Grupo de Orléans – Médium: Sr. de Monvel
De todas as virtudes de que o
Cristo nos deixou o adorável exemplo, nenhuma foi mais indignamente esquecida
pela triste Humanidade do que a castidade. E não falo apenas da castidade do
corpo, de que certamente ainda se encontrariam na Terra numerosos exemplos, mas
dessa castidade da alma, que jamais concebeu um pensamento, deixou escapar uma
palavra susceptível de manchar a pureza da virgem ou da criança que a escuta.
O mal é tão universal, as
ocasiões de perigo tão multiplicadas, que os pais, mesmo os verdadeiramente
castos em seus atos e em suas palavras, não podem escapar à dolorosa certeza de
que seus filhos não poderão, façam o que fizerem, subtrair-se ao funesto
contágio. É-lhes necessário, por maior que seja a repugnância que apresentem, resignarem-se
eles mesmos a abrir os olhos dessas inocentes criaturas, ao menos para preservá-las
do perigo físico, já que é absolutamente impossível preservá-las do perigo
moral; e, muitas vezes ainda, quando julgavam ter evitado o perigo, aparece
algum escolho, cuja existência não haviam suspeitado e sobre o qual vem
encalhar a pobre e inocente criança, que seu amor não pôde preservar da sujeira
do vício.
Quantas palavras imprudentes, mesmo
na mais seleta sociedade; quantas imagens e descrições, mesmo nos mais sérios livros,
não vêm, sem que os pais o saibam, despertar, excitar ou mesmo satisfazer
completamente essa curiosidade ávida, tão temível, da criança que não tem a
menor consciência do perigo! Se o mal é difícil de evitar, mesmo nas classes
mais esclarecidas da sociedade, que dizer das classes inferiores? E supondo que
uma criança tenha tido a felicidade de escapar a isso no teto paterno, como
protegê-la desse inevitável contato com os vícios que a oprimem diariamente?
Eis uma chaga muito profunda,
muito perigosa, da qual todo homem, que conservou o senso moral no fundo do
coração, deve sentir a mais imperiosa necessidade de expurgar da sociedade.
O mal está arraigado em nossos
corações, e muito tempo se escoará ainda antes que cada um de nós se tenha
tornado bastante puro para apenas lhe suspeitar a gravidade. Um tal pensaria cometer
falta séria se, ante uma criança, se permitisse a mínima palavra ambígua; no
entanto, rodeado de pessoas maduras, sentirá prazer em contar piadas obscenas
ou triviais que, diz ele, não fazem mal a ninguém. Não vê que a obscenidade é
um mal tão imoral que mancha tudo quanto toca, mesmo o ar, cujas vibrações
levarão longe o contágio. Diz-se que as paredes têm ouvidos e esta imagem nunca
foi tão verdadeira quanto em semelhante matéria. A pura e santa castidade só
estabelecerá definitivamente o seu reino na Terra quando toda criatura que
pensa e fala tiver compreendido que jamais deve, em qualquer circunstância, nem
escrever nem pronunciar uma palavra que a virgem mais pura não possa ouvir sem
corar.
Direis que não tendes filhos e
que não há uma só criança em vossa casa e, assim, não tendes nenhuma razão, no vosso
entender, para vos constrangerdes. Mas se vós mesmos fôsseis puros, não vos
sentiríeis constrangidos; e não tendes amigos que vos escutam, que o vosso
exemplo excita e que talvez perderão, ante os filhos que não conheceis, a
reserva que um resto de pudor lhes havia feito observar até então? Depois, é
quase sempre às refeições que vosso espírito se deixa arrastar em ditos
espirituosos que provocam o riso dos convivas; mas não vedes os serviçais que vos
rodeiam, e vosso vizinho tem filhos! Não conheceis esse vizinho, nem seus
filhos, e jamais sabereis o mal do qual fostes a causa; mas o mal – ficai
certos – venha de onde vier, será sempre punido. Não só as paredes têm ouvidos:
no ar que respirais há coisas que ainda não conheceis ou que não quereis
conhecer.
Ninguém tem o direito de exigir
de seus subalternos uma virtude que não pratica nem possui.
Basta uma única palavra impura
para alterar a pureza de uma criança; basta uma única criança impura
introduzida numa casa de educação pública para gangrenar toda uma geração de crianças
que, mais tarde, se tornarão homens. Haverá um só homem sensato que ponha em
dúvida a verdade patente e dolorosa deste fato? Ninguém duvida, ninguém ignora
toda a extensão do mal que uma única palavra pode acarretar e, contudo, ninguém
se julga obrigado a essa castidade da alma, que revolta todo pensamento
obsceno, por mais disfarçado que seja e, mesmo, em certas circunstâncias,
ninguém olha como estrita obrigação moral abster-se de pilhérias que deviam
fazê-lo corar, se não se orgulhasse em não corar. Triste e vergonhoso orgulho!
Não é só a castidade que
deveríamos respeitar nas crianças, mas, também, essa delicada candura a quem
toda ideia de falsidade faz corar o rosto; e essa virtude é também muito rara.
Mas quando se observa como é elevada a imensa maioria de nossos filhos, não nos
devemos admirar muito. Para a maioria dos pais, os filhos, sobretudo em tenra
idade, não passam de pequenas bonecas, com as quais se divertem, como se fossem
um brinquedo. E o que as torna tão divertidas é que sua ingênua credulidade
permite que se abuse de sua paciência, de manhã à noite, com pequenas mentiras,
julgadas inocentes porque são feitas sem qualquer maldade e unicamente, como se
diz, para rir. Ora, em sua verdadeira acepção, a palavra inocente significa:
que não prejudica.
Mas, ao contrário, que há de
mais nocivo à candura de uma criança que esses pequenos e contínuos abusos de
confiança, dos quais ela é inocente por um instante, mas só por um instante,
para depois rir e se divertir, achando o maior prazer em imitar logo que pode?
Disso resulta muitas vezes que a
criança mais cândida aprende a enganar tão depressa quanto aprende a falar e
que, ao cabo de pouco tempo, é capaz de dar lições aos seus mestres.
Quase não se suspeita, sobretudo
nessa idade, que muitas vezes uma causa insignificante possa mais tarde
provocar deploráveis resultados. Os órgãos da inteligência, nas crianças muito
jovens, são qual cera mole, apta a receber o molde do mais fraco objeto que a
toca e, mesmo, deformá-lo, ainda que por um instante. E quando esta cera, a
princípio tão fluida, vier a endurecer, a impressão ficará inapagável. É um
erro crer-se que ela possa ser coberta por outras: só a marca primitiva ficará
indelével; ao contrário, as impressões ulteriores é que deixarão apenas um
traço fugaz, sob o qual a primeira aparecerá sempre.
Eis o que bem poucos jovens pais
são capazes de sentir com bastante força para disso fazerem uma regra de
conduta com seus filhos, sendo necessário que se lhes repita continuamente.
Cécile Monvel
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