sociedade.
O jogo escraviza o homem tal qual as drogas, contra as quais combatem com energia. De qualquer natureza ele é sempre um mal, tanto para quem faz uso como para quem o promove. Ninguém pode sequer imaginar o aspecto espiritual da jogatina: verdadeiros vampiros associam-se aos incautos e quanto mais se apaixonam pelo jogo, mais necessidade passam a ter dele, numa estreita e constringente simbiose.

André Luiz desvela[5] para todos nós os cinzentos e embaciados panoramas onde estão alocadas no Mundo Espiritual essas Almas enviscadas no vício. Aprendamos um pouco com o ilustre Benfeitor Espiritual:
(…) Muitos de nossos irmãos, que já se desvencilharam do vaso carnal, se apegam com tamanho desvario às sensações da experiência física, que se cosem àqueles nossos amigos terrestres temporariamente desequilibrados nos desagradáveis costumes por que se deixam influenciar.
(…) Esses nossos companheiros situaram a mente nos apetites mais baixos do mundo, alimentando-se com um tipo de emoções que os localiza na vizinhança da animalidade. Não obstante haverem frequentado santuários religiosos, não se preocuparam em atender aos princípios da fé que abraçaram, acreditando que a existência devia ser para eles o culto de satisfações menos dignas, com a exaltação dos mais astuciosos e dos mais fortes. O chamamento da morte encontrou-os na esfera de impressões delituosas e escuras e, como é da Lei que cada alma receba da vida de conformidade com aquilo que dá[6], não encontram interesse senão nos lugares onde podem nutrir as ilusões que lhes são peculiares, porquanto, na posição em que se veem, temem a verdade e abominam-na procedendo como a coruja que foge à luz.
Chegará o dia em que a própria Natureza lhes esvaziará o cálice (…), utilizando-se de uma infinidade incomensurável de processos de reajuste, no Universo Infinito em que se cumprem os Desígnios do Senhor, chamem-se eles aflição, desencanto, cansaço, tédio, sofrimento, cárcere…

Há dolorosas reencarnações que significam tremenda luta expiatória para as almas necrosadas no vício. Temos, por exemplo, o mongolismo, a hidrocefalia, a paralisia, a cegueira, a epilepsia secundária, o idiotismo, o aleijão de nascença e muitos outros recursos, angustiosos embora, mas necessários, e que podem funcionar em benefício da mente desequilibrada, desde o berço, em plena fase infantil. Na maioria das vezes, semelhantes processos de cura prodigalizam bons resultados pelas provações obrigatórias que oferecem…
No entanto, se as criaturas visivelmente confiadas à devassidão resolverem reconsiderar o próprio caminho, se voltarem à regularidade, através da renovação mental com alicerces no bem, ganhariam tempo, recuperando a si mesmas… Usando a alavanca da vontade, atingimos a realização de verdadeiros milagres; mas, para isso, há que se despender esforço heroico.
(…) Onde há pensamento, há correntes mentais e onde existem correntes mentais existe associação. E toda associação é interdependência e influenciação recíproca. Daí concluímos quanto à necessidade de vida nobre, a fim de atrairmos pensamentos que nos enobreçam. Trabalho digno, bondade, compreensão fraterna, serviço aos semelhantes, respeito à Natureza e oração constituem os meios mais puros de assimilar os princípios superiores da vida, porque damos e recebemos, em Espírito, no plano das ideias, segundo as leis universais que não conseguiremos iludir.
Concluem os Espíritos Superiores[7]:
(…) não tereis verdadeiramente o direito de dizer-vos civilizados, senão quando de vossa sociedade houverdes banido os vícios que a desonram e quando viverdes como irmãos, praticando a caridade cristã. Até então, sereis apenas povos esclarecidos, que hão percorrido a primeira fase da civilização.

Com todos esses fatos, podemos compreender um pouco melhor o que motivou Jesus a dizer[8]:
Se, portanto, a luz que em ti há são trevas, quão grandes serão tais trevas! Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamon.



Fonte: Mundo Espírita (FEP)




[2] Xavier, Francisco Cândido. “Seara dos médiuns”. Pelo Espírito Emmanuel. 11. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1998. cap. Espíritos perturbados.
[3] Kardec, Allan. O livro dos Espíritos. 88ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. pt. 3, cap. 1, q. 645.
[4] Bíblia, N. T. Mateus. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Campinas: Os Gideões Internacionais no Brasil, 1988. cap. 6, vers. 21.
[5] Xavier, Francisco Cândido. “Nos domínios da mediunidade”. 12ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 1983. cap. 15.
[6] Bíblia, N. T. Mateus. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Campinas: Os Gideões Internacionais no Brasil, 1988. cap. 16, vers. 27.
[7] Kardec, Allan. O livro dos Espíritos. 88ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. pt. 3, cap. VIII, q. 793.
[8] Bíblia, N. T. Mateus. Português. O novo testamento. Tradução de João Ferreira de Almeida. Campinas: Os Gideões Internacionais no Brasil, 1988. cap. 6, vers. 23 e 24.

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