sexta-feira, 7 de junho de 2019

Manifesto por um Espiritismo Kardecista Livre[1]




No Brasil existem centros espíritas que dão cursos práticos de mediunidade de cura com aulas sobre física quântica. Noutros centros, apostilas mostram a coreografia correta para se aplicar um passe. Médiuns psicografam livros detalhando planos de dominação das trevas, e lideranças se dedicam a traduzir a Bíblia. Instituições impõem liturgias, proibições e dogmas e consideram o trabalho de Kardec uma revelação divina, seus livros como lei escrita em pedra. E tudo isso é denominado unicamente de espiritismo, apesar das profundas contradições.
Além disso, vivemos num momento histórico de grandes contradições sociais e retrocessos políticos. E muitos espíritas como nós não estão satisfeitos com o conservadorismo predominante em nosso movimento.
Para tentar organizar essa cacofonia, iluminando o que é essência e o que é incoerência, lançamos hoje esse manifesto, que ficará on-line. Nele também mostramos que o espiritismo é um pensamento livre e progressista e deve estar a postos para mudar a sociedade. Nos próximos meses vamos aprofundar as ideias do manifesto aqui no blog da ABPE. Quem quiser assinar (os nomes serão incluídos no site da ABPE), envie nome, cidade e estado ou país para o e-mail: abpe@pedagogiaespirita.org.br

Preâmbulo
O espiritismo no século XXI é um fenômeno multifacetado e complexo. Diferentes correntes que praticam a mediunidade se autodeclaram espíritas; outras, apenas espiritualistas. Todas elas merecem nosso respeito e solidariedade.
Entretanto, esse manifesto se refere à tradição específica de Kardec e quando nos declaramos espíritas aqui, estamos tratando desse legado.
 No Brasil, porém, o país com maior número de espíritas no mundo, criou-se uma forma de espiritismo institucional, hegemônico, que, para nós, não representa a maneira como entendemos o espiritismo fundado por Kardec.
Lançamos assim um manifesto de um movimento espírita kardecista livre, para demarcar o que nos une (e convidamos aqui o próprio movimento institucional) e o que desejamos como vivência e prática de uma filosofia livre, emancipadora e progressista como é a filosofia proposta por Kardec.
Esse manifesto tem a intenção de unir, sem homogeneizar; declarar princípios, sem dogmatismo; propor diálogo sem dissensão.
É uma iniciativa da Associação Brasileira de Pedagogia Espírita, mas apoiado por todos os signatários (pessoas físicas ou instituições) que manifestam a mesma visão que nós.

Manifesto

1) Aceitamos como princípios espíritas a existência de Deus, a existência dos Espíritos e comunicação com estes e a reencarnação, numa perspectiva de evolução individual e coletiva.
2) Consideramos Allan Kardec a referência fundamental do espiritismo, entendendo que há diversas leituras sobre suas obras e que essas diferenças devem ser respeitadas e debatidas fraternalmente.
3) Vemos o espiritismo como uma filosofia progressista, que não perde a sua identidade e especificidade de espiritualidade racional, quando em diálogo com outras filosofias e com a cultura de cada época histórica.
4) Compreendemos que o espiritismo está em permanente construção, em diálogo com a pesquisa científica, a reflexão filosófica e a comunicação dos Espíritos, desde que se mantenham de Kardec o espírito crítico, a observação empírica e o princípio ético do desinteresse.
5) Entendemos que a ética espírita – que é a do amor universal, inspirada na ética de Jesus – deve orientar nossas ações individuais e coletivas, em prol da transformação social; portanto, devemos marcar posição contra a violência de qualquer espécie, trabalhando pela dignidade humana, pela justiça e combatendo o abuso e a sujeição de pessoas, de qualquer idade ou condição.
6) Consideramos que as manifestações de médiuns, lideranças e dirigentes espíritas são livres e podem e devem ser analisadas e discutidas de forma respeitosa e racional. O exercício da mediunidade e os postos de liderança não conferem autoridade incontestável em nenhum assunto.
7) Rejeitamos a ideia de que o espiritismo seja uma religião institucional. Entendemos que ele propõe uma espiritualidade livre e aberta, com a possibilidade de diálogo com outras tradições espirituais.
8) Rejeitamos qualquer tutela institucional sobre o pensamento espírita: a prática, o estudo, as produções e a representação do espiritismo são livres e não são monopólio de nenhuma instituição nacional ou internacional.
9) Consideramos que o diálogo entre todos os espíritas deve ser aberto, empático e construtivo, sem a perda da criticidade e da liberdade de consciência e expressão.
10) Entendemos o espiritismo como uma proposta pedagógica, que trabalha por uma educação emancipatória de todas e todos para a convivência pacífica, para a justiça e equidade e para a prática de uma espiritualidade amorosa e crítica.




[1] https://blogabpe.org/2019/02/07/manifesto-por-um-espiritismo-kardecista-livre/

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