quarta-feira, 7 de novembro de 2018

A mediunidade de Eusápia Paladino[1]





Abaixo relato de Albert de Rochas com relação ao desenvolvimento e a manifestação da mediunidade de Eusápia Paladino.

As primeiras manifestações mediúnicas coincidiram com a idade da puberdade, aos treze ou quatorze anos.
É uma coincidência encontrada em quase todos os casos em que observamos a singular propriedade da produção dos movimentos à distância.
Nessa época de sua vida, notamos que as sessões espíritas às quais era convidada tinham muito mais sucesso quando ela sentava-se à mesa. Mas elas cansavam-na e aborreciam-na, e ela absteve-se de participar delas durante oito ou nove anos.
Foi somente aos vinte e dois ou vinte e três anos que a cultura espírita de Eusápia teve início, orientada por um espírita, o senhor Damiani[2]. Foi então que apareceu a personalidade de John King, que a possuía quando ela entrava em estado de transe[3]. Esse John dizia ser o irmão de Katie King[4] de Crookes, e ter sido o pai de Eusápia em outra existência. Era John quem falava quando Eusápia estava em transe. Ele falava dela, chamando-a de "minha filha" e dava conselhos sobre a maneira como ela devia ser tratada. O senhor Ochorowicz pensava que esse John era uma personalidade criada na mente de Eusápia pela reunião de certa quantidade de impressões recolhidas nos diferentes meios aos quais sua vida foi ligada. Essa seria quase a mesma explicação para as personalidades sugeridas pelos hipnotistas e para as personalidades observadas pelos senhores Azam, Bourru[5]·, Burot[6] etc. Pensamos ter notado que Eusápia se preparava, consciente ou inconscientemente, para a sessão, diminuindo sua respiração que permanecia regular; ao mesmo tempo, o pulso acelerava-se gradualmente de oitenta e oito para cento e vinte pulsações por minuto e tomava-se extremamente vigoroso. Seria uma prática análoga à utilizada pelos faquires da Índia, ou um simples efeito da emoção que, antes de cada sessão, Eusápia sentia - pois fazia muita questão de convencer os espectadores, mas nunca tinha certeza da produção dos fenômenos?
Eusápia não era hipnotizada. Ela entrava sozinha em transe quando participava da corrente de mãos.
Começava a suspirar muito profundamente, depois começava a bocejar, soluçar. Seu rosto passava, a seguir, por uma série de expressões diferentes. Ora ele assumia uma expressão demoníaca, acompanhada de um riso entrecortado idêntico ao que Gounod dá a Mefistófeles na ópera Fausto e que sempre precedia um fenômeno importante. Ora ele enrubescia; os olhos tornavam-se brilhantes, úmidos e muito abertos; o sorriso e os movimentos caracterizavam o êxtase erótico; ela dizia "mio caro" (meu querido), apoiava-se no ombro do seu vizinho e quando o achava simpático, procurava carícias. Era então que se produziam os fenômenos, cujo sucesso lhe provocava arrepios agradáveis, até voluptuosos. Durante esse tempo, as pernas e os braços encontravam-se em um estado de grande tensão, quase de rigidez, ou, então, tinham contrações convulsivas, às vezes uma trepidação, que se estendia pelo corpo inteiro.
A esses estados de superatividade nervosa sucedia um período de depressão, caracterizado pela palidez quase cadavérica do rosto, que muitas vezes se cobria de suor, e pela inércia quase completa dos seus membros. Se levantássemos sua mão, ela caía pelo seu próprio peso.
Durante o transe, os olhos reviravam-se para cima e só o branco era visível. A presença de espírito e a consciência geral eram diminuídos ou mesmo abolidos: diante das questões, não havia resposta ou a resposta era retardada. Assim, a lembrança do que aconteceu durante as sessões não existia para Eusápia, a não ser quanto aos estados muito próximos ao seu estado normal e, consequentemente, eles eram geralmente relativos somente aos fenômenos de pouca intensidade.
Frequentemente, para ajudar as manifestações, ela pedia que lhe déssemos força, colocando uma pessoa a mais na corrente. Várias vezes, acontecia-lhe de chamar um participante simpático, segurar-lhe os dedos e apertá-los como para deles extrair alguma coisa e, a seguir, rejeitá-los bruscamente, dizendo que ela já tinha força suficiente.
À medida que o transe se acentuava, a sensibilidade à luz aumentava. Uma luz súbita causava-lhe dificuldade de respirar, aceleração dos batimentos cardíacos, sensação de bola histérica[7], irritação geral dos nervos, dor de cabeça e nos olhos, tremores no corpo inteiro e convulsões, exceto quando ela própria pedia luz (o que acontecia com frequência quando havia constatações interessantes que deviam ser feitas a respeito dos objetos deslocados), pois, então, sua atenção estava voltada para outras coisas.
Ela se movia constantemente durante o período ativo das sessões: poderíamos atribuir esses movimentos às crises de histeria que então a acometiam; mas eles pareciam ser necessários à produção dos fenômenos. Todas as vezes que um movimento devia se produzir à distância, ela o simulava, seja com as mãos, seja com os pés, e desenvolvendo uma força bem mais considerável do que seria necessário para a produção do movimento com contato.
Eis o que ela própria conta de suas impressões quando quer produzir um movimento à distância:

Primeiramente, ela deseja ardentemente executar o fenômeno; depois ela sente entorpecimento e arrepios nos dedos. Essas sensações aumentam sempre e, ao mesmo tempo, ela sente na região inferior da coluna vertebral uma espécie de corrente que se estende rapidamente para os braços até os cotovelos, onde para suavemente. É então que o fenômeno acontece.

Durante e após a levitação das mesas, ela sentia dor nos joelhos; durante e após a realização dos outros fenômenos, sentia dor nos cotovelos e nos braços inteiros.




[1] As Forças Naturais Desconhecidas, Camille Flamarion
[2] Giovanni Damiani, italiano, professor e estudioso do espiritismo.
[3] Demos o nome de transe (os ingleses escrevem trance) ao estado especial no qual entram os médiuns quando eles perdem a consciência do meio ambiente. É uma espécie de sono sonambúlico.
[4] Katie King era o suposto espírito que se manifestou em fins do século XIX através da médium Florence Cook, uma jovem de quinze anos.
[5] Henri Bourru, médico francês.
[6] Prosper Ferdinand Burot, médico francês.
[7] Sensação de ter um “nó”, um obstáculo na garganta, quando ele não existe.

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