“Porventura compreendeis a expansão da Terra... o caminho da Morada da
Luz... ou o local da escuridão...?” (Livro
de Jó)
Quando tudo corre suavemente em
nossas vidas, a maioria de nós tende a pensar que a sociedade na qual vivemos é
“natural” e que nossas ideias sobre o mundo são inquestionavelmente
verdadeiras. É difícil imaginar como outras pessoas, em outras eras e lugares,
viveram do modo como viveram ou que acreditaram em certas coisas. E é assim que
aconteceu com as teorias sobre a luz.
Diversas teorias sobre a
natureza da luz e como ela se comporta foram propostas desde os tempos dos
filósofos gregos, através de suas observações pura e simples da natureza.
Os antigos filósofos
gregos acreditavam que o olho humano teria a capacidade da visão porque a deusa
Afrodite incluiu o fogo na sua composição[3].
A luz que percorre o universo é
resultante de processos complexos que se passam a nível estelar. A ciência nos
mostra que a luz vagou através dos tempos como as ondas, ora batendo em praias
de liberdade, ora em praias de escravidão; ora caindo na escuridão da
inquisição medieval, ora renascendo e trazendo de volta os valores humanos. Assim
acreditava o físico holandês Christian Huygens (1629-1695), que a luz se
propagava no espaço como uma onda, como as ondas de um oceano.
Discordâncias a parte, pois o físico
inglês Isaac Newton (1643-1727) argumentava em favor de uma teoria corpuscular
para a luz; são as descobertas do século XIX sobre a fotografia, ótica e sobre
o funcionamento da visão que possibilitaram a exploração de novos parâmetros e
concepções de jovens pintores preocupados com uma nova forma de expressar a luz
em seus quadros. A luz, objeto de pesquisa científica, tornou-se o assunto da
época e invade as artes aguçando os sentidos e o prazer sensorial. Nascia
assim, numa tarde fria de abril de 1874, na cidade de Paris, no ateliê do
fotógrafo Maurice Nada, o Impressionismo. No Impressionismo, após a
decomposição do real, a luz é utilizada como o elemento de construção da
matéria. Os impressionistas não pintam as coisas, mas as luzes refletidas por elas.
Semelhantemente aos gregos, os artistas impressionistas também não faziam
discernimento entre a luz e a visão uma vez que o contorno do desenho tem um
caráter indeterminado porque não se deixa discernir.
O impressionismo de
Claude Monet (A Ponte de Argenteuil - 1874). Monet pintava ao ar livre e era um
incansável pesquisador das técnicas de pintar o reflexo da luz solar,
principalmente quando refletida nos seres humanos e/ou na natureza. Para obter
os efeitos desejados, Monet pintava o efeito das luzes com rápidas pinceladas.
Sua obra é clara, limpa e cheia de cores, onde até mesmo as sombras são
luminosas e coloridas[4].
Através das tecnologias
desenvolvidas nos séculos XIX e XX tornou-se possível decodificar as
informações transportadas pela luz e isso levou a uma compreensão
significativamente maior do universo que nos envolve. Moléculas diferentes e
elementos químicos absorvem frequências ou cores diferentes de luz, algumas
vezes visíveis e outras vezes em qualquer outra parte do espectro eletromagnético
invisível ao olho humano. Tornou-se, então, possível a investigação da
composição química da Terra ou de planetas e estrelas distantes. Descobriu-se
quão vastas são as diversidades de fenômenos da Natureza e quão ricas são as
informações escondidas na luz.
A luz carrega
informações importantes e pode ser utilizada para examinar não só a composição
química de nosso planeta, mas também a de planetas distantes[5]
e da estrela responsável pela vida na Terra, o nosso Sol[6].
No caso da Terra, o espectro do Sol é de emissão, isto é, as linhas de emissão
dos elementos químicos são correspondentes às linhas negras do espectro solar.
Os séculos XX-XXI marcam uma
forte sinergia entre os criadores da tecnologia (engenharia) e as ciências da
Natureza (química, biologia, física). Os processos sinérgicos operam há muito
tempo em vários níveis hierárquicos da Natureza e muitas vezes escapam à
percepção comum. Na ciência e tecnologia isto não é diferente, particularmente
dentro do campo das ciências e tecnologias aplicadas à saúde humana.
Foi graças à sinergia que, há
aproximadamente quatro décadas, surge uma nova área na medicina utilizando a
luz para o tratamento do câncer: a fotomedicina.
Trata-se de uma área da medicina que emprega a luz como ferramenta essencial em
procedimentos de diagnóstico e terapia de enfermidades, particularmente o
câncer.
A fotomedicina apresenta um
crescimento quase exponencial no desenvolvimento de novas tecnologias para a
área da saúde, estimando-se para o ano de 2019 um faturamento de cerca de 754
milhões de dólares resultantes do desenvolvimento de novas técnicas de
tratamento e diagnóstico sendo projetado um crescimento aproximado de 4,1% ao
ano a partir de 2014.
Uma fonte de luz amplamente
utilizada na fotomedicina é o laser de baixa intensidade baseados em diodos
emissores de luz ou LED (Light Emitting Diode), laser de CO2 (de maior
potência) para cirurgias de grande porte e laser de fibras óticas.
Laser manual de
diodo semicondutor (LED) de Arseneto de Gálio e Alumínio (GaAlAs), laser de CO2
(maior potência relativamente ao manual) e laser de fibra ótica, atualmente
utilizado em procedimentos da acupuntura ou cirurgias invasivas[7].
Atualmente pesquisadores do
Laboratório de Biomateriais da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI) têm
concentrado esforços em busca do desenvolvimento de materiais avançados para a
fotomedicina. As pesquisas concentram-se especialmente no campo da
nanotecnologia envolvendo a aplicação da luz laser e nanotubos de dióxido de
titânio (TiO2) revestidos com sulfeto de zinco (ZnS) no diagnóstico e
tratamento do câncer. Ao mesmo tempo os nanotubos de TiO2/ZnS são carregados
com o agente quimioterápico, o 5-fluorouracil (5-FU), fármaco comumente
utilizado no tratamento de alguns tipos de câncer.
Os nanotubos de TiO2/ZnS
absorvem a energia luminosa da luz laser e transfere essa energia para o
oxigênio presente nas células tumorais formando espécies de oxigênio no estado excitado.
As células tumorais são normalmente mais oxigenadas que as células sadias.
Logo, o oxigênio excitado produzido pela transferência de energia dos nanotubos
de TiO2/ZnS à célula tumoral induz várias reações em cadeia com os componentes moleculares
presentes no tumor tais como DNA, proteínas, fosfolipídios da membrana celular,
mitocôndrias entre outras estruturas, tendo como resultado a morte da célula e consequentemente
do tumor.
Uma das características mais
marcantes da geração de dispositivo médico TiO2/ZnS voltado para aplicações na
fotomedicina é o seu acúmulo seletivo em massas tumorais com maior eficiência
na destruição do tumor, com um efeito colateral mínimo nas células normais,
vizinhas às células neoplásicas.
Os estudos experimentais de
fitotoxicidade no Laboratório de Biomateriais da UNIFEI com células de plantas (sycamore)
indicaram que os nanotubos de TiO2 /ZnS apresentam adequadas características
biocompatíveis além do sistema possuir propriedade de liberação controlada de
5-FU na dose terapêutica desejada. O estudo preliminar da fitotoxicidade se constitui
em um modelo alternativo de investigação da biocompatibilidade e sua utilização
na triagem inicial de materiais sintéticos candidatos a biomateriais poderá
contribuir significativamente para a substituição/utilização parcimoniosa de animais
em experimentação atendendo plenamente ao princípio dos 3 R´s da experimentação
animal (Redução, Reposição e Refinamento).
Devido à sua propriedade
biocompatível e de liberação do fármaco 5-FU, o potencial de aplicação dos
nanotubos de TiO2/ZnS na fotomedicina é muito promissora, principalmente na
área de oncologia. Entretanto, o mecanismo de atuação ao nível celular do
sistema TiO2/ZnS ainda está sob estudo do grupo de investigadores do
Laboratório de Biomateriais da UNIFEI.
O entendimento do processo
básico de atuação ao nível celular, o controle de sua vetorização às células
tumorais e da liberação do quimioterápico 5-FU levará a uma nova geração de
sistemas fotônicos sinérgicos para o tratamento do câncer, que combinam as
propriedades peculiares dos nanotubos de TiO2/ZnS com sua capacidade de
reconhecimento molecular de células tumorais.
Os resultados da pesquisa com
TiO2/ZnS são decorrentes de financiamentos dos órgãos de fomento à pesquisa
FINEP, CNPq e FAPEMIG sob a coordenação do Prof. Dr. Álvaro Antonio Alencar de
Queiroz. Atualmente os nanotubos TiO2/ZnS estão sendo revestidos com materiais
magnéticos. O intuito da inovação destes materiais é fazer com que os nanotubos
de TiO2/ZnS sejam guiados por campos magnéticos até a região tumoral e
proporcione aquecimento local ou seja, hipertermia magnética. A hipertermia
magnética é um tratamento alternativo que se baseia no aquecimento da região
tumoral, levando à morte células malignas.
De certa forma, todo o progresso
da ciência nos dois últimos séculos tem sido uma viagem ininterrupta a
dimensões de Natureza estranha.
A simplicidade baseada de que a
vida surgiu do acaso revelou-se uma ilusão. Em vez disso, descobriu-se que a
complexidade que reside na célula biológica humana é espantosa. E ainda há
muitas dimensões escondidas que a mente humana desconhece.
Os resultados experimentais e
teóricos apontam que a vida parece ter sido planejada por uma Inteligência Suprema
o que é um choque para o ser humano que se acostumou a pensar na vida como um
resultado de leis naturais simples, um resultado do acaso. Os gregos também tiveram
um choque ao descobrirem a verdadeira natureza da luz. A humanidade também se
chocou quando Einstein reinventou o espaço, o tempo e a luz.
Outros séculos por vir também
terão seus choques e não há razão para pensar que deveríamos escapar deles. Na medida
em que a vida se expande e na proporção em que o universo se mostra mortal, avanços
revolucionários na medicina transformarão ficção em realidade. Entretanto, a
esperança da evolução humana reside essencialmente como um estado de espírito e
não como um estado de mundo. A oportunidade de trabalharmos juntos para o bem
comum é esplendorosa e devemos aproveitá-la, pois haverá evolução e sabedoria sem
precedentes. Seremos o próprio universo conduzindo a experiência de conhecer a nós
mesmos.
[2] Dr. Álvaro Antonio Alencar de Queiroz, Professor do
Instituto de Física e Química e Pesquisador Associado do Centro de Estudos e
Inovação em Materiais Biofuncionais e Biotecnologia da Universidade Federal de
Itajubá.
[5] Cotton, D.V., Bailey, J., Crisp,
D., Meadows, V.S., 2012, "The Distribution of Carbon Monoxide in the Lower
Atmosphere of Venus", Icarus, 217, 570-584.
[6] Cotton, D.V., Bailey, J., Crisp, D., Meadows, V.S.,
2012, "The Distribution of Carbon Monoxide in the Lower Atmosphere of
Venus", Icarus, 217, 570-584 e http://astro.u-strasbg.fr/~koppen/discharge/
(Adaptado).
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